Ensinamentos de Krishna - Resumo

Ensinamentos de Krishna - Resumo

Um resumo do estudo dos ensinamentos de Krishna 

Ensinamentos de Krishna - Resumo

O trabalho da reforma íntima

Uddhava perguntou:

Ó Krishna, muitos dos mortais sabem que o contato dos gunas objetivos (objetos, coisas) com os gunas sensoriais (sentidos) geralmente é fonte de perigo e perdição. Por que, então, os homens se deliciam com tal contato, como fazem um cão, um asno ou uma cabra? (Bhagavata Puranas – capítulo 7 – versículo 8).

Vejam que tema interessante será abordado hoje. Uddhava, discípulo que conversa com Sri Krishna nesse texto, faz a pergunta que todos vocês me fazem. Ele pergunta ao mestre por que o homem que já tem notícias da influência do pensamento sobre a vida, o que é o caso de vocês, aceita esta influência?

Em essência é exatamente esta a questão que vocês levantam quando me perguntam: “já entendi tudo, mas por que não consigo colocar na prática?” Através da resposta de Krishna, buscarei responder, de uma vez por toda, pelo menos para nosso grupo, aos questionamentos mais freqüentes de vocês: como se faz a reforma íntima para alcançar a elevação espiritual? Como se consegue levar à prática tudo o que temos estudado?

O Bendito Senhor disse:

No Coração daquele que não está atento e que não discerne, de forma aparentemente espontânea levanta-se o pensamento de “eu” e “meu”; depois disso, uma horrenda tendência rajásica se apodera da mente de tal homem (atividade egocêntrica e egoísta), que, originalmente, será sáttvica (ou pura e impessoal).

E o pensamento, arrastado pelas tendências rajásicas, cobiça os desejos que reforçam aquele, graças a toda espécie de raciocínio. E, depois de muito insistir nas qualidades supostamente atraentes de uma coisa (pensada), o néscio passa a sentir por ela uma ânsia veemente e desordenada.

Dominado por esta ânsia, o homem, incapaz de dominar-se, passa a executar ações intencionais, cujos frutos lhe produzirão futuros sofrimentos, tão embotado fica pela violenta tendência rajásica. (idem – versículos 9 à 11).

Como disse, nesta resposta de Krishna está ensinada toda essência da reforma íntima. Vamos entendê-la...

O mestre começa a resposta dizendo que toda perdição (vivência da vida carnal sem o sentido da elevação espiritual) inicia-se quando o ser humanizado, por desatenção, acredita (dar o valor de real, realidade) nos pensamentos fundamentados no “eu” ou no “meu” que são gerados pelo ego.

O que são pensamentos fundamentados nestes pronomes? Paixões... Eu sei, eu gosto e é meu...

Todo pensamento que começa a partir destes três elementos e é aceito como real pelo ser humanizado que não está atento ao seu trabalho de reforma íntima (alterar os frutos de seu íntimo), sofre a influência do guna rajas (qualidade de pensamento que se caracteriza pela obsessão de agir), ou seja, sofre a tendência de gerar um novo pensamento, que contenha a necessidade de agir.

Compreendam bem o ensinamento de Krishna. Todo pensamento, formado a partir do “eu” ou do “meu”, que diga respeito a qualquer elemento do Universo, leva a um novo pensamento que embute em si uma necessidade de agir, seja esta ação executada por você mesmo ou por outros. Quem está descuidado com o pensamento que diz, por exemplo, que essa cadeira é dele, ou seja, aceita a posse expressa através da paixão pela cadeira como real, estará logicamente sujeito a um pensamento que diz que ele deve agir sobre a cadeira, protegendo-a, dando-a, limpando-a, arrumando-a, etc. Não importa qual a ação seja exigida: o próximo pensamento trará em si uma determinada obrigação de você ou alguém praticar uma ação que reflita a posse e a paixão.

É isso que Krishna ensina a Uddhava. Mas, é interessante repararmos que o mestre também diz que o primeiro pensamento, aquele que determinou a posse e a paixão, foi, primariamente, originado com qualidades de bondade e amor (gerado com o guna sattva). Só depois, ou seja, quando o ser humanizado, por desatenção, aceitou como real a possessão, ele sofreu a influência da tendência rajas. Vamos entender isso...

É aquilo que temos falado durante todos estes anos de estudo: o pensamento cria a provação que o espírito vem realizar durante a sua encarnação. Por isso ele é a materialização do amor de Deus por este ser, já que, com isso, está proporcionando uma oportunidade para que este filho realize o trabalho da libertação (reforma íntima).

Dessa forma, o pensamento que originou todo o processo, era bondoso, mas, quando o ser humanizado não se reforma (liberta-se da influência das suas verdades relativas), sofre a obsessão de vivenciar uma ação. É exatamente o que Paulo diz na Carta aos Romanos: quando o ser humanizado não dá a Deus o seu Real valor (Senhor do Universo, Causa Primária de todas as coisas), Ele o entrega às relações artificiais, que são uma vergonha para a coletividade espiritual (relação com os elementos do mundo através da possessão).

Esta entrega de Deus (deixar que o ser humanizado acredite no que o ego cria) se reflete, então, num novo pensamento que conterá a necessidade de uma ação. Mas, esta ação não acontecerá, a menos que Deus, utilizando-se da Causa Primária crie, através de maya, uma ilusão que forme tal ação.

No entanto, o ser humanizado, dominado por esta tendência da necessidade de uma ação, entra num processo de agonia, já que querer agir e muitas vezes não consegue. Mas, mesmo que Deus crie a ilusão da ação acontecer,a agonia não terminará, pois novo pensamento com qualidade rajásica se instalará e gerará, novamente, a necessidade de outra ação.

Todo esse processo continuará e cada vez mais o ser humanizado acreditará na qualidade rajásica de seus pensamentos e exigirá a necessidade de maya espelhar a ação esperada. Esse processo gera uma eterna agonia pois, às vezes, a obsessão é atendida e outras não.

É exatamente a vivência desta agonia que reflete o distanciamento do ser humanizado de Deus, pois aquele que se aproxima do Pai vive a felicidade que Ele tem prometido.

Foi isso que Krishna respondeu a Uddhava neste texto. O ser humanizado desatento, aceita a possessão (é meu, eu sei, eu gosto) e a paixão que o ego cria apenas como prova, como se fosse real. Quando isso acontece, o ego, numa segunda etapa, exige uma ação e a condiciona a um determinado desejo. Dessa crença na necessidade da ação e na esperança que ela satisfaça as vontades deste ser é que vem a agonia de esperar que o desejo seja transformado em atos...

Aí está como eu disse, a resposta às perguntas que vocês fazem constantemente. Aquele que quer ser senhor da mente, promover à sua reforma íntima e elevar-se espiritualmente, precisa estar, primeiro, atento às formações mentais e segundo, durante esta atenção, reconhecer as paixões oriundas de possessões que o ego cria. A partir do momento que reconhece como tal, tratar estas verdades ditadas pelo ego como prova e não como realidades...

Colocando este ensinamento dentro do exemplo que dei, o ego diz que determinada cadeira é sua, que você gosta dela e que, por isso, quer que ela fique aqui. Neste pensamento estão presentes as posses moral (saber), sentimental (gostar) e material (propriedade) agindo em conjunto com a paixão (cadeira) e um desejo específico (ficar aqui).

Reconheça que este pensamento é apenas uma declaração expressa das posses, paixões e desejos presentes no seu ego, para que você possa realizar o trabalho da reforma. Faça isso não acreditando que estas afirmações são verdadeiras...

Entenda que tudo isso (a existência de posses, de paixões e de desejos e a utilização deles pelo ego em pensamentos) não é real, mas apenas uma prova que Deus está lhe dando para que você possa reformar o seu íntimo e, com isso, alcançar a elevação espiritual...

Apesar de estarmos lendo um texto védico que contêm ensinamentos de Krishna, o que estamos falando é do tema máximo que Cristo ensinou e exemplificou como o caminho, a verdade e a vida que leva à Deus: o despossuir os bens materiais...

Sabe, filhos, tem uma música de vocês que diz: assim: “a lição sabemos de cor, só nos falta aprender” (Primavera – Beto Guedes). Esta afirmação é perfeita...

Cristo ensinou que é necessário despossuir os bens materiais e todos que leram o Novo Testamento sabem disso – ou melhor, leram sobre isso. Mas, apesar de saberem, ninguém aprendeu de verdade este ensinamento porque não reconhecem o que é a possessão e o que possuem. Como então despossuir?

A possessão é tudo aquilo (as paixões) que são tratadas pelo pensamento a partir dos pronomes “eu” e “meu”. É qualquer declaração mental onde entre um “eu” (acho, sei, gosto, amo, tenho vontade) e um “meu” (é minha coisa).

Em qualquer raciocínio onde estejam presente estes dois elementos (“eu” e “meu”) o que existe ali é a expressão de uma posse de um objeto, que é a paixão mundana, já que é uma paixão motivada por elementos materiais (pelas posses).

A posse, seja de qualquer um dos três tipos, por qualquer coisa (objetos, pessoas ou acontecimentos) externada através de um pensamento, lhe é dada como uma oportunidade de despossuir. Ela não é real, ou seja, nada é seu, de nada você gosta ou sabe realmente.

Deus não lhe dá a cadeira, a casa, o cachorro, o marido, a mulher ou o filho. Tudo é dele, tudo é Ele. Ele não lhe dá, mas coloca, através do poder de maya, estas ilusões à sua disposição para justificar racionalmente o pensamento formatado a partir do “eu” e do “meu” para que você tenha a grande oportunidade de despossuir.

Agora está completa a resposta às eternas perguntas de vocês:

O que é o trabalho de reforma íntima? É o trabalho de libertação das realidades criadas pelo ego (despossuir), o trabalho de reformar a sua forma de relacionar-se com o ego...

Como realizá-lo (como despossuir)?

Primeiro: reconhecendo que você é um possessivo por natureza.

Segundo: reconhecendo as paixões que a possessão gera (o que é seu, o que você sabe e do que gosta ou desgosta).

Terceiro: silenciando a ação da paixão (libertar-se do valor real que o ego aplica ao que diz saber, diz que é seu e do que ele afirma que você gosta ou desgosta).

Vivendo com atenção plena às suas formações mentais através de um esforço correto, o ser humanizado pode atingir a compreensão perfeita da realidade (tudo o que o ego diz é apenas uma prova onde o possuir está sendo testado).

NOTA: Os três elementos citados neste parágrafo (“atenção plena”, “esforço correto” e “compreensão perfeita”), fazem parte do Nobre Caminho Óctuplo ensinado por Buda como àquele que leva à elevação espiritual.

Com isso silencia-se o poder da paixão que está expressa no pensamento e consegue-se viver a essência sáttvica que o gerou. Consegue-se, ainda, eliminar a influência rajásica (a obsessão de haver uma ação) e, com isso acaba-se com o processo obsessivo da exigência da ação que leva à agonia. Tudo isso somado, deixa o espírito vivenciar a felicidade que Deus promete aos seus filhos: a felicidade incondicional, a glória de Deus.

O ser humanizado não vive a felicidade incondicional não é por causa das ações que ele vivencia como agente ou receptor. A simples expectativa, criada pela qualidade rajásica, de que tem que haver ações em conjunto com determinados desejos, que surgem naturalmente quando existem possessões e paixões, já leva o ser humanizado à agonia, pois ele não sabe se ação gerada por maya (inescrutável poder de Deus de criar realidades ilusórias – Causa Primária das coisas) atenderá sua vontade e expectativa.

Quem sabe, por exemplo, que a casa é sua e sabe como ela deve ser limpa, espera uma determinada ação: aquela que espelhe a limpeza que acha que deveria ser realizada. Este ser viverá em constante agonia esperando que este desejo se concretize.

Quem sabe que o filho é seu e que por isso acha que tem o direito de comandar o destino dele, entra na obsessão da ação gerada a partir de suas vontades. Apesar de acreditar que sabe o que é “melhor” para este filho, o ser humanizado que vive estas criações mentais como realidades, tem a plena consciência de que muitas vezes o que ele espera nunca acontecerá. Por isso a agonia constante...

Por tudo isso que vimos aqui, afirmo: o conhecimento gerado a partir desta resposta de Krishna é fundamental para nosso estudo e é, também, para a vida daquele que quer se dizer buscador de Deus.

Ensinamentos de Krishna - Resumo

Aproveitando o tempo

12. Sabe, Arjuna, que nunca houve tempo em que eu (SER) deixasse de existir, nem tu, nem esses reis, e jamais deixaremos de existir no futuro. (Bhagavad Gita – capítulo II)

O espírito é eterno. Este é o ensinamento que todo aquele que acredita no ser universal possui. O espírito é gerado por Deus e viverá por toda eternidade.

Vocês sabiam disso? Então, eu pergunto: porque vivem a encarnação com pressa em realizar alguma coisa? Se vocês acreditam no ser universal como eterno deveriam saber que possuem toda eternidade para alcançarem aquilo que desejam e, por isso, não deveriam ter pressa em realizar nada...

Participante: Concordo com o senhor que vivemos com pressa em realizar, mas algumas realizações que buscamos podem ser consideradas boas, como por exemplo a busca da elevação espiritual, não?

O que importa, como já vimos, é a intenção com que se vive e não o ato em si. A sua pressa em buscar a elevação espiritual não se fundamenta no desejo de interligar-se amorosamente com Deus, mas no medo da morte, medo do julgamento, medo do que sucederá se não realizar a elevação espiritual. Por isso, mesmo esta pressa não pode ser considerada válida.

Aliás, o espírito humanizado tem pressa em conquistar coisas durante a vida material, mesmo que ela não esteja ligada à sua Realidade espiritual, justamente por isso: por ter medo da morte. Quer conquistar elementos materiais porque acha que o tempo está passando. Acredita que precisa rapidamente conquistar os bens materiais porque a sua vida tem um limite.

O ser humanizado, mesmo aquele que acredita na existência eterna, quer conquistar rapidamente o bem material porque acredita na morte, ou seja, vive com a certeza de que sua vida chegará ao fim. Mas, a existência do espírito não acabará nunca, pois não há fim para a vida do ser universal.

Participante: Acho que neste caso entra aquilo que já estudamos: a busca do prazer. Temos pressa em realizar coisas para poder aproveitar o máximo possível essa ‘vida’ tendo todo prazer que puder.

Exatamente. A pressa em realizar-se materialmente é para gozar a coisa material, o prazer material, a felicidade material. Esta é a pressa do ser humanizado.

Mas, por que há esta inconsciente pressa?

 Participante: Por causa do medo da morte?

Não, isto é consciente. Todos buscam entrar no gozo de determinados prazeres o mais rapidamente possível porque imaginam que a vida se extinguirá. Não é disto que estou falando, mas, de uma motivação inconsciente que existe no ser universal para que ele tenha pressa em locupletar-se com o bem material. Para saber do que estou falando, volto a perguntar: por que, inconscientemente, o ser humanizado tem pressa de conquistar os desejos oriundos das paixões geradas pelo ego?

Porque sabe que isto é errado, é contrário à elevação espiritual. O ser universal sabe que desfrutar do bem material (a satisfação de ver seus desejos atendidos) não o leva a aproximar-se Deus, mas não quer abrir mão deste prazer. Por isso tem pressa em realizar-se como humano: ‘vamos gozar logo porque senão amanhã chega a morte (o fim da encarnação) e eu tenho que me contentar em ser feliz incondicionalmente’.

Sabe por que você está renascendo, ou seja, está preso à roda de encarnações? Para poder gozar o prazer, que é caracterizado pela satisfação de seus desejos, que são frutos das paixões que o ego cria e às quais você está aprisionado.

 O espírito, liberto da ação do ego, pede com consciência a elevação espiritual, mas, mesmo na erraticidade, no seu inconsciente, existe ainda o apego ao mundo material, o desejo do prazer. Mesmo liberto da ação do ego, o ser universal de posse da sua consciência espiritual está apegado à satisfação de seus desejos e, por isso, deseja renascer sempre. Enquanto o ser universal não eliminar este desejo, ele estará agindo no inconsciente. Isto ocorre quando o ser está encarnado (ligado a um ego) ou não, porque o espírito é sempre o mesmo. Por isso todos os mestres ensinaram que o caminho para se atingir a Deus passa pelo desapego às coisas materiais e a renuncia ao prazer.

Sabe por que vocês não aproveitam a encarnação para a realização da evolução espiritual? Porque o que querem mesmo nesta vida é gozar o prazer. Esta é a realidade da grande maioria dos seres encarnados, mesmo daqueles que dizem querer se elevar, mas que ainda aplicam valores (paixões) às coisas do mundo material. E, para conseguir a realização deste desejo que está no inconsciente de cada um, precisam estar encarnados.

Vocês se lembram dos momentos de sofrimento de suas vidas? Claro que não. Sempre se lembram dos momentos ‘bons’ da vida, ou seja, do prazer que amealharam. Mas, sabem que há muito mais a se aproveitar, no sentido da elevação espiritual, no momento da contrariedade do que o da satisfação? Sim, sabem, pois todos os mestres ensinaram que os momentos de contrariedade são como o fogo que, se bem trabalhado, forja o aço.

Repare que não estou falando em masoquismo, em querer sofrer, mas em aprender a lidar com as situações de contrariedade como uma oportunidade de libertar-se do desejo do prazer. Este, segundo os mestres, é o caminho para chegar a Deus e, por isso, o momento de contrariedade é tão importante para aquele que busca aproveitar a encarnação.

Mesmo assim, mesmo sujeitando-se a perder tão importante instrumento da elevação espiritual, preferem esquecer os momentos ruins das suas existências. A não ser quando o espírito tem prazer no sofrimento. Aí ele quer relembrar para poder sofrer a vontade e, com isso, alcançar o prazer.

A busca constante do prazer torna-se, então, uma obsessão para o espírito e, por isso, surge a pressa em viver suas paixões. Mal os seres encarnados entram na adolescência querem se tornar adultos. A primeira preocupação é em conseguir um emprego; quando isso ocorre quer se casar. Quando consegue esta realização, ou seja, o prazer de ter se casado não mais é considerado como satisfatório e logo cria outro desejo. Começa, então, a sonhar em ter um filho. Realizado este novo sonho surge logo a pressa em conseguir um emprego melhor para garantir o sustento do seu rebento. Neste novo emprego busca ascensão e principalmente estabilidade, pois já começa a sonhar com a aposentadoria para poder parar de trabalhar e começar a curtir os filhos e netos. Tudo vivido fora de tempo, tudo feito apressadamente.

E qual o preço desta pressa? Quanto você paga por esta pressa?

Participante: Não viver o momento presente...

Exato, deixar de viver. Digo isso porque você só tem um segundo para viver. O anterior não mais existe porque já passou e o próximo só se tornará realidade quando este acabar. Mesmo quando está vivendo o presente, você o vive atrelado ao passado ou ao futuro. Vivendo desta forma jamais consegue vivenciar o agora. Ou seja, você passa a encarnação inteira fugindo da vida: vivendo um passado e um futuro que não existem. E tudo isso por quê? Porque está obcecado em conquistar seus desejos, porque tem pressa de sentir o prazer antes que a encarnação acabe.

Você troca o presente, aquilo que existe, que é real, pelo futuro que não existe. Ou seja, deixa de vivenciar o que existe para viver o que não existe: este é o preço que paga por ter pressa em gozar o prazer.

Se agora é o seu momento de sair, passear, divertir-se, não se preocupe com emprego, problema de casa, carreira profissional. Tudo isso deve ser deixado para amanhã, para o momento em que for presente em sua existência. Quando o amanhã chegar viverá estas situações, não agora, mesmo que este amanhã seja apenas daqui à uma hora ou dez minutos. Hoje, agora, a sua vida se resume àquilo que você está participando e nada mais.

Estamos falando em viver um segundo de sua existência por vez, a cada segundo. Este é o ensinamento que surge quando se entende a eternidade do espírito. O espírito não tem pressa em viver. Ele não se preocupa em viver o futuro, mas em bem viver cada segundo. E o que é bem viver cada segundo que Cristo nos ensinou? Guardar bens no céu. Portanto, o espírito não se preocupa em alcançar rapidamente os acontecimentos da vida para poder buscar o prazer, mas curte cada segundo da sua existência amealhando bens celestes, ou seja, a felicidade incondicional, a felicidade sublime.

Você vive bem, no sentido espiritual, cada segundo da sua existência quando, a cada um deles, mantém o seu estado de espírito de felicidade incondicional, permanece em paz e harmonia e existe na graça de Deus. Aquele que consegue compreender e vivenciar isso, ou seja, liberta-se do desejo inconsciente da busca da satisfação através da realização de seus desejos, não tem pressa de que esse momento se encerre, pois tudo o que ele quer está presente neste segundo. Aquele que consegue atingir a consciência espiritual vive cada segundo em toda a sua intensidade. Apesar de ter toda eternidade, vive profundamente cada segundo.

Parece incongruência dizer que o espírito, que tem toda eternidade para existir, vive profundamente todo segundo. Parece até algo sem nexo. Quem tem toda a eternidade para existir não deveria prestar tanta atenção ao momento presente que é tão fugaz, mas, garanto que aquele que possui a consciência espiritual vive cada segundo como se fosse uma vida inteira, tal a profundidade que ele o vivencia.

E, exatamente por viver tão profundamente cada segundo, o tempo é sempre curto, tudo é sempre rápido, para aquele que vive com a consciência espiritual. Agora, para vocês que estão sempre em busca de viver o futuro, falar em eternidade é falar no amanhã que está perto. A demora de apenas alguns dias ou mesmo minutos para a realização daquilo que é desejado, já se constitui numa eternidade.

Isto porque o ser aprisionado à realização de seus desejos tem a ânsia de que o tempo corra, para que ele possa conseguir realizar o máximo possível de suas aspirações e, assim, ter mais prazer.

O ser liberto do vício do prazer não tem ânsia de chegar a lugar nenhum porque ele já é tudo que pode ser e já está onde quer estar: com e em Deus.

Ensinamentos de Krishna - Resumo

Equanimidade

14. Ó filho de Kunti, as noções que tens a respeito do quente e do frio, do prazer e da dor, essas nascem do contato dos sentidos com os objetos; tudo isso tem origem e fim e em verdade, são aparências transitórias. Suporta isso com equanimidade, ó Bhârata! (Bhagavad Gita – Capítulo II)

O que é o mundo para os seres humanos?

Participante: Aquilo que ele consegue perceber a através das suas percepções.

Sim, o mundo para o ser humano nada mais é do que aquilo que ele percebe através dos sentidos. Uma cadeira, para o ser humano, é o que ele vê, cheira, prova o sabor, houve ou sente pelo corpo.

Na verdade, uma cadeira não existe. O que existe é um conjunto de percepções que o ser humano chama de cadeira. Este conjunto é formado pela forma, pelas sensações, ou seja, pelo que se sente frente a cadeira, pelas percepções dos órgãos dos sentidos, pelas formações mentais, o raciocínio, e também pela consciência, ou seja, pelo que fica armazenado na memória.

É destas cinco coisas, que o Buda chama de cinco agregados, que o mundo se forma para o ser humano. Mas, o mundo não é isto...

Eu tenho feito muito este teste: pegue o seu braço. Quando digo isso, normalmente as pessoas põem a mão em cima do braço. Mas, colocar a mão em cima do braço não é pegar o braço, mas causar uma percepção.

Tente pegar o braço sem colocar a mão em cima dele... Consegue? Não... Então, braço não é braço, mas apenas a percepção de haver um braço... O braço não existe: o que existe é percepção de um braço.

Deixe-me dar um exemplo melhor. Já repararam que a pessoa surda também é muda? Ela não é muda porque não sabe falar, mas sim porque não conhece o som, porque nunca percebeu um som...

O som que você ouve é uma percepção e não uma realidade. O som que você ouve não é real: ele é alguma coisa que você percebe através dos cinco agregados. Se esta pessoa jamais ouvir o som, jamais pronunciará palavras...

Se uma pessoa for cega e não tiver sensações pelo corpo (tato), jamais saberá o que é um corpo. Esta pessoa não acreditará que ela tenha um braço porque nunca o percebeu... Você só sabe que tem braços porque os percebe...

Ficou bem claro que o mundo não existe, mas que eles são apenas percepções que você tem? A partir do momento que compreender isso, pode, então, trabalhar as suas percepções. Enquanto achar que um braço é um braço, não poderá mudar as idéias sobre ele; mas, quando compreender que um braço não existe, mas que se trata apenas de uma percepção que você espírito está tendo, poderá alterar as idéias sobre aquilo.

