Reforma íntima - Textos - volume 03

Reforma íntima - Textos - volume 03

Coletânea de textos referentes à reforma íntima. 

Reforma íntima - Textos - volume 03

Tudo

Sempre que o investigador da Verdade fizer uma separação, por mínima que seja, no eterno infinito, aquilo que, por negligência, ele vê como separado do eterno torna-se, para ele, uma fonte de perigos.

Os egos humanos possuem uma incapacidade para administrar alguns conceitos. Entre eles destacamos aqui o termo tudo.

“TUDO – 1. A totalidade das coisas e/ou animais e/ou pessoas. 2. Todas as coisas.” (Mini Dicionário Aurélio).

Apesar da definição deste termo ser extremamente explícita, o ego humanizado não consegue operar dentro da sua máxima amplitude. Com isso, o termo passa a ser aplicado a um conjunto de elementos que se quer ver incluído no tudo enquanto outros são eliminados deste grupo.

A definição abrangente do termo, porém, não permite que isso posa acontecer. Tudo é a totalidade de todas as coisas, sejam elas objetos, elementos humanos ou animais.

Por isso, quando o termo tudo é aplicado em algum ensinamento, ele não aceita que qualquer elemento, por qualquer razão, possa ser excluído do seu campo de aplicação. Mas, não é isso que se repara quando da interpretação dos mesmos...

“1. Que é Deus? Deus é a Inteligência Suprema, Causa Primária de todas as coisas” (O Livro dos Espíritos).

O termo todas é uma variação do tudo e, portanto, com a mesma abrangência que ele possui. Sendo assim, temos que compreender que o ensinamento nos diz que Deus causa primariamente tudo que pode acontecer. Mas não é isso que os egos humanos dizem...

Eles afirmam que acreditam no ensinamento, mas que a doença, por exemplo, não está subordinada a Causa Primária, ou seja, não é fruto da ação divina. Para os egos humanos a doença é fruto da ação de uma propriedade de elementos materiais (vírus, bactérias, etc.).

Acusam aqueles que vêem nos movimentos sísmicos a Causa Primária em Deus de fanáticos. Afirmam isso porque acreditam que a causa dos abalos sísmicos são as propriedades do subsolo da Terra. Ou seja, retiram do tudo que é causado pela Causa Primária aquilo que acreditam saber como acontece. Com isso cerceiam a abrangência do termo usado pelo Espírito da Verdade.

Mas, o pior é que não podem negar desconhecimento para tal atitude, visto que o texto da pergunta 07 de O Livro dos Espíritos é bastante explícito: “Poder-se-ia achar nas propriedades íntimas da matéria a Causa Primária da formação das coisas? Mas, então, qual seria a causa dessas propriedades? É indispensável sempre uma Causa Primária.”

Outra coisa que os egos humanizados separam como não pertencendo a causa primariamente a ação de Deus é a própria atividade humana (pensar e agir). Porém, mais uma vez não podem alegar ignorância, pois o texto da pergunta nove do mesmo livro não deixa dúvidas: “Em que é que, na causa primária, se revela uma inteligência suprema e superior a todas as outras inteligências? Tendes um provérbio que diz: vede a obra e procurai o autor. O orgulho é que gera a incredulidade. O homem orgulhoso nada admite acima de si. Por isso é que ele se denomina a si mesmo de espírito forte. Pobre ser, que um sopro de Deus pode abater”.

Deus é a Causa Primária de toda atividade humana, já que os seres humanos estão incluídos no “tudo” utilizado pelo Espírito da Verdade. Kardec, que não fez distinções para o “tudo” do ensinamento, compreendeu isso: “Quaisquer que sejam os prodígios que a inteligência humana tenha operado, ela própria tem uma causa e, quanto maior for o que opere, tanto maior há de ser a causa primária. Aquela inteligência superior é que é a causa primária de todas as coisas, seja qual for o nome que lhe dêem” (O Livro dos Espíritos – comentários à pergunta 09).

Deus é tudo e tudo é Deus...

Se todas as coisas originam-se primariamente na ação divina, podemos, então, afirmar que todas as coisas (objetos, pessoas, animais e acontecimentos) são emanações do próprio Deus.

Todas as coisas...

No entanto o ego humanizado continua incluindo neste conceito apenas o que ele quer, o que acha certo, bonito, bom. Deus não é apenas o que cada um acha que Ele é, mas sim tudo o que existe. Não importa a opinião de ninguém a respeito de quaisquer coisas: aquilo é uma emanação de Deus, é Causado Primariamente por Ele e, portanto, é Ele.

Mas, o ego humano não consegue captar esta Realidade... Apesar de todos os ensinamentos que dizem a mesma coisa, ele continuará gerando grupos de tudo que contenham apenas aquilo que ele quer que esteja presente.

O ego jamais irá mudar, ou seja, compreender a amplitude do tudo, porque ele não existe para ser perfeito, mas para gerar as provações necessárias ao ser universal (espírito) que está ligado a ele. Por isso continuará sempre excluindo do tudo aquilo que o espírito precisa despossuir.

Compete, então, ao espírito ligado a ele, agir contra esta consciência, ou seja, não aceitar como real as separações que ele faz. Este é o trabalho da reforma íntima, este é o caminho para se aproximar de Deus.

Enquanto o espírito aceitar como real as distinções que o ego cria estará afastado do Criador, pois não vivenciará a Real Causa Primária de todas as coisas.

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Eu e Deus somos UM

Nos dias de hoje é moda nos meios espiritualistas falar-se na Unidade, em tornar-se UNO com Deus ou com o Todo. Mas, nesta busca, se esquece do ensinamento de Cristo a este respeito: “Eu e Deus somos UM”... Vamos falar um pouco sobre este tema...

Reparem que Cristo não fala em ser UM, mas tornar-se UNO com Deus... Ele não fala em tornar-se UM, mas em unir-se a Deus. Esta diferença é sutil, mas a compreensão dela é o grande diferencial entre conseguir unir-se e imaginar-se unido...

Para podermos compreender a diferença é preciso antes conhecer os elementos da afirmação: Deus, Eu e unir-me...

Deus é o Todo Poderoso, o Onipresente, Onisciente e Onipotente. Por isso podemos dizer que ele é o Absoluto. Absoluto é tudo aquilo que é eterno e universal, ou seja, que jamais foi alterado ou jamais se alterará ao longo dos tempos e aquilo que sempre é igual para todos.

Só Deus é o Absoluto, pois só Ele jamais se alterou e mesmo que cada o um o imagine de uma forma diferente, Ele é sempre o mesmo...

Eu sou o ego/ser humano ou o espírito, dependendo do ponto de vista de cada um tem sobre si mesmo. Se Deus é o Absoluto e eu sou diferente Dele, posso dizer que o ego/ser humano e/ou o espírito é o Relativo, já que no Universo existe apenas o Absoluto e o relativo... Esta afirmação torna-se mais compreendida quando entendemos o que é relativo...

Relativo é o oposto do Absoluto. Portanto, relativo é tudo aquilo que sofre alteração seja ao longo dos tempos ou de um para outro ser/ego e/ou espírito... Nós, os egos/seres humanos e/ou espíritos, somos relativos porque estamos em constate mudança, quer seja na forma física como nas percepções e idéias que tenhamos.

Depois de entendido os dois termos da frase, podemos, então, compreender a ação: o eu UNIR-SE a Deus...

Quando se toma a acepção corrente nos dias de hoje no meio espiritualista, veríamos que UNIR-SE a Deus seria deixarmos de ser relativos e nos tornarmos Absoluto... Mas, isso é impossível: só Deus é o Absoluto...

O ego/ser humano e/ou o espírito não podem tornar-se Absoluto, porque se isso acontecesse, eles não estariam UNOS com Deus, mas se tornariam o próprio Deus, a própria Unidade buscada...

Reparem que Cristo não fala em tornar-se Deus, mas em UNIR-SE a Ele. Não fala em nos tornarmos Absolutos, mas em nos ligarmos ao Absoluto...

Esta é a grande diferença que falei antes...

O ego/ser humano e/ou espírito no processo de universalização ao invés de buscar unir-se a Deus, quer se transformar em Deus. Ou seja, quer tornar-se Absoluto. Mas, isso é impossível...

O ego/ser humano e/ou espírito é por natureza relativo porque não é Perfeito. Jamais um ego/ser humano e/ou espírito alcançará a Perfeição, pois esta não é ditada por normas e padrões que precisem ser alcançados, mas por Deus...

Deus não é Perfeito: é a Perfeição. Não existem verdades Absolutas que Ele conheça: Ele é o Absoluto... Não existe algo Absoluto que Deus conheça e os outros não: Ele é o que existe de Absoluto...

É neste ponto que reside a diferença que eu falei...

Os egos/seres humanos e/ou espíritos querem conhecer o Absoluto, ou seja, querem ter Verdades e Realidades Absolutas... Mas, elas não existem: o que existe é Deus que é o Absoluto...

Tentando conhecer o Absoluto, o máximo que os egos/seres humanos e/ou espíritos fazem é continuar com idéias relativas que eles acreditam como Absolutas... Mas, isso não é realização alguma, pois hoje todos os egos/seres humanos e/ou espíritos já possuem alguma verdade relativa que creditam como Absolutas, ou seja, acreditam como verdadeiras...

UNIR-SE a Deus como propõe Cristo não é ter idéias novas sobre qualquer coisa, mas tendo a idéia que tiver saber que ela é relativa e não Absoluta...

Para se UNIR a Deus o ego/ser humano e/ou espírito, não tem que adquirir idéias/conhecimentos novos sobre as coisas, mas apenas ter a consciência de que elas são relativas. Não importa no que cada um acredite, tudo é verdadeiro de uma forma relativa, mas nada é de forma Absoluta...

Não acreditar que o que acredita é verdadeiro: isto é UNIR-SE a Deus...

Compreendeu o que quis dizer? Compreendeu a diferença entre os dois processos? Que pena... Você criou uma verdade relativa à qual está dando um valor de Absoluto...

Não acredite que isso que você compreendeu é verdadeiro, mas também não ache que é falso. Não existe nada verdadeiro ou falso, mas apenas Deus...

Deixe o ego/mente humana e/ou espírito acreditar no que quiser, mas não leve a sério esta crença. Apenas saiba: “isto é no que EU acredito e não uma verdade Absoluta. Amanhã esta idéia se mudará e por isso não vale a pena defendê-la com unhas e dentes”...

