Unidade - Capítulo 1

Versículo 65

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Faixa 1
Faixa 2

 65. Não sou agente, nem desfrutador, tampouco existem quaisquer atos a me prenderem. Não sou corpo, nem incorpóreo; como pode a posse ser atribuída a quem tem nenhuma?

O que é posse?

Participante: Um sentimento de individualismo...

Mas, como se caracteriza a posse?

Participante: Por dizer que as coisas são minhas...

Mas, o que é este é “meu” que caracteriza esta posse? O que a possessão lhe leva a acreditar?

Por favor, me diga: o que é aquilo ali?

Participante: Uma mesa...

Por que você afirma isso?

Participante: Porque alguém juntou uma tampa e quatro pernas...

Não, porque esta mesma junção pode ser chamada de outra forma em outro lugar. Sabe por que aquilo é uma mesa para você? Porque você acredita que seja...

Esta é a posse: determinar valores para as coisas. Querer saber a verdade das coisas: este é o verdadeiro possuir.

Vocês possuem as coisas não quando acha que está sob sua guarda, mas sim quando decretam o que é aquilo. Quando vocês decretam o que é e acreditam nas opiniões de vocês sobre aquilo estão possuindo o elemento.

Participante: Posse, então, é a minha verdade?

Posse não é a sua verdade, mas a ação dela. Possuir a mesa é saber que aquela forma é uma mesa.

Mas, por que a possessão é dita como não evoluída pelos mestres? Porque quando há a possessão (o saber que aquilo é uma mesa), se alguém lhe contradisser (disser que é um banco, por exemplo), você terá que brigar para defender seu ponto de vista, sua posse. Neste momento não está amando e por isso está em desunião com Deus...

Participante: É... Para um gigante aquilo seria um banco...

Apesar de compreender assim, se um gigante viesse aqui agora e sentasse naquilo que lê acha um banco, você mandava que ele saísse porque “sabe” que aquilo é uma mesa e “sabe” que não se senta sobre a mesa...

Isto é posse...

Mas, por que você possui as coisas? Por que os seres humanos querem dar valores às coisas? Por que eles querem saber o que é cada coisa? Exatamente para uma das coisas que Dattatreya fala neste trecho: ser o agente das coisas...

Os seres humanizados não abrem mão de qualificar os elementos do mundo material para poderem se considerar o agente das coisas: “eu fiz”, “eu construí”, “eu realizei”. Esta visão sobre si mesmo que o ser humanizado tem é irreal: ela só existe por causa da posse...

Mais do que irreal: esta visão destrói a elevação espiritual, não deixa o ser entrar em Unidade com Deus. Isso porque cria a idéia de um agente, que na realidade não age, acaba com a realidade, pois tudo é feito por Deus, o Agente Universal.

Mas, o mestre fala mais sobre a posse... Vejamos...

Por que os seres humanizados querem ser o agente das coisas? Para poderem desfrutar delas, ou seja, para impor a verdade das coisas que eles têm aos outros...

Quando, por exemplo, um ser humanizado diz que alguma coisa é azul, esta verdade não pode ser mudada. Ele, por causa da possessão, exige que todos os demais concordem, para que assim ele se satisfaça.

Estes são dois motivos para possuir: imaginar-se agente da coisa e exigir que a sua posse seja reconhecida como real para que ele desfrute do prazer. Dois motivos que levam o ser humanizado a preferir a posse ao invés do despossuir: libertar-se do maya que cria os valores...

Mas, isso só é assim, porque o ser humanizado objetiva nesta vida ser famoso como realizador e conhecedor das coisas. Também, porque ele objetiva nesta vida um prazer de ter as suas verdades satisfeitas e acatadas pelos outros, ou seja, o elogio...

 Mas, o mestre dá mais motivos para o ser humanizado possuir ao invés de praticar o depossuir: “tampouco existem quaisquer atos a me prenderem”.

O ser humanizado quer ser reconhecido como agente para que assim possa determinar a ação a ser executada. Ele se prende, por exemplo, ao valor de sujeira dado pelo ego ao pó que se encontra sobre os móveis para que desta forma, ele possa limpar ou obrigar alguém a limpá-lo.

O ser humanizado se prende (possui) as verdades geradas pelo ego para que assim, possa executar ou ver alguém fazer um determinado ato, porque ele “gosta” daquela ação específica...

Sim, o ser humanizado que exige limpeza, gosta de limpar... Aquele que diz que não gosta do exercício da limpeza, mas vive com a vassoura na mão, está querendo iludir a si mesmo, pois se não gostasse não pegava na vassoura...

Sendo assim, o espírito encarnado possui uma verdade gerada pelo ego, porque espera que um determinado aconteça e com isso terá prazer...

Dattatreya ainda fala: não sou corpo, nem incorpóreo... Ele fala assim porque sabe que o ser humanizado possui formas (“isso fica bonito aqui e não ali”). Com esta posse ele passa, então, a exigir ser o agente do lugar da coisa e assim ter o prazer...

“Eu quero isso deste jeito”... Esta frase não está motivada por nenhuma verdade (a existência do lugar e jeito “certo” das coisas), mas sim por uma posse. Acreditar nesta realidade criada pelo ego é uma prisão ao maya, uma desunião com Deus.

Quando Deus, Causa Primária de todas as coisas, tira aquele objeto do lugar ou faz as coisas acontecerem de um modo diferente, vocês brigam com Ele...

Este é o ensinamento do mestre...

A partir dele, ele pergunta: por que você possui? Por que possui as coisas do mundo se você não é agente de nada? Por que possui, se não é desfrutador de nada? Por que possui se os atos não existem na realidade? Por que possui, se as formas não existem?

Saia desta ilusão, deste mundo ilusório que a posse lhe cria. Vire-se para Deus, só O veja ao invés dos elementos compostos que vivencia... Una-se a Ele...

Como já disse: viva por, para e em Deus... Quando agir assim, você nada mais possuirá, pois estará Uno com o Senhor. Saberá que tudo é Deus...

Para se libertar das possessões ilusórias, saiba que, como já foi dito, Ele é a Verdade... Portanto, viva a Verdade que é Ele sem querer impor a sua...

Mas, viver a Verdade que é Ele é atirar-se ao nada, ao vazio, à ausência de verdades, pois vocês não sabem qual é a Verdade Dele. Vocês não sabem se Deus quer que alguma coisa esteja aqui ou ali, por isso ame a coisa onde quer que ela esteja...

Por isso o mestre acaba este trecho perguntado: “como pode a posse ser atribuída a quem tem nenhuma?”