Krishna nos ensina neste trecho: as percepções que você tem sobre as coisas são passageiras. Hoje você tem uma percepção sobre alguma coisa, mas amanhã poderá de ou outra. Isto porque a percepção é dada por Deus. É Ele lhe diz o que perceber através dos órgãos dos sentidos.

Nós cantamos um ponto nas giras de umbanda que diz assim: filho de Umbanda quando está no Reino que o vento venta e que a chuva molha, não tem querer. O vento ventar não existe, é só uma percepção... Por isso se fala no mundo onde o vento venta, ou seja, onde existe a percepção disso acontecer.

 O molhar da água também é uma percepção... Isto porque se você não tiver sensação pelo corpo jamais sentirá sensação de molhado.

Mas, porque é importante se conhecer isso? A resposta está na segunda parte do ensinamento de Krishna: viva de forma equânime com as suas percepções... Vou falar sobre isso...

Destruir as percepções não é deixar de tê-las. Você, enquanto humanizado, não poderá, por exemplo, deixar de sentir frio. O que você pode é, a partir do momento que entender que o frio é apenas uma percepção, vivenciá-lo com equanimidade. Conseguindo isso, passará pelo frio que está sentindo, sem morrer de frio; passará pelo calor, sem morrer de calor. Passará pelo calor sem desejar o frio e vice-versa.

O problema das percepções, com relação à elevação espiritual, não está em tê-las, mas sim na vivência sentimental das incontáveis sensações a respeito delas que o ego cria para lhe incitar constantemente na busca desenfreada do prazer.

Tem hora que se molhar é muito bom, mas em outros momentos é ruim, diz o ego. Quando está calor você quer água, mas porque quer molhar-se neste momento? Para ter o prazer de se refrescar. Mas o que é se refrescar? Uma percepção... A sensação de se refrescar é uma percepção e não uma realidade... Então, o ego cria o calor para induzi-lo a comprometer-se sentimentalmente com a busca do refresco e poder ter o prazer. Portanto, precisar viver a percepção da água sobre o corpo para sentir-se refrescado é viver a matéria. O espírito não precisa se molhar, mas o ego cria a idéia dele estar se molhando para ter poder liberar a sensação de frescor e a de prazer.

Na hora que você aprender a controlar a vivência das suas percepções, mesmo que o calor suja, por estar ligado no espírito, não precisará da água para sentir refrescado.

Participante: O corpo é um elemento do carma, por isso precisamos conservá-lo. Se eu pegar a minha mão e colocá-la sobre o fogo, ela irá se queimar. Se eu não ligar para esta sensação, estarei destruindo o corpo que eu preciso para ter carma. Como então desprezar as sensações?

Você não preserva corpo algum... Onde está Deus neste seu raciocínio?

Participante: Mas se eu puser o dedo no fogo...

Você não coloca dedo algum... Se o dedo for colocado, foi Deus quem fez isto. Ao fazer isso, está gerando o seu carma...

Sendo assim, você não pode preservar ou destruir corpo algum. Isto não depende de você. Praticar esta ação não depende das suas percepções, porque você pode ter todas elas e só se dar conta de que está queimando o dedo quando ele já estiver queimado.

Esta primeira questão, mas há outros tópicos a se falar...

Será que colocar a mão sobre o fogo queima? Desculpe, mas tem hindu que anda sobre o fogo com os pés descalços e não se queima. Não estou falando em não sentir dor, mas, em não queimar e não fazer bolhas. A ciência não consegue explicar este fenômeno. Sabe por quê? Porque a ferida e as bolhas não são feitas pelo fogo, mas surge do espírito.

Então veja: você tem que preservar este corpo, mas precisa compreender que a melhor preservação começa quando vencer o carma e não por cuidar dele. Como Cristo ensinou, nós viemos aqui para vencer o mundo e se o mundo são as suas percepções, você vem aqui para vencê-las e não para entregar-se a elas.

Só que esta vitória nem você nem nenhum outro espírito encarnado conseguirá por si mesmo: Deus dará... Os seres humanos não conseguem nada...

Será Deus que lhe dará a vitória sobre as percepções. Mas, quando será isso?

Participante: Quando tiver o merecimento disso...

Certo, mas quando você terá este merecimento? Quando fizer o que Krishna ensina aqui: enquanto tiver percepções, trate-as com equanimidade...

Deus lhe dará percepção de frio, mas você não deve vivê-lo morrendo de frio. Viver assim não é ser equânime, não é alcançar o caminho do meio, não é estar equilibrado. Vivenciar este tipo de situação com esta sensação, não é harmonia nem paz, mas entrega a percepção. Desta forma, a você, compete sentir o frio que Deus cria, mas, manter-se ao mesmo tempo equânime. Se conseguir vestir um casaco, viva uma sensação, mas se não conseguir vestir, mantenha a mesma sensação. Este é o trabalho que o espírito pode fazer: sentimento. A partir da busca de não viver o frio e o calor, Deus dá então a paz e a harmonia com a percepção.

Portanto, não queira não sentir frio e nem sofra ao sentir frio. Não queira não sentir o calor, mas também não se entregue a sensação de quente vibrando com o calor.

Quando você realizar sua parte, Deus fará a Dele. Não é assim que está na bíblia: faça a sua parte que eu lhe ajudarei? Qual é a sua parte? Não se entregar às sensações geradas a partir de percepções pelo ego. Quando fizer isso, Deus fará parte Dele.

Desta forma posso dizer que a luta do espírito que busca a elevação espiritual é pela e equanimidade.

Participante: A partir do que tenho ouvido do senhor, tenho tentado praticar. Por exemplo: às vezes tenho uma dor de cabeça e procuro não ligar para ela. Quando consigo, ela acaba a sumindo. O engraçado é que consigo fazer isso com a dor, que aparentemente é uma coisa difícil de ser superada, mas, quando vejo fios de cabelo branco, não consigo deixar para lá...

Você está falando de dois trabalhos completamente diferentes. Um é o trabalho junto à percepção, o outro nas sensações. O que lhe perturba não é o branco do cabelo, mas sim a vaidade. Ou seja, a perturbação não surge do ver o cabelo branco, mas do orgulho próprio ferido. Neste caso, não se trata de ficar a equânime com a percepção do cabelo branco, mas sim com a sensação da vaidade.

Participante: É isso que estou falando. A dor, que é uma coisa que aparentemente mais difícil de lidar, não judia tanto quanto a vaidade...

A dor não é pior coisa, porque ela é resultante da vaidade. O mais difícil para o espírito encarnado não é vencer a percepção, mas sim uma sensação.

A sensação é tão importante que a própria percepção nasce dela. Quem tem sensação de vaidade, vive percepções que falam de feiúra, de defeitos, mesmo quando outros têm, na mesma cena, a sensação de beleza...

Voltando à questão das percepções, falei muito do frio, mas este ensinamento vale para todas elas. Por exemplo: não existe mau cheiro. O que existe é a percepção de um odor que vem acompanhada do adjetivo mal e da sensação de não gostar...

O cheiro não existe: é uma percepção que Deus lhe dá e ao mesmo tempo lhe propõe a idéia de que ele é mau. Isto para que você espírito opte pela equanimidade, demonstrando assim o seu amor a Deus acima de todas as coisas...

Mas, quando você vencer a percepção e a sensação de mal, o que acontecerá? Será que irão acabar todos os cheiros? Claro que não... O que irá terminar é a sensação de mau.

Participante: Então, não tenho que fazer força para nada. Estou vendo o rato morto e não preciso me preocupar em me sentir bem, pois isto só acontecerá quando Deus fizer. É isso...

Não, você não precisa se preocupar em ficar bem frente ao cheiro ou à figura de um rato morto, mais sim não sofrer por causa disso. Pense assim: eu estou aqui, estou sentido esse cheiro, meu ego está dizendo que ele é mal, mas eu não posso me sentir mal por causa disso. Ou seja, a única coisa que você não pode fazer, como já falamos, é ficar se lamentando porque está ali naquele momento frente aquele cheiro.

Não se esqueça que estamos estudando uma conversa de Krishna com Arjuna e que o mestre já havia dito que quem lamenta parece sábio, mas que o verdadeiro sábio não se lamenta por nada.

15. Ó tu, o melhor dos homens, somente aquele que não se aflige por tais modificações e é equânime tanto no prazer como na dor, realiza a Imortalidade. (idem)

Foi o que acabei de dizer agora: aquele que não se aflige em nenhuma situação. Quando você não se afligir nem com frio nem com o calor, torna-se equânime e mantém-se em paz e harmonia com o mundo em que vive.

Ensinamentos de Krishna - Resumo

Karma Yoga

40. Neste sendeiro da ação (ou Yoga), nenhum esforço se perde, por mais incompleto que seja, nem se produzem resultados maus ou menos contraditórios. Até mesmo uma prática mínima desta Yoga libera o homem de um grande perigo e temor. (Bhagavad Gita – Capítulo II)

Até aqui vimos os aspectos iniciais da conversa de Krishna com Arjuna. Agora começaremos a estudar o trabalho da elevação espiritual chamado de caminho da yoga ou o sendeiro da ação, que é a mesma coisa...

Para começar o bendito Senhor nos diz que: nenhum esforço se perde, por mais incompleto que seja; não se produzem resultados mais ou menos contraditórios; e, finalmente, que a prática mínima deste caminho libera o homem do perigo e temor. Vamos ver isso...

Nenhum esforço se perde... O que quer dizer isso? Todos os atos que são feitos, mesmo aqueles considerados maus, são válidos para a elevação espiritual...

Não estou falando apenas de atos físicos. Mesmo quando você escolhe um sentimento individualista (egoísta) para vivenciar os atos da vida, esta forma de proceder é válida para a elevação espiritual. Por quê? Porque é a vida do espírito...

Na existência do espírito nada se perde: tudo vira lição. Quando o ser universal humanizado opta por um sentimento egoísta para vivenciar uma situação da vida material, é mais um ensinamento que aprende e com isso uma nova oportunidade de elevação se apresentará. Portanto, quando optar em determinadas situações por sentimentos individualistas, não se desespere, pois isto é válido para a sua elevação espiritual. Claro, melhor seria se optasse pela universalização, pois avançaria mais. Mas, saiba que mesmo quando opta pelo egoísmo, algo foi feito no sentido da sua aproximação de Deus...

Portanto, aí está o primeiro conhecimento necessário da prática do caminho da yoga: nunca se lastime por nada...

Jamais se arrependa do que fez ou deixou de fazer. Jamais qualifique o que fez de bom ou mau, porque aquilo é útil à sua elevação espiritual. Jamais se contrarie com o que aconteceu ou que deixou de acontecer. Ou seja, não se lastime por nada, porque tudo que você faz vale alguma coisa para a sua elevação espiritual. A forma de reagir a determinados acontecimentos faz parte da sua caminhada, do seu aprendizado. Se você perde tempo parado no passado se lastimando, ou seja, culpando a si ou a outro pelo que aconteceu, parou no tempo.

Na vida do espírito, como já dissemos, não existe passado ou futuro: a única coisa que existe para ele viver é o presente. Só que ele tem que viver o presente olhando para frente. Olhando para o que ainda pode acontecer e não para o que passou. O ser humanizado deve vivenciar a sua existência carnal sem se amarrar as coisas que passaram e ficar lamentando-se delas. Vivendo assim, o ser se prende o passado e com isso não vive o presente e nem terá futuro, já que o futuro é construído no presente.

Este é o primeiro grande ensinamento; este é o primeiro grande aviso: não se lastime por nada. Tudo vale alguma coisa e quando você fica lá atrás se lastimando, perdeu uma nova oportunidade de realizar algumas coisas.

 

41. Neste caminho, ó descendente de Kuru, existe uma única determinação que se dirige somente a um objetivo. No entanto, tu sabes muito bem que os propósitos das mentes irresolutas são inúmeros e desencontrados.(idem)

Segundo aspecto da yoga ou do caminho da libertação: ele é totalmente dirigido à realização do ser...

O que quer dizer isso? Ele não é dirigido para que você tenha alguma coisa, ganhe ou participe de algo, mas toda vida onde se busca a elevação espiritual tem uma única preocupação: se auto-realizar no ser.

O que é esta auto-realização no ser? É alcançar a paz interior, a harmonia com o Universo e a felicidade incondicional. Esta é a estrada da libertação ou da elevação espiritual. O ser humanizado yogue é aquele que vive para a sua auto-realização nestes três aspectos.

O ser que caminha por esta estrada se preocupa sempre em estar harmonizado com o Universo, por isso não vive procurando motivos para discordâncias. Quando estes motivos por acaso surgem em sua mente, ele os mata. Ele mata estas idéias porque o objetivo dele não é difamar o próximo ou ser superior a ele (estar certo), mas sim harmonizar-se com o outro.

O yogue não faz guerra contra ninguém, não aponta erro dos outros, não julga nem critica porque está sempre objetivando a paz, está sempre preocupado em viver em paz. Por isso, ao invés de lutar contra o outro para provar que está certo, ele luta contra si mesmo: briga consigo para calar a crítica que surge através do ego...

O ser humanizado yogue não vê motivos de sofrimento, porque não tem nada para perder, fazer ou ser. A única coisa que ele objetiva nesta vida é alcançar a verdadeira felicidade, aquela que não depende de realização alguma. Por isso luta contra os desejos para que a felicidade dele não seja condicionada a alguma coisa.

Este é o verdadeiro yogue. Ele pode ser chamado assim porque tem a mente em paz. Já aquele que possui a mente perturbada por milhares de objetivos nada consegue com relação à elevação espiritual, pois não tem como objetivo a harmonia, a paz e a felicidade verdadeira...

O ser humanizado que não caminha pelo caminho da elevação espiritual no trabalho tem um objetivo, em casa, na rua ou na escola outros. Ou seja, ele tem diversos objetivos e acaba se perdendo nesta montanha de vontades e desejos.

Quando vai para casa esquece o objetivo que tinha no trabalho e passa a se dedicar a outro. Sai de casa e seus objetivos mudam... Ao viver assim esquece que cada vez que altera o objetivo, a razão de estar vivendo, deixa de se realizar, de sentir-se pleno...

É por isso que os ser humanizado jamais se realiza durante a sua existência. A existência desta multiplicidade de objetivos a serem alcançados para poder levar o ser ao gozo da plenitude da felicidade cria a necessidade de que ele fosse um super-homem: alguém capaz de realizar tudo...

É por isso que os ser humanizado sofre, não consegue harmonizar-se com o mundo e não vive em paz: por colocar estas realizações na dependência de alcançar seus múltiplos objetivos individualistas. Para ser feliz ele teria que inverter o processo, ou seja, ao invés de colocar estes elementos (paz, felicidade e harmonia) como dependentes de vontades, os transformar em objetivos de vida...

 Sendo assim, posso dizer que reforma íntima é colocar a paz, a harmonia com o mundo e a felicidade incondicional como objetivo de vida.

42, 43 e 44. Ó Partha, os tolos, cuja mente está cheia de desejos e que consideram a vida celestial (ou paraísos relativos e pensados) como a sua meta mais alta, os quais estão submissos aos panegíricos védicos (no ocidente, submissos à letra morta dos versículos bíblicos) e que consideram isso algo muito superior, esses ignorantes, ó Arjuna, falam com os costumeiros termos floridos a respeito das diversas classes de cultos védicos, cultos esses que originam os nascimentos, as ações e seus resultados, como meios para o prazer e a dor. Aqueles que se ligam a esses néscios e se deixam levar por toda essa fraseologia enfeitada, jamais lograrão a determinação única, que conduz o homem à absorção espiritual. (idem)

Vamos entender isso, porque apesar de parecer muito complicado, já que contêm algumas palavras difíceis, este texto é importante para quem quer realizar-se no ser.

Na verdade o que Krishna diz é o seguinte: alguns ensinam o reino do céu através da letra fria. Antes de buscar o entendimento, uma observação: ligo aqui o ensinamento de Krishna ao reino do céu (ensinamento bíblico) porque, apesar do texto falar em livros védicos, os “Vedas” são os livros sagrados hindus, assim como a Bíblia o é dos cristãos. Portanto, em essência eles são a mesma coisa: o instrumento usado por religiosos para buscarem a elevação espiritual. Sendo assim, o alerta serve para elementos de qualquer religião: não procure a elevação espiritual preso apenas à fraseologia enfeitada de um livro sagrado, porque quem assim age jamais logra alcançá-la. Vamos compreender isso...

Os católicos, por exemplo, pela prisão à letra fria, acreditam que, depois do desencarne, dormirão até o dia do juízo final. Por isso, para eles, o ideal é morrerem, ou seja, dormirem depois do desencarne. Os espíritas são levados a acreditar na existência das cidades espirituais. Por causa deste apego à letra fria, ao saírem da carne, buscam uma cidade espiritual. Os mulçumanos acreditam que Alá fez no reino do céu uma grande tenda onde haverá um harém cheio de virgens para eles. Os budistas sonham com o Nirvana, ou seja, com um jardim muito bonito, com lindas plantas, borboletas... Por isso estes religiosos sonham com a chegada a estes lugares. Mas, Krishna está nos ensinando que não devemos nos apegar a estas coisas. Por quê? Porque estas coisas foram apenas figuras criadas através de determinadas palavras que os mestres usaram para simbolizar a felicidade plena...

Aqueles que buscam a felicidade a partir da satisfação, ou seja, precisam de determinadas coisas para ser feliz, na verdade não alcançam lugar algum, porque só alcançaram a realização dos seus desejos. Como o que surge quando isso acontece é o prazer, estes terão que reencarnar para realizar o trabalho da reforma íntima, pois ainda estão presos aos desejos e paixões humanizados.

É isso que Krishna está nos ensinando. O caminho da yoga, da libertação, é o caminho do fim do desejo de tudo. É chegar ao mais alto poder de harmonização com o Universo, ou seja, ser feliz incondicionalmente. É isso que pode e lhe levará à elevação espiritual.

É por isso que ele fala que quem se liga a esses néscios (ignorante, incapaz – Mini Dicionário Aurélio) se prende à vida carnal, mesmo depois de desencarnado. Ele está preso à roda de encarnações e por isso terá que novamente voltar à condição de humanizado. O verdadeiro buscador de Deus precisa ouvir as palavras, mas também ir além do sentido humano delas. Compreender, por exemplo, que o mestre não podia dizer que o céu era uma tenda no meio do deserto cheio de virgens, porque se fizesse isso, estaria decretando que mulher não entra no reino do céu, a não ser para servir os homens. Na verdade, o texto sagrado dos mulçumanos prendeu-se a elementos daquela época, onde a mulher não era levada em consideração. Por isso o texto foi escrito para chamar a atenção de homens e não de mulheres...

É isso que estou querendo dizer. Na verdade o que Krishna nos ensina é que temos que buscar a felicidade incondicional. Esta felicidade que o mestre fala está acima de qualquer figura que possa ter sido criada pelos textos sagrados de cada religião. Ela está no interior de cada um, no coração... Por isso, para alcançá-la, é preciso se desligar de toda e qualquer imagem (paixão) e dos desejos e vontades que surgem através da mente.

Para eliminar as idéias que temos sobre o que é viver no reino do céu, pergunto: o que é o reino do céu? É um estado de espírito onde, esteja você onde estiver, tendo quem quer que seja ao seu lado, viva em perfeita harmonia com o Universo e em felicidade. Isto é o reino do céu... Não importa se você está na carne ou não: na hora que estiver vivendo assim estará no reino do céu...

45. Nossos Vedas tratam dos três gunas, que são Sattva, Rajas e Tamas. Ó Arjuna, liberta-te desses três gunas relativos, liberta-te dos pares de opostos e, sempre equilibrado, ficarás livre dos pensamentos de aquisição e posse, estabelecendo-te no ser (ou Atma). (idem)

NOTA: Sattva – qualidade da bondade; Rajas - qualidade da atividade e da paixão; Tamas – qualidade da inércia e do obscurantismo.

Antes de qualquer coisa vamos entender o que é guna: propriedades do pensamento... Gunas são direcionamentos que estão embutidos nos pensamentos humanos.

O primeiro guna que Krishna cita é o sattva. Este é o guna da bondade, ou seja, da sua forma de pensar as coisas com bondade. O que você acha que é bondade é formado pela ação do guna sattva presente no seu ego e não uma verdade por si mesmo.

Apesar deste guna parecer algo bom, porque humanamente se acha que pensar com bondade é bom, Krishna nos diz que o buscador de Deus precisa se libertar deste padrão. Isto porque, se você estiver preso (acreditar como real) nos padrões de bondade que existem na sua razão, automaticamente também acreditará nos padrões de maldade que existirão por causa do dualismo.

O Bendito Senhor ensina isso porque sabe que a prisão aos pensamentos formados pelo guna sattva prende o ser universal ao prazer, ou seja, condiciona a felicidade. Isso porque nasce o desejo de vivenciar o que é considerado bondoso e o desejo de não vivenciar o que não é assim considerado. Deste desejo de vivenciar o que se quer nasce o condicionamento à felicidade e, com isso, a desarmonia com o Universo.

Vou dar um exemplo: a mãe espera que o filho faça determinadas coisas (estude, trabalhe, cresça materialmente). Esta forma de pensar é considerada como bondosa pela humanidade. Por acreditar nisso, o ser que se humaniza como mãe vivencia esta criação da razão como real e certa. Mas, quando o filho, por seu próprio carma, não age assim, ela sofre... Esta desarmonia com o Universo (aquilo que ela vive) não lhe deixa alcançar a elevação espiritual...

Na verdade este ser não se elevou por culpa do filho – porque ele a fez sofrer – mas, por sua própria culpa. Deixou de unir-se a Deus (entrar no gozo da felicidade plena) não por culpa do filho, mas por sua própria, pois colocou a realização dos seus desejos como condicionamento à felicidade.

Segundo guna que Krishna cita: rajas. Esta é a propriedade da mente humana que insere nos pensamentos o gostar de alguém, do que deve ser feito, do que precisa ser realizado...

Esta é a qualidade do pensamento que cria as paixões. É a partir destas paixões, positivas (gostar, fazer) e negativas (não gostar, não fazer), que nascem os desejos que condicionam a felicidade...

Terceiro guna: tamas. Este é o guna que confere ao pensamento direcionamentos no sentido de omitir-se, de esperar as coisas realizarem por si só.

Um destes três direcionamentos está sempre presente em cada formação mental criada pelo ego. São eles que servem de base para a criação dos pensamentos. É por existirem estes três direcionamentos que nascem as suas paixões e delas surgem, então, os desejos que condicionam a felicidade, ou seja, lhe afasta da realização no ser...

Mas, estes direcionamentos jamais poderão deixar de existir... Enquanto você estiver preso a um ego humanizado estará sujeito as formações mentais e elas sempre estarão fundamentadas em um destes três gunas. Por isso Krishna diz: seja equânime, ou seja, trate com igualdade os três impulsos que a formação mental usar para decretar o que você tem que fazer ou deixar de realizar. Sendo assim, se ela lhe diz que você deve agir, não se prenda a isso como realidade; se ela disser que deve omitir-se, não acredite sentimentalmente nisso; se ela lhe disser que tal coisa é certa moralmente de ser feita, não creia nisso...

Na hora que o ser humanizado buscar a yoga, ou seja, o caminho da libertação, terá obrigatoriamente que abrir mão dos seus gunas. Se não abrir mão destes padrões que compõem o pensamento não conseguirá jamais a equanimidade necessária para que evolua.

Participante: É tão simples assim... Basta abrir mão destes impulsos?

Sim, a elevação espiritual é simples...

Mas, não pense que este ensinamento é primazia dos hindus. Cristo ensinou a mesma coisa: se o seu olho lhe faz pecar, arranque-o porque é melhor entrar no reino do céu sem um olho do que ir para o inferno com os dois. Ao ouvir isso os discípulos perguntaram ao mestre: o senhor está dizendo que somos pecadores? Cristo respondeu: se dizem que podem ver, são...

Na verdade este ensinamento cristão é a mesma coisa que acabamos de ver com palavras diferentes. Isso porque tudo que você percebe através da visão leva à formação de um pensamento onde estão presentes as características dos gunas.

 Portanto, se abrir mão de tratar o que vê como real estará eliminando a ação do guna...