Pensando assim, você poderá ser UNO com Deus. Acreditando no que está compreendendo agora, tornar-se-á o UM e estará excluindo Deus desta Unidade...

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Apatia

Um dos elementos para a caminhada terrestre rumo à unidade com Deus ensinado por Sri Krishna é a equanimidade. Se consultarmos o dicionário, encontraremos como definição para este termo "igualdade de ânimos", ou seja, quando nos animarmos em qualquer situação, seja ela considerada positiva ou negativa, da mesma forma.

Ser equânime é libertar-se do prazer e da dor. É não vibrar por conquistas nem cair no abismo do desespero ou da depressão nas perdas. Em resumo, ser equânime é não ter emoções.

No entanto, para nós, ocidentais latinos, eu acredito que isso é quase impossível. Somos considerados sangue quente, ou seja, temos nossas emoções à flor da pele. Se nós ganhamos, vibramos intensamente; se perdemos, sucumbimos profundamente. Como, então, por em prática este ensinamento? Vivenciando uma única emoção: a apatia.

Se os orientais conseguem sufocar todas as suas emoções e nós, por carma pessoal, não conseguimos, precisamos, pelo menos, encontrar uma emoção que nos leve a aproximar de Deus. Esta emoção é o que eu chamo de apatia.

Portanto, vejo como caminho para a nossa busca de elevação o ser apático às coisas do mundo. Para mim, ser apático às vitórias ou derrotas é o caminho do meio que pode nos levar a vivenciar nossa plenitude espiritual encoberta pela ação do ego.

No entanto, quando se fala em apatia muitos imaginam frieza, mas não é disso que estou falando. Não estou dizendo para ficar indiferente ao mundo, mas lidar com ele sem deixar-se levar pela exaltação ou pela dor. Ser frio é não ligar para o mundo; ser apático é lidar com as coisas de uma forma diferenciada.

O apático não está alheio às coisas do mundo. Pelo contrário, ele está atento a elas, mas não as vivencia com as emoções humanas (dor/prazer). Isto porque o apático às coisas do mundo é ligado na emoção oriunda da glória de Deus. Ele não vive friamente, mas vivencia as coisas do mundo com a emoção espiritual e não com as materiais.

O apático não lida com pessoas ou objetos, mas deuses emanados; não vivencia acontecimentos, mas emanações de Deus. O apático é aquele que encontra em todas as coisas a Causa Primária se pronunciando com Justiça Perfeita e Amor Sublime. Se tiver emoção é ser quente, o apático ferve com o amor de Deus que ele vivencia em tudo.

O apático se regozija na glória de Deus. Sei que esta frase pode ser considerada por muitos como cafona, inculta. Aliás, já vi inclusive textos que buscavam ensinar coisas espirituais onde o autor iniciava falando que não se preocupassem, pois ele não iria falar em Deus ou em Cristo, como se apenas a própria cultura fosse o suficiente para levar o espírito à vitória durante a encarnação. Ledo engano.

O mais alto grau de elevação espiritual que um ser pode alcançar é quando ele se funde numa comunhão amorosa com o Pai. Quando o espírito amar a Deus e sentir-se amado por Ele o tempo inteiro funde-se naturalmente ao Universo sem necessidade de qualquer conhecimento teórico. Aliás, como Cristo ensinou, "louvado seja Deus que mostra aos simples o que esconde do sábio".

O apático é simples, porque para ele só existe Deus e seu Amor em ação. Para ele tudo o que acontece é fruto do Amor de um Pai olvidando todos os esforços para que o seu filho possa alcançar o mais alto grau de elevação espiritual: a comunhão com o Todo. Portanto, bem aventurado o apático.

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Tradição, família e pátria

Somos aquilo que imaginamos ser e vivemos aquilo que acreditamos que é real... Este é o ensinamento que estamos aprendendo com os amigos espirituais e ele vale para os vivos (encarnados) e os mortos (desencarnados).

Para ilustrar a necessidade da luta contra a realidade ilusória que vivemos como realidade, eu reproduzo abaixo um texto ditado no ano de 2000 por um amigo espiritual que se auto intitulou Irmão José. Apesar de hoje compreendermos que tanto ele como os demais envolvidos na história apenas vivem num mundo criado pelas suas próprias imaginações (ego), acho que esta história nos mostra que se nos apegarmos às nossas paixões e desejos, como diz Buda no sutta Devaddha, não garantiremos um bom lugar para depois da morte.

TRADIÇÃO, FAMÍLIA E PÁTRIA

Irmão José

Esta ninguém me contou: aconteceu comigo.

Estava em excursão pelo umbral inferior já há algum tempo junto com meus amigos ciganos, quando, um dia, Adolfo, o chefe dos ciganos, deu alto ao grupo de carroças e mandou chamar-me à sua. A sós, ele me relatou:

- José, por todos os lugares por onde temos passado tenho lhe servido de guia e cicerone. Por nossa causa você tem sido bem recebido em todos os feudos do umbral, mas agora a situação é diferente: Neste local que vamos chegar agora será você o nosso guia e cicerone. Você deverá apresentar-nos e solicitar estadia para nós. Sei que não será fácil desincumbir-se da missão, mas assim é necessário, pois para os chefes deste lugar, os ciganos não prestam. Você, entretanto, é conhecido lá e sua palavra de apresentação garantirá acomodações para todos nós e evitará retaliações por parte deles.

Estava perplexo. Era a segunda viagem que fazia ao umbral e achava que não conhecia ninguém ali. Isto porque todos fazem idéia que nós e nossos amigos não cometemos atos tão ruins para estarem no Umbral, quanto mais o inferior, que é onde vivem os ‘capetas’.

Entretanto, uma idéia se firmava na minha cabeça e muito me assustava. Infelizmente, quando Alfredo continuou, todos os meus maus pressentimentos tornaram-se verdade.

- O lugar para onde estamos indo agora é um quartel militar muito recente. Foi construído nos anos setenta para abrigar os militares e civis amigos que criaram os regimes ditatoriais da América do Sul. Você conhece toda esta gente e eles ainda têm em você um simpatizante. Não sabem que já se arrependeu e que hoje auxilia os exércitos do bem, por isso vão recebê-lo como a um filho pródigo.

Reagi imediatamente.

- Vamos pular este lugar. Passamos ao largo e não nos verão, como já fizemos com muitos outros. Eu não vou colocar-me novamente nas mãos destas pessoas. Sofri muito pelo que eles me induziram a fazer e acho que ainda não tenho estrutura para ver tudo de novo e fingir que concordo com eles. Isso para mim vai ser um inferno.

- Infelizmente José, nós vamos ter de passar lá. É necessário que você conheça o local para relatá-lo. Existem muitas pessoas que ainda hoje clamam por justiça entre os encarnados. Muitos dos atos praticados por estes espíritos quando na carne permaneceram escondidos e, por isso, as pessoas acham que eles ficaram impunes. Agora chegou a hora de mostrar ao mundo dos ‘vivos’ que a Justiça de Deus não falha nunca.

Os argumentos eram fortes e eu não podia fugir deles. O coração apertou, o medo me dominou, mas o meu trabalho exigia esta presença. Era importante também para mim, pois não se pode fugir para sempre do reflexo de sua vivência dos atos quando encarnado e, mais cedo ou mais tarde, temos que enfrentar tudo o que fizemos.

Já tinha pago minha dívida como simpatizante que fui; nunca fui colaborador do regime militar. Nunca entreguei ninguém, mas a tudo assisti sem esboçar reação para salvar as vítimas. Por este motivo havia me sujado, mas já tinha pago minhas dívidas.

Voltei para minha carroça e, enquanto a caravana continuava andando, troquei de roupa. Antes de sair, Alfredo entregou-me um terno, camisa social, gravata e sapatos que haviam sido trazidos justamente para aquele momento. Eu não sabia de nada, mas esta visita estava nos planos dos espíritos para quem trabalhava.

Vendo-me novamente de terno e gravata muitas lembranças voltaram. Sabia que dentro do quartel muitas outras voltariam, mas tinha que me apegar à minha crença atual e ao meu amor pelos amigos espirituais superiores para que pudesse enfrentar condignamente o tempo que permaneceríamos no quartel.

A estrada continuava e após um ligeiro aclive pude vislumbrar a fortificação. Os muros brancos caiados, as guaritas, tudo me era horripilantemente familiar. Chegando mais perto, pude ver que no alto da construção central, onde deveria ficar o quartel general, estava hasteado não uma bandeira, mas diversas: Brasil, Argentina, Chile e Paraguai ali estavam representados. Aquilo me assustou: lidar com um grupo de fanáticos já era difícil, imaginem com quatro.

Chegamos ao portão principal e a sentinela nos deu ordem de parar. Estava mal humorado pela visão das carroças dos meus amigos ciganos. Aquele povo, criado na tradição, família e pátria não aceitava ninguém diferente deles. Saí da carroça e fui falar com a sentinela.

- Boa noite, sou José, jornalista do Brasil e queria falar com o comandante do quartel. Quem está no comando aqui?

Claro que José não foi o meu nome real quando encarnado, nem foi isso que disse ao soldado. Entretanto, omito o meu nome verdadeiro porque alguns familiares meus ainda estão vivos e tenho muita vergonha da vida que levei e os forcei a levar.

Sem me responder a sentinela avisou ao corpo da guarda da nossa presença e mandou que aguardássemos. Passaram-se poucos minutos e um tenente que eu não conhecia veio me receber na guarita de entrada. Saudando-me com uma continência formal, falou o seguinte:

- Senhor José? Tem alguma identificação para que possamos comprovar que é o senhor? Claro que me lembro do senhor na televisão, mas é que ultimamente muitos agitadores têm conseguido milagres para penetrar em nosso forte e por isso pedimos a identificação de todos.

Já ia me desculpando por não estar com documentos quando, instintivamente, enfiei a mão no bolso de trás da calça e senti o volume de minha carteira. Aqueles meus amigos pensavam em tudo. Haviam preparado uma carteira igual a que usava quando na carne e copiaram os meus documentos. Tirei de dentro a minha identidade e mostrei ao tenente. Este exultou.

- É o senhor mesmo! Que bom que nos achou, estamos em uma época de má sorte, mas agora com o senhor aqui poderemos soltar as nossas notícias preparadas e assim voltaremos a dominar o país. Seja bem vindo, o comandante o receberá imediatamente. Mas, os seus amigos não podem entrar com as carroças. Peça-lhes que façam uma roda perto do muro, no lado oeste, e podem acampar por ali.

Olhei para Alfredo e vi que ele tinha compreendido a mensagem e fazia um sinal que eu devia entrar. Meu coração gelou. Na minha última encarnação havia estado em muitas dependências do exército e da polícia e ainda me lembrava das cenas que assistira ali dentro.

Segui o tenente. Passamos pelo corpo da guarda onde o sargento gritou ‘atenção’ e todos os soldados puseram-se de pé, em posição de sentido, à nossa passagem. Olhei para os rostos daqueles soldados e comecei a compreender como o mundo espiritual é magnífico.

Ao invés dos jovens recrutas que não sabiam direito o que acontecia dentro dos quartéis, a guarda era formada pelos inquisidores da época da carne. Reconheci dois ou três que balançaram a cabeça em sinal de cumprimento e também de reconhecimento.

Entretanto, não eram mais aqueles mesmos homens que havia conhecido. Algo neles estava mudado. Olhei mais detalhadamente e percebi o que era: não possuíam mais o vigor físico de outrora. Seus semblantes continuavam a mostrar o orgulho e a ferocidade que tinham quando vivos, mas seus corpos estavam fracos. O tenente percebeu minha dedução e comentou :

- Temos andado muito ocupados. Os comunistas não nos dão um minuto de sossego. Perto daqui existem duas células da guerrilha e fazemos incursões todas às noites no mato para caçá-los. Os homens estão esgotados, pois agora que foi extinto o serviço militar obrigatório os recrutas não aparecem mais. Só de vez em quando que algum antigo companheiro nos acha e podemos reforçar nossas tropas.

Depois do corpo da guarda, o pátio. Imenso, com as viaturas muito bem limpas. Apesar de ser noite, pois no umbral inferior sempre é noite, a faina era muito grande. Homens andavam de uniforme por todo lado e executavam mecanicamente o seu serviço. Faziam a única coisa que aprenderam quando na carne: servir ao exército.

Reparei que existiam quatro prédios centrais, cada um com a bandeira de um dos países. O meu tenente-guia explicou.

- Pela carência de mão de obra resolvemos juntar nossas forças. Antes havia um quartel para cada país, mas agora que as deserções estão acontecendo em grande número, os nossos chefes militares acharam por bem se juntar em um único quartel. Os comunistas fizeram a mesma coisa, mas eles sempre foram adeptos do internacionalismo, não é mesmo...

Dirigimos-nos ao prédio com a bandeira do Brasil. Posteriormente conheci todos os outros e conversei com figuras dos outros regimes autoritários que conhecia, mas destes não vou falar, pois os seus regimes devem ser analisados pelos seus próprios compatriotas.

Entramos no prédio e fomos ao terceiro e último andar. Ao longe podia ver os outros prédios que serviam de residência às tropas. Tudo permanecia igual. Parecia que o tempo não passara dentro do quartel.

O tenente guiou-me até uma porta dupla no fim do corredor. Depois que entramos dirigiu-se à ordenança que estava em uma mesa.

- Este é o jornalista José. Suas credenciais já estão conferidas. O general está informado de sua presença e o aguarda.

Voltando-se para mim, continuou:

- Espero poder encontrá-lo mais vezes no quartel, se tiver tempo. Que bom que veio. Vamos fazer uma incursão ao aparelho da guerrilha logo mais, se quiser vir conosco será bem recebido. Temos até uma equipe que grava tudo para podermos passar na televisão. Espero que possa fazer um bom trabalho com este material também, apesar de saber que a sua parte não era a edição.

Mais uma vez tive vontade de chorar e fugir dali. Meu passado, que achava extinto voltava e me feria o sentimento. As lembranças do que fizera para estar de bem com o poder atormentavam-me novamente.

O ordenança mandou que eu sentasse e aguardasse, pois o general estava ao telefone organizando a incursão do dia com o seu companheiro argentino. Ao lado da poltrona onde me sentei, os boletins do quartel davam conta das grandes vitórias que o exército aliado vinha conseguindo no combate ao terrorismo.

Sabia, por experiência própria, que só podia acreditar em dez por cento do que falava. Assim mesmo as notícias ruins não apareceriam de jeito nenhum. Mas os boletins serviram para passar o tempo enquanto esperava o general que, sabia, não estava ao telefone coisa nenhuma, mas sim me mostrando como era importante.

Enquanto esperava entrou um outro civil na sala. Ele não me viu a princípio, mas logo o reconheci. Havia sido um político muito importante no Brasil na década de sessenta e setenta. Participara como mentor civil do golpe militar em 1964 no Brasil. Não sei por que estranhei quando o vi ali: ele procuraria sempre o poder onde quer que estivesse...

Depois de falar com a ordenança e receber a informação de que o general não ia poder recebê-lo cedo, o dito político já ia embora quando me viu. Veio ao meu encontro.

- José, que prazer... Quanto tempo não nos vemos! Ainda bem que chegou, estávamos mesmo precisando de vocês da imprensa séria. Estamos sem cobertura e todos os periódicos são assinados por oficiais. Agora com um civil aqui as informações vão ganhar mais credibilidade.

- Governador, também tenho prazer em encontrá-lo. Muitas vezes pensei o que havia sido feito de vocês.

- Estamos todos morando neste quartel. Lá fora não existe mais segurança para se viver. O general mandou construir este prédio só para nós e instalamos aqui a Câmara dos Deputados e o Senado. Continuamos trabalhando para o povo e fazemos discursos inflamados de apoio aos militares. Votamos os projetos que eles nos pedem e aceitamos as leis de exceção que eles ditam.

- É, governador, nada mudou.

Percebi que esses soldados de chumbo nem sabiam que haviam morrido. Achavam que ainda se encontravam em um quartel em Brasília. Tinham medo da subversão fora dos muros, mas no restante continuavam a fazer leis e promulgar atos de força para uma população que não mais existia.

Ficamos conversando algum tempo mais falando das coisas do passado e ele atualizando-me a respeito das novas leis sancionadas. Logo, entretanto, o ordenança disse que poderia entrar e despedi-me do governador.

Aos mais curiosos, desculpe se não cito o nome deste político, mas os acontecimentos ainda estão muito recentes e com isso poderia contribuir para que muitas pessoas dessem vazão ao seu ódio. Da mesma forma vou agir com os militares que encontrei no quartel.

Uma coisa, porém, quero deixar bem clara: nos dias que passei no quartel encontrei praticamente todos os nomes que ocuparam o poder no Brasil, Argentina, Chile e Paraguai durante os regimes militares. Oficiais, praças e civis, ninguém escapou da repercussão dos seus sentimentos quando viveram os atos da encarnação.

Havia ainda alguns amiguinhos meus dos tempos de redação de jornal e de televisão, mas estes eram poucos. Somente aqueles que se entregaram de corpo e alma as revoluções ainda encontravam-se por lá.

O general veio ao meu encontro na porta do seu escritório. Abraçou-me efusivamente com o seu jeito tão meu conhecido. Conversamos aproximadamente por umas três horas. Colocou-me a par dos últimos acontecimentos no combate à guerrilha e pediu-me algumas informações sobre os demais postos existentes, pois há muito não faziam contato com eles.

Perguntou como estava reagindo a população, pois desconfiava das informações que os agentes secretos passavam para ele. Foi aí que fiquei sabendo que não só os militares sul americanos estavam ali: no forte moravam também os integrantes da CIA que ajudaram a fomentar os golpes nos nossos países.

Depois de muito falar sobre a situação atual veio com a pergunta que mais temia.

- José, você continua do nosso lado?

Não queria mentir, não podia faltar com a verdade, mas mais uma vez tive medo de enfrentar aqueles senhores. Se dissesse que não, iria direto para o calabouço e lá sofreria as torturas que tão bem conhecia; se dissesse que sim, estaria sendo desonesto com os amigos que me ajudaram a sair do umbral e que agora me destacavam com a possibilidade do trabalho para as hostes celestiais.

Fui impreciso na minha resposta e o general entendeu o que quis entender: que eu continuava do lado deles. Por isso me deu, como despedida, um conselho.

- Fui informado que você chegou aqui em carroça de ciganos. Espero que isto só tenha acontecido como carona, pois este povo anda juntando-se aos guerrilheiros. Eles têm sido vistos em número grande por aqui e sempre levam os recrutas que estão fraquejando nas suas determinações de combater a guerrilha.

- Eles também têm sido vistos junto aos acampamentos dos guerrilheiros, continuou o general. Acreditamos que eles estão seqüestrando nossos recrutas e os levando para o acampamento onde os comunistas fazem-lhes lavagem cerebral e os colocam para lutar contra nós.

O general não sabia e não compreendia que os ciganos ajudavam o plano espiritual do bem no salvamento das almas que iam adquirindo o arrependimento dos seus atos na carne. Com toda certeza meus amigos ciganos haviam retirado do quartel e do acampamento dos comunistas aquelas almas que procuravam o arrependimento.

Passei dois dias entre os militares. Visitei os outros prédios acompanhado pessoalmente pelo general. Os que eu conhecia apenas de rosto no noticiário me foram apresentados pelo chefe do grupo brasileiro. Conversamos sobre a situação da América Latina como um todo e especificamente dos problemas de cada país. De cada entrevista saia mais convencido que eles não se sabiam mortos. Continuavam procedendo como se estivessem no poder dos seus países e me davam entrevistas que pediam fossem publicadas nos jornais de lá.

Visitei os locais de torturas que se encontravam exatamente como eram na Terra. Visitei as dependências do DOI-CODI, do SNI e da Polícia Federal. Conversei com os agentes que apenas reclamavam da quantidade pequena de trabalho que tinham para fazer. Participei de uma patrulha e conheci o acampamento dos comunistas.

Na verdade os militares e os comunistas não entravam em combate físico, mas sim com propaganda ideológica. Quando a patrulha aproximou-se do acampamento um alto falante iniciou a tocar a Internacional Socialista ao fundo, enquanto que um narrador trazia máximas de Stalin, Lenin e Marx. O exército então colocava seus aparelhos de som para funcionar. O Hino Nacional brasileiro e os dos demais países participantes eram ouvidos e o oficial fazia então a propaganda baseada nos conceitos da tradição, família e pátria.