46. Para um autêntico brâmane, vivenciador da Verdade, todos os livros sagrados ou Vedas são de pouca valia. Tais livros assemelham-se a um pequeno tanque de água que perde a sua utilidade quando, como numa inundação a água (ou vivência) se espalha por todas as partes. (idem)

Este é um ponto que já tinha comentado diversas vezes. Já havíamos falado dele quando estudamos os ensinamentos de Buda.

Lá dissemos que o ensinamento é como um barco que lhe leva do porto da ignorância ao da sabedoria. Só que quando se chega o destino é preciso desembarcar (esquecer o ensinamento). O problema é que tem muita gente que acha o barco bonito (imagina que o ensinamento é muito profundo) e fica navegando eternamente dentro do barco. Com isso não realiza nada...

Na verdade, todos os ensinamentos não valem de nada: eles são apenas culturas. O que é preciso alcançar é a sabedoria, ou seja, a cultura na prática. Enquanto você tiver cultura apenas, este saber lhe parecerá um oásis: sentir-se-á realizado por ter alcançado uma verdade, uma coisa importante que deve saber e ensinar aos outros. Mas, isso não leva a lugar algum: o que precisa é praticar o que aprendeu...

Quando transfere a cultura para a sabedoria, transfere para a vivência, tudo o que soube torna-se automático em você. Na verdade, se inunda com o saber e aí não mais consegue ver um oásis, mas faz parte dele. Enquanto apenas sabe, não consegue distinguir a água da terra...

O ser que alcança a sabedoria, ou seja, consegue a realização do que sabe, não mais se prende ao ensinamento, porque passa a ser o próprio... É isso que Krishna está ensinando... Aliás, a mesma coisa que estudamos em Buda, Cristo, em O Livro dos Espíritos, ou seja, um ensinamento universal.

 Por isso compreenda: cultura é uma coisa, uma tina com água; sabedoria é aprender a viver dentro da água...

47. Ó Arjuna, como ser manifesto e pensante somente tens direito à ação, nunca aos frutos do que crês fazer. Portanto, que tua ação jamais seja motivada pelos frutos. De outro lado, não te apegues à inação. (idem)

Vocês não podem criar nada que vai acontecer, pois tudo já está escrito e é realizado pelo faça-se (emanação) de Deus... Vocês só têm, portanto, o direito de agir agora dentro do que está pré-escrito...

Por isso quando agirem agora, não junte a esta ação nenhuma vontade (intenção) de que ela resulte em determinada coisa. Isto é perda de tempo, porque o futuro, ou seja, o que decorrerá da ação de agora, já está escrito. Você não vai criar o futuro agora...

Não falo apenas da ação física, mas também da sentimental... Não participe das ações esperando sentimentalmente receber alguma coisa... Jamais participe dos acontecimentos da vida com o sentimento de espera de receber alguma coisa ou com medo do que possa vir a acontecer. Ao contrário, participe do mundo de hoje, o agora, apenas de uma maneira perfeita e clara: amando a Deus acima de todas as coisas e ao próximo como a si mesmo. Esta é a única coisa que você pode fazer (amar ou não a Deus, amar ao próximo ou a si mesmo) e isso não altera os acontecimentos futuros, os seus carmas futuros...

Portanto, não se preocupe com o futuro: ele acontecerá dentro do seu plano carmático. Ao contrário, concentre-se em saber se está amando o próximo ou não. Preocupe-se em ver se está amando a Deus acima de todas as coisas ou não... Esqueça todo o resto, porque você não tem comando sobre as coisas que sucederão este momento...

Esta é uma coisa que você, ser universal humanizado, pode realizar: amar. Só que quando tem notícia de que o futuro está pré-escrito, faz exatamente ao contrário: imagina que deve cair na inação...

O que é inação? Não agir, não fazer nada, inércia... Quando um mestre fala nisso, o ser humanizado, que está preso à ilusória capacidade de agir acredita que ele está falando em não agir fisicamente. Mas, acontece que como o futuro está pré-escrito a ação acontecerá inexoravelmente e no sentido que tiver que acontecer...

Krishna, como nós já vimos neste estudo até aqui, sabia disso. Por que, então, ele orienta Arjuna a não se apegar à inação? Porque ele está falando da inação espiritual, do não agir espiritualmente...

O ser universal humanizado pode agir sentimentalmente. Como disse anteriormente, ele pode escolher entre amar a Deus e ao próximo ou amar a si mesmo. É sobre esta ação que Krishna está orientando aos buscadores de Deus que não se entreguem à inação: não deixem de estar sempre fazendo uma opção sentimental...

Ação é escolha sentimental através do livre arbítrio; a inação, ou inatividade espiritual, neste caso é não escolher a cada segundo entre amar a Deus ou amar a si. Agindo dentro desta inação, o ser humanizado entrega-se constantemente ao que o ego diz que é verdade...

Como já salientei em outras oportunidades, o ser humanizado deixou de racionar sentimentalmente. Ele sabe através dos ensinamentos dos mestres que deve amar a Deus acima de todas as coisas e ao próximo como a si mesmo, mas não se preocupa em realizar isto. Por isso se deixa levar pelas sensações que o ego cria. A personalidade humana cria, por exemplo, a idéia de que determinas pessoas são fofoqueiras. Cria, também, a sensação que não se deve gostar delas por este motivo. Neste momento o ser universal pode agir amando a Deus e ao próximo e, com isso, libertar-se desta sensação. Mas, ele não faz isso: entrega-se à inação, ou seja, não realiza a opção e segue placidamente o que o ego diz que tem que sentir...

Chegou à inação... O ser humanizado não age mais... Se a única coisa que ele pode agir é sentimentalmente, quando usa a sensação que o ego cria, não mais usou o seu livre arbítrio, não mais agiu...

Se alguém um dia lhe der uma pisada, nunca mais você será seu amigo, pois o ego criará sempre a sensação de desconfiança para este ser e você, que não realiza a única ação que pode, a vivencia... Isto é parar de raciocinar sentimentalmente... Isto é inatividade, inação...

O espírito, a coisa mais magnífica do Universo, nasceu para ação: para exercer o livre arbítrio... Quando se humaniza, se entrega às sensações criadas pelo ego, joga fora o grande dom que Deus lhe deu: a capacidade de optar pelo amor, ou seja, amar...

Nosso trabalho, que também é a yoga, o caminho da libertação, é ensinar aos seres humanizados a exercer o livre arbítrio novamente. É isso que Krishna fala no início deste texto quando diz que todos os livros védicos, ou seja, todo conhecimento trazido por ordem de Deus é no sentido voltar a utilizar o livre arbítrio. De mostrar a importância de optar entre vivenciar os acontecimentos do Universo amando ou se deixar ser guiado pelos gunas do ego...

Todos os mestres ensinaram isso. Cristo foi um mestre na arte de raciocinar espiritualmente, de optar pela entrega a Deus e ao próximo acima de si mesmo. Por isso, todos os que querem unir-se a Deus precisam retornar a esta atividade (exercer uma opção através do livre arbítrio sentimental) ao invés de entregar-se à inação, ou seja, viver a vida seguindo placidamente o que os gunas criam...

Falo em libertar-se da inação do raciocínio espiritual, porque do exercício do raciocínio material os seres humanizados não abrem mão. Apesar de todos os mestres ensinarem que Deus é a Causa primária de todas as coisas, os seres humanizados não abrem mão de dizer que são eles que escolhem se uma pessoa é bonita ou feia. Não abrem mão de realizar esta ação, mas por outro lado, não dão à mínima ao livre arbítrio espiritual...

Utilizar-se do livre arbítrio do ser universal é o grande bem que o espírito perdeu quando deixou de viver para Deus e entregou-se ao mundo material como independente do Universo... Por isso Cristo e todos os mestres vieram ensinar isso...

48. Ó Dhananjaya abraça essa forma de agir ou estabelece-te nessa yoga e renuncia ao apego. Sê indiferente ao sucesso e ao fracasso e assim comporta-te. Esta equanimidade é a própria Yoga. (idem)

O que é a própria yoga?

Participante: A equanimidade...

Que surge do que? Do desapego e da indiferença ao sucesso e ao fracasso... Ou seja, da não busca da fama individual...

O ser humanizado deixou de raciocinar e por isso convive com os seus conceitos como verdades puras, cristalinas. Mas, ao fazer isso, não entende que não está vivendo consigo mesmo, pois estes conceitos não são dele. Na verdade são conceitos que lhe são impostos, já que foram criados por sua mãe, seu pai, sua tia ou mulher, ou seja, foi a humanidade que os criou.

Quando o ser humanizado é pequeno a mãe o ensina a não andar descalço. De tanto ela repetir isto, ele toma como sua esta verdade e nunca mais anda descalço. Se andar, cria inconscientemente a culpa que pode se transformar em doença...

O ser humanizado trocou toda a arte de pensar, de escolher seu próprio caminho, pela busca da fama, ou seja, para mostrar ao mundo que ele conhece e segue as verdades do mundo... Este ser não anda calçado porque quer, mas para poder dizer que aprendeu a verdade que é aceita como certa pela humanidade...

É a isso que Krishna está se referindo neste trecho: a busca do elogio, da fama, do ser considerado humanamente certo. Por conseguinte, fala também do medo da crítica, ou seja, do medo de ser repreendido por não estar agindo corretamente.

Dentro do nosso exemplo, se o ser humanizado gosta ou não de andar descalço isso não tem importância, porque ele anda sempre calçado para provar que conhece as verdades do Universo e por medo de ser considerado alguém que destoa do mundo... Na verdade cada ser humanizado passou, por comodismo, por inação, não por maldade, a agir de acordo com as verdades que lhe foi dada, para buscar a fama...

Por isso Krishna falou anteriormente que o ser humanizado precisa voltar a raciocinar. A raciocinar espiritualmente (escolher sentimentos) e não deixar levar-se pelos gunas que dão características aos pensamentos...

O ser humanizado precisa voltar a discutir consigo mesmo. Será que ao criticar o próximo está amando-o? Será que se ao acusar o próximo está amando-o? Será que ao desejar uma coisa a ponto de sofrer se não consegue está amando mais a Deus do que a si mesmo?

Realizar estes questionamentos no seu mundo sentimental é o caminho da yoga, o caminho da elevação. Aqueles que entram neste caminho têm como prática voltar a raciocinar espiritualmente. Com isso o ser humanizado volta a realmente viver, pois hoje ele não vive: conta tempo, passa pela vida. Isso porque apenas repete conceitos sentimentais sem exercer o livre arbítrio, exercício esse que caracteriza o seu existir...

Salomão, o Sábio, dá um grande conselho neste sentido: será que você pode fazer alguma coisa que ninguém fez? Veja que tudo que um ser humanizado pode fazer, já foi feito por outro. Sendo assim, o ser não cria nada: apenas repete o que alguém já fez. É importante entender isso porque se a elevação é caracterizada por uma reforma íntima, é preciso reformar o nosso íntimo. Ninguém se reforma apenas repetindo o que todos fazem...

Se alguém bebe, o ser humanizado logo vibra na acusação chamando-o de alcoólatra... Acha que este conceito é ele que está criando, mas não vê que é apenas uma repetição do que o mundo, a sociedade, a humanidade acha. Será que se você vibrar dentro da sensação que acompanha a denominação de alguém como alcoólatra isso é sinal de amor? Ou amá-lo não seria dar a ele o direito de beber até morrer, se assim quisesse? Claro que sim, pois desta forma estaria utilizando o sentido de liberdade que está embutido no amor.

Para que você ame o outro deve conceder a ele a liberdade absoluta, ou seja, dar o direito dele fazer, estar e ser o que quiser. Esta forma de viver respeita o direito à individualidade que todos querem ter e que, por conseguinte, devem dar aos outros para amá-los segundo o Espírito da Verdade.

NOTA: Refere-se a uma pergunta de O Livro dos Espíritos onde o Espírito da Verdade afirma que a expressão máxima do amar é dar ao próximo o que deseja para si. Neste caso, se alguém quer ter o direito de não beber, deve dar ao outro o direito de fazê-lo.

O ser humanizado não tem nada a ver com a vida do outro, porque não a vive. Apesar disso, não consegue viver sem criticar a quem bebe, pois precisa mostrar que conhece as leis morais do planeta (beber não é certo) para poder assim, ser reconhecido como uma pessoa boa...

É isso que Krishna fala neste texto. Ele fala que, apesar da ação dos gunas que criará no pensamento o sentido de criticar o outro (ele é um bêbado, não presta), o verdadeiro yogue busca raciocinar do ponto de vista sentimental: eu amo essa pessoa?

Não estou falando de amor humano, daquele que tem condições para existir. Estou falando do amor universal, aquele que é incondicional. Quando o ser humanizado ama universalmente alguém, o acolhe em seu coração sem críticas, bêbado ou são...

O amor universal não tem dualismos: existe numa hora e não existe na outra. Por isso, não importa se a pessoa deixou de beber, está bebendo ou já está bêbado, ele existe...

49. Ó Arjuna, qualquer obra que se cumpre movida pelo desejo é bastante inferior à que se cumpre com a mente não perturbada pelos resultados almejados. Portanto, refugia-te na Yoga do reto entendimento. Infelizes são aqueles que sempre se movem em busca de um resultado. (idem)

Por que a obra cumprida com desejo é inferior à outra?

Participante: Porque o ser imagina que é capaz de fazer alguma coisa, mas tudo já está escrito...

Sim, mas há outro motivo. Quem cumpre uma obra motivado pelo desejo encontra o quê como resultado?

Participante: O que ele esperava acontecer ou o que não esperava...

Certo... Agora, se ele encontra o que não esperava sofre, mas se encontrar o que esperava, ele terá felicidade. Como, então, Krishna fala que todos que se movem em busca de um resultado são infelizes? Porque esta felicidade que é encontrada por quem se move a partir de desejos é falsa?

Participante: Porque é uma felicidade baseada num desejo...

Sim, felicidade com tempo marcado...

A felicidade alcançada quando a realidade e o desejo são iguais é falsa porque é momentânea, relativa... Pela característica impermanente que a vida humana possui certamente a situação que hoje satisfaz os desejos irá mudar. Quando isso acontecer o ser humanizado sofrerá...

Por isso Krishna diz que não importa se você alcança o que quer ou não, é um infeliz... Ele fala assim porque sabe que, mesmo alcançando o que desejava, esta conquista será tão fugaz, tão rápida, que logo depois você sofrerá...

Por isso ele aconselha: refugia-se na yoga, no caminho reto. O que é refugiar-se? Proteger-se. Krishna, então, lhe aconselha a buscar amparo na yoga, porque o caminho reto lhe ampara, lhe protege. Do quê? Do sofrer...

Proteger contra o sofrimento: este é o objetivo do ensinamento de Buda, Krishna e de Cristo. Tudo o que os mestres ensinaram tem como objetivo proteger o ser humanizado da vida. Ou melhor, protegê-lo dos sofrimentos da vida.

Aquele que se refugia, que busca amparo na yoga, no caminho reto, jamais sofrerá, pois este caminho não conduz a uma intencionalidade. Por isso não lhe expõe ao prazer e a dor...

50. Quando alguém vivencia esta tranqüilidade mental, ainda que nesta mesma vida, liberta-se das noções do bem e do mal. Por conseguinte, consagra-te a esta Yoga. Karma Yoga significa habilidade na ação e ausência de propósitos pessoais. (idem)

Krishna fala algo interessante neste texto: a yoga ou caminho reto tranqüiliza a mente... O que é tranqüilizar a mente?

Primeiro: acabar com as dúvidas... O caminho reto, o caminho onde não há intencionalidade acaba com qualquer dúvida que o ser humanizado tiver sobre qualquer coisa. Ele não terá mais pensamentos investigativos sobre se é ou não é, se gosta ou não, se quer ou não.

Isso, por si só, já tira um peso imenso do ombro de vocês, pois passam o dia inteiro investigando as coisas. Investigam os acontecimentos do mundo para proteger suas verdades, seus conceitos, seu prazer. Agir assim traz uma perturbação mental, pois por mais que investiguem, não conseguem compreender perfeitamente o que está acontecendo. Não conseguem chegar a uma conclusão final sobre qualquer assunto. Por isso têm sempre que investigar mais...

Mesmo assim, tem horas que o ego diz que chegou a uma conclusão sobre o tema, mas aí vem a impermanência e transforma tudo... A partir desta ação da impermanência são obrigados a investigar novamente o assunto...

A segunda coisa que acaba com a ausência de intencionalidade é o medo. A yoga, o reto caminho, acaba com o medo, porque o ser humanizado não tem mais expectativas, desejos. Por isso não tem mais medo. O medo é o segundo grande peso que vocês carregam o dia inteiro: o medo de ser ferido, o medo de ser contrariado...

A dúvida que leva ao investigar constante e o medo do sofrimento são os elementos que transformam o viver em algo pesado, difícil, cansativo... A yoga traz a paz para a mente porque ela acaba com estes tipos de pensamentos.

Na hora que você vive a vida sem querer saber se quer ou não, se gosta ou não, ou seja, sem intencionalidade, a sua mente e os seus pensamentos ficam em paz: sem dúvidas e sem temores.

Participante: É possível alcançar isso?

Sim... Basta sempre perguntar a você mesmo: eu estou participando desta ação querendo ou esperando alguma coisa?

Participante: O problema é que sempre quero alguma coisa...

É contra isso que tem que lutar. Tem que lutar contra o seu querer e não entregar-se a ele, pois ele não é seu. O desejo, como nós já vimos no estudo dos ensinamentos de Buda, nasce como poluição adventícia, ou seja, como elemento material que serve como instrumento carmático para a sua reforma íntima...

Viver por viver e não viver para alguma coisa: esta é a realização do yogue... Mas, para isso é preciso voltar a raciocinar a vida e não simplesmente entregar-se às sensações criadas pelos gunas do ego...

51. O sábio dotado de entendimento está mentalmente tranqüilo, por isso se afasta dos frutos de suas ações; liberta-se dos laços que o pensamento forja a respeito do nascimento, crescimento e morte e vivencia um estado que está mais além de qualquer mal ou dano. (idem)

O grande pedaço deste trecho é: o sábio dotado de entendimento liberta-se dos laços que o pensamento forja a respeito do nascimento, crescimento e morte. Tudo o que pensou até hoje que é vida, deve ser alvo de uma libertação. Isso porque tudo o que pensou foi condicionado ao seu querer.

Em determinada época, viver para o ser humanizado é apenas brincar. Depois se transforma em realizar-se nos estudos para poder ter futuramente uma profissão e ganhar dinheiro. Mais tarde passa a ser vivenciar o casamento e a educação dos filhos. Liberte-se de tudo isso. Não coloque objetivos nas diversas etapas da vida, porque não nasceu para realizá-los.

Você não nasceu para realizar objetivos materiais, mas para realizar sua reforma íntima e alcançar a elevação espiritual. Para isso, é preciso que você se liberte destes desejos.

Na verdade, você quando encarnou tinha um único objetivo: ter estes desejos e provar a si mesmo que é capaz de libertar-se da ação deles... O ser humaniza-se justamente para provar a si mesmo que é capaz de libertar-se da prisão aos conceitos materiais que o ego cria ao longo daquilo que vocês chamam de vida carnal. Só que como diz o Espírito da Verdade, depois de encarnado sua forma de ver as coisas muda e por isso passa a desejar o que a mente cria como desejo.

Esta é o grande trecho deste texto. Com relação a acalmar a mente já havíamos conversado. Mas, esta informação foi novamente inserida porque não foi dito anteriormente que para se acalmar a mente é preciso haver a libertação destes objetivos padrões que se alteram ao longo da existência humana. É preciso se libertar das obrigações humanas que a sociedade cobra de cada um para poder ser considerado como um ser humano certo, bom...

Cristo ensinou assim: eu venci o mundo. Vencer o mundo é exatamente isso: vencer os padrões do mundo... Libertar-se dos padrões, das obrigações de ser, estar e fazer. É alcançar a mais pura liberdade: a liberdade ser você mesmo e não apenas um repetidor de padrões...

É isso que é o caminho da yoga. O resultado para quem trilha o caminho reto é a liberdade dos padrões e obrigações mundanos. Este não é mais atingido pelos elogios e críticas do mundo...

52. Quando a tua compreensão superar o valor dos conceitos ilusórios e do espelhismo que eles provocam, ficarás indiferente tanto em relação ao que já ouviste (memória) como ao que terá que ouvir (imaginação). (idem)

Da compreensão dos ensinamentos deste trecho surge uma palavra que temos usado muito: apatia, indiferença...

Aquele que alcança a elevação espiritual se torna apático, indiferente ao mundo. Ele não dá valor às coisas deste mundo porque ele sabe que, como Krishna diz, todas as coisas deste mundo são maya, ou seja, ilusão...

O yogue completo sabe disso. Sabe que tudo que ele acha e todos os desejos que têm são criados pela ilusão de estar, ser e fazer. Isso é que estamos ensinando...

A mesma ilusão que Krishna chama de maya, por nós é definida com outras palavras: o mundo é irreal, não existe. Nada do que você vivencia existe. Quando sair desta encarnação tudo isso ficará para você, espírito, num passado remoto, perdido... É só começar uma nova encarnação que tudo isso ficará perdido no tempo...

Vocês já tiveram notícias de espíritos que voltaram a reencarnar junto com os mesmos familiares de encarnações anteriores. Quando isto aconteceu estes seres não tinham a mínima consciência de já haver vivido junto com aqueles. Não possuíam a mínima consciência do sentimento familiar que em uma encarnação viveram tão intensamente como realidade...

O espírito que reencarna não tem a mínima noção do que fez em outras vidas. Mesmo que tenha notícias de coisas que foram realizadas em uma determinada encarnação que tenha vivenciado – refiro-me àqueles que viveram encarnações cujas histórias pertencem ao passado histórico do planeta – não sabe que foi ele quem fez... Isto porque tudo é ilusão...

Ter, ser, querer, fazer, o que disseram, o que você fez, o que deixou de fazer: tudo isso acaba com a morte. Por isso é ilusão... Somente Deus e o Universo são reais...

O ser precisa a partir desta consciência da ilusão do mundo ser apático ele. Só quando ele é indiferente ao mundo consegue ser atento ao Universo, à realidade espiritual...

53. Quando se aclarar o teu entendimento perplexo, por causa das mais diferentes opiniões vigentes e te estabeleceres n samadhi (ou na absorção espiritual, na vivência do Absoluto), somente então vivenciará a Yoga Suprema. (idem)

Foi o que acabei de falar: é preciso calar a mente perplexa para poder se concentrar em Deus...

Ensinamentos de Krishna - Resumo

O caminho da ação

O bendito senhor disse:

03 - Ó impecável, como já te disse, neste mundo dois são os ca¬minhos a seguir: ou o Sendeiro da Sabedoria (ou Jnana-Yoga), que é para os meditativos, ou o Sendeiro da Ação Impessoal (ou Karma-Yoga), que é para os ativos. (Bhagavad Gita – Capítulo III)

Krishna responde que existem dois caminhos: um caminho para aqueles que levam a vida na meditação – se isolam e lá, com eles mesmos conseguem se elevar a Deus – e um caminho para aqueles que vivenciam sua vida normalmente, para aqueles que levam uma vida normal.

Hoje muito poucos são escolhidos para o primeiro caminho. A maioria – pela época atual, pelos carmas presentes – precisa vivenciar o segundo caminho, ou seja, viver em coletividade. Esta forma de vivência Krishna chama de Karma-Yoga, ou a Ação sem Intenção.

Então, segundo o bendito Senhor existe dois caminhos que levam a Deus: a vida afastada da coletividade e a vida na coletividade, desde que vivenciada sem intenções.

04 - Um homem não consegue libertar-se da ação só porque resolve não cumpri-La; tampouco pela simples renúncia à ação se logra a perfeição. (A verdadeira não-ação é aquela em que, ao cumprir-se, todo e qualquer motivo pessoal ou intenção está ausente) (idem)

Agora o bendito senhor está falando de atos, ações. Ele diz: o homem jamais poderá deixar de fazer alguma coisa. Isto é o que fala primeiramente. Vamos estudar esta afirmação...

Você não pode fugir das ações pré-programadas para sua existência; não pode se negar a praticar atos que estejam escritos no seu livro da sua vida. Tal compreensão deve nos levar a entender que as pessoas não fazem e nem podem fazer nada errado. Ninguém jamais poderá deixar de fazer aquilo que esteja fazendo ou que fez. Isso porque quando alguém age está sempre cumprindo a determinação de Deus para aquela ação.