Encerrados meus dias no quartel solicitei nova audiência com o general e expliquei que precisava ir embora para poder levar as notícias para o povo. Não estava mentindo, pois na verdade é o que estou fazendo agora. Já de roupa trocada, com as vestes ciganas que tanto me orgulhava de vestir, fomos nos afastando do quartel. De longe, vi as bandeiras pela última vez e pensei:

Tudo continua como dantes no quartel de Abrantes.

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Medo da morte

Que os religiosos não espíritas tenham medo da morte é até compreensível, pois deve ser extremamente tediosa uma existência onde não ajam ações, como aquelas que crêem que existirá depois do desencarne. Além do mais, a visão do sono profundo não deixa que este ser tenha a confirmação da existência da vida espiritual pós-morte.

Os espíritas, no entanto, que possuem o conhecimento sobre as atividades extras corpóreas e as comprovações da existência desta vida, possuírem o mesmo medo, é algo inadmissível. Apesar de todas as transmissões da espiritualidade descortinando o véu do esquecimento, os espíritas apegam-se à vida material.

Isto ocorre porque, tanto um quanto o outro ainda está preso à matéria carnal através de elos.

O Espiritualismo Ecumênico Universal ensinou as Quatro Âncoras, ou seja, quatro grupos de aspirações que os seres humanos possuem que dificultam a sua elevação espiritual. Estas Quatro Âncoras, no entanto, são presas por Quatro Elos, que fixam o ser na vida carnal. É destes dois conjuntos que provém o medo da morte.

Falemos um pouco sobre estes elos.

 

A morte do ser humano

Neste trabalho quando nos referimos à morte, não estamos abordando apenas o assunto desencarne, mas também o renascimento que Cristo ensinou a Nicodemus:

“Eu afirmo que ninguém pode entrar no Reino de Deus se não nascer da água e do Espírito. A pessoa nasce fisicamente de pais humanos, mas nasce espiritualmente do Espírito de Deus. Por isso não se admire de eu dizer que todos vocês precisam nascer de novo. O vento sopra onde quer e ouve-se o barulho que faz, mas não se sabe de onde vem nem para onde vai. O mesmo acontece com todos os que nascem do Espírito”. (Evangelho de João – capítulo 03 – versículo 05)

O medo da morte física (desencarne) advém da certeza que, ao morrer, nascerá um novo ser: o espírito ou alma, como queiram chamá-la. É desta certeza que advém o medo da morte que o ser humano sente.

O ser humano tem medo do processo de sua transformação em espírito, e, por isto, teme a morte. Ele teme a transformação porque tem medo da perda da sua identidade, ou seja, do seu eu. Entretanto, Cristo nos afirma que este eu material deve ser eliminado ainda na própria existência corporal para que se entre no gozo da felicidade universal.

É preciso que o ser na carne morra (elimine o eu humano) para que renasça o espírito (a universalização dos conceitos) para alcançar o Reino de Deus. Este processo ficou conhecido como reforma íntima.

Eliminar o eu é deixar de utilizar as propriedades intrínsecas do ser – inteligência, amor e justiça – com objetivos individualistas. Quando isto acontecer, o ser não será mais o que é, ou seja, não terá a mesma consciência que possui hoje. Este é o temor dos seres humanos: deixarem de ser quem são.

A morte que estamos falando neste trabalho é exatamente o fim deste eu e isto não implica necessariamente em ter de sair da carne. É do temor da promoção da reforma íntima (fim do eu) que vamos falar.

Para se processar a reforma íntima é preciso quebrar os quatro elos que aprisionam as quatro âncoras ao ser humano.

Quatro Âncoras

São os seguintes os quatro grupos de situações (Quatro Âncoras) que dificultam a elevação espiritual:

Desejo de ganhar e medo de perder;

Desejo de se satisfazer e medo da insatisfação;

Desejo de ser elogiado e medo da crítica;

Desejo de obter a fama e medo da infâmia.

O ser humano é um ser universal que particulariza as suas propriedades intrínsecas: inteligência, justiça e amor. Esta particularização é representada neste ensinamento pelas quatro âncoras.

O ser humano que deseja sempre ganhar, satisfazer seus desejos, ser elogiado e obter a fama, utiliza no processo raciocínio conceitos que objetivem este fim. Determina os padrões de justiça de acordo com o seu objetivo e, desta forma, ama apenas a si mesmo.

As Quatro Âncoras levam o ser a não cumprir o segundo mandamento da constituição universal (amar ao próximo como a si mesmo), comprometendo a busca que ele vem realizar na carne: a evolução espiritual. É preciso que o ser livre-se destas amarras para poder navegar em direção ao porto da sabedoria, onde a utilização das propriedades é universal.

 

Libertando-se das âncoras

Para liberar-se das âncoras é preciso eliminar os quatro elos que as prendem ao ser. Sem quebrá-los é impossível livrar-se destas amarras.

A quebra, porém, não pode ser feita individualmente, pois as quatro âncoras estão aprisionadas nos Quatro Elos: todos os elos aprisionam todas as âncoras. Seria impossível se libertar de apenas uma âncora quebrando apenas um dos elos.

A reforma íntima, portanto, depende do ser quebrar os Quatro Elos para libertar-se das quatro âncoras de uma só vez, alcançando a universalização de suas propriedades e entrando no gozo da felicidade universal.

Os Quatro Elos

Quando o brâmane Janussoni pediu a Buda ensinamentos sobre o medo que sentem aqueles que estão face à morte (fim do eu), o Iluminado apontou os Quatro Elos que aprisionam às Quatro Âncoras. São eles:

A paixão pela posse moral (sensualidade);

A paixão pelas coisas materiais (corpo);

O individualismo (prática de coisas “más”);

A falta de fé (incompreensão dos ensinamentos).

Estes são os Quatro Elos que prendem o ser universal à visão ser humano, não permitindo a evolução espiritual. São eles que aprisionam o ser no desejo de ganhar, se satisfazer, ser elogiado e alcançar a fama.

 

Primeiro elo

O primeiro elo que prende às Quatro Âncoras que aprisionam o ser na visão ser humano é a paixão pela posse moral.

O ser individualista imagina que apenas o que ele compreende das coisas é que está certo, é bom e belo. Tudo o que os outros acham diferente dele está errado, é mau ou feio.

A posse moral se caracteriza pela detenção da verdade. A paixão por possuir a verdade sobre as coisas é que leva o ser a querer ganhar sempre, se satisfazer, ser elogiado e ficar famoso.

O prazer gerado pela satisfação do cumprimento dos seus desejos é tão forte que Buda comparou-o ao prazer sexual. É por este motivo que ele fala deste elo como uma paixão sensualista.

Quebrar este elo é abrir mão de possuir a verdade sobre as coisas. É preciso acreditar que todos os acontecimentos do universo estão perfeitos porque partem da Inteligência Suprema, observados os parâmetros de Justiça Perfeita e Sublimação do Amor.

Este elo foi simbolizado na Bíblia Sagrada na história de Adão e Eva. A mulher foi tentada a comer a maçã (adquirir um conhecimento) para alcançar o poder de determinar o que é bom ou mau no universo.

As religiões que utilizam a Bíblia como livro básico afirmam que é necessário acabar com o pecado original (o ato de Eva) para alcançar o reino do céu. Estão falando, portanto, da quebra do primeiro elo.

Assim sendo, a informação da quebra deste elo não é exclusividade do budismo, mas também é ensinamento de toda religião que utiliza a Bíblia.

 

Segundo elo

O segundo elo que prende as quatro correntes é a paixão pelas coisas materiais. Chamamos esta paixão de posse.

O prazer advindo da posse das coisas morais é que leva o espírito a ter medo de perdê-las, pois desta forma ficará insatisfeito, sentindo-se difamado. A perda é considerada uma crítica aos seus desejos.

Para acabar com estes sentimentos é que o espírito precisa despossuir todas as coisas materiais. Para que isto aconteça é necessária a compreensão de que o universo é a casa de Deus e que tudo que aqui existe pertence a Ele.

Se o universo foi criado por Deus para servir aos seres no seu processo de evolução, podemos afirmar que as coisas materiais são instrumentos para esta busca. Assim, enquanto o ser necessitar delas, o Pai as colocará à sua disposição, tornando-o “guardião” temporário delas.

Portanto, se as coisas são instrumentos da elevação do ser, fazem da parte da “prova” que ele tem que fazer quando está encarnado para alcançar a elevação espiritual.

Aprendemos na Segunda Verdade Universal da Doutrina Espiritualista Ecumênica que a prova é alterar a visão sobre as coisas, não vendo a forma, mas a essência.

É baseado nesta Verdade Universal que Buda utiliza no seu ensinamento a paixão pelo corpo. Quem está preso a este elo se apaixona pela forma das coisas e não pela sua essência. Esta paixão é que leva à posse.

Ao demonstrar que a vida carnal nada mais é do que uma etapa da vida espiritual, Kardec ensinou que o ser humano deve abrir mão das posses materiais para poder alcançar a elevação espiritual. O espiritismo, portanto, pede o fim do segundo elo.

 

Terceiro elo

Para Buda, o terceiro elo é a apreensão quanto ao resultado da provação que o ser faz durante a vida carnal.

Pela consciência que possui de ter buscado apenas a sua satisfação pessoal ao invés de universalizar os acontecimentos durante a existência carnal, o espírito sabe que causou ferimentos aos demais seres. Pelo estudo, compreende que precisa expiar suas faltas seja em nova encarnação ou no umbral.

Para fugir deste destino prende-se ainda mais à visão ser humano, imaginando que desta forma estará fora do alcance da ação justa de Deus, que só ocorrerá depois da morte.

A expiação de erros é chamada de carma, ou seja, um acontecimento traçado no sentido de expiar o sofrimento que causou ao outro ser. O carma causa medo, porque o ser sabe que ele se constituirá de um acontecimento que não satisfará os seus conceitos, ou seja, não levará a um prazer individual.

Fala-se muito em carma de vida passada, ou seja, expiações de situações de sofrimentos causadas em vidas anteriores, mas existe também o carma da vida atual. Este último, na maioria das vezes, é expiado nesta própria vida. Como no ditado popular, aqui se faz, aqui se paga.

 

Quarto elo

Este elo talvez seja o mais difícil de ser quebrado pelo ser, pois ele jamais será alcançado por comprovações materiais. Para alguns é mais fácil quebrar a posse moral; para outros, a espiritual; muitos, ainda, conseguem perder o medo do carma, pois conseguem enxergar materialmente estes ensinamentos. O quarto elo, no entanto, jamais poderá trazer confirmações materiais, pois isto o tornaria mais forte e resistente.

A fé é um sentimento que foi descrito por Cristo no primeiro mandamento da constituição universal: “amar a Deus acima de todas as coisas”. A fé é expressa através do amor incondicional ao Pai e a resposta de Deus aos seus filhos é a felicidade universal alcançada.

Infelizmente não é esta a compreensão que os seres encarnados possuem da fé, pois eles a condicionam à satisfação dos seus desejos. Para amar a Deus (ser feliz), os seres humanos precisam de posses materiais, morais e de situações de não sofrimento. Não amam a Deus, mas a si mesmos.

 Para que o quarto elo seja quebrado, ou seja, para que o ser humano alcance a fé em Deus, é preciso que todos os outros três elos (posse moral e material e a não existência de situações de sofrimento) sejam mantidos.

Como já explicamos, as Quatro Âncoras não podem ser eliminadas isoladamente, pois estão presas pelos quatro elos. Somente com a ruptura total destes elos é que o ser se libertará das âncoras.

Ninguém deve amar outra pessoa tendo motivos para isso, pois o amor não pode ter condições. Quem ama o outro porque é belo, ama a beleza e não o ser; quem ama porque o outro é amigo, ama a amizade; quem ama pela cultura, ama a sabedoria.

Em qualquer caso que exista uma condição para o amor, não há este sentimento pelo outro ser, mas pela condição que ele representa.

Para quebrar o quarto elo o ser necessita não mais impor condições para o exercício do amor. A ruptura do quarto elo passa pelo fim da “fé raciocinada”, ou seja, pelo fim da análise do prazer que resultará do trabalho do ser.

 A quebra do quarto elo só será alcançada com a fé incondicional a Deus: entrega e confiança total no Pai.

Para isto é preciso a perfeita compreensão dos ensinamentos deixados por todos os mestres.

Nenhum deles criou condições para que se amasse a Deus, mas pediram que se tivesse uma fé incondicional no Pai. Todos os ensinamentos tiveram este objetivo, mas foram interpretados pelo ser humano de forma diferente, pois buscavam a satisfação pessoal.

 

Quebrando os elos

Para alcançar a elevação espiritual o ser precisa, então, quebrar os Quatro Elos para que se liberte das Quatro Âncoras.

Este é o trabalho que o ser terá que fazer algum dia, pois como ensinou Kardec, todos os seres um dia terão que evoluir, independente de sentirem medo ou não. Este processo de transformação foi que levou diversos seres à elevação em uma de suas encarnações.

É um processo inexorável que todo ser tem que passar. O medo de enfrentar o renascimento apenas retarda o momento, mas não pode eliminá-lo nunca, pois faz parte integrante da existência do ser, como a morte física faz parte da vida carnal.

Além do medo do desconhecido (em que se transformará depois do renascimento) o ser tem o conhecimento inconsciente de que os Quatro Elos não podem ser quebrados passo a passo, mas que precisam ser rompidos ao mesmo tempo, o que exige um grande esforço. Por isto, encarnação após encarnação, o ser tenta quebrar os elos, mas não consegue se desfazer deles todos ao mesmo tempo.

Todos os elos agem e são dependentes entre si. A posse moral nutre a posse material, pois o indivíduo certo quer determinar a forma das coisas morais. O fim destas duas âncoras depende exclusivamente do fim do carma, já que na maioria das vezes esta ação divina fere as posses do ser.

Como perder tudo isso sem perder o amor a Deus? Compreendendo Sua ação no universo, ou seja, tendo fé.

O ser que busca realmente quebrar os quatro elos precisa atacá-los todos de uma vez, abandonar o poder de determinar o valor das coisas, para poder abrir mão das posses materiais. Para isso precisa perder o medo do carma, amando a Deus mesmo que suas vontades não sejam satisfeitas.

Existem dois instrumentos para esta ação: espiritualismo e ecumenismo.

Para quebrar os quatro elos o ser precisa acabar com a divisão do universo em material e espiritual, pois esta divisão leva à busca da satisfação em um mundo (material), afastando para o outro (espiritual) a ação universal. Para colocar em prática esta visão, é preciso juntar os ensinamentos de todos os mestres em apenas um caminho para se amar a Deus.

Como fizemos questão de frisar, todos os enviados de Deus falaram dos quatro elos e trouxeram os ensinamentos necessários para que eles fossem quebrados. O ser humano é que separou estes ensinamentos, quando afirmou ou entendeu que a elevação espiritual só seria alcançada trabalhando-se em apenas alguns deles.

Mesmo a forma da ligação necessária com Deus para a quebra dos elos foi diversificada, pois já se entendeu que apenas a junção de todas elas facilitará esse trabalho.

Alguns afirmam que o trabalho da elevação será alcançado recitando os textos sagrados (islamismo), outros com a meditação (orientais) e outros ainda através da oração (cristãos). Na verdade, a elevação espiritual só será alcançada quando se viver a vida material em meditação, recitando para si mesmo os ensinamentos que os mestres deixaram, a cada segundo. Esta vida é uma vida em oração, ou seja, vivida de acordo com as palavras dos livros sagrados.

Tanto o espiritualismo como o ecumenismo leva o ser a universalizar suas propriedades intrínsecas, enquanto que o medo da morte surge do individualismo destas mesmas propriedades.

Reforma íntima - Textos - volume 03

Beleza universal

Que me desculpem os poetas, mas a natureza não tem nada de bela, pois Deus, o Supremo Administrador do Universo, não possui o conceito de beleza. Como a ciência hoje já comprova, as cores e formas de animais e vegetais são funcionais e não estéticas.

As plumagens dos pássaros atraem as fêmeas e assim a preservação da espécie está garantida. As flores possuem cores e formas diferentes para atrair os pássaros para a polinização. As frutas têm cores atraentes para que os pássaros distribuam as sementes que farão nascerem novas árvores. Os peixes possuem cores variadas para mostrar o seu grau de periculosidade e afastar seus inimigos naturais.

Os animais são providos de artifícios que às vezes acabam com suas belezas, mas que garantem a sua existência para que possam cumprir o seu papel no desenvolvimento do planeta. Alguns possuem cascos que provocam asco, outros têm chifres que acabam com a beleza estética, mas todos estes artifícios são utilizados para prolongar a existência dos animais.

Tudo na natureza tem uma razão de ser. Deus, o Pai Criador causa todas estas coisas para que os reinos não inteligentes possam permanecer ativos, sustentando a vida humana no planeta.

 Dentro da evolução espiritual é necessário que o ser encarnado alcance esta compreensão e acabe com os seus conceitos sobre as coisas da natureza. Enquanto o homem achar alguma coisa bela é porque a estará comparando com outras que considera feia e não amará estas últimas.

A temida aranha tem o seu papel fundamental na natureza, o estranho besouro também e até a nojenta barata cumpre a sua função para que o planeta viva em equilíbrio.

Se o planeta fosse povoado apenas pelas plantas e animais bonitos, quem faria a função dos úteis? De que se alimentariam os animais que pastam se todas as plantas tivessem que ter flores bonitas, mas que não dispusessem dos nutrientes necessários para eles? O capim pode ser considerado uma praga pelos seres humanos, mas se ele não existisse não haveria o leite que sustenta o homem durante toda a sua vida.

Deus não possui estética, mas sim funcionalidade. Todas as coisas que existem no planeta agem entre si e dependem umas das outras para existir. O temido tubarão, senhor dos mares, precisa de pequenos peixes que lhe limpem o exterior para continuar existindo. Mesmo os animais de grande porte precisam das pequenas aves para livrá-los dos insetos.

O ser humano que separa as coisas em feias e bonitas, úteis ou inúteis, ofende ao Pai porque não compreende a ação de Deus suprindo todas as necessidades dos seres.

O questionamento sobre a estética ou importância das coisas interfere na elevação espiritual, pois não deixa o ser compreender a interação universal. Sem este conhecimento, não consegue compreender a interação que acontece em sua própria espécie para auxiliá-lo na elevação espiritual.

 Assim como o ser humano depende de todos os outros reinos para existir, também depende de outros seres da mesma espécie, pois a elevação espiritual só será conseguida quando amar aos outros como a si mesmo. Os seres humanos não conseguem se amar mutuamente porque possuem conceitos de belo e útil para qualificar os demais seres.

Conceitos como beleza são fatores que contribuem para o atraso na evolução espiritual, pois condicionam o amor do ser apenas para aqueles que contemplem os seus padrões. Cristo não nos mandou amar apenas aqueles que estão dentro do nosso padrão positivo, mas amar a tudo e a todos no universo.

Como se pode amar o feio? Apenas compreendendo a importância deste para o equilíbrio planetário. O amor entre os seres nunca nascerá de valores estéticos, mas surgirá quando cada um entender que a sua existência, que serve como campo para a elevação espiritual, depende de todos os outros seres que existem no universo.

Peço novamente desculpas aos poetas, mas não tenho a menor intenção de acabar com a poesia, pois tive algumas encarnações onde ganhei o pão de cada dia escrevendo versos. Minha intenção com estas palavras é mostrar-lhes o que é a verdadeira beleza: Deus e a Sua ação no universo.

Que não escrevam laudas sobre a flor de lótus, mas louvem a beleza da ação de Deus para criar o lodo, o único ambiente que pode nutrir esta flor. Que não falem das flores, mas lembrem a todos como é belo o Pai que dá o adubo para sustentá-las, mesmo sendo ele formado pelo estrume deixado pelos animais. Mostrem a maravilha que são os insetos que Deus criou: aqueles que mantêm o equilíbrio do meio ambiente tão atacado pelo ser humano, o mais louvado.

Tudo é perfeito, organizado e projetado para que um seja o sustentáculo da vida do outro. O que atrapalha esta visão do universo é o conceito do ser humano que separa as coisas como bonitas e feias, úteis ou inúteis.