Agora, ao fazer a ação, o ser humano pode anexar a ela uma paixão, positiva ou negativa. Paixão positiva é o prazer: ‘eu gostei’ do que fiz’, ‘eu queria fazer isso’, ‘eu fiz o que acho certo’, ‘eu fiz o que eu acho bonito’, ‘eu estou me sentindo bem porque fiz aquilo’. A paixão negativa é a culpa: ‘eu não devia ter feito aquilo’, ‘eu não gostei do que fiz’, ‘eu acho que aquilo não deveria ter sido feito’.

Todas as duas não levam a Deus, não são caminhos para a universalidade. Isso porque as duas levam o ser humano à dependência do seu querer, do seu achar, da sua paixão.

O sendeiro que leva a Deus, a Yoga perfeita acontece quando o ser humano vivencia a ação sem intencionalidade, sem paixão: ‘estou fazendo porque estou fazendo’, ‘não estou fazendo porque gosto, porque quero’ ou ‘não estou fazendo porque não gosto, porque não quero’. Esta forma de vivenciar a ação leva ao universalismo porque este ser está perfeitamente sintonizado com aquele momento, com o Universo.

Não importa o que você está fazendo. O que importa é que você está fazendo aquilo. Isso é uma verdade fria. Agora se desta ação universal você tirar um lucro próprio, seja ele positivo ou negativo, seja um prazer ou a culpa, não participou daquela ação dentro do sendeiro da elevação espiritual.

Participante: Eu não entendo. Se os atos são dados de acordo com os nossos sentimentos, de repente, por causa de um determinado sentimento, pode acontecer um que não é o melhor pra gente apenas como conseqüência de um sentimento?

Todo ato que lhe acontece, mesmo que você não goste, é o melhor sempre.

Quando você fala ‘não é o melhor pra mim’ está dizendo que Deus está lhe punindo. Isso só poderia acontecer se Ele não fosse o amor sublime.

Participante: Eu não diria punindo, diria que estaria dando de acordo com meu merecimento por causa do sentimento?

Dar o que não é melhor para você só poderia acontecer se Deus não fosse o amor sublime. Suponhamos que tenha tido raiva e o Pai tenha redirecionado a sua raiva para aquela outra pessoa. Vamos estudar este exemplo.

Você teve raiva porque escolheu raiva. Deus direcionou seu pensamento para que esta raiva fosse aplicada para aquela pessoa. A partir daí você pratica um ato raivoso contra ela. Está certo o meu raciocínio dentro do que tenho dito?

Participante: Sim...

Acontece que se Deus direcionou a raiva que você escolheu ter para aquela determinada pessoa é porque ela precisava e merecia recebê-la. Ele não agiu desta forma porque aquela pessoa era a que estava mais perto ou por qualquer outro motivo. Portanto, apesar de você ter escolhido raiva, este acontecimento não ocorreu isoladamente dentro do Universo. Deus usou o que você escolheu para dar a outra pessoa o que ela precisava e merecia. Assim, a sua escolha sentimental, apesar de aparentemente errada ajudou Deus na obra geral: o campo de provas para evolução dos espíritos.

Para que prejudicasse os outros com sua escolha sentimental seria necessário que eles não merecessem receber aquilo. Neste caso, eles estariam sendo injustiçados e Deus, neste caso, não poderia mais ser a Justiça Perfeita...

Participante: E a questão da culpa?

Não existe culpa. O que existe é uma situação que você não gosta e por isso se culpa. A culpa pela prática do ato não existe: ela só acontece dentro de você porque não gostou do que fez...

Participante: Por causa desse sentimento de culpa eu deixo de fazer atos para outras pessoas?

Não necessariamente. O que você deixa é de ser protagonista de outros atos, fundamentados em outros sentimentos. Passa a ser protagonista apenas daqueles que precisam e merecem receber a sua culpa...

 

05 - Em realidade, ninguém fica inativo um instante sequer, porque os gunas ou as qualidades nascidas da "Prakriti" (mente-ma¬téria ou natureza psicofísica) obrigam o homem a agir sem cessar. (idem)

Isso porque nós só pensamos que ação é ato. Mas, o pensamento também é um ato.

Portanto, ninguém fica inativo. Você está agindo a cada segundo, pois está tendo um pensamento. Este pensamento é uma ação e a ação de pensar é o seu momento de trabalho na busca da elevação espiritual. A cada pensamento tem que lutar contra as idéias que lhe surgem para tirar delas todas as intencionalidades: tudo o que acha, todo o que quer, tudo o que gosta.

Neste trecho, portanto, Krishna está dizendo claramente: ação não é só ato, mas também o pensar é ação. Diz mais: os seres humanos precisam agir no pensamento e não na atitude. Esta é a Karma-Yoga, este é o caminho da ação...

Viver é um trabalho mental, não um trabalho físico. Os seres humanos para considerarem-se vivos precisam agir sobre os pensamentos, lutando para retirar deles a intencionalidade.

06 - Aquele que pensa ter controlado externamente os órgãos da ação, mas que mentalmente continua preso aos objetos (pensados) dos sentidos, esse é um hipócrita. (idem)

O que o bendito Senhor diz neste texto é o seguinte: eu não deixo de dar um tapa em outra pessoa porque me acho mais fraco e tenho medo da reação dele ou porque eu acho que não devo bater na cara dos outros; deixo de bater apenas porque deixei de bater. Todo discurso que dá razões aos atos são apenas intencionalidades de cada um e não realidades...

Mas, Krishna chama os que acreditam nos motivos porque praticaram ou não as ações (pensam ter controlado externamente os órgãos da ação) de hipócritas. Por que isso? Porque se alguém tiver a intenção de dar um tapa em alguém, já o fez, mesmo que não pratique o ato. Na verdade, esse ensinamento de Krishna é igual ao de Cristo: só o desejar já é pecado...

Além disso, é preciso observar neste texto mais uma coisa: novamente o Bendito Senhor volta a dizer que os seres humanos não devem se preocupar com os atos externos, pois eles não são passíveis de controle. Ao contrário, orienta os seus seguidores para que se preocupem todo tempo em estar observar seus atos mentais para ver se eles contêm intencionalidades.

Viver para aquele que busca a elevação espiritual é isso: estar constantemente vigilante ao pensamento para libertar-se das intencionalidades que ele contém.

07 - Mas, ó Arjuna!, aquele que, graças a um reto discernimento mental, controla seus sentidos e sem ligar-se nem identificar-se se¬gue a Karma-Yoga (caminho da ação impessoal que conduz à Libertação), esse é estimado. (idem)

Tanto faz você colocar a mão no cocô quanto colocar no mel; tanto faz olhar uma coisa que gosta como uma que não gosta. É assim que vive aquele que vivencia a Karma-Yoga. Por isso o Bendito Senhor ensina: controle os seus sentidos para olhar tudo sem gostar ou desgostar de alguma coisa; controle seu sentido para usar o que gosta e o que não gosta sem alteração de ânimo. Quem vive assim é o apreciado por Krishna, é aquele que está no caminho da elevação, pois está tirando toda intencionalidade do seu pensamento, está tirando todo individualismo fabricado pelas verdades desse mundo.

Outro dia alguns vegetarianos me disseram assim: coitada da vaca, ela morre e tem sofrimento só pra nos alimentar... Eu respondi você quer matar quem, a planta? O processo é o mesmo: a morte de um para a subsistência do outro...

Ah! Matando a planta você também mata o oxigênio que lhe mantém a cada segundo.

08 - Cumpre, pois, as ações justas e obrigatórias, pois a ação é superior à inação. Se não agisses, nem sequer a existência corpo¬ral seria possível. (idem)

Então, é preciso que você aja e cumpra as ações justas e obrigatórias. Qual a ação justa e obrigatória que precisa cumprir? Xingar quem estiver xingando, bater em quem estiver batendo ou matar quem estiver matando, como no caso de Arjuna...

Participante: Aí é que está... Como vou cumprir se não sou eu que faço?

Vivenciando a ação sem se culpar ou gozá-la. Cumpre sua ação de uma forma justa, ou seja, faça o que está fazendo, que é o que tem que ser feito, mas não acrescente a essa ação uma satisfação individual ou uma culpabilidade - uma paixão.

Toda ação do ser humano é justa porque cada um serve de instrumento para dar ao próximo o que ele precisa e merece (Deus dá a cada um de acordo com suas obras). Portanto, faça o que você fizer contra quem fizer, a ação foi justa. Sua ação é obrigatória porque você foi o instrumento apto a praticar aquilo. Se uma pessoa precisa receber uma ação raivosa, quem pode praticar essa ação? Aquele que tem raiva. Sendo assim, você que está com raiva é a pessoa que é obrigada a praticar aquela ação. Na verdade, são carmas entrelaçados: um está no padrão vibracional necessário para praticar a ação que o outro, por carma, precisa receber.

Então, toda ação é justa e obrigatória: justa porque é o merecimento de cada um e obrigatória porque quem pratica está no padrão vibracional que o leva a ser instrumento do carma do outro.

Saiba de uma coisa: se os carmas não estiverem relacionados, jamais alguém praticará nem receberá a ação...

Ensinamentos de Krishna - Resumo

Yajña

09 - Neste mundo, as pessoas comuns se enlaçam por ações que diferem daquelas que são cumpridas por amor a "yajña" (que é um sacrifício, uma oblação, um culto ou orações a Vishnu, o pró¬prio Deus). De forma que, ó Kounteya!, atua sem apego, somente por amor a "yajña". (Bhagavad Gita – Capítulo III)

Os seres humanizados se ligam a ações sem sacrificar-se a Deus. É isso que diz o Bendito Senhor diz neste trecho. Vamos compreender essa questão do sacrifício, do sacrificar a Deus.

O que você tem que sacrificar a Deus, numa ação? Para entendermos isso temos que observar que Krishna fala em dois tipos de vivência de ação: aquele onde seres humanizados se relacionam dentro do sacrifício a Deus e outro onde não há este sacrifício. Será que você pode sacrificar, ou seja, deixar de ter, a prática da ação? Pelo que ouvimos de Krishna até aqui eu diria que não. Portanto, repito a pergunta: o que você tem que sacrificar a Deus numa ação? O controle sobre ela: o resultado e a autoria dela.

Quem segue o reto caminho sacrifica tanto o controle sobre o resultado da ação como a autoria dela ao Pai. Por exemplo. Quem busca o reto caminho diz assim: ‘eu briguei com aquela outra pessoa, mas não fui eu que briguei; eu fui instrumento de Deus. Ele me deu a ação’.

O yajña é o sacrifício do ‘eu’ durante a vida. É o sacrifício da sua capacidade de agir por desejo próprio, é o sacrifício da intencionalidade na ação. É também, o sacrifício do resultado da ação a Deus: ‘Deus, está fazendo, por isso só Ele sabe no que vai dar; eu sou apenas o instrumento da Sua vontade’. Aquele que busca o reto caminho sacrifica durante as suas ações a autoria e qualquer intencionalidade que tenha. Por exemplo: se o pensamento sobre determinada pessoa é fruto de uma raiva, aquele que busca o reto caminho não se frustra se não conseguir a exprimir, nem se culpa se conseguir fazer. Ainda dentro do mesmo exemplo, aquele que busca o reto caminho também não fica especulando pelo resultado da ação. Se conseguir praticar o ato raivoso não se preocupa com a reação do outro nem se vangloria por ter praticado a ação. Se não praticar, também não se culpa por não ter feito...

Participante: Quer dizer que tudo que falamos, por pior que seja a besteira...

Você foi instrumento de Deus para quem precisa ouvir aquilo.

Participante: Mas, se isso se reflete num ato aparentemente, vamos dizer assim, contra nós?

O ato só refletirá – terá como conseqüência – aquilo que Deus queira. Neste caso, lembre-se do que falamos: Deus não faz nada contra ninguém...

A sua pergunta seria mais ou menos assim: ‘eu faço alguma coisa, mas não fui eu que fiz. Porque acontece um resultado negativo a mim e não a Deus que foi quem o praticou’? Vamos entender bem essa questão...

No momento que você falou aconteceu um presente. Ele foi daquele modo porque o carma dos envolvidos levou o acontecimento a ocorrer daquela forma. No momento em que houver uma reação será um novo presente que também será criado pelos carmas de cada um. Isso quer dizer que se você receber de Deus uma reação, ela não foi motivada pela sua ação, mas porque você tinha o carma que tornou justo e obrigatório recebê-la. Se não tivesse aquele carma, mesmo que praticasse ação, jamais receberia tal reação.

Sendo assim, não existe o que vocês acreditam: porque eu fiz uma coisa aconteceu isso; porque fiz aquilo recebi tal resposta. Todos os acontecimentos do mundo são completamente independente um do outro. Eles estão sempre vinculados ao carma daquele momento e não à sua ação anterior. Por exemplo. Vocês imaginam que foram demitidos de empregos porque fizeram tal coisa. Isso não é real. A demissão já estava escrita no livro da vida de quem a recebeu. A partir disso posso dizer o seguinte: você não foi demitido por causa do que fez, mas fez o que fez para ser demitido. Ou seja, a conseqüência é causa da ação e não o contrário...

Voltando ao texto quero dizer o seguinte: talvez aqui esteja o maior ensinamento do Krishna. O sacrifício da autoria e da intencionalidade – sacrificar o ‘eu’, sacrificar as suas paixões, vontades, culpas, intencionalidades, a repercussão da ação – é, dentro do caminho da elevação espiritual, a atitude que mais pode ajudar.

Participante: Falam que o cansaço é energia negativa, mas o cansaço também não pode ser Deus agindo para que alguma coisa aconteça ou não, para que se faça ou não?

Sim, o cansaço pode servir de intencionalidade para o acontecimento ou não de uma ação. Mas, preste bem atenção: você não deixa de fazer nada porque está cansado. Quando, por exemplo, acredita que o seu dia não rendeu nada porque estava cansado, ainda está preso em você mesmo: no que acha que está sentindo. Aquele que pratica a yajña diz assim: ‘hoje o dia não rendeu porque não rendeu’. Se perguntarem a esta pessoa porque não rendeu, aquele que pratica o sacrifício a Deus responde: ‘porque não era pra render’...

É isso que se está falando sobre a prática do viver em sacrifício a Deus: sacrificar o que você acha sobre os acontecimentos da vida. Achando que não está produzindo porque está cansado, sacrifique sua intenção a Deus. O seu cansaço não pode atrapalhar o rendimento porque este é dado por Deus e isso acontece independente do que você está sentindo, pois o que tem que acontecer, vai acontecer.

Sabe de uma coisa: ninguém morre de câncer porque fuma; fuma para morrer de câncer; de nada adianta se combater o cigarro. Ou seja, o que você acha que é efeito, é a causa.

Sacrificar a Deus o ‘eu’ não é simplesmente abandonar a intencionalidade: é sacrificá-la a Deus. Você pode achar que fez alguma coisa errada, mas em sacrifício ao Senhor, mata o seu errado e só diz assim: eu fiz.

Essa é a verdadeira oração, o verdadeiro amor a Deus acima de todas as coisas. O sacrifício da sua intencionalidade é na verdade, o cumprimento do primeiro mandamento da Lei que Cristo ensinou: amar a Deus acima de todas as coisas. Isso porque só quando você sacrifica seu individualismo a Deus O ama acima de si mesmo.

Esse, volto a dizer, é o ensinamento mais forte de Krishna. Todo resto do ensinamento de Krishna está em Lao Tsé, todos os ensinamentos de Krishna estão em todos os outros mestres. Mas, essa visão do sacrifício a Deus do seu individualismo, só Krishna tem.

10 - No início, o Senhor das criaturas, tendo criado o gênero hu¬mano, juntamente com "Yajña" (sacrifício, oblação, culto, orações) disse: "Por este 'Yajña' vos multiplicareis, por este 'Yajña' pros¬perareis e alcançareis todos os fins desejados, como (se lidásseis com) 'Kamadhuk' (a vaca simbólica que possui a extraordiná-ria qualidade de dar ao leiteiro tudo quanto deseja). (idem)

O gênero humano significa o Espírito no início, significa Adão e Eva. A partir daí pergunto: onde podemos achar o sacrifício na história de Adão e Eva? ‘Vocês podem comer os frutos de todas as árvores, menos dessa aqui; sacrifiquem o desejo de comê-la a Mim’. O fruto da árvore proibida é o fruto do conhecimento: o saber...

O espírito não ouviu o que Deus disse e por isso até hoje ainda quer saber as coisas. Quer conhecer a autoria de cada ação, quer saber o que está acontecendo, quer saber o resultado de cada acontecimento. Com isso, ao invés de praticar o yajña recomendado, entregou-se ao seu individualismo, ao seu prazer de comer a fruta que parecia gostosa.

11 e 12 - Com este 'yajña' (sacrifício) nutrireis aos devas (seres celestiais, duendes, elementais) e eles vos nutrirão a vós. Nutrin¬do-vos mutuamente, ambos alcançareis o bem supremo. Sendo nutridos pelo 'yajña', os devas vos darão os objetos que desejar¬des. É um verdadeiro ladrão aquele que peleja pelos objetos que os devas outorgam, sem fazer a eles as devidas oferendas. (idem)

Com o sacrifício do individualismo a Deus você se nutre espiritualmente, ou seja, recebe amor.

Quando você quer ganhar, recebe o ganhar, quando tem raiva de perder, recebe a raiva, quando tem mágoa pelo que foi lhe feito, recebe mágoa. Só através do sacrifício do individualismo é que entra no amor perfeito, na conjunção perfeita do amor com Deus.

É um ladrão aquele que quer ter alguma coisa sem sacrificar algo. Você quer ter a felicidade, mas não quer sacrificar a sua visão do acontecimento; quer estar harmonizado com o Universo, mas não quer sacrificar a Deus o que você acha do outro. Para receber do Pai é preciso sacrificar a Deus seus rituais, seus atos, suas vontades, seus desejos. Precisa sacrificar tudo isso para poder receber algo Dele.

Sem dar algo, não se recebe nada. Cristo ensinou que “é dando que se recebe”. Dar em sacrifício o individualismo para poder receber o amor de Deus.

13 - Os justos, comendo os restos do "yajña" (sacrifício, obla¬ção), libertam-se de todos os pecados, mas os injustos (ou os que não fazem oferendas), os que cozinham só para si, comem pecados. (idem)

Os restos citados por Krishna são os resultados da ação. Por exemplo: você agiu gritando com uma pessoa, mas conseguiu vivenciar esta situação fazendo o sacrifício a Deus. O resto desta ação será a consciência da presença do amor de Deus. Agora, praticou a mesma ação sem se sacrificar a Deus, certamente vai se sentir ferido quando o outro revidar.

Para poder receber a justa recompensa de Deus, você precisa sacrificar a Ele as suas intenções. Se ao invés disso ainda se sente vitoriosa por ter ganhado a discussão com ele ou sente-se culpado por ter agido daquela maneira receberá o que sobrou daquela ação: o prazer ou a dor.

O resto (resultado) é o que sobra da ação.

14 - Os seres corpóreos nascem do alimento, o alimento provém da chuva, a chuva vem de "yajña" (das rezas, dos rituais, das oblações) e o "yajña" vem da ação ou "karma". (idem)

O que precisa sacrificar vem do seu carma, vêm das suas ações interiores anteriores. Se você grita com alguém é porque se desgostou com o que ele disse ou fez. Mas, antes de se desgostar você teve certeza de que ele disse ou fez determinada coisa. Ou seja, você não praticou o sacrifício a Deus naquele momento. Com isso gerou para si um carma. Durante este novo acontecimento que está vinculado ao carma anterior é preciso que pratique o yajña para poder gerar para si outro tipo de carma.

Ensinamentos de Krishna - Resumo

O sábio e o ignorante

26 - O Sábio não deveria turbar a mente do ignorante, que está ligada à ação intencional; ao contrário, ele próprio, trabalhando assiduamente, tem que ocupar o ignorante na ação justa. (O conhecimento vulgar se purifica pela ação inegoísta, tornando-se entendimento. O egoísmo, que é o maior obstáculo contra o pro-gresso espiritual, cresce muito mais na indolência ou na falsa não¬-ação do que na Ação Pura. (Bhagavad Gita – Capítulo III)

O verdadeiro sábio não ensina nada a ninguém. O sábio deve participar da ação sem intencionalidade, inclusive com a de ensinar alguma coisa aos outros: 'olha, eu sei, eu sou sábio, você não pode fazer desse jeito'. Ao contrário, o verdadeiro sábio zela para pensar desse jeito: 'você acha que é melhor pôr isso ali, eu vou por'; 'você acha melhor fazer isso, eu vou fazer'; ' você queria que eu fosse a tal lugar, eu vou'; 'você não quer que eu vá ali, eu não vou'; 'você acha que isso que acredita está certo, então está'.

O verdadeiro sábio luta para se libertar das suas formações mentais que afirmam que ele é superior aos outros, que sabe mais e que por isso tem que impor sua vontade e verdade aos outros. Ele busca libertar-se de pensamentos como este: 'você não pode querer que eu vá onde você quer, porque ao querer isso está agindo intencionalmente'. Ele luta para libertar-se de tal pensamento porque sabe que se prender-se a ele estará também agindo intencionalmente.

O verdadeiro sábio age sem intenção alguma e por isso não ensina ao outro que não se pode querer, ter ou ser alguma coisa...

Ensinamentos de Krishna - Resumo

Zelar pela sua espiritualidade

28 - Porém, ó tu de braços poderosos! Sabe que os Sábios discernem corretamente a verdade relacionada à distinção dos gunas e do Karma (ou ação intencional e sua conseqüência). Percebem claramente como os gunas, em seu papel de sentidos (pensantes ¬pensados), se pousam sobre os mesmos gunas, mas agora em seu papel de objeto (pensado, gunas esses que são a falsa dualidade psicofísica sobreposta), e graças a essa reta percepção o Sábio jamais se apega a nada. (Bhagavad Gita – Capítulo III)

O sábio sabe que tudo que tudo que vive como realidade é fruto da sua intenção. Ao ter esta consciência, ao invés de declarar que aquilo é verdade, luta contra a sua formação sacrificando o fruto da sua intencionalidade a Deus. Ele não sacrifica a prática da ação, mas o fruto dela.

Os sábios percebem que as qualidades que aplica as coisas surgem do seu individualismo e por isso busca sempre a intenção universal. Por exemplo. Um banco, conforme a percepção de cada um pode ser sujo, bonito, feio etc. A intenção universal, no caso, é saber que está percebendo um banco; já as qualidades creditadas a ele, desde a forma até sua limpeza e estado de conservação, estão fundamentadas no individualismo de cada um.

Agora, engana-se aquele que pensa que o sábio não tem formações mentais que afirmem que o banco não é limpo. Ele tem, mas sacrifica a qualidade que está na formação mental criada pelo guna a Deus. Ele zela para pensar desta forma: 'ali existe um banco, já a sujeira que estou vendo nele é coisa da minha cabeça, do meu individualismo'.

O que Krishna está dizendo neste trecho é que o sábio sabe quando sua percepção repousa sobre a Realidade Real ou não. Por exemplo: o que é sua esposa? O sábio diria apenas que é um instrumento do seu carma; o aprisionado ao seu individualismo diria que é sua companheira, a qualificaria como bonita ou feia, afirmaria se gosta ou não dela, etc.

Quando há uma desavença entre o casal, o sábio, ao invés de culpar a esposa pelo que fez, zela para pensar desta forma: 'eu acho que ela não deveria ter feito isso, mas se fez, tinha de fazer'. Com isso ele está sacrificando o seu achar a Deus.

Por este sacrifício, o sábio denota o seu zelo pelas coisas espirituais. Já o não sábio critica a esposa. Com esta crítica, ele demonstra o seu zelo pelo individualismo, por sua vontade de estar certo. Para sustentar esta vitória está sempre atento em descobrir erros nos outros para poder criticá-los.

Para se alcançar a verdadeira sabedoria é só estar atento ao pensamento e zelar para vivenciar o universalismo, para viver para o ser.

43 - Ó tu, o de braços fortes!, comungando com aquele que é su¬perior ao intelecto, e subjugando o (falso) ser (personificado) pelo SER, destrói a esse inimigo na forma de desejo, tão difícil de vencer! (idem)

Comungando com aquele que é su¬perior ao intelecto é o mesmo que comungando com o Ser. É amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo. Comungar com o espírito é viver na felicidade de estar participando do mundo de Deus, não importando o que esteja acontecendo. 'Minha mãe morreu, mas eu amo a Deus acima da morte da minha mãe'. Quem vive deste jeito está comungando com o seu espiritual, com a sua consciência espiritual. Para este a mãe não morreu, porque nem mãe ele tinha. Ele sabe que tanto ele como a suposta mãe são espíritos filhos de Deus, ou seja, irmãos...