Senhores poetas utilizem o seu dom para ensinar aos seres encarnados a compreender a ação de Deus no Universo. Mostrem para eles que tudo que existe, por mais estranha que seja a forma, é obra do Pai e que possui, por isto, a beleza suprema do Universo. Todo o mundo de Deus é belo porque é perfeito.

Quando o homem compreender a ação de Deus e não julgar as coisas a partir dos seus padrões estéticos, estará apto a ver esta mesma ação nos outros seres humanos. A partir desta compreensão verá em seu inimigo (o feio) um instrumento de Deus para a sua evolução.

Aquele que busca a beleza nas coisas também a procura nos outros seres humanos. Como não acha esta beleza continua amando apenas aqueles que satisfazem os seus conceitos. O ser universal está muito acima de padrões como os de beleza, porque conhece a maravilha do universo: a ação de Deus em prol da elevação dos seres.

Em seu evangelho (logia 29), Tomé traz um ensinamento de Cristo que pode nos ajudar a compreender o assunto aqui abordado: “Se a carne veio a existir por causa do espírito, isto é uma maravilha; mas se o espírito veio a existir por causa dela, é a maravilha das maravilhas. Mas o que me maravilha é como essa grande riqueza fez morada em tal pobreza”.

O Mestre neste ensinamento fala de sua admiração pelas coisas materiais. Esta admiração, porém, não nasce da forma estética das coisas, mas pela sua função: servir ao espírito para a sua evolução. Cristo se maravilha com a obra de Deus e não com a beleza das coisas materiais. Quando o ser humano compreende esta ação e abandona os seus conceitos, universalizando-se, para Cristo ocorre a maravilha das maravilhas.

Para o Mestre todas as coisas materiais são pobres se comparadas com o espírito, a grande riqueza. O ser humano que valoriza as coisas pelos seus conceitos acaba ofendendo outras maravilhas que Deus cria, chamando-as de feias.

A beleza universal é a ação de Deus que tudo provê para a evolução dos seus filhos.

Reforma íntima - Textos - volume 03

Bem zen

A humanidade elegeu nesse início de século a qualidade de vida como necessidade básica para a existência. Todas as coisas estão sendo relacionadas a essa qualidade para se transformarem em objetos das ações humanas. Em um mundo onde o stress, a correria e o sofrimento imperam, o ser humano pretende colocar a paz, a felicidade e a harmonia como objetivos para alcançar o bem-estar.

Nesse texto, procuraremos auxiliar os seres humanos nessa busca. Para isso enfatizaremos a cultura ocidental, tendo em vista que, a partir do final da segunda guerra mundial a globalização impôs essa cultura como básica para o planeta, afetando também a povos orientais.

Há um enfoque na humanidade que compromete o resultado do conhecimento das culturas: analisá-las a partir de fatos históricos. A compreensão dos fatos não se pode basear nas ações executadas durante a sua realização, pois essas ações são frutos de pensamentos. Um ato é apenas a materialização de um pensamento. Portanto, para se compreender um fato corretamente, é necessário conhecer a cultura ou base de raciocínio do povo que o gera.

Recentemente a humanidade vivenciou uma situação que espelha essa verdade. Para a existência da guerra do Afeganistão, entre outros motivos, foi criada a idéia da libertação das mulheres daquele país das rígidas regras machistas da cultura islâmica. Houve a guerra, aconteceu a libertação e, no entanto, milhares de mulheres daquele país continuam a utilizar a vestimenta que serviu como um dos pretextos para a guerra.

Isso porque, de acordo com a cultura das mulheres do Afeganistão o uso dessas vestimentas é certo e bom, por isso traz felicidade a elas. A idéia da liberdade, que acabou não sendo alcançada apesar da vitória na guerra, surgiu daqueles que não usam esse tipo de roupa. Eles quiseram impor suas vontades (errado e mal) a partir de sua cultura e não levaram em consideração o desejo das libertadas. É como a velha história do escoteiro que se orgulha de ter praticado uma boa ação: auxiliou uma senhora a atravessar a rua. Acontece que ela não queria atravessá-la.

A partir dessa análise, podemos compreender que o mal estar (infelicidade) dos tempos modernos não existe por causa dos fatos, ou seja, nas ações que o ser humano pratica, mas sim na sua cultura. De nada adianta mudar-se os atos para que seja feliz sem que haja uma alteração cultural, uma conscientização de que o mal estar surge dos valores com os quais se vive.

No nosso exemplo da guerra do Afeganistão, o sofrimento das ocidentais era a felicidade das afegãs. Para que os ocidentais vivessem felizes com a existência daquelas roupas, era necessário que compreendessem a cultura afegã.

Para alcançar o bem-estar, muitos ocidentais estão buscando as alternativas utilizadas por aqueles que possuem a cultura oriental. Yoga, relaxamento, meditação, acupuntura, reiki, Feng-Shui e tantas outras técnicas de se alcançar à paz e a felicidade como estado de espírito estão na moda. Poucos, entretanto, conseguem o sucesso esperado com esses tratamentos.

Isso ocorre porque todas essas técnicas não são a causa da paz e da felicidade dos orientais, mas apenas caminhos para auxiliá-los na prática de atos. O que leva alguns orientais a atingirem um estado de espírito que reflita o bem-estar almejado pelos ocidentais não são as técnicas, mas a cultura oriental. Portanto, além da utilização de métodos orientais é necessário que os ocidentais também vivenciem a sua existência com os valores da cultura oriental para promoverem o seu bem-estar.

Uma cultura não pode ser representada por objetos materiais. Estas coisas também são instrumentos da cultura. A vivência com a cultura oriental que falamos, portanto, não é a utilização de talismãs ou símbolos orientais, nem será alcançada trajando-se ou habitando semelhante aos orientais. De nada adianta o ocidental trajar-se à moda oriental nem utilizar mandalas. É preciso se atacar o mal pela raiz. Enquanto a raiz do mal-estar estiver nutrindo o ser humano, o bem-estar não será alcançado.

A raiz de uma cultura é os valores que determinam os objetivos de vida dos povos. A cultura ocidental é formada sobre a base da realização material ou a busca do prazer. O homem ocidental acredita que, para ser feliz, é preciso que todos os seus desejos sejam realizados.

 Assim, se sonha em possuir uma casa, um automóvel ou uma determinada pessoa (conquista amorosa), o ser humano que vive na cultura ocidental condiciona o seu bem-estar à posse dos elementos desejados. Esses elementos transformam-se em objetivo de vida e todas as ações são guiadas por esse sentido.

Entretanto, mesmo quando conseguem alcançar o objetivo, não são felizes, pois um novo objeto do desejo aparece rapidamente. A felicidade novamente será adiada por esse novo condicionamento. Quando o ser humano ocidental “põe a mão” no objeto do desejo, a felicidade escorrer por entre os seus dedos.

Quando consegue uma casinha própria já quer fazer mais um quarto ou construir uma suíte. Se o objetivo era um carro, sempre haverá um modelo mais moderno, mais possante ou bonito para ser desejado. O relacionamento que surgiu da conquista amorosa não é tão excitante quanto à perspectiva de nova conquista.

Isso ocorre porque uma cultura não é feita de valores materiais, como já dissemos, mas sim da forma como se encara a realidade (coisas materiais). A cultura não é determinada pelos seus objetos de consumo, mas pelos valores da existência que o ser humano possui.

No ocidente os seres humanos possuem quatro valores que norteiam a sua existência. São os reais objetivos das ações daqueles que vivem com a cultura ocidental.

A busca por ganhar e o medo de perder é o primeiro valor utilizado pelos seres ocidentais em todas as suas ações. Quando deseja um objeto, na verdade não o quer, mas seu objetivo é vencer a “competição” para possuí-lo. Todos os outros seres humanos são seus competidores em uma louca corrida pela posse do objeto.

A felicidade do ser humano ocidental nasce da vitória na competição e não da posse do objeto. Por isso, tão logo vença uma corrida propõe-se logo outra (outro desejo), para conquistar nova vitória para ser feliz.

Alcançar o primeiro lugar é o que satisfaz o ocidental. Segundo ou último lugar para ele é a mesma coisa, pois não trouxe a vitória, condição básica para a felicidade. Qualquer outra posição que não o lugar mais alto do pódio é perda, ou seja, motivo de insatisfação. Por esse motivo tem medo de perder.

Se ganhar e não perder é o primeiro objetivo do ser humano ocidental, o segundo é alcançar a satisfação e fugir das insatisfações. A satisfação é uma sensação fugaz e temporal à qual o ser humano se submete como felicidade porque seu primeiro objetivo existencial é ganhar, estar sempre certo. É por causa do seu primeiro objetivo de vida que o ser humano não permanece feliz com as vitórias alcançadas e sempre se propõe um novo desafio.

O elogio é a prova da vitória e, por isso, se transforma no terceiro objetivo da existência do ser humano ocidental. Busca constantemente a aprovação de todos como prova de suas vitórias constantes. Ele tem pavor das críticas, pois elas espelham as suas derrotas.

  A vitória também traz a fama, quarto objetivo da existência humana sob a cultura ocidental. Ela demonstra o status de ganhador do ser humano e dá satisfação a ele. Quando se transforma em um perdedor (não consegue vencer a corrida pela posse das coisas) o ser humano ocidental se considera difamado. Por isso, tem medo da infâmia.

Esses quatro elementos (ganhar, satisfazer-se, receber elogios e alcançar a fama) são à base da cultura ocidental, ou seja, o objetivo dos seres humanos que vivem sob a tutela dessa cultura. Para esses, o bem-estar depende de que esses elementos estejam presentes em cada acontecimento.

Pela prática da vida (fatos históricos) durante os séculos, está provado que essas condições não podem existir constantemente. Um ser humano não pode ganhar sempre para se satisfazer, pois isso geraria bilhões de seres infelizes. Essa insatisfação global acabaria por aniquilar a satisfação de quem ganhou. É necessário que haja a alternância na vitória para ocorrer a felicidade.

A felicidade (bem-estar) do ser humano tem que ser alcançada com o equilíbrio das coisas. Ficar feliz quando vencer e não a perder quando outro alguém conseguir superá-lo: aí está o verdadeiro bem-estar. Combater o mal-estar (a sensação de perda) apenas com técnicas e objetos é impossível. É preciso aniquilar a dependência dos elementos básicos da cultura ocidental para que todos os momentos se transformem em motivo de felicidade.