É a questão que já falamos neste estudo: o zelo. É a questão do direcionamento que dá para sua vida. Você só vai conseguir vencer nesse processo quando a sua busca for amealhar bens no céu e não na Terra. Isso porque o bem terrestre é o fruto do individualismo. É o prazer: eu quero, eu gosto e acontece, sou feliz.

É isso que Krishna está falando: você só vai subjugar a paixão e o desejo quando abrir mão da felicidade material. Quando não tiver mais motivos para ser feliz e for feliz com tudo que está acontecendo terá realizado alguma coisa na busca da elevação espiritual. Você só será terá realizado alguma coisa na elevação espiritual quando ao receber um tapa na cara permanecer feliz porque ama a Deus acima de todas as coisa e ama o agressor como se fosse você mesmo. Mas, enquanto viver como real, certo, o seu lado humano que diz que é errado apanhar, terá que reagir e perderá a felicidade.

 Portanto, quando lhe disserem 'você não sabe', responda: 'não sei mesmo'. Não siga o que a sua mente diz: 'quem é ela pra me dizer alguma coisa, eu sei muito mais do que ela'. Quando alguém lhe disser 'eu tenho certeza' deixe-o ficar com a certeza dele e mantenha sempre a sua dúvida... Não se preocupe em contestar, em ensinar. Mantenha-se unido a Deus e liberte-se da necessidade de vencer, de provar que está certo, de ter que dobrar o outro ao seu saber...

 A comunhão com o espiritual é o universalismo; é participar do Universo harmonicamente. Se o Universo para você agora é receber um tapa na cara, louve a Deus. Assim estará harmonizado com Ele. Comungar com o espiritual é viver o ecumenismo, ou seja, a consciência amorosa nessa vida e a ligação direta com Deus. Sem o espiritualismo (a vida fundamentado no valor espiritual) sem o ecumenismo (a fusão de todas as verdades em uma) e sem o universalismo (harmonizar-se com o Universo) não há comunhão com o espírito.

Em 1999 foi fundado o Espiritualismo Ecumênico Universal, mas só agora vocês conseguem compreender porque escolhemos esse nome. Ele reúne as três coisas básicas da vida para quem quer realizar a elevação espiritual. Sem espiritualismo, ecumenismo ou universalismo não há comunhão espiritual. O que existe é a satisfação pessoal, mesmo quando pretensamente se realiza uma obra para o Universo.

Enquanto vocês estiverem me acompanhando porque querem, porque gostam ou achando que estão ganhando com o aprendizado, estão andando para a elevação espiritual, mas a passos lentos. Isso porque vêm pelo prazer e quando não conseguem vir sofrem. É necessária a comunhão com o Espírito para subjugar o ser humano, mas só a vivência da ação com espiritualismo acaba com o materialismo; só a vivência da ação com ecumenismo acaba com as leis ditatoriais do ser humano; só a vivência da ação com universalismo acaba com o individualismo.

Ensinamentos de Krishna - Resumo

Contaminação da ação

31 - Aquele que livre das elucubrações (discurso mental) e cheio de fé ou "sraddha" (atitude mental que se manifesta como since¬ridade, humildade, respeito), constantemente põe em prática estes conselhos, esse também se liberta das ações contaminadas e seus resultados (ou karma). (Bhagavad Gita – Capítulo III)

O que é uma ação contaminada? É aquela que é vivenciada com intencionalidade. O que contamina uma ação não é o ato que se pratica, mas a vivência acompanhada com o querer ou não, ou gostar ou não, o achar ou não. Toda ação é justa, pura e perfeita porque ela vem de Deus. É como um rio que cruza uma cidade grande: ele nasce puro, perfeito e ao longo do seu caminho e se contamina. Deus cria a ação pura, limpa e perfeita; quando ela passa pelos seres humanizados é agregada uma intenção. Neste momento ela tornou-se contaminada...

Ensinamentos de Krishna - Resumo

Apego

22 - Contente com o que surge sem fazer esforço, transcendendo os pares de opostos (prazer, dor, calor, frio, bem, mal etc.), livre de inveja, equânime diante do sucesso e do fracasso, o sábio, embora atue, não se liga. (Bhagavad Gita – Capítulo IV)

O que surge sem fazer esforço: o que quer dizer isso? É viver sem planejamento, sem desejos, sem querer. Contente com o que surge: 'o que surgiu é isso, então é isso que vou fazer'. Se o verdadeiro sábio hoje tiver um limão, ele vai chupá-lo; agora, se amanhã tiver um morango, irá comer morango... O problema é que se hoje vocês têm um limão, o chupam pensando no morango de amanhã ou então não chupam o limão preferindo a fome para esperar o morango de amanhã.

Ser sábio é viver o que tem para viver hoje sem nenhuma preocupação com o futuro ou culpabilidade com o passado. Quando alcança a sabedoria, o ser humanizado se encontra acima do bem e do mal. Ele chega a um ponto onde não há emoções. Ele não se emociona, ou seja, não está em euforia positiva ou negativa. Ser sábio é alcançar a apatia com as coisas do mundo. Trata-se de viver de forma igual o sucesso (quando acontece o que você queria) e o fracasso (quando não acontece o que você queria). Esse está livre da inveja porque esta é a filha do desejo não atendido.

O sábio, embora aja não se liga às coisas: transita entre elas sem prender-se à elas. As pessoas se prendem às coisas vítimas do desejo. Para despossuir é preciso não desejar. Enquanto o ser humano não deixar de desejar, haverá a posse, a vontade de ter, a vontade de comandar o destino daquela coisa. O sábio é desapegado porque vive fora do conceito dualista. De nada adianta querer combater a posse sem combater a prisão às coisas materiais. Quando falo em coisa matérias não estou me referindo a objetos, mas ao prazer. Não adianta nada combater o prazer se não combater a humanidade, que são as regras, os conceitos pré-estabelecidos que ditam o certo e o errado.

Estamos chamando os ensinamentos de Krishna de caminhos e esta é uma colocação muito boa, pois o que ele ensina é um caminho que precisa ser caminhado. Não se trata de mágica. Jamais ocorrerá uma transformação mágica na sua vida. Os ensinamentos de Krishna também não se constituem numa ciência, uma medicina em que vocês tomam tantas seções de passe e vai estar tudo bem. Não é uma novena onde você faz noventa orações pra melhorar. Não, eles são um caminho onde se trabalha o tempo inteiro para alterar os objetivos de vida, para alterar o comportamento de vida, os valores da vida. Por isso Yoga é o caminho da libertação – o caminho do Reto Entendimento.

Apesar disso, o ser humano ainda continua procurando a verdadeira ligação através da mágica: 'hoje não estou bem, me dá um passe'. Muitos acreditam que depois de um passe ou de uma novena vão sair dali e arrumar um emprego. Tudo o que ele recebeu durante o passe já foi embora quando este ser humano se anelou espiritualidade com satisfação material. Isso acontece porque ele usou Deus e as coisas universais para benéfico próprio, individual. De que adianta ir a um centro quando se está perturbado, assistir uma palestra e tomar um passe? Mesmo que o ser humano saia de lá se sentindo bem, não luta para proteger o que ganhou lá dentro.

Digamos que neste dia esteja chovendo e alguém passa na rua e joga água neste ser. Ele vai buscar o perdão, o amor universal? Não, ele vai berrar e falar mal do agente do seu carma. Na verdade, tudo o que este ser humano recebeu no centro, ficou lá dentro...

É preciso estar atento a cada segundo, alterar a vida a cada segundo e não ficar esperando mágicas que mudem a vida.

Participante: mas como, se quem faz a mudança é Deus? Mudar o que?

Você tem que mudar o seu sentimento para poder merecer outra vida. Só que esse sentimento você não reconhece. Mas, pode reconhecer o pensamento. Portanto, tente mudar o seu pensamento.

Quando você vai ao centro está ligado nas coisas espirituais, por isso sai recarregado de sentimento positivo. Acontece que ao chegar à rua você dá vazão ao desejo, que é um sentir. Neste momento, todos aqueles bons sentimentos foram transformados em sentimentos individualistas. Por causa disso Deus terá que prover novos acontecimentos que sejam a colheita deste individualismo até você dizer: 'chega, eu não agüento mais, será que Deus não vai fazer o que eu quero'? Aí uma voz lhe diz internamente: quem disse que você precisa e merece o que quer?

Ensinamentos de Krishna - Resumo

Tudo é Deus

24 - (Todavia, ó Arjuna sabe que) o colherão (usado para a oblação) é Brahman (ou o Absoluto), a oblação é Brahman, e o que cumpre com o ritual é Brahman e o fogo sagrado é Brahman. Aquele que conscientiza Brahman agindo, unicamente esse torna-¬se o próprio Brahman. (Bhagavad Gita – Capítulo IV)

Agora leia de novo e substitua Brahman por Deus: o objeto usado na oblação é Deus, a própria oblação que é o sacrifício a Deus, é Deus; o que cumpre o ritual é Deus; e o fogo sagrado é Deus. Deus é tudo que existe, mas também é o que acontece.

Quem cria a ação das coisas é Deus. As coisas que acontecem é Deus; o acontecimento das coisas é Deus. O sentimento que se envolve nas coisas é Deus. Aquele que toma consciência de que Deus age, e só Ele age, atinge a perfeição, ou seja, passa a ser o próprio Deus.

Eu não estou aqui falando: Deus está falando. O que eu falo é Deus, o corpo que utilizo é Deus. Eu sou Deus.

Na hora que vocês compreenderem que ninguém faz nada e que qualquer coisa é nada, a não ser Deus, entrarão no Universo, encontrarão na Realidade. Que cor é esse sofá? O que está caindo lá fora? Porque algo faz barulho? O que é o vento? Tudo é Deus.

Na hora que você atinge esse patamar, na hora que vê Deus em tudo e sabe que tudo é Ele, passa a ser simplesmente um repetidor consciente de Dele. Hoje, você que está humanizado, é um repetidor de Deus inconsciente. Mas, nós espíritos temos consciência de que somos apenas antenas repetidoras do Pai. Sabemos que é o Senhor quem decide o que eu vou pensar, o que vou fazer, o que vou falar, o assunto que vai ser tratado, o pensamento que vou ter, as atitude que vou tomar. Sendo assim, quem está falando? Sou eu? Eu estou apenas materializando com voz e gestos o que Ele está dizendo. Esse é o patamar que atinge o sábio quando joga toda intencionalidade, paixão e desejo fora.

O ensinamento de que Deus é a Causa Primária vem antes de Cristo. Não estamos ensinando nada de novo. O único problema é que o ser humano não se liga a Deus, mas se liga a si mesmo: acha alguma coisa, tem certeza do que está acontecendo, sabe o que vai acontecer, tem certeza que o outro tinha aquela intenção. Ele não vê que tais pensamentos são apenas frutos de suas próprias intenções. Se este ser se ligasse a Deus, veria que é o Pai quem está agindo, está fazendo. Se para ele Deus estivesse acontecendo, nada mais estaria acontecendo. Não existiria a injustiça, o errado ou a imperfeição, porque sempre seria Deus agindo e se sempre é Ele agindo, então é Justiça, Sabedoria e Perfeição. Os seres humanos acham, por exemplo, injusto e errado alguém brigar com eles, mas aquele acontecimento foi justo e um ato amoroso, pois a sua fonte é a Causa Primária de todas as coisas.

Esta forma de viver que estou falando agora não é uma vida diferente da que vocês levam? Ela não traz mais felicidade que o padrão que estão vivendo agora? Por que, então não a vivem?

O problema está na religação: enquanto religarem-se ao material (o eu individual) não viverão esta nova vida, por mais que aparentemente estejam presos a ensinamentos de mestres. Por isso falamos lá atrás que a verdadeira religião está ameaçada. A verdadeira religação, a religação com Deus, não acontecerá enquanto o homem se ligar a si mesmo, às suas vontades, aos seus desejos e ao seu saber, não se importando com o resto do mundo, por mais que decore e tente seguir os ensinamentos dos mestres.

Ensinamentos de Krishna - Resumo

Os yogues

25 - Assim que certos yogues há que oferecem sacrifícios aos devas, e outros há que oferecem seu próprio ser como oblação no fogo de Brahman. (Bhagavad Gita – Capítulo IV)

Devas são os espíritos da natureza humana. Yogue é o que pratica o caminho da elevação.

Os religiosos humanos não fazem promessas ou rezam para santos para alcançar os seus desejos individualistas? Esses são um tipo de yogues: eles estão num caminho de busca da espiritualidade, pois são religiosos. Mas, para os verdadeiros Yogues, aqueles que entregam o seu ser para o fogo sagrado, esse queimar é missionário.

O fogo sagrado que Krishna se refere é o amor. Aqueles que sacrificam seus próprios desejos ao amor a Deus através do amor universal, ou seja, aceitam receber um tiro sem acusar, ser caluniado, escarnecido, crucificado sem revidar, estes alcançam a união com Deus.

26 - Alguns oferecem a própria sensação auditiva ou mesmo outras sensações mais, na oblação do fogo de quem controla (e que é o Ser interior); outros ainda, no entanto, oferecem o som, e outros, por fim, oferecem os objetos sensibilizadores como oblação no fogo dos sentidos. (idem)

Alguns oferecem a própria sensação auditiva, ou seja, renunciam a querer compreender os acontecimentos e objetos da forma que a mente lhe propõe. Eles renunciam a compreensão de algumas palavras... Alguns yogues, ou seja, seres caminhando no sentido da elevação espiritual, renunciam a sua intencionalidade ao escutar palavras não se sentindo ofendido, caluniado, atacado.

27 - Há os que oferecem todas as ações dos sentidos e as funções das forças vitais (ou "prânas") no fogo da Yoga do auto controle (ou união), encendido pela Sabedoria. (idem)

É através da sabedoria que estes vivem sem intencionalidade.

28 - Alguns oferecem a riqueza como sacrifício; outros oferecem a austeridade e a Yoga, enquanto há os que consideram como "yajnas" (ou sacrifícios) o voto austero, o estudo das Escrituras e a sabedoria. (idem)

Austeros são aqueles que aceitam a viver uma vida em que poderiam ter mais, mas não têm para desta forma servir a Deus. E outros yogues meditam muito, vivem em meditação para servir a Deus e não para ganhar nada... Outros se entregam sem intencionalidade ao estudar os livros sagrados.

É isso que Krishna está dizendo aqui...

29 - Alguns há que praticam o "prânayâma" (ou o controle dos pranas ou forças vitais), oferecendo "prâna" (ou a exalação) no "apana" (ou na inalação) e "apana" no "prâna", depois de restringir a saída e a entrada dessas forças. Enquanto outros que regulam sua alimentação, oferecem as funções dos "prânas" nos "prânas" ou os sentidos. (Depois de dominar um dos cinco "prâ¬nas", o yogue passa a concebê-los como um fogo sagrado, e nes¬se oferece os quatro prânas restantes como oblação. O yogue per¬feito controla os cinco prânas ou o corpo psicofísico, que é o que chamamos corpo e alma humana). (idem)

O yogue perfeito é o que controla tudo. Por isso existem diversos caminhos, diversas yogas ou ações espirituais de entrega a Deus, mas elas somente serão completas quando o yogue dominar tudo.

Portanto, não adianta você fazer, por exemplo, a caridade doando a austeridade a Deus ('deixo de comprar pra mim pra comprar para o pobre') sem que tenha dominado também a mente. É válido praticar a caridade? É yoga? Sim, é um caminho para a elevação, mas ainda não é o caminho completo. Ele só estará completo quando houver o domínio de todos os sentidos, inclusive a mente.

30 e 31 - Todos eles conhecem o "yajna" que consome seus pecados; e eles, absorvendo o néctar, o resto da oblação, alcançam o Eterno Brahmán. (Qualquer ação cumprida inegoisticamente ou cumprida como uma oferta a Deus purifica a mente do homem e o liberta.) Aquele que não cumpre com "yajna", este mesmo mundo não lhe pertence e muito menos o outro; ó tu, o melhor dos Kurus!, compreende isso. (idem)

Absorvendo o néctar, o resto da oblação. Já explicamos aqui o que é se alimentar do resto da ação: é aquele que recebe o que vem da ação sem esperar mais nada. Este ser participa da ação sem intencionalidade. Se ganhar ótimo, se perder, ótimo. Qualquer ação feita sem egoísmo, ou seja, sem individualismo ou intencionalidade purifica o Espírito. Qualquer ação...

Portanto, não existem determinadas ações que lhe purifica ou outras que lhe mancha: qualquer ação pode purificar. O que vai decidir se a ação lhe purifica ou mancha, na verdade, é a sua intencionalidade, ou seja, e o controle sobre o sentido e o controle sobre a mente.

Este mesmo mundo não lhe pertence significa que os acontecimentos não satisfazem. O mundo não lhe pertence, ou seja, o yogue tem a consciência que as coisas não vão acontecer do jeito que quer.

Destes ensinamentos podemos tirar uma grande compreensão: quem age com intencionalidade perde neste mundo e no próximo. Perde neste mundo porque não vai ficar satisfeito e nem vai entrar no próximo, porque ainda não descobriu como encontrar a verdadeira felicidade. Compreenda que não adianta querer lutar para que a sua intencionalidade ocorra, para que as coisas aconteçam do jeito que você quer, porque isso não vai lhe trazer resultado positivo. Agora, se abrir mão da intencionalidade, se viver a vida de uma forma equânime, se controlar a sua mente para não desejar mais nada, vai ganhar esse mundo e o próximo.

Na verdade abrir mão da intencionalidade é não esperar resultado algum, ou seja, tanto faz acontecer ou não. Ter desejos, você sempre os terá, pois sua mente funciona dentro de um padrão chamado humano. O problema é desejar o desejo...

Portanto, precisamos compreender que a luta, o controle da mente, não coisa é para a próxima vida: é para essa vida. Não existe outra forma de se viver feliz se não for abrindo mão da intencionalidade. Enquanto você não abrir mão, não estará vivendo, mas sobrevivendo, contando o tempo para a morte, pois viver é estar feliz. Quando não se está feliz, se está morto.

Sendo assim, não adianta correr atrás da satisfação desse mundo. Por mais que corra atrás da satisfação desse mundo jamais ela acontecerá.

Ensinamentos de Krishna - Resumo

A prática

38 - Nada neste mundo purifica tanto como a reta sabedoria. Aquele que está se aperfeiçoando pela Yoga, no devido tempo, a encontra por si mesmo e dentro de si mesmo. (Bhagavad Gita – Capítulo IV)

 “Nada neste mundo purifica tanto como a reta sabedoria”... O que é esse nada a que se refere Krishna? A oração, o trabalho mediúnico, rezar o terço, tomar passe... Nenhum destes trabalhos espirituais lhe purifica. Nada que não seja a reforma íntima, a mudança dos seus valores, o fim da intencionalidade pode lhe purificar. Nenhuma ação como ir à missa todo domingo pode lhe ajudar; se você não alcançar o reto entendimento, não adianta ser palestrante do centro espírita; de nada adianta doar todas as suas coisas e viver na pobreza.

Outro detalhe: ninguém vai alcançar o fim da intencionalidade por você. Só você, com o seu trabalho, pode anular o seu ego. A força para isso já está dentro de você e se fundamenta na informação de que o espírito é puro por natureza. Se ela é verdadeira, isso quer dizer que toda pureza já está em você, mas ela está impedida de brilhar por causa da presença da sujeira do ego.

Sendo assim, de nada adianta ir para a escola aprender o reto entendimento. Isso só vai fazer você adquirir mais eu acho, mais sujeiras. O que precisa é dentro de você mesmo buscar tudo o que já tem. Para isso precisa apenas se libertar de tudo o que acha que sabe...

Ensinamentos de Krishna - Resumo

Renúncia da ação

Arjuna disse:

01 – Ó Krishna, tu exaltas a renúncia da ação e ao mesmo tempo o cumprimento da ação, que é o Karma-yoga. Por favor, diz-me de forma definitiva: o que melhor me convém?(Bhagavad Gita – Capítulo V)

Arjuna, a partir dos ensinamentos de Krishna, ficou indeciso: ele deve ou não praticar as ações?

Na verdade, ninguém pode deixar de praticar ações, pois esta é a razão de estar vivo. Se não praticar ações, para que está encarnado? Neste mundo ninguém fica parado.

É face a esta dúvida que Arjuna pergunta: renuncia a ação ou a pratica? É sobre isso que vamos conversar agora...

01 – A renúncia dos frutos e a ação inegoísta, ambas conduzem à libertação; porém entre as duas, a karma-yoga ou a ação impessoal e inegoísta é superior à simples renúncia de agir. (idem)

Renunciar ao fruto da ação é renunciar ao que a ação lhe dá. Por exemplo: você veste uma roupa nova. Isso é uma ação. Qual o fruto de vestir uma roupa nova? A vaidade, o prazer, a soberba, etc. É isso que Krishna está ensinando: renunciar a tudo que o ato pode lhe trazer...

Outro exemplo. Hoje você orienta uma pessoa para fazer determinadas ações e ela faz. Quando constata isso, se enche de soberba por ver que aquela pessoa fez o que você mandou fazer. Este não renunciou ao fruto da ação, pois ainda alimentou-se do que adveio da ação.

Este renunciar ao que a ação oferece vale para todas as coisas, sejam elas consideradas positivas ou negativas. No exemplo da pessoa fazer o que você quer, se ela não fizer, o verdadeiro yogue renuncia ao sofrimento advindo do não acontecer o que se espera.

Esta é a ação com a renúncia dos frutos da ação. Ela existe quando o ser humanizado participa das ações, mas não se alimenta daquilo que surge da prática do ato. Já a ação inegoísta é diferente. Ela se consiste em participar do acontecimento sem ter a intenção de ganhar individualmente, de ter lucro pessoal, sem esperança que determinados resultados surjam da ação que é praticada. .

 A ação inegoísta acontece quando você faz alguma coisa para alguém ou alguma coisa e não espera resultados de sua ação. Aquele que age inegoisticamente, por exemplo, limpa uma mesa, mas não é por isso que ele espera que ela não se suje mais. Quem não participa desta ação com esta disposição, vai sofrer, porque não há mesa que consiga se manter limpa com o passar do tempo.

Compreendeu a diferença? Um participa da ação de limpar a mesa sem esperar que ela permaneça limpa; o outro a limpa, mas não se alimenta da soberba de dizer que possui uma casa limpa, que sabe limpar bem uma casa. Um deixa de ganhar; o outro age sem intenção. As duas conduzem à elevação espiritual, mas Krishna afirma: a ação inegoísta é superior à renúncia de agir. Portanto, concentre-se em praticá-la, ou seja, concentre-se em silenciar as intenções que o ego lhe cria.

Mas, mesmo com esta concentração, preocupe-se ainda em ao praticar a ação de dar a quem precisa, por exemplo, não esperar que alguém venha lhe elogiar por conta deste fato, não espere que lhe chamem de bom, de caridoso, nem que vá ganhar um terreno no céu por causa disso. Aja sempre sem esperar nada em troca, nem que seja um muito obrigado. Como vocês só participam da ação de uma forma egoísta, ainda acham que é obrigação daquele que recebe seu ato dizer pelo menos obrigado. Isso não é atitude de alguém que diz que quer buscar a elevação espiritual.

Quem não lhe diz muito obrigado não é mal educado: é Deus lhe dando uma prova para ver se você vai praticar a renúncia da ação ou não.

Participante: então, as duas formas de agir conduzem a elevação espiritual. Uma se consiste em participar da ação sem esperar lucros e a outra é renunciar aos frutos da ação.

Perfeito. Só para distinguir melhor uma coisa da outra, posso dizer que aquele que renuncia ao fruto da ação está envolvido com sentimentos enquanto aquele que age inegoisticamente está ligado a acontecimentos materiais. Quem renuncia ao fruto da ação, renuncia ao sentimento que aquela ação faz surgir. Quem age inegoisticamente é aquele que não espera resposta física ao que fez.

Por exemplo: o ato de comprar uma roupa. Aquele que renuncia ao fruto da ação não vibra dentro da emoção de sentir-se vaidoso porque está com uma roupa nova, de sentir-se mais bem arrumado que os outros, etc. Já aquele que participa desta ação de uma forma inegoísta não espera que a sua blusa seja elogiada, não espera que os outros reparem que ele comprou uma blusa nova.

Isso precisa ser feito por aquele que busca a elevação espiritual a cada segundo de sua existência, já em cada momento existe sempre uma prova. No momento que está comprando a blusa existem ações que são esperadas pela parte dos outros e sensações que são criadas pelo ego do ser encarnado. Quando sair da loja, quando vestir a blusa e admirar-se no espelho e quando estiver vestindo-a junto a outras pessoas, novas atitudes serão esperadas e novas sensações serão criadas pelo ego. Por isso, em cada um destes momentos aquele que deseja a elevação espiritual precisa agir para poder se manter equânime.

Em cada segundo de uma existência, Deus está sempre perguntando se você irá se apegar ao fruto (sentimental) ou à necessidade de um resultado para sentir-se feliz ou se manterá equânime.

Ensinamentos de Krishna - Resumo

A renúncia ao desejo

02 – Sabe ó Arjuna, que o que é chamado sannyâsa (ou renúncia) é idêntico à yoga, porque ninguém pode ser um yogue se não renuncia ao desejo pelo fruto da ação. (Bhagavad Gita – Capítulo VI)

É preciso lembrar sempre destas palavras: ninguém pode ser um iogue, ou seja, um espírito que aproveitou a oportunidade da sua encarnação, se não renunciar à intencionalidade, ao fruto da ação. Hoje vocês acham que yogue é aquele faz ioga. No entanto, isso não é real, porque a compreensão do que têm sobre yoga é errônea.

Yoga para vocês é a prática de determinados exercícios físicos. É assumir determinadas posturas para alcançar o equilíbrio. Mas, para isso não é preciso assumir posição alguma: apenas renunciando ao fruto da ação o ser consegue a paz e a harmonia que tanto busca.

O que lhe tira a paz, a tranqüilidade e o equilíbrio? Os contratempos da vida. O que é um contratempo? É alguma coisa que acontece diferente daquilo que o ser almeja para si naquele momento. Se este ser humanizado não esperasse nada deste momento, ou seja, se houvesse renunciado ao fruto da ação e agisse sem egoísmo, será que ele veria contratempo no que aconteceu naquele momento? Claro que não... Aquele que pratica a renúncia jamais espera nada e por isso não se contraria com o que acontece...

A questão da yoga abordada aqui pode ser levada a outras crenças. De um católico se espera que ele faça o sinal da cruz e se ajoelhe frente ao altar, do espírita se espera que ele tome a posição com as mãos espalmadas na hora do passe, etc. Mas, nenhuma destas posturas serve para a elevação espiritual se não forem acompanhadas com a renúncia dos frutos da ação ou do egoísmo.

Na verdade, a única coisa que pode levar o ser à evolução espiritual é renunciar aos frutos da vida. Esse é o caminho. O caminho que Jesus, Buda e todos que são chamados de santos seguiram. Sem isso não há elevação espiritual.

03 – Para o homem meditativo que busca alcançar a união (yoga), diz-se que a ação não intencional é o meio; mas, para aquele que já se estabeleceu na yoga, diz-se que a inação já é suficiente. (idem)

Para aquele que está caminhando, o livrar-se da intenção é necessário. Somente depois de se livrar dela é que realmente se pode viver a inação.

Inação é a vivencia da ação sem intenção. Quando o ser humanizado conhece o ensinamento que deve renunciar às intenções, gera automaticamente a intenção de não ter intenções. Conseguindo se libertar da intenção de fazer algo material, acha que conseguiu, mas não vê que sua intenção tinha mudado: ela agora consistia em viver sem a intenção. Por isso, apesar de achar que está praticando a inação, este ainda está preso a uma intenção.

Por isso Krishna ensina que viver os acontecimentos sem intenção é apenas um meio para se chegar à inação. Ela só é realmente alcançada quando o ser consegue retirar todas as intenções do momento, inclusive a de não ter intenções.

04 – Quando já não se tem apego pelos objetos sensórios nem pelo ato intencional e seus frutos, desse diz-se que realiza a yoga. (idem)

O ser humanizado realmente realiza a yoga, torna-se um iogue quando chega à ação sem intenção. Enquanto não alcançar isso, ele é um meditativo.

O termo meditativo aqui está sendo usado porque estamos falando da cultura hindu. Se estivéssemos falando de cristãos, poderíamos dizer que ele é um rezador. Falando de espíritas, que prezam a caridade material como fundamento para a elevação espiritual, diríamos que ele é um caridoso.

O ser que executa os ditames de uma religião, mas que ainda não pratica a renúncia do fruto da ação pode ser qualquer coisa, menos um espírito elevado.

Ensinamentos de Krishna - Resumo

O amigo e o inimigo do ser

05. O homem deve elevar-se graças a seu próprio ser e nunca rebaixar-se a si mesmo, porque somente o homem é amigo de si mesmo e também seu próprio inimigo. (Bhagavad Gita – Capítulo VI)

O ser humanizado deve elevar-se pelo seu próprio ser, pelas coisas espirituais e não pelas materiais. Ou seja, a elevação é caracterizada pela felicidade, pela espiritualidade, pelo contato com Deus. Isso quer dizer que nenhuma característica humana pode servir como marca da elevação espiritual.

Só dar coisas a quem necessita não caracteriza a elevação de nenhum ser humanizado, a não ser que esta ação seja realizada com paz e harmonia com todos, amando-se a todos e a Deus acima de todas as coisas. Rezar, exercer atividades mediúnicas, ser voluntário em trabalhos assistenciais, nada disso caracteriza um ser elevado, se não for praticado com a renúncia do fruto da ação ou do egoísmo.

Neste aspecto existe algo que hoje é considerado como característica de um ser elevado: a sua cultura sobre as coisas espirituais, o suposto conhecimento que ele possui sobre as coisas do mundo além matéria. Isso é irreal. Como ensina Cristo, Deus mostra aos simples o que esconde dos sábios. De nada adianta a cultura que alguém tenha, pois se ela não for acompanhada com a renúncia, não houve realização espiritual.

06. Aquele que se conquistou a si mesmo, graças ao ser, é seu próprio amigo; porém, aquele cujo ego não está subjugado, esse mesmo “eu” atua como seu inimigo, como se fosse um adversário eterno. (idem)

O ser humanizado é amigo de si mesmo quando se realiza pelos elementos espirituais e não materiais. Para isso precisa compreender que a humanidade que vive neste momento é apenas uma passagem na sua existência. Quando comunga com a espiritualidade e não com a materialidade, ele torna-se seu próprio amigo.

No entanto, quando não compreende isso, ou seja, quando prioriza a busca do bem material ao espiritual, torna-se seu pior inimigo. Este é aquele que acredita nas realidades criadas pela mente e por isso cede ao seu egoísmo e tem fome do resultado da ação. É seu pior inimigo porque é ele mesmo que está gerando carmas para si mesmo que mais tarde terá que vivenciar.

Ensinamentos de Krishna - Resumo

O bom e o mal

08. Aquele que está satisfeito com a sabedoria e com a visão direta da Verdade, que reequilibrou os sentidos e está sempre tranqüilo e para o qual um pouco de terra, uma pedra ou uma pepita de ouro são a mesma coisa, de tal yogue diz-se que é um yukta, ou um santo de sabedoria firme. (Bhagavad Gita – Capítulo VI)

 “Aquele que está satisfeito com a sabedoria e com a visão direta da verdade”: que bela colocação de Krishna e que reflete toda dificuldade de vocês no tocante à busca da elevação espiritual...

Sabe por que vocês não conseguem realizar as suas reformas? Porque não estão satisfeitos com o que advém dela. Querem sempre mais!

O buscador da elevação espiritual precisa compreender que tudo o que existe para ser conquistado é a equanimidade, é a apatia. Nada mais resulta do trabalho da busca espiritual durante a encarnação. Isso o máximo que pode conquistar. Não existe nada além para o buscador.

. Só que vocês querem conquistar outras coisas... Querem o paparico dos outros, querem ganhar atenção, querem obter a fama, o elogio, a glória, a vitória. Estas coisas não fazem parte do resultado do trabalho da elevação espiritual. Como ainda estão apegados a estes desejos, não conseguem sentir-se satisfeitos com o que advém do trabalho.

Quantas vezes eu falei em abrir mão de determinadas coisas e as pessoas me falavam logo em conquistar outras. Quantas vezes eu disse que era necessário despossuir alguma coisa e as pessoas me perguntavam o que iam ganhar ao fazer isso? Quantas vezes eu falei em libertar-se de algo e as pessoas criavam instantaneamente uma prisão a resultados? Quantas vezes eu falei da apatia e as pessoas demonstraram o seu desagrado por esta emoção? Para se tornar um iogue verdadeiro o ser humanizado precisa desejar, ansiar, pela apatia. Só assim ele viverá feliz com o que receber como resultado do trabalho. Se não fizer isso, o que ganhará não o motivará a buscar a elevação.

Ainda vão esperar que as pessoas passem a gostar de vocês porque estão fazendo o trabalho. Que importa para alguém que está buscando aproximar-se de Deus a aprovação de outros seres humanizados? Se alguém não gosta de vocês, qual é o problema disso para quem está mirando um alvo muito superior: Deus. Quem busca a felicidade incondicional está preocupado com o seu relacionamento com o Pai e não com os outros. Só quem ainda vive com um olho no peixe e outro no gato, ou seja, que não se libertou completamente dos anelos humanos e quer alcançar a elevação espiritual precisa da aprovação de outros seres humanizados.

Conseguir a apatia é o máximo que um ser em provação pode conquistar, mas vocês por estarem presos ainda a um sistema humano de vida querem mais. Querem sempre subjugar o próximo, querem que as coisas saiam da forma que acham certo, querem ter uma vida organizada dentro dos códigos de normas de cada um. Isso é impossível, pois como ensinou Cristo, não se serve dois senhores ao mesmo tempo.

Por isso indico a quem busca a elevação espiritual a verificar consigo mesmo o que espera desta vida, o que lhes move durante os acontecimentos deste mundo, quais são os seus objetivos de vida. Só conhecendo-os profundamente poderão enfrentá-los. Indico ainda que se conscientize da importância para a sua existência eterna da vivência da apatia durante a encarnação. Sem estes dois requisitos, mesmo que consiga algo, se sentirá frustrado com o que conseguir.

É como Cristo ensinou: o reino do céu é como um homem que encontra uma pérola valiosa. Ele vai e vende todas que tem para comprar aquela.

09. É estimado aquele que considera da mesma maneira ao benfeitor, aos amigos, aos inimigos, às pessoas neutras, ao árbitro, àquele que odeia, aos parentes, aos justos e injustos. (idem)

É estimado por quem aquele que consegue conviver com todos de uma forma equânime? Por Deus, só por Ele...

Agora repare: quantos buscadores ainda querem ser estimado pelos outros, ainda estão preocupados com a aceitação dos outros. A estima de Deus apenas não basta para estes. Para eles esta estima e nada é a mesma coisa: precisam da aprovação dos outros seres humanizados. Dizem que buscam a Deus, mas apenas alcançá-Lo é pouco... Querem tocar os demais seres humanizados, tornam-se dependentes da aprovação e da estima de outros seres humanizados.

Aquele que realmente busca a elevação espiritual apenas se concentra em religar-se a Deus, em buscar a estima do Pai. Para eles não há coisa mais importante do que isso e por este motivo não ligam para a estima dos demais seres.

Como amar a Deus sem sentir-se amado por Ele? Lembro da primeira vez que disse isso a um ser humanizado que lidava dentro do espiritualismo há muitos anos e ele me respondeu: ‘eu nunca tinha pensado nisso’. Sim, as pessoas foram incitadas a amar a Deus acima de todas as coisas, mas esqueceram de dizer a elas, que são egoístas por natureza, que apenas quem se sente amado tem condições de amar o outro. Portanto, o seu trabalho inicial na relação com Deus e trabalhar em você tudo aquilo que não confere a Deus o papel de Pai, protetor e Amante.

Ensinamentos de Krishna - Resumo

A yoga e a vida espiritual

40. Ó Partha, compreende que não há destruição para esse homem, nem aqui nem no mais além, porque, filho meu, o benfeitor (ou o devoto) nunca termina mal. (Bhagavad Gita – Capítulo VI)

Arjuna está pedindo ao Bendito Senhor que lhe diga o que acontece ao espírito quando desencarna ligado a um ego, acreditando nas fantasias do mundo humano. Para este, segundo Krishna, não há destruição, não acontecem penalidades...

A figura do umbral, do inferno como lugares para onde vão aqueles que não conseguem aproveitar a sua encarnação são apenas lendas, no sentido de local para sofrer punições. Segundo estas lendas, aquele que durante esta encarnação comete o suicido, faz maldades com outros ou usa tóxicos é punido por estas ações num lugar específico. Alterando-se o nome do lugar, esta lenda está presente em todas as doutrinas religiosas humanas, mas isso são apenas crendices e não realidades.

Na verdade não há destruição, punição, para o ser quando desencarna, pouco importando o que ele faça nesta vida. Jamais Deus puniria o seu filho. O Seu trabalho é de conscientizar o espírito do seu individualismo que não o deixa conviver em unidade com o Todo e não de julgar e punir faltosos. Deus coloca os espíritos desencarnados em ambientes específicos não para puni-los, mas para que eles possam sentir os efeitos do seu individualismo.

O inferno ou umbral não é um lugar onde os espíritos são castigados por erros que cometeram, mas sim um espaço onde eles vão sentir o efeito do que produzem nos outros quando vivem a partir do seu individualismo. Quem gosta de fofoca, por exemplo, depois que desencarna irá conviver com outros seres que também gostam de falar da vida dos outros. Neste local os outros irão comentar sobre sua vida e quem viveu fazendo fofoca nesta vida sentirá na pele, então, o que fez para outros.

É como ensina o Espírito da Verdade: o Universo é feito por afinidades. Deus junta os espíritos afins não como punição, mas para que cada um sofra a ação daquilo que fez ao próximo. Somente assim este ser pode constatar em si mesmo o que causa aos demais e com isso arrepender-se do que fez e reformar-se.

O umbral, portanto, não é um lugar de castigos, mas uma união de espíritos afins onde cada um age sobre o outro de forma individualista e assim conscientizar-se do mal que causa ao próximo. Este lugar é necessário porque só quando o espírito sofre o que faz aos outros pode se conscientizar da forma que está agindo. Enquanto ele não sentir diretamente o mal que provoca, não tem condições de mensurar as suas ações.

Portanto, estes lugares não existem para pena e castigo, mas para que cada um receba de acordo com suas obras, o justo que merece. Merece não como castigo, pena, mas como uma oportunidade de reforma.

Participante: nós aprendemos que o espírito quando desencarna volta à sua consciência espiritual.

Sim e não. O ser quando se liberta do ego realmente retorna à sua consciência espiritual, mas isso não quer dizer que ele tenha plena consciência de sua pureza e viva dela. Na verdade, quando retorna à sua consciência espiritual, se não obteve êxito na sua provação durante a encarnação, ela encontra-se no mesmo molde que estava antes. Ou seja, ele continua vivendo da mesma forma que antes da encarnação. Vou exemplificar para ficar melhor entendido...

Segundo O Livro dos Espíritos, o ser escolhe antes da encarnação os gêneros de prova que irá vivenciar durante ela. Faz isso após um período de estudos onde descobre que determinada forma de compreender o Universo e o relacionamento com os outros seres não se coaduna com o ambiente que vive. Através destes estudo, por exemplo, descobre que ser ganancioso não está de acordo com a vivência no Universo.

Ter ganância é uma decorrência do egoísmo. Ganancioso é aquele que, por defender o seu direito acima do dos outros, acha que tem que ter tudo. Esta é uma impureza que leva o ser a não conviver com seus irmãos espirituais dentro da fraternidade e do amor universal.

Quando de seus estudos antes da encarnação o espírito se conscientiza disso e por isso pede para vivenciar esta provação. Sendo assim, ele viverá um papel onde o ser humanizado que o representará será ganancioso, ou seja, terá desejo por todas as coisas. Faz isso com a intenção de que agora cônscio de que isso é uma impureza vai suplantar os apelos do ego a este respeito.

Digamos que este ser não consiga libertar-se dos conclames da personalidade humana, ou seja, que quando o seu ego criar idéias de desejar o que não tem ceda a tentação e também deseje ter. Por conta deste não aproveitamento da encarnação, a ganância que estava em sua consciência espiritual antes da encarnação não se extingue. Portanto, quando voltar àquela consciência ainda será ganancioso. Só aquele que consegue vencer a tentação quando na carne, ao voltar à sua consciência primária não mais terá o que motivou a provação.

Participante: só que quando vai conviver com pessoas afins, como o caso dos fofoqueiros que o senhor usou como exemplo, o espírito não está estudando nada...

Não, ele ainda não chegou neste estágio.

Assim que o espírito liberta-se da carne, ele ainda não está ligado à sua consciência primária. Ainda está conectado ao ego.

A mente humana, ou seja, o conjunto de valores racionais e emocionais da personalidade humana persiste mesmo depois do desencarne. Não há um passe de mágica na morte que faça o espírito voltar à sua consciência instantaneamente. Ele precisa se libertar do ego para poder retornar à sua consciência primária.

É para isso que se juntam os afins neste lugar que vocês chamam de umbral ou inferno. Ali os seres submetidos à mesma individualidade que aplicam aos demais se conscientizam do quando aquilo é danoso para os outros e com isso podem, então, renegar às idéias geradas pelo ego. Só depois disso é que eles poderão voltar aos estudos e prepararem-se para nova provação.

O estágio de libertação da ação da personalidade humana é imprescindível para que o espírito possa retornar ao seu mundo Real. Quer ver um exemplo? Qual é o seu nome?

Participante: Maria...

Quem é a Maria? É uma mulher e, portanto, feminista. É brasileira e, portanto, vive a partir de uma série de conceitos que formam os hábitos e costumes de quem vive neste país. É uma profissional de determinada área de atuação e por isso analisa situações de determinadas formas. Tudo isso é você, o espírito, hoje.

Acontece que estas coisas não são universais. O seu feminismo, os seus hábitos e costumes e a forma como analisa as situações não são realidades universais e por isso, entraves para se viver a Realidade do Universo. Portanto, elas precisam ser eliminadas da sua consciência antes de poder voltar à sua existência espiritual. Mas, há mais um motivo pelos qual você precisa se desligar da Maria.

Vocês são espiritualistas e acreditam no processo de reencarnação. Sabem que em cada existência humana o espírito pode assumir diversas personalidades. Imagine se você, Maria, nascesse em um país com hábitos e costumes diferentes, que fosse homem e que possuísse uma graduação em outra área. Como conseguiria viver mantendo os mesmos conceitos que hoje têm?

Somente quando estiver completamente liberta do papel Maria poderá assumir outra identidade para nova encarnação. Por isso este segundo estágio, o de permanência no umbral ou inferno, é necessário dentro do processo de vivência do espírito ao longo da eternidade.

Participante: então, a grande maioria de nós quando desencarna vai para o umbral?

Eu diria que sim. Somente aqueles que conseguem viver esta vida pelo próprio ser, ou seja, por Deus e pelas coisas universais, merece ser desligado da personalidade humana sem ter que conscientizar-se daquilo que causou a outrem. O processo para este desligamento é o que vocês vêem na literatura espírita.

Quantas vezes já não leram na literatura que determinados seres quando desencarnam são encaminhados a hospitais espirituais onde, através de passes magnéticos, são atendidos. Estes tiveram o merecimento de passar por este processo e isso foi motivado pela sua dedicação à busca da elevação durante a encarnação, ao invés de submeter-se à humanidade que viveu.

Aqueles que não buscam viver pelo ser saem desta carne completamente ligados à personalidade humana que viveram. Como desta forma não conseguem conviver no mundo universal, ficam por aqui mesmo. São as mães e pais que ficam tomando conta do filho, é o avaro que fica tomando conta de sua fortuna, são aqueles que ligados à natureza terrestre, permanecem neste orbe para poder gozar dela. Estes permanecerão ligados às coisas humanas até que em determinado momento se conscientizem que isso não leva a lugar algum e aí se voltam para o Universo e neste momento paulatinamente as suas consciências vão se alterando. Com isso podem conhecer a sua real posição no Universo e preparar-se para nova encarnação.

No Mahabarata, o livro do qual faz parte o Bhagavad Gita, se conta que o irmão mais velho de Krishna ao sair deste mundo passou alguns minutos neste estágio de viver desencarnado apegado ao mundo material. Se ele, que foi um ser que buscou sempre sua elevação espiritual, ainda teve que viver esta situação por alguns minutos, imagine aqueles que não buscam.

41. Aquele que fracassou na yoga, depois de abandonar o corpo, vai à esfera dos justos e vive aí durante longo tempo para finalmente renascer numa família de gente pura e próspera. (idem)

O lugar dos justos não é o lugar de espíritos perfeitos, mas sim que reúna exatamente aqueles que você precisa para poder libertar-se do ego e posteriormente preparar-se para uma nova encarnação.

Depois desta preparação renascerá numa família pura e próspera, por mais que ela seja desunida ou viva na penúria. Isso porque a pureza e a prosperidade daquela família não são avaliadas pelo aspecto material e sim pelo espiritual. Se sua família é desunida e vive na penúria ela é o grupo ideal para a sua provação e por isso se torna perfeita para você.

42. Ou talvez nasça numa família de sábios karma yogues; todavia, um nascimento assim é raríssimo e muito difícil de conseguir neste mundo.

43. Ou ainda, ó descendente de Kuru, num renascimento favorável, tal indivíduo redesperta a sabedoria que acumulou em vidas passadas e então passa a se esforçar fervorosamente para lograr a perfeição mais do que antes. (idem)

A sabedoria acumulada em outras vidas que Krishna afirma que alguns renascem não se trata de conhecimentos materiais, mas do impulso interno de buscar a elevação espiritual.

Toda cultura material se perde de uma encarnação para outra. Isso é fácil de constatar ao observarmos os recém-nascidos. Eles nada sabem culturalmente e precisam aprender tudo novamente. Se a cultura humana se mantivesse no espírito, quando renascesse não precisaria estudar novamente as mesmas coisas. Portanto, a sabedoria que fala Krishna nada tem a ver com estes valores.

Como disse, esta sabedoria acumulada tem a ver com a busca da elevação espiritual. Chamamos a este impulso interno advindo de outras vidas de despertar. Ele pode ser de dois tipos: o interior, ou seja, algo interno e incompreensível que lhe mova a buscar a elevação, ou exterior, ou seja, que venha através de um ser não incorporado que o incite para esta busca. Tanto faz um ou outro, os dois chegam impulsionados pelo resultado de encarnações anteriores e no momento em que esta busca deve começar.

Quando esta sabedoria oriunda de outras encarnações ocorre, chega, então, o despertar. Neste momento o ser encarnado se move no sentido de obter informações para que possa realizar o trabalho da encarnação.

Apenas um detalhe: ser despertado por este chamamento fundamentado em sabedoria de vidas anteriores não tem nada de especial. Grande parte dos seres humanizados o sente. É aquela motivação que o leva a aprofundar-se nos ensinamentos das doutrinas das diversas religiões.

44. Esse homem, mesmo que se lhe depare algo contrário, é levado a meta, graças simplesmente ao impulso favorável que é uma resposta de suas práticas anteriores. Por isso que um simples investigador da yoga é sempre superior a um que se restringe ao simples estudo da letra morta ou àquele religioso que pratica cultos a Brahman. (idem)

Quando alguém é despertado, ou seja, é chamado a integrar-se a um conjunto de ensinamentos que o leve a provocar a mudança interna do material para o espiritual e entrega-se a esta doutrina acaba tendo uma caminhada mais fácil. Isso acontece porque a pré-disposição positiva com relação aos ensinamentos lhe faz relembrar, mesmo que em surdina, sem consciência, de trabalhos que já realizou em outras encarnações neste sentido.

Agora, quando este ser é despertado e não se entrega a este impulso, a força para a realização oriunda do trabalho de outras vidas não estará disponível. É como o remador que rema contra a maré. Por isso, é preciso que na hora que você é chamado, é tocado por alguma doutrina reformadora, que se entregue.