A ausência desses fatores que determinam a condição para ser feliz faz parte da real cultura oriental. Falo em real e não da atual cultura oriental, porque essa é vítima da globalização imposta pela cultura ocidental.

Com o fim da segunda guerra mundial os fatos (vitória aliada) impuseram aos seres humanos orientais os fatores da cultura ocidental. Não foram exportados só objetos materiais para o oriente, mas também os objetivos existenciais. Com isso, grande parte dos orientais alterou o seu modo de viver.

As técnicas e símbolos orientais servem apenas de instrumento para atingir à vivificação com os valores da real cultura oriental. A Yoga e todas as outras técnicas citadas não faz o ser humano ganhar, atingindo seus objetivos materiais, mas ensina-o a conviver feliz com a perda.

 Ajuda na compreensão de que a felicidade de ter participado da disputa (estar vivo) já é motivo para ser feliz. Não cria elogios, mas ensina o ser humano a utilizar a crítica para o aperfeiçoamento; mostra que a pessoa que passa por uma infâmia deve manter-se feliz, pois lhe foi dada uma nova chance de reabilitação.

O ser que vive com os valores orientais, como a Fênix, renasce das situações contrárias (perdas) aos seus desejos, porque não sofre com elas. Utiliza-as como um trampolim para a evolução. Todas as técnicas são instrumentos nesse sentido.

Já aquele que vive sob a tutela da cultura ocidental preocupa-se em ganhar para ser feliz. Daí nasce o stress. Quando não vence, aprofunda-se na depressão porque não entende a linguagem universal (acontecimentos).

O universo não age para derrotar os seres, mas para ensiná-los a vencer realmente. Quando os acontecimentos não permitem que apenas uma pessoa se satisfaça constantemente ensina-os a viver feliz com o que possui: essa é a grande vitória da vida e traz o bem-estar constante, qualidade de vida procurada pelo ser.

Para auxiliar o ser humano a alcançar essa consciência é que existem as técnicas e amuletos ocidentais. Todos são meios de renascimento e não instrumentos de satisfação. Auxiliam a viver e não a alcançar objetivos materiais.

Por isso, para se estar bem zen, alcançando o bem-estar permanente, é necessário não só se praticar as técnicas orientais, mas alterar os objetivos da existência.

Reforma íntima - Textos - volume 03

O cabeçalho da prova

Os acontecimentos da vida são momentos onde o ser pode optar pela defesa de seus interesses ou não. Sendo assim, o que acontece a cada ser humanizado pode ser chamado de cabeçalho da prova.

Digamos, por exemplo, que um ser humano tenha sido assaltado. Isso não é um acontecimento, mas o cabeçalho da prova de um espírito. O ato em si e toda repercussão dele é o texto que serve para o espírito responder se opta pela defesa de seu interesse ou submete-se a ele sem defender o que imagina ser seu.

 Isso vale para todas as coisas da vida de um ser humanizado. Você está aqui me ouvindo? Não está vivenciando uma prova. Você não lê livros, não passeia, não trabalha, não anda nem come nada: tudo o que lhe acontece é o texto de uma provação do espírito. Não é assaltado, não perde coisas, não é caluniado ou criticado, nem seus aparelhos eletrônicos deixam de funcionar: estas coisas também são apenas textos de provações do espírito.

Neste aspecto encontramos uma contradição entre aquilo que os seres humanizados compreendem como provação do espírito e o que os espíritos afirmam ser o instrumento do processo de elevação. Para os humanos prova é só os momentos que espelhem perda de algo que lhe interessa.

Isso não é real segundo o Espírito da Verdade:

 “ ... para alcançarem essa perfeição, têm que sofrer todas as vicissitudes da existência corporal; nisso é que está a expiação”. (O Livro dos Espíritos, pergunta 132 – Objetivos da encarnação)

Diferente do que os seres humanizados acreditam as vicissitudes da vida não são representadas apenas pelas carências. Vicissitude quer dizer alternância das situações da vida.

A vida humana é sempre formada por altos e baixos. Ela é composta por momentos onde existe a carência e a riqueza, momentos onde tem ‘sorte’ e em outros onde vivencia o ‘azar’, momentos onde consegue realizar o que quer e outros onde não consegue. Esta gangorra da característica de cada acontecimento da vida é que a faz representar as vicissitudes que o espírito precisa vivenciar para realizar suas provações.

Sendo assim, o que está acontecendo nos momentos da vida de um ser humanizado, seja este acontecimento recebido como bom ou mal, são o cabeçalho da prova do ser universal. Quando um ser humano é roubado está vivendo um dos aspectos da vicissitude, mas quando por acaso ganha um dinheiro inesperado também está vivenciando o espírito está realizando a sua provação. O acontecimento do roubo ou de ganhar, portanto, é o cabeçalho da prova.

Reforma íntima - Textos - volume 03

O céu e o inferno estão no mesmo lugar

Apesar de renegada pela maioria dos novos cristãos, principalmente os espíritas e espiritualistas, a Bíblia Sagrada é o livro mais importante para qualquer ser humanizado que siga os ensinamentos de Cristo, pois o próprio mestre disse:

Não pensem que eu vim acabar com a Lei de Moisés e os ensinamentos dos profetas. Não vim acabar com eles e sim dar o verdadeiro sentido deles. (Mateus – Capítulo 05 – Versículo 7)

Ao longo de toda a sua pregação Cristo não só seguiu o que ensinaram os profetas do antigo testamento como afirmou que muita coisa do que vivia era necessário acontecer para que o que estava profetizado acontecesse. Se ele submeteu-se a estas leis, se ele acreditou no que foi ensinado antes, porque os novos cristãos não a seguem? Não saberia explicar...

Acho que isso acontece porque muitos destes novos cristãos não entendem a Bíblia, não a conhecem direito. Por este motivo vou tentar jogar um pouco de luz sobre o que está neste livro sagrado.

A Bíblia começa com a parábola de Adão e Eva. Este casal simboliza os primeiros espíritos criados por Deus no Universo. Eles viviam no paraíso, ou seja, no plano espiritual superior, onde tinham tudo o que precisavam para a sua existência. Lá eles podiam transitar livremente e alimentar-se de todas as coisas, com exceção de um fruto, aquele que nascia da árvore que ficava no meio do paraíso: o fruto da árvore do conhecimento...

Qual o fruto da árvore do conhecimento? O saber... Sempre que um ser acredita naquilo que toma conhecimento (alimenta-se do fruto desta árvore) imagina saber alguma coisa. Portanto, o saber é o fruto que os espíritos que vivem no plano superior não podem usar para alimentar-se.

Mas, a que saber eu estou me referindo? Para explicar isso, com a palavra a cobra, ‘que era o animal mais esperto que o Deus Eterno havia feito’.

Deus disse isso porque sabe que, quando vocês comerem a fruta dessa árvore, os seus olhos se abrirão e vocês serão como Ele, conhecendo o bem e o mal. (Gênesis – Capítulo 03 – Versículo 05).

É este saber que estou me referindo: o saber distinguir o bem do mal, o certo do errado, o bonito do feio. Quando o ser humanizado acredita poder distinguir o que é certo do que é errado, o que é bom do que é mal, simbolicamente se transforma naquele que come a maçã, ou seja, que comete o pecado original.

Sendo isso verdade e estando os espíritos num mundo de provação, podemos, então, compreender que esta prova se refere a ter o saber ou abrir mão dele. Para que o espírito execute a sua prova, então, é preciso que até hoje a cobra esteja presente neste mundo oferecendo a cada momento o fruta proibido (os códigos que determinam o que é certo ou errado, bom ou mal) para que o ser universal possa fazer a sua opção: fechar seus olhos (deixar de ter certeza do que é bonito ou feio). Sendo assim, a cobra de hoje são as próprias doutrinas religiosas, os códigos morais, de ética ou comportamental que servem como guia para os seres humanizados distinguirem o bom do mal, o certo do errado. Libertar-se deles, ou seja, não utilizá-los para julgar o mundo, é, portanto, o objetivo da encarnação no mundo de provas e expiações.

Mas, isso não deve ser feito com o objetivo de ganhar qualquer coisa, inclusive a elevação espiritual, a volta ao paraíso. O ser que busca se libertar destes códigos deve fazê-lo pelo reconhecimento que não é igual a Deus, ou seja, não possui o mesmo poder de compreensão das coisas universais que Ele possui e não para ganhar qualquer coisa.

 Aí está a provação do espírito e como ela pode ser vencida: reconhecer que os códigos de leis que regem a convivência humana são apenas fruto da árvore proibida e libertar-se de se alimentar deles através da aceitação de que apenas Deus tem o poder de conhecer o bem e o mal. Quando age assim o ser universal demonstra que reconhece no Pai a ascensão moral que Ele possui.

Aqueles que executam este trabalho vão para o Reino do Céu, ou seja, retornam ao paraíso, enquanto que aqueles que não fazem isso permanecem no reino onde se nasce e morre. Este lugar é o próprio planeta onde estão encarnados.

Na Bíblia encontramos a referência ao castigo àquele que continua comendo a maçã, ou seja, continua sabendo distinguir o bem do mal: eles vão para o inferno. Ora, se como já vimos este castigo é permanecer encarnado, isso quer dizer que o planeta onde os espíritos cumprem a pena por saber é aquele em estão encarnando. No caso de vocês, a Terra...

Sim, a Terra para os seres universais que estão no processo de encarnação para provas e expiações é o próprio inferno... Nenhum espírito que continuar praticando o pecado original durante a sua encarnação irá para o inferno ou umbral como os espíritas chama o inferno, quando desencarnarem: apenas continuarão presos ao orbe terrestre.

O umbral ou inferno não está no céu ou abaixo dele, mas no próprio orbe terrestre. E aquele que persistir em atender a tentação da cobra continuará preso aqui.

É para ajudar na luta do espírito para realizar suas provações durante as suas encarnações que a Bíblia Sagrada, tanto o novo quanto o velho testamento, foi escrita. Ela contém ensinamentos que se transformam em caminho para aqueles que querem deixar de se alimentar do fruto proibido: o saber distinguir entre o bem e o mal. A cada trecho, seja ele ditado pelos profetas, apóstolos ou pelo próprio Cristo, a Bíblia traça um caminho que se seguido levará o ser universal a retornar ao paraíso.

Mas, como é descrito na Bíblia o céu, o paraíso, o lugar onde aqueles que conseguirem se libertar da tentação da cobra? Como a Nova Jerusalém.