Um detalhe: não estou falando de nenhuma religião especificamente, mas do chamado para qualquer uma. Sempre que o ser humanizado se sentir tocado por algum conjunto doutrinário religioso deve entregar-se a ele de corpo, alma e espírito para poder receber o impulso oriundo de atividades em outras encarnações neste sentido.

Aquele que tem contato com qualquer doutrina religiosa encontra nos preceitos dela o caminho para a elevação espiritual. Aquele que tem este contato com entrega, ou seja, com a busca da prática do que aprende, é superior àquele que não se entrega. Este último é aquele que apenas lê os livros sagrados ou que participa dos cultos da sua religião. Isto é o que Krishna está ressaltando nestes trechos que estamos lendo.

Muitos são despertados, são atraídos a determinadas religiões. Só que as vivenciam sem entrega, ou seja, sem buscar a prática do conjunto de informações das suas doutrinas. Estes, apesar de terem sido despertados, encontrarão dificuldades na sua caminhada.

Portanto, primeiro vem o despertar, o chamamento para a vivência dentro dos princípios doutrinários de uma religião ou seita. Depois vem a ação do espírito através do seu livre-arbítrio: entregar-se ou não a estes princípios. Aquele que escolhe entregar-se tem sua caminhada facilitada pela sabedoria advinda de vidas anteriores; quem não faz esta opção, navega contra a correnteza.

45. Certamente o yogue que pratica assiduamente e com perseverança liberta-se de qualquer pecado e, purificado graças a muitos nascimentos, chega por fim à Meta Suprema. (idem)

Krishna está falando aqui algo que é de conhecimento de todos os que acreditam na reencarnação: os múltiplos nascimentos purificam o ser e o levam a atingir a meta espiritual. Mas, reparem que antes ele diz algo importante: é preciso praticar o ensinamento que se recebe assiduamente e com perseverança. Muitos espiritualistas ainda não compreenderam este aspecto do processo de elevação espiritual.

O processo de encarnações sucessivas é perfeito. Ele é, como diz o Espírito da Verdade, um processo justo porque dá novas oportunidades àquele que não consegue realizar o que é preciso numa só vez. No entanto, para que esta oportunidade seja aproveitada, é preciso que o ser pratique os ensinamentos que recebe. Se isso não for feito, de nada adianta apenas ficar encarnando. O processo de vidas sucessivas perde o sentido para aquele que não aproveita as oportunidades de cada existência. De nada vale para aqueles que apenas se instruem culturalmente, mas que não alcançam a sabedoria, a prática daquilo que foi recebido.

Existem muitos espiritualistas que sabedor do infinito número de oportunidades que Deus concede aos seus filhos acomoda-se em uma determinada existência deixando para realizar a mudança em outras oportunidades. Por que Deus iria favorecer este com a força para realização do que precisa ser feito?

A purificação se dá com o trabalho assíduo e perseverante a cada encarnação. É preciso haver, depois de despertado, uma dedicação total a este objetivo para que o ser receba o impulso oriundo da sabedoria de outras vidas. Por isso, mesmo que nesta vida este impulso não exista, se você foi despertado pela doutrina de alguma religião, se entregue ao trabalho assíduo e perseverante de seus preceitos doutrinários para que em outra vida possa ter a força do impulso oriundo da sabedoria de outras vidas.

Ensinamentos de Krishna - Resumo

O conhecimento de Deus

01. Ó Partha... se praticas a yoga com a mente fixa em Mim, tomando refúgio em Mim, ouve como poderás conhecer-Me plenamente e sem qualquer dúvida. (Bhagavad Gita – Capítulo VII)

O caminho do reto conhecimento começa quando você foca a mente em Deus e se refugia Nele. Focar a mente em Deus é compreender as coisas deste mundo da seguinte forma: tudo foi Deus que fez. Refugiar-se em Deus é atribuir a seguinte idéia ao futuro: só vai acontecer o que Deus quiser. Quando você alcançar este reto entendimento qualquer coisa que aconteça será o que pode lhe acontecer de melhor, já que sua confiança (fé) estará depositada em Deus.

Portanto, para aquele que possui o reto entendimento pouco importa o que acontece nesta vida. Por estar refugiado em Deus, este não sofre. Não importa o que aconteça, se a mente está focada em Deus, este só O verá agindo e por conta da confiança que tem no Pai, jamais sofrerá.

Agora, se a mente está dispersa pelo turbilhão das idéias, o ser humanizado ficará perdido buscando entender o que acontece. Como isso é impossível para quem não tem o reto entendimento, o ego criará falsas verdades, fantasias, para gerar uma compreensão que não é real. Neste momento, aquele que não está refugiado em Deus, mas no eu, no ego, sofrerá, pois sentirá sempre sua felicidade ameaçada pela vida. Por causa da incerteza sobre o futuro (se terá ou não suas vontades satisfeitas) sofrerá constantemente.

02. Sem reservas te falarei sobre este conhecimento e o método de sua realização; vivenciando-os, nada mais resta para conhecer aqui neste mundo. (idem)

Um grande recado do Krishna neste trecho: quem possui o reto entendimento penetra nos segredos mais profundos do Universo. Isso acontece sem que nenhum conhecimento tenha sido transferido...

Os seres humanizados vivem buscando informações sobre Universo. Seja através da ciência ou do estudo das coisas espirituais, estão sempre buscando conhecer a intimidade do Todo. Mas, alcançar isso através de conhecimentos é impossível. A mente humana não possui capacidade para tornar conscientes as informações sobre as coisas que existem além deste planeta. Falta-lhe sentido para poder percebê-las; faltam-lhe imagens para poder descrever o que poderia ser percebido. Por isso esta busca é vã.

Apesar disso, Krishna nos afirma que o ser mesmo humanizado pode penetrar neste desconhecido. Esta penetração, no entanto, não se dá por conceitos, por formas, por informações que possam ser compreendidas. Aquele que possui o reto entendimento e que, portanto, sabe que só Deus age, mesmo sem compreender esta informação perfeitamente, já sabe tudo o que pode ser sabido neste momento.

Mas, quando este conhecimento chega ao ser? Quando há a vivência do reto entendimento, ou seja, a prática do que se sabe. Penetra no segredo do Universo aquele que vivencia a consciência de que é Deus quem faz tudo e não apenas aquele que conhece esta informação. Sem a vivência do reto caminho, ninguém consegue conhecer tudo o que há para ser conhecido.

Portanto, por mais que um ser humanizado seja instruído na questão das coisas universais, por mais que ele conheça de cor e salteado os ensinamentos dos mestres, sem a vivência, sem a colocação na prática, sem o orai e vigiai a cada segundo para conhecer a intenção gerada pelo ego e libertar-se dela, este jamais chegará a conhecimento algum.

03. Entre milhares de seres humanos, apenas um busca a perfeição; entre os que tentam, possivelmente somente um alcança a perfeição e entre os perfeitos, talvez um só Me compreende perfeitamente. (idem)

Neste trecho do Bhagavad Gita há um grande ensinamento sobre o reto entendimento que precisamos nos aprofundar. Vamos vê-lo em detalhes...

Quando o Bendito Senhor fala dos seres humanizados que existem, claro, não está falando na sua totalidade, pois a sua conversa é com um buscador de Deus. Ele, portanto, está se referindo a existência de milhares de seres humanizados que se dizem buscadores de Deus. Quando fala deles afirma que apenas um realmente busca a perfeição. Quem são os que apesar de dizerem que estão buscando Deus não o fazem realmente? São aqueles que são católicos, mas que só vão à missa de domingo, aqueles que são espíritas, mas só freqüentam o centro na quarta-feira e não fazem mais nada por sua reforma. Enfim, Krishna está falando daqueles que apesar de se dizerem participantes de uma doutrina religiosa, apenas comparecem aos cultos, mas não praticam nenhum ensinamento dela.

Saiba que entre os que se dizem buscadores de Deus, na verdade só um O está procurando realmente. Os outros comparecem aos templos de sua religião para dar uma satisfação à sociedade ou para conquistar desejos e não para buscar ao Pai realmente. Estes, na verdade, não são movidos pelo anseio de procurar a elevação espiritual, mas freqüentam os cultos de uma religião por medo do que lhes acontecerá depois do desencarne.

Aquele que não busca o reto entendimento, ou seja, que não vive com a mente focada em Deus, freqüenta o culto da religião que professa apenas para ter uma desculpa quando desencarnar: ‘eu freqüentei tal centro’, ‘eu ia a igreja todo domingo me confessava e comungava’... Acha que desta forma pode enganar a espiritualidade e não receber aquilo que plantou. Ele não está preocupado com a questão do aproveitamento desta encarnação para a elevação espiritual, mas apenas buscando um salvo conduto para quando do seu retorna à pátria espiritual.

Apesar dos seres humanizados que agem desta forma ser muitos, existe ainda uma boa quantidade de pessoas que está preocupado com esta questão, mas mesmo entre estes, poucos chegarão. É a questão da frase de Cristo que certamente vocês já ouviram: muitos serão os chamados, mas poucos os escolhidos.

Por que isso acontece? Porque mesmo de alguns que buscam poucos conseguem alcançar? Porque para se alcançar a elevação espiritual é preciso um desprendimento muito grande de si mesmo e poucos tem coragem de fazer isso. Para se alcançar o reto entendimento é preciso matar você mesmo, é preciso desprender-se de tudo que até hoje para você foi importante. É por isso que Cristo diz ao moço que sempre cumpriu todos os ditames doutrinários de sua religião: abandone a sua riqueza e venha comigo.

Quando ele fala isso não está se referindo apenas à riqueza material, à posse de objetos, mas também as emoções. Para se alcançar o reto entendimento é preciso libertar-se do que se gosta, do que se quer, do que se acha importante conquistar. Todas estas razões são elementos gerados pela personalidade humana e, portanto, incompatíveis de serem vividas por quem almeja estabelecer-se definitivamente no mundo universal.

É a partir deste aspecto que Krishna afirma a existência de alguns que são movidos pela busca a Deus, mas que dificilmente conseguirão o reto entendimento. Mesmo quem diz amar a Deus tem dificuldades para abandonar estas razões oriundas das paixões, posses e desejos gerados pela mente humana. Dizem amar a Deus, mas não o fazem acima de sua própria satisfação humana. Por isso não estão dispostos a abrir mão das suas vidas, no sentido de realizar-se materialmente, não estão dispostos a abrir mão do pretenso comando da vida.

Estes são os dois primeiros tipos que Krishna cita como aqueles que não conseguirão o reto entendimento: aquele que tenta ganhar um salvo conduto para depois do desencarne ou que se torna religioso como uma satisfação à sociedade e aquele que apesar de realmente tentar, não consegue libertar-se da realização material. No entanto, o Bendito Senhor ainda fala de um terceiro tipo: os perfeitos. Vamos falar deles...

Para podermos compreender quem são os perfeitos que Krishna cita que não conseguirão o reto entendimento precisamos observar o que fala sobre os que deste grupo conseguirão. Sobre estes ele diz: “Me compreenderão perfeitamente”. Isso quer dizer que os perfeitos que não alcançarão o reto entendimento possuem uma compreensão sobre Deus. Portanto, ele está se referindo agora a doutos religiosos...

Krishna está falando dos padres, dos médiuns, dos palestrantes de centros espíritas, dos dirigentes das diversas religiões. Na verdade, está falando dos professores da lei sobre os quais Cristo também falou: aqueles que conhecem, mas não praticam o que sabem.

Os seres humanizados que possuem um conhecimento profundo sobre os ensinamentos dos mestres possuem, também, um determinado entendimento. Este, no entanto, segundo o Bendito Senhor, não os leva a alcançar o reto entendimento. Por que isso? Porque este entendimento se firma no culto ao ego, aos anseios e desejos humanos, à busca da satisfação nesta vida. Não alcançam o reto entendimento também porque na prática do ensinamento do mestre ao invés de cultuarem a Deus, idolatram outros seres humanizados: os mensageiros de Deus.

Os doutos das religiões criam interpretações para os ensinamentos de tal forma que eles sirvam como instrumento do prazer mundano e como instrumento de idolatria aos mestres enviados por Deus. É por conta destas duas bases em que se fundamenta a compreensão dos doutos religiosos que Krishna afirma que eles não alcançarão o reto entendimento.

Se o reto entendimento é a compreensão de que apenas Deus age e quando o faz é por conta da Justiça Perfeita e do Amor Sublime, é preciso se cultuar a Ele para promover a reforma íntima. Se o reto entendimento leva em conta a existência de uma realidade única, a vida universal, é nela que se deve buscar a felicidade. Justamente por causa desta diferença entre o reto entendimento e a forma de proceder dos perfeitos é que apenas um deles conseguirá atingir a elevação espiritual, por mais que conheçam os textos dos ensinamentos.

Desta análise sobre o que Krishna falou tiramos uma grande lição: para chegarmos a Deus e promover a reforma íntima, de nada adianta ser professor da lei. De nada adianta freqüentar cultos, de nada adianta se conhecer o que deve ser feito: se não houver uma centralização mental no Pai, nada leva o ser humanizado a aproveitar a sua encarnação. Nada o fará renascer do espírito e da água a não ser a convivência amorosa com Deus a cada momento, aconteça o que acontecer na vida carnal.

Aquele que não se entrega ao processo de reforma íntima com a consciência de que tudo que lhe acontece é fruto do amor de Deus, ficará num dos três grupos de buscadores que Krishna enumerou. Somente aquele que por força da sua confiança no Pai (fé) entrega-se completamente a Ele e vivencia o Seu amor independente do acontecimento da vida será o escolhido e, como diz a Bíblia, sentar-se-á ao Seu lado direito. Para que essa confiança e entrega seja alcançada é preciso que o ser humanizado abra mão de si mesmo, de suas posses, paixões e desejos, que não tenha mais obrigações nesta vida, e que não queira transformar a sua compreensão sobre os ensinamentos em verdades.

Participante: ouvi uma moça evangélica que na sua corrente doutrinária se prega que a riqueza material, a posse de objetos neste mundo, e o status que se pode adquirir como Inal da benção de Deus. Ou seja, segundo esta corrente, Deus dá tudo para eles porque são bons. A partir daí também pregam que aquele que não consegue nada é porque são muito pecadores e não merecem a ajuda de Deus.

Eis aí um exemplo do porque muitos doutos não conseguem, apesar de conhecerem os ensinamentos.

Os dirigentes desta corrente evangélica certamente já leram na Bíblia que Cristo afirma que não se pode servir dois senhores ao mesmo tempo. Também já leram que ele afirma que se deve amealhar bens no céu e não na Terra. Onde estão presentes estas informações no que eles pregam?

Repare numa coisa. A questão de Deus dá a cada um segundo suas obras está completamente vinculada aos ensinamentos de Cristo, mas o que Ele dá foi desvirtuado por uma compreensão de um ser humanizado que está apegado à idéia de gozar da felicidade neste por mundo. É a questão da interpretação dos ensinamentos que comentamos e que não deixa o ser humanizado que acredita nela alcançar o reto entendimento.

04. A terra, a água, o fogo, o ar, o éter, a mente personificada, o intelecto e o egotismo constituem a minha prakriti em suas oito divisões. (idem)

Prakriti é a consciência do espírito encarnado. Ela é formada pela terra (mineral), água (mundo aquático), fogo, ar – que juntos constituem os quatro elementos básicos da Terra – e pelo éter, que é a parte espiritual. Além disso, a mente personificada (o ego, o espírito encarnado) é formada pelo intelecto (os conhecimentos ou a memórias dos acontecimentos humanos) e pelo egoísmo (a vontade de se satisfazer).

Esses são os elementos que compõem a materialidade, ou a humanização do espírito. São elementos materiais e não espirituais. Mesmo o éter que Krishna fala trata-se de uma espiritualidade baseada ns valores do mundo material e não na Realidade universal.

05. Esta é a minha prakriti inferior. Diferente dela, ó tu de braços poderosos, é a minha prakriti superior, vivencia-a porque ela é o ser interno que sustenta este Universo. (idem)

Prakriti superior é a consciência espiritual. Aquela que o ser possui quando liberto da consciência inferior.

A prakriti superior ou consciência espiritual é superior à humana.

Participante: a prakriti seria uma influência a consciência ou não?

Sim, ela influencia aquilo do qual você se conscientiza porque é formada pelos elementos que comentamos e estes pertencem apenas ao mundo terrestre. Quem se deixa guiar pela prakriti inferior está apegado ao mundo humano.

Participante: mas a inteligência não é o espírito?

Difícil conversar sobre isso, pois vocês não sabem o que é inteligência. Em O Livro dos Espíritos é dito que o ser é o princípio inteligente do Universo, o que nos leva a confundi-lo com a própria inteligência. No entanto, posteriormente o Espírito da Verdade afirma que a inteligência é uma propriedade que o espírito possui. Isso derruba aquela tese.

Saiba apenas que o espírito vivencia duas prakriti: a inferior e a superior. A primeira é formada por elementos materiais e a segunda por elementos universais. Aquele que alcança o reto entendimento conhece isso e por este motivo não vivencia as consciências que a prakriti inferior cria como reais.

06. Sabe que todos os seres são gerados por essas duas prakriti. Eu sou a origem e também a dissolução do cosmo inteiro. (idem)

“Saiba que todos os seres são gerados por essas duas prakriti”, ou seja, todos os seres, humanos ou espirituais, vivem nessas duas prakriti. Eles são formados, gerados, passam a existir por conta das duas prakriti.

Participante: originados?

Originados no sentido de formados. É a existência de uma consciência que dá origem à idéia de se existir.

Participante: ser espiritual ou material? Qualquer um?

Sim, isso, qualquer um.

Agora, repare num detalhe. Claramente Krishna está falando neste trecho da prakriti. No entanto, na última frase ele diz: “Eu sou”... O que isso quer dizer? Que Deus é a própria prakriti, as consciências que geram a existência de uma individualidade...

Nada existe sem que Deus dê a idéia de existir. Nenhum ser, encarnado ou não, possui consciência de sua própria existência se o Pai não lhe conferir esta idéia. Isso é importante de se compreender para se alcançar o reto entendimento.

Um dos grandes entraves para a entrega com confiança à Deus durante os acontecimentos da vida é a questão do amor próprio, dos brios. Em nome destas coisas o ser humanizado imagina que precisa agir para se defender dos ataques do mundo ao seu íntimo. Mas, ataques a quem? A quem é apenas uma consciência gerada por Deus?

O amor a si mesmo como praticado nos moldes dos seres humanizados é algo que cai no vazio quando se entende que a consciência de ser, de existir é irreal: é apenas uma idéia de ser que Deus está criando. Não há nada sendo, mas apenas a idéia de ser alguma coisa. Por conta disso, volto a perguntar? Defender o que? Defender-se do que?

Mas, a informação sobre as prakriti não param por aí. O Bendito Senhor diz mais: ela é a origem de todas as coisas e também a dissolução delas.

Para os seres humanizados tudo que acontece tem uma origem ou um fim, um começa ou um término. No entanto, quando nos deparamos com a informação de que tudo o que existe apenas como uma consciência, como uma idéia de existir, a crença de algo começa ou acaba se transforma apenas numa idéia e não numa realidade.

Ter a consciência de ser, estar ou fazer é diferente do estar praticando ou sendo algo. Você não é gordo ou magro, mas tem a idéia de ser. Isso quer dizer que não é o volume da sua cintura que existe, mas que ele passa a existir porque você tem a consciência de ser gordo. É esta consciência que lhe faz perceber um volume grande na barriga e não ao contrário.

Entendido isso, posso, então, afirmar que nada existe: tudo é apenas uma idéia da existência das coisas. Olhe para sua frente. O que está vendo? Não importa o que seja aquilo não existe. Só passa a existir porque Deus lhe deu a idéia daquilo estar na sua frente agora. Se Ele não desse essa consciência, se não formasse essa prakriti, aquilo não estaria ali.

Este é o grande ensinamento de Krishna neste capítulo do Bhagavad Gita que pode nos ajudar a atingir ao reto conhecimento. Só juntando a idéia de que as coisas não são percebidas, mas formadas por consciências que são enviadas por Deus o ser humanizado pode praticar a reta vivência: Deus é tudo. Sem esta idéia o ser ainda continuará vivendo a existência de múltiplas coisas, entre elas ele mesmo, que se movimentam por moto próprio e em face do seu egoísmo nato, terá que defender seus interesses para ter seus desejos alcançados.

Portanto, se a origem de todas as coisas é a prakriti e não a realidade, a origem da terra, da água, do fogo, do éter, do intelecto e até do próprio egoísmo que você vivencia está em Deus. Ele também é a dissolução de tudo isso. Sendo assim, mantenha-se equânime, firme na relação amorosa com o Pai, quer seja na origem ou na dissolução das coisas que vivencia

Participante: qual é o trabalho da gente?

O trabalho do espírito enquanto recebe a prakriti de Deus é o que foi falado nos outros capítulos: sacrificar sua intenção ao Senhor. Não é não ter intenções, mas tendo-as sacrificá-las a Deus.

As intenções que sua mente gera são parte da prakriti, ou seja, algo gerado por Deus. Por causa disso, nunca deixará de tê-las. Mas, se é Ele que gera e dissolve as coisas, o Pai pode acabar com elas. Quando isso acontecerá? Quando você começar a participar dos acontecimentos desta vida em interligação com Ele, entregando-se a Ele, sacrificando sua intenção por conta desta relação amorosa.

Um grande exemplo disso é a frase de Cristo ao final da Santa Ceia: “Pai, afasta de mim este cálice.” Nesta frase está nítida a presença de uma intenção, mas na continuação dela encontra-se claramente também o sacrifício dela ao Pai: “se não for possível, que seja feita a Sua vontade.” Apesar de possuir a intenção de não viver determinado acontecimento, no caso a crucificação, Cristo sacrificou o seu querer ao Pai e manteve-se em paz e tranqüilo. Com isso harmonizou-se com o momento que viveria.

É esse eu o seu trabalho para alcançar o reto caminhar. É por conta dele que você, ser universal, ao longo das encarnações alcança a elevação espiritual.

Participante: mas, quando acabarão estas provações?

Quando Deus acabar. Quando Ele julgar que realmente você conseguiu libertar-se de suas intencionalidades egoístas, as provações acabarão. Ou seja, quando praticar tudo o que Krishna e outros mestres ensinaram conseguirá encontrar o reto caminho que o aproximará de Deus e neste momento todas as provações se acabam.

07. Ó Dhananjaya... além de Mim, nada existe de mais elevado. E tudo isto existe em Mim, como pérolas enfiadas num barbante. (idem)

Pouca coisa tem a se comentar neste trecho que não tenha sido falado antes. Quero apenas abordar a questão do Universo como Krishna o descreveu: tudo existe como pérolas enfiadas num barbante. Bela figura...

 Tudo o que existe no Universo são pérolas enfiadas num mesmo barbante, ou seja, são individualidades que formam uma nova individualidade, que chamamos de colar. Ele, no entanto, só existe quando há o barbante; se não houvesse, as pérolas ficariam espalhadas e não formariam um colar.

Nesta figura criada por Krishna o barbante é Deus. É ele que entrelaça tudo o que existe e faz surgir a realidade que você vivencia. Sem Ele, todas as coisas ficariam dispersas e nada faria sentido.

A partir desta figura, podemos compreender que qualquer lógica que seja alcançada precisa necessariamente conter a idéia de que Deus é que faz as coisas acontecerem. Se ela não estiver presente, não há lógica no que é pensado.

08. Ó filho de Kunti... Eu sou o sabor das águas, o esplendor do sol e da lua; sou a sagrada sílaba OM dos Vedas, sou a música do espaço e sou também o ser consciência do homem. (idem)

Deus é tudo. Isso Krishna fala às pessoas que adoram a natureza, a espiritualidade e as músicas. Com isso ele diz: sem colocar Deus atrás de tudo ou sem adorá-Lo através das coisas que gosta, não há como se alcançar a elevação espiritual. É isso que precisamos entender...

Não há o menor problema em achar lindo o pôr do sol, em gostar das informações que se recebe sobre o mundo espiritual ou em ouvir sons: o problema existe quando não se usa estas coisas para alcançar a Deus. Quem ama as coisas apenas por elas mesmo não se aproxima da Causa Primária delas.

09. Sou a fragrância na terra, a luminosidade no fogo; sou a vida de todos os seres e sou a austeridade nos ascetas.

10. Percebe-Me, ó Partha, como a semente eterna de todos os seres; sou o reto entendimento dos inteligentes, a valentia dos valentes e o poder dos poderosos. (idem)

Até aqui Krishna falou que os objetos materiais são Deus, mas Ele não é só isso. É também tudo o que você acredita ser.

Achando-se valente, saiba que a sua valentia é Deus; achando-se triste, saiba que sua tristeza também é Deus. Sendo um sonhador, saiba que isso é Deus. Ou seja, aquilo que acha que é, que imagina que está sentindo é Deus, já que tudo o que acredita sobre si mesmo é apenas uma consciência que o Pai está lhe dando e não uma realidade.

Deus é a semente universal. Se tudo o que passa a existir precisa de uma semente para germinar e crescer, a consciência de existir ou ser algo, também é Deus. Nada acontece que você tenha consciência nesse mundo se a semente daquela idéia não tiver sido plantada por Deus. Pouco importa se estamos falando da sua blusa, do cachorro, da planta, do sol, da casa ou daquilo que pensa sobre si ou sobre os outros, tudo nasceu da semente Deus e por isso é Ele.

É por isso que apenas aqueles que suplantam a tudo, inclusive a si mesmos, e se religam completamente ao Pai, alcançam a felicidade. Qualquer coisa que considere independente de Deus, é uma ilusão, um maya.

11. Ó príncipe da raça Bhârata, Eu sou o a força isenta de desejos e ligaduras. Eu sou também o anelo de todos os seres que não se opõem aos deveres morais e espirituais. (idem)

Apesar de ser tudo o que existe, Deus é isento de desejos e não ligado aos anseios humanos. Isso quer dizer que os seus desejos não são uma semente de Deus? Claro que não. Ao dizermos que Ele é tudo, afirmamos também que é inclusive a sua consciência de desejar alguma coisa. Mas, isso não quer dizer que ele deseja o que lhe faz desejar.

O desejo que Deus dá a cada um é a provação que representa os gêneros de prova que cada ser escolhe antes de encarnar. Quando, por exemplo, Ele gera a consciência de desejar o que não se tem, isso não quer dizer que ele comungue deste anseio. O faz apenas para que o ser possa exercer o seu livre arbítrio e optar pelo reto caminho: tudo é Deus e por isso não apego a este desejo.

Além de dar o desejo, Deus também é a força que leva os seres a libertarem-se da busca dos prazeres mundanos. Já falamos sobre isso: Deus dá esta força àqueles que sinceramente O busca

Mas, além destas coisas, o Pai também é a prisão daqueles que não se entregam à universalidade. Não é justo que aqueles que não aproveitam uma oportunidade tenham uma provação maior? Então, é exatamente por isso que quem não segue o reto caminho vai aos poucos tendo a consciência de estar mais apegado às coisas materiais. É como diz o Espírito da Verdade: “Dando ao espírito a liberdade de escolher, Deus lhe dá a inteira responsabilidade de seus atos e das conseqüências que estes tiverem”.

Sendo Deus, então, o desligamento do mundo mundano ou a prisão a este, volto a repetir o que eu digo sempre: em cada segundo da sua vida há uma pergunta que Deus lhe faz. A cada momento Ele está lhe perguntando se você O amará mais do que tudo, inclusive você mesmo, ou se irá se apegar aos anseios gerados pela personalidade humana. Em cada segundo da sua vida é isso que está acontecendo enquanto você está tendo a consciência de que outras pessoas ou objetos estão agindo de determinada forma.

A partir desta consciência lhe digo mais: se a liberdade e a prisão são dadas por Deus, que culpa ou glória você tem de ter feito ou não o trabalho da busca do reto entendimento? Nenhuma... Portanto, mesmo quando a mente se glorificar de ter conseguido ou quando o crucificar por não ter, não deixe de se desapegar destas idéias para poder realmente conseguir fazer alguma coisa.

12. E sabe também que os estados sattva, rajas e tamas de Mim provêm; porém, Eu não estou nesses estados, ainda que eles estejam em Mim. (idem)

Já falamos destes elementos. Eles são características que a mente implementa quando cria os pensamentos: a característica de praticar uma ação, a de omitir-se e a de ser bondoso. Apesar delas pertencerem à mente e, portanto, à prakriti inferior, elas também provém de Deus, mas Ele não se encontra nestes estados, ou seja, não possui a intenção de agir ou omitir-se nem se utiliza da bondade que vocês conhecem.

13. Por ser enganado por esses estados, compostos pelos três gunas (ou qualidades da prakriti), este mundo não Me percebe, nem sabe que estou além dos gunas e que sou imutável. (idem)

Quando você se depara com a presença destas características nos pensamentos que a mente cria, ou seja, a compreensão racional do momento de sua existência, ilude-se.. Se ilude com o que? Com a idéia de que é você que está querendo agir ou omitir-se, que é você que está querendo ser bondoso... Nenhuma destas idéias é nata de você, mas provém de Deus. Por isso acreditar que você está com vontade de fazer ou deixar de fazer é uma ilusão...

É por conta desta convicção que você consegue chegar ao reto caminho, ou seja, que consegue sacrificar suas intencionalidades a Deus. Somente quando o ser compreende que as consciências não são expressões dos desejos individuais, mas sim uma provação dada por Deus ao espírito, é que ele consegue caminhar no reto caminho.

14. Em verdade, este meu divino maya, composto pelos gunas, é difícil de superar e transcender. Ó Arjuna, só os que se refugiam em Mim é que conseguem transcender maya. (idem)

Maya é a ilusão que o ser humano vivencia quando acredita que a consciência que recebe da mente expressa um desejo seu. Essa divina ilusão, pois provém de Deus, é difícil de ser superada.

Sim, é difícil superar a idéia de que existe uma parede naquele lugar. Como superar esta idéia se ela é percebida pelos órgãos sensoriais do corpo? É difícil superar a idéia de que se está fome quando a barriga ronca. Como superar tudo isso? Refugiando-se em Deus...

Aquele que se refugia em Deus constata que existe um ronco na barriga que está sendo percebido como fome, como vontade de alimentar-se, mas ao invés de se agoniar na busca da comida, ele tranquilamente espera a hora de alimentar-se. Dependendo dele a confecção da refeição, levanta-se e placidamente vai fazê-la; não dependendo, aguarda em paz e tranqüilidade que ela seja feita.

Saber que todas as posses, paixões e desejos são fruto de Deus como provação ao espírito e que a única resposta que deve ser dada naquele momento é o refúgio no Senhor, é alcançar o reto entendimento e caminhar pelo reto caminho que leva à elevação espiritual.

15. Desprovidos de discernimento, devido ao poder de maya e arrastados por tendências demoníacas, os enganadores, os perversos e os malfeitores não chegam a Mim. (idem)

Para Krishna os seres humanizados são desprovidos de discernimento, ou seja, não possuem a verdadeira compreensão das coisas, devido ao poder de maya, porque estão presos à ilusão criada pela mente como realidade, ao que acham, Eles são arrastados por tendências demoníacas, pela tendência de querer atender ao demônio que existe dentro dele, o ego, por isso tornam-se enganadores, perversos e malfeitores. Estes não chegam a Deus.

Bela imagem ele faz dos seres humanizados, não? Apesar de forte, ela é real: os seres humanizados não chegam a Deus porque preferem aproximar-se da natureza humana que vivenciam durante a encarnação.

16. Ó Arjuna, quatro classes de homens virtuosos Me adoram: os aflitos, os que buscam a prosperidade do mundo ou do próximo, os que buscam o entendimento e os sábios de verdade. (idem)

Novamente não podemos dizer que Krishna está falando com todos os seres humanizados. Como ele está falando com Arjuna sobre a elevação espiritual, temos que entender que as quatro classes que ele cita neste trecho se referem somente à buscadores de Deus. Entre os que estão buscando a elevação espiritual existem estas quatro classes que cita Krishna: aqueles que apesar de estarem buscando a Deus ainda estão aflitos, ainda buscam a prosperidade, os que buscam o entendimento e aqueles que realmente buscam a Deus desmotivadamente. Vamos conversar sobre eles...

Para começar, pergunto: o que é preciso para se alcançar Deus? Desligar-se do ego...

Cristo ensinou que ninguém pode servir a dois senhores ao mesmo tempo. Desta forma, para poder estar com Deus é preciso se desligar do senhor humano: a mente geradora de falsas realidades. Este é o trabalho que deve ser feito por aquele que quer alcançar Deus. No entanto, como já vimos anteriormente, muitos apenas dizem que estão buscando alcançar o Pai, mas não se desligam do ego. Este trabalho leva o ser a viver algumas características que estão relacionadas nas classes de seres humanizados que Krishna fala neste texto.

Os aflitos são aqueles que estão desesperados, aqueles que mesmo dizendo que buscam a Deus ainda se afligem com os problemas gerados pela mente. São aqueles que acreditam que são reais as situações problemáticas desta vida. Como eles não conseguem resolver estes problemas e, por isso, não vivem a felicidade pura e eterna que o Pai tem prometido, vivem em aflição.

Estes, na verdade, estão vivendo apenas para si mesmos, para aquilo que a mente humana produz. Eles só procuram a Deus no discurso e não no coração. Eles só se lembram de Deus quando isso satisfaz as suas necessidades humanas. O Pai para eles não é um porto seguro, pois se fosse não viveriam em aflição. Não procuram Deus por amor, através da busca de uma convivência amorosa, mas apenas para que Ele o liberte do sofrimento resolvendo seus problemas. Quando isso acontece, estes nem se lembram mais de Deus.

Existem ainda os que buscam a Deus não para conviver com Ele, mas para conseguir ganhar alguma coisa neste ou em outro mundo. A diferença desta classe para a que vimos anteriormente é que aqueles querem resolver problemas, estes querem ganhar alguma coisa.

Os elementos desta classe são os buscadores que vivem fazendo promessas que retribuirão quando ganharem alguma coisa, aqueles que praticam as obrigações das religiões com a intenção de conseguir ganhar pontos no céu. Enfim, são aqueles que não estão realmente interessados em conviver com Deus, mas usá-Lo para atingir os desejos mundanos que a mente cria. Eles ainda servem ao ego e não a Deus. O Senhor para estes não é um Pai que possa acarinhá-los, mas um intermediário super poderoso que pode realizar seus anseios.

O terceiro grupo são aqueles que buscam a Deus através da ciência, através do entendimento. Eles querem que Deus se prove para eles.

Nós já conversamos sobre esse grupo aqui há algum tempo. Os elementos que pertencem a ele são como o apóstolo Tomé: precisam ver para crer. São aqueles que precisam encontrar respaldo na sua cultura para poder acreditar. Precisam que o Universo espiritual comprove a sua existência para poder passar a acreditar nele.

Dizem que Cristo vai voltar à carne. Isto é afirmado pelos elementos deste grupo, por aqueles que precisam de comprovação material para crer. Eles esperam a volta do mestre para poder acreditar no caminho que ele ensinou. Para que Cristo voltaria aqui? Para ensinar alguma coisa? Mas, ele já ensinou tudo o que tinha para ensinar. Leia a Bíblia, está tudo lá...

Na verdade os elementos desta classe citada por Krishna não estão procurando Cristo dentro de si, mas externamente. Isso porque eles só acreditam naquilo que seus órgãos do sentido ou seu mundo mental possa captar. O trabalho da reforma íntima precisa sempre da existência da fé, da entrega com confiança a alguma coisa. Por isso esperam que Cristo volte, comprove que é ele mesmo e diga a eles pessoalmente o que têm que fazer.

Se você só se entrega com confiança depois de ter feito um julgamento racional, está confiando em quem: no objeto externo que é alvo da sua fé ou no seu ego? Por confiar apenas na sua personalidade humana é que os elementos deste grupo também dizem que buscam a Deus, mas servem apenas à humanidade que estão vivendo durante a encarnação.

Participante: a gente sempre acha que se acontecer um milagre é mais fácil acreditar.

É claro; é mais fácil presenciar um milagre para crer do que realizar um trabalho de reforma íntima. Aliás, Cristo fala isso na Bíblia. Ele diz que os judeus da época viviam pedindo milagres para poderem acreditar. Hoje, dois mil anos depois, os seres humanizados continuam iguais...

Saiba de uma coisa: não existe milagre que possa lhe salvar de algo. Tudo o que lhe acontece é um carma, é o resultado de uma vivência anterior que você teve. Portanto, se quer mudar alguma coisa amanhã, precisa se mudar hoje.

Este é o terceiro grupo citado por Krishna: aqueles que estão preocupados em compreender ensinamentos para que possam avaliar a realidade das coisas. A classe daqueles que estão preocupados em conhecer cientificamente o mundo espiritual, conhecer Deus cientificamente. Mas, há mais um grupo citado por Krishna: o dos sábios. Vamos vê-lo...

Os seres humanizados que estão na quarta classe que o Bendito senhor afirma existir são aqueles que verdadeiramente procuram Deus. Quem são eles? Pela simples constatação dos elementos que pertencem aos outros grupos temos a resposta: aqueles que não se afligem com as coisas deste mundo, que vivem sem buscar ganhar neste ou em outro mundo e aqueles que crêem independente do que conhecem. Quem consegue vivenciar isso, apesar da mente produzir pensamentos que gerem realidades humanas, são os que verdadeiramente estão buscando a Deus, pois estão trabalhando para libertarem-se do ego.

Esses são, portanto, os quatro grupos de buscadores de Deus que existem dentro da humanidade. Todos os seres humanizados que, através de uma doutrina religiosa qualquer, se dizem buscadores de Deus estão incluídos neles. Pena é que setenta por cento dos buscadores ainda se afligem, vinte por cento quer ganhar, nove por cento precisa ver para crer e apenas um por cento realmente luta para se libertar da sua humanidade...

Ensinamentos de Krishna - Resumo

Para alcançar Deus

06. Ó filho de Kunti, se um homem, no momento de morrer, pensa em qualquer coisa (objeto, pessoa ou deva), por estar constantemente absorto nisso, para isso se dirige quando abandona o corpo. (Bhagavad Gita – Capítulo VIII)

Neste trecho Krishna nos explica a figura do obsessor. Este é aquele que ao desencarnar morre ligado na ação que o matou. Quem no momento do desencarne está ligado ao ego, ou seja, aos pensamentos que comentam o momento morte, continua vivendo preso à personalidade humana.

Por causa disso, aquele que no momento do desencarne está apegado aos pensamentos que construíram sofrimentos para o ser e que apontaram determinada pessoa como causadora deles se transforma em obsessor daquela. Quem, no momento do desencarne não se dá com outro ser encarnado, continuará, mesmo sem carne, desgostoso daquele e assim como quando estava na carne procurará vingar-se do que o outro lhe fez. É isso que vocês chamam de obsessão...

É por conta desta obsessão que na Bíblia Cristo diz: se alguém tem alguma coisa contra você, vá correndo fazer as pazes, pois senão ela pode representar contra você junto ao juiz. Todo aquele que sai da carne ligado às idéias humanas continua vivendo a mesma coisa no mundo espiritual.

Só que esta obsessão não se dá apenas por sensações consideradas como negativas, mas também pelas chamadas positivas. Quem sai apegado a uma ligação sentimental amorosa que a mente cria a respeito de outro ser encarnado, seja pai, mãe, marido/mulher, filho ou filha, continua vivendo esta mesma sensação depois do desencarne. Por causa dela, como fazia durante a encarnação, tentará dirigir a existência do outro dizendo o que é certo e errado para ele, o que é bom ou mal de ser feito.

Participante: a obsessão espiritual é tratada no mundo humano como a presença de um espírito do mal que busca atrapalhar a vida de um encarnado. Quer dizer que isso é errado, ou seja, que existe obsessão por amor?

Não existe espírito maligno.

Você chama de mal aqueles que, encarnados ou não, lhe contraria, ou seja, que não age em benefício de seus desejos. Mas, se como já vimos, tudo é emanação de Deus. Portanto, aquele que age assim está vivenciando uma emanação de Deus. Por este raciocínio, quando você chama outro ser de mal, está classificando desta forma o próprio Pai.

Voltando à questão da obsessão, ela é muito mais ampla do que vocês imaginam Como vimos, ela acontece quando o espírito sai preso ao ego e vive como real aquilo que o pensamento afirma existir, seja esta relação marcada por sensações positivas ou negativas. Mas, ela pode acontecer também entre encarnados e desencarnados e entre dois seres humanizados. Isso acontece porque toda relação criada pela mente é fundamentada no egoísmo o que confere a quem se gosta o título de ‘é meu’...

A mãe é obsessora do filho, o amigo daquele por quem nutre amizade. Quem fica obsedia aquele que desencarna.

Participante: nós chamamos isso de saudade...

Sim, eu sei que vocês utilizam este termo para designar esta relação e que consideram esta sensação como prova de amor, mas isso não é verdadeiro. Sempre que se coloca a denominação é meu, não importando seu o que, o que existe é uma obsessão, já que esta mesma expressão é usada para se criar uma possessão.

Participante: como trabalho de desobsessão nós costumamos realizar um trabalho no sentido de orientar apenas o desencarnado para acabar com a obsessão. Quer dizer que devemos também doutrinar o ser humanizado?

Perfeito. É preciso orientar o encarnado no sentido dele desligar-se das verdades criadas pelo ego, pois senão, como afirma Krishna, depois do desencarne estes continuarão se obsediando.

07. Por conseguinte, tenha-Me sempre em mente e luta. Tendo-Me oferecido a tua mente e o teu entendimento, sem qualquer dúvida, chegarás a Mim. (idem)

O ensinamento de Krishna neste trecho é claríssimo: tenha Deus sempre em mente e viva buscando sempre fazer oblação.

 Ontem, eu estava falando com uma menina e disse a ela uma coisa interessante: vocês vivem buscando a felicidade, mas quando ela aparece, ao invés de vivenciá-la, complicam as coisas preocupando-se com a dúvida se aquilo está certo ou não, querendo descobrir quando aquele momento deixará de existir, se é justo ou não ter aquela felicidade. Realmente vocês humanos são incongruentes...

Esta menina que conversei estava me dizendo que gostava de um moço e que esta sensação a estava fazendo feliz. Só que ao mesmo tempo queria saber se estava certo gostar dele, se aquela relação ia ter futuro, se tudo correria bem ou não entre eles. Vocês realmente são engraçados: dizem que querem ser felizes, mas quando a felicidade chega complicam a vida gerando preocupações que não fazem parte daquele momento.

É sobre isso que Krishna está falando. Ele está dizendo que o ser humanizado deve ter Deus sempre em mente e saber enfrentar a vida, saber enfrentar os pensamentos que constroem os momentos de uma existência. Aquele que sabe viver esta vida espiritualmente falando é quem não vivencia a preocupação, o sofrimento, o remorso, a auto-acusação e a crítica que a mente cria. Por ter Deus fixo em sua mente, caminha em paz e tranqüilidade, pouco importando o que o ego está criando.

É por isso que Krishna fala que o ser humanizado deve por Deus em sua mente. Quando isso acontece, o ser humanizado consegue viver exclusivamente com e para Ele. Este não conhece problemas, chateações, aborrecimentos. Por isso, quando estiver vivenciando um momento de felicidade, ao invés de se preocupar, curta este momento profundamente, se entregue àquela sensação. O que acontecerá depois? Só Deus sabe...

Mas, o Bendito Senhor diz mais: aquele que oferece sua mente a Deus terá um entendimento das coisas que o levará a aproximar-se do Pai.

O que está na mente de vocês hoje? O egoísmo, ou seja, a defesa de seus interesses. Isto é o que está sempre presente na mente do ser humanizado hoje, pouco importando o que está acontecendo. Ele sempre participa dos momentos da vida preocupado em ganhar, em ter o prazer, em ser reconhecido e elogiado pelos outros. É a preocupação da defesa de seus interesses que precisa ser substituída por Deus. Deixando de preocupar-se com os seus interesses e entregando a salvaguarda deles à Deus, estará livre para poder curtir o momento de agora intensamente.

O problema é que além de não estarem preocupados prioritariamente com Deus, vocês ainda imaginam que Ele está muito longe. Acham que ele está no céu. Para poder focarem-se Nele é preciso lembrar-se de outro ensinamento de Krishna: tudo é emanação de Deus.

Deus é tudo e tudo é Deus. Ele é todos os objetos com os quais você se envolve, é todas as pessoas que convive com você, é tudo o que faz e pensa. Ele está aqui ao seu lado, é você, e não no Universo. Lembrando-se disso, fica mais fácil ter Deus sempre em mente e com isso conseguir viver plenamente a felicidade quando ela surge.

Quem vive Deus como tudo o que existe tem uma compreensão diferente dos acontecimentos da vida. Ao invés de se preocupar com o que os outros fazem, ao invés de querer entender o que está acontecendo, vê o Pai em todas as coisas e aí se entrega a Ele, pouco importando o que está ocorrendo.

08. Ó Partha, aquele que pratica a yoga constantemente e que não permite que a mente fique vagando de lá para cá, quando medita no Divino Ser Supremo chega a Ele. (idem)

A mente vagueia de lá para cá, ou seja, os pensamentos se alternam constantemente. Mas, se alternam de onde para onde? Do certo para o errado, do bonito para o feio, do que você gosta para o que não gosta. É assim que você vive: navegando ao sabor dos pensamentos. Você não vive num caminho único, com uma rota reta traçada. Sua vida é um eterno vagar entre os dois lados da dualidade...

Só aquele que tem o pensamento fixo em Deus segue uma rota reta. Aliás, é por isso Krishna chama a yoga de reto caminho. Ela é o caminho reto que vai de você a Deus.

Aquele que trilha por este caminho alcança a felicidade pura e eterna, ou seja, é sempre feliz. Já aquele que navega de acordo com os pensamentos, um dia está bem e no outro dia está mal e no outro ainda está pior. Às vezes melhora um pouquinho, mas no outro dia volta a cair...

09 e 10. Aquele que no momento de morrer, com a mente firme e cheia de devoção, fixa o alento vital bem no meio da fronte, entre as sobrancelhas, graças ao poder da yoga e, além disso, medita sobre o Ser Onisciente e Primordial, o Governador e Dispensador de tudo, o Menor das coisas diminutas, o Sustentador de tudo, cuja forma é inconcebível, mas resplandece como o sol e que está muito além dos envolvimentos da ignorância, esse é o que obtém a Existência Suprema e Divina. (idem)

Só quero lembrar que a morte citada por Krishna não é a física, mas o Bendito Senhor fala de morte no sentido de renascimento, do matar o homem velho para renascer o novo. A partir desta visão, podemos compreender que os é falado que quando o ser humanizado está buscando o fim do homem velho deve se fixar no ser e em Deus.

Além disso, há outra informação importante neste trecho. Krishna fala que o Governador, que é Deus, quem governa, é o Menor das coisas diminutas. Como podemos entender esta fala do Bendito Senhor? Vamos ver isso...

Qual a coisa diminuta que existe? Qual a menor partícula que existe? O átomo, as moléculas. Krishna afirma que Ele é menor que estas coisas. Com isso, é óbvio que o Bendito Senhor não está falando de tamanho, até porque no mundo universal não existem formas, mas sim do que está por trás da ação dos átomos e moléculas.

Até aqui falamos de Deus como causador das coisas que você faz, da vida que o ser humanizado tem, ou seja, falamos da ação Dele sobre as personalidades humanas e sobre os objetos. Mas, o Pai não age só nas coisas macros, mas também nas micros. Ele é a Causa Primária do funcionamento de todas as moléculas e átomos dos objetos e corpos.

O bário, o mercúrio, o cromo ou o oxigênio não teriam as propriedades que possuem se Deus não os fizesse ter. Aliás, isso está dito claramente em O Livro dos Espíritos?

“07. Poder-se-ia achar nas propriedades íntimas da matéria a causa primária da formação das coisas? Mas, então, qual seria a causa dessas propriedades? É indispensável sempre uma causa primária”.

Sem a ação de Deus nada do que você conhece existiria. Responda-me uma coisa: do que você e tudo o que existe para você é formado? De um monte de células e átomos. Porque estas moléculas e células vivem aglomeradas nesta na forma e não se espalham? Porque Deus as une...

Eis aí a ação total de Deus como Causa Primária das coisas. Ele age sobre os seres humanizados comandando suas ações, age sobre os objetos comandando seu existir e age sobre os átomos e moléculas dando a cada um destes elementos propriedades diversas e os mantêm coesos para que as formas conhecidas no mundo humano existam. Sem a ação Dele o Universo seria um mar de átomos e células espalhadas que não possuiriam nenhuma propriedade.