Se o livro Gênesis mostra o início de tudo e as páginas internas mostram o caminho a ser seguido, o Apocalipse, o último livro da Bíblia, faz um resumo dos acontecimentos do mundo de provas e expiações no planeta Terra e termina falando do lugar onde viverão os espíritos se percorrerem todos os ensinamentos bíblicos.

Vamos conhecer um pouco da Nova Jerusalém ou o Reino do Céu como mostrado a João pelos anjos.

Um dos sete anjos que tinham as sete taças das últimas sete pragas veio e me disse:

- Venha e eu lhe mostrarei a Noiva, a Esposa do Cordeiro.

Então o Espírito de Deus me dominou e o anjo me levou para uma montanha muito alta. Ele me mostrou Jerusalém, a Cidade Santa, que descia do céu e vinha de Deus, brilhando com a glória Dele.

(Apocalipse – Capítulo 21 – Versículo 09 a 11).

A figura da Nova Jerusalém acontece no final da Bíblia Sagrada. Ele é descrita como o lugar onde conseguirão chegar àqueles que seguirem os ensinamentos dos mestres, apóstolos e profetas. Aqueles que por reconhecimento da ascensão moral do Senhor desistem de querer ser, estar ou fazer qualquer coisa baseado no seu saber.

Mas, qual a característica deste lugar é descrita na Bíblia?

Não vi nenhum templo na cidade, pois o seu Templo é o Senhor, o Deus Todo Poderoso e o Cordeiro. (Apocalipse – Capítulo 21 – Versículo 22).

Eis aí a primeira característica da Nova Jerusalém. Ela não precisa de intermediários entre os seres universais e Deus, pois o templo do paraíso é o próprio Deus. Mais uma vez voltamos à questão do reconhecimento da ascensão moral de Deus que leva à desistência de ter os olhos abertos e com isso saber distinguir entre o bem e o mal.

No mundo espiritual os espíritos não aceitam ser dirigidos por nenhum outro ser, a não ser o próprio Deus. Dirigido no sentido de dizer o que é certo ou errado. Tanto faz se estes sejam leigos ou religiosos: os espíritos aceitam apenas aquilo que Deus diz e faz. Eles submetem-se àquilo que Deus dá, sem concordar ou discordar com o que o Senhor faz fundamentados em códigos de regras traçados por outros seres humanizados.

A cidade não precisa de sol nem de lua para a iluminarem, pois a glória de Deus brilha sobre ela e o Cordeiro é a sua própria luz. (Apocalipse – Capítulo 21 – Versículo 23).

Mais uma vez a compreensão de João, aquele que escreveu o Apocalipse, nos leva a entender que não há nada artificial na existência daqueles que conseguirem chegar ao fim da Bíblia, ou seja, ao final do seu processo de provas e expiações: tudo se origina em Deus. Viver a partir de Deus, ou seja, viver dando ao Pai o primeiro lugar em tudo: este é o destino daquele que consegue trilhar os caminhos deixados pelos apóstolos, profetas e por Cristo.

Para alcançá-lo é preciso seguir o que João diz que é feito por aqueles que vivem na Nova Jerusalém:

Os povos do mundo andarão na sua luz e os reis da terra vão lhe trazer as suas riquezas. (Apocalipse – Capítulo 21 – Versículo 24).

Para se viver na Nova Jerusalém é preciso que o ser universal ao longo de suas encarnações leve a Deus toda a sua riqueza. Que riqueza maior pode possuir um ser do que aquilo que ele crê? Todos os seus bens materiais podem ser tomados ou se deterioram com o passar do tempo, mas aquilo que cada um acredita jamais pode ser roubado ou tomado. Por isso é a maior riqueza que um ser possui...

Doe todo o seu saber a Deus, ou seja, entregue para Ele toda a sabedoria que pode haver e com isso você poderá viver na Nova Jerusalém.

O trono de Deus estará na cidade e os seus servos o adorarão. Eles verão o seu rosto e o nome Dele será escrito nas suas testas. Ali não haverá mais noite e não precisarão mais de lamparinas nem da luz do sol porque o Senhor Deus será a luz deles e eles reinarão para sempre.

(Apocalipse – Capítulo 22 – versículo 03 a 05).

Portanto, quem se liberta de todo o seu saber não possui mais critérios para julgar o próximo. Com isso fecha os seus olhos, ou seja, não percebe mais nada de bom ou mal, certo ou errado, e devolve o poder exclusivo de Deus a Ele. Com isso entra na Nova Jerusalém, ou seja, vai para o paraíso.

Mas, onde é que se localiza a Nova Jerusalém? Relembremos o que o anjo mostrou a João: “Ele me mostrou Jerusalém, a Cidade Santa, que descia do céu e vinha de Deus”... A Nova Jerusalém descia do céu sobre a própria Terra. Ou seja, o paraíso é aqui mesmo...

Foi isso que Cristo ensinou através do Evangelho de Tomé:

“003. Jesus disse: Se aqueles que vos guiam vos disserem: vê, o Reino está no céu, então os pássaros vos precederão. Se vos disserem: ele está no mar, então os peixes vos precederão. Mas o reino está dentro de vós e está fora de vós. Se vos reconhecerdes, então sereis reconhecidos e sabereis que sois filhos do Pai Vivo. Mas se vos não reconhecerdes, então estareis na pobreza, sereis a pobreza.”

O Reino de Deus está dentro de cada um. A Nova Jerusalém precisa ser construída dentro de cada um através da doação do bem de maior valor que cada um possui: as suas verdades, os códigos que usa para julgar o próximo.

Assim como o inferno é aqui, o paraíso também é aqui. Inferno e paraíso não são lugares para onde o espírito irá depois das encarnações, mas um elemento do interior de cada um: estados de espírito, uma forma como se vivencia a vida carnal. Aquele que tem seus olhos abertos e se julga capaz de distinguir o bem do mal vive o inferno; aquele que coloca Deus antes de todas as coisas entregando, assim, o poder de julgar a Ele, vive o céu.

O paraíso é aqui, mas ele só será achado quando vocês entregarem o comando a Deus. Enquanto estiverem comendo o fruto da árvore proibida, ou seja, acharem que possuem o poder de ser o deus (aquele que pode julgar o bem e o mal das coisas) da sua e da vida dos outros, viverão o inferno.

Aqui pode ser o céu e o inferno: depende apenas de como cada um vivencia a sua existência carnal.

Reforma íntima - Textos - volume 03

O barco

Todo ensinamento é como um barco que transporta o espírito pelo mar do conhecimento. Este barco nos levará do porto da ignorância até o da sabedoria. É o transporte leva os ignorantes para viverem em um mundo onde serão sábios.

Entretanto, ninguém pode afirmar que conhece o povo de algum lugar sem que tenha convivido com este. Pode visitar e conhecer pontos específicos, mas só saberá perfeitamente como é aquele lugar específico se viver lá, junto com os seus habitantes.

Por isto, não adianta apenas passear no barco entre os dois portos para dizer que se conhece a sabedoria: é necessário descer do barco e conviver no mundo dos sábios para se portar como tal.

Este pensamento nos leva a compreender que não se deve apenas aprender, mas também praticar. Aquele que apenas vive aprendendo idolatra o barco condutor, mas quando este voltar para a terra da ignorância, ele continuará a bordo e não mais será sábio. Afirmar que o barco é muito bonito, perfeito, limpo e arrumado (tem lógica), mas não colocá-lo na prática não garante a vida em novas terras.

O ensinamento é apenas um passaporte para a vida no novo mundo e não a própria vida. Ao ser atingido o ponto de chegada, é necessário que se caminhe por neste novo lugar, convivendo com seus moradores para que seja um deles. Apenas a prática do ensinamento pode transformar o espírito em um sábio.

Durante milênios a espiritualidade, comandada pelo Pai Supremo, tem passado ensinamentos para os espíritos encarnados. Todos eles objetivaram transformar a vida na carne (que premia a ignorância espiritual) para que ela sirva para a conquista da glória (sabedoria) na vida espiritual. No entanto, os espíritos que recebem estes ensinamentos prendem-se a eles apenas como “conhecimento” e deixam de colocá-los na prática.

Jesus nos disse que devemos amealhar bens no céu, onde os vermes e a ferrugem não os destroem. No entanto, fieis e os próprios Senhores da Lei das religiões oram e promovem cultos pedindo bens materiais. Fazem promessas e pedidos a santos no sentido de obterem emprego, saúde, casa, carro, comida. Todas estas coisas são bens materiais que serão roídos pelos vermes e estragados pela ferrugem.

O barco navegou pelo oceano e mostrou a terra da sabedoria, mas os espíritos, por comodismo preferem retornar a ignorância. Buscam o prazer imediato e não a felicidade eterna prometida por Deus. O sábio não pede que seus desejos se contemplem, mas busca em Deus a força e o entendimento para superar a ausência das coisas materiais. Ele não pede um prato de comida a Deus, mas sim a força para suportar a fome sem murmurar para que possa ganhar o Reino do Céu.

O ensinamento não pode ser apenas conhecido, decorado e adorado, mas deve ser utilizado a cada momento da existência material do espírito. É preciso colocá-lo em prática a cada segundo de vida material para que se alcance a sabedoria espiritual.

Jesus nos disse que apenas aquele que for pobre de espírito herdará o Reino do Céu. O pobre de espírito não é aquele que não possui bens materiais, mas aquele que não tem desejos a serem atendidos. O pobre de espírito é aquele que ama tudo o que tem e o que não tem. Desta forma ele estará juntando este bem (o amor) no céu para o gozo de sua vida eterna.

Aquele que busca satisfazer as suas vontades materiais se tornará um rico, quer seja monetariamente falando como de saúde ou de alimentação. Lembremos que Jesus também nos disse que “é mais fácil um camelo passar pelo buraco da agulha do que um rico entrar no reino do céu”. Aquele que tem os seus desejos atendidos, sob qualquer prisma, é um rico, que dificilmente entrará no reino do céu.

Caminhar na terra da sabedoria é conhecer o ensinamento e aplicá-lo a cada momento da vida. Enxergar os acontecimentos de uma vida sob o prisma dos ensinamentos. Não importa qual seja o ensinamento que você acredite, se não aplicá-lo a cada segundo de sua vida, você estará navegando sempre entre os dois portos.