Unidade - Capítulo 1

Versículo 26

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 26. No eu somente e pelo eu (tu) somente se acha contido tudo isto (universo). Para ti não há contemplador, contemplação ou o órgão da contemplação. Como, então, contemplas e não te envergonhas?

Vamos por partes...

“No eu somente e pelo eu (tu) somente se acha contido tudo isto (universo)”.

Somente o espírito humanizado pode e quer explicar as coisas do mundo, pois ele imagina que é capaz de conhecer todas as verdades do mundo. O espírito universal, aquele que está desumanizado, entrega a Deus o conhecimento de toda a Verdade do Universo, a posse exclusiva de todo conhecimento do Universo.

Deixe-me dizer algo... Sabe porque todos os seres humanizados debatem assuntos com outros? Porque partem da presunção que sabem alguma coisa. Se alguém nada soubesse aceitaria o que os outros dizem sem questionamento.

Acontece que a presunção de saber causa um grande problema ao ser humanizado: ele nada aprende... Para se aprender alguma coisa é preciso antes existir a consciência de não saber nada, já que o saber cria sempre uma confrontação entre o que está sendo dito e o que você sabe.

Além do mais, o egoísmo que é a base do ego humanizado jamais deixará de tentar vencer, ou seja, de provar que está “certo”. Portanto, mais do que uma confrontação de idéias, o que acontece nos debates é uma batalha entre dois egos onde um quer vencer o outro, ou seja, quer subjugar o outro às suas verdades...

É baseado nesta Realidade que o espírito liberto da humanização procura não saber nada. Sempre que consegue libertar-se de suas crenças individualistas ele pode, então, absorver de Deus a Verdade.

Quando o espírito declara para si mesmo que sabe alguma coisa, ele contesta a Deus. Mas, esta contestação é fútil e ilusória, pois todo espírito só sabe parte da Verdade Universal. Deus é o único elemento inteligente do Universo que sabe tudo...

Sendo assim, podemos afirmar que aquele que contesta alguma coisa é porque imagina que sabe. Só que ao saber não se abre para novos conhecimentos.

É isso que está sendo dito neste texto: só no eu, pelo eu, se contêm tudo. Só no eu material existem conhecimentos para todas as coisas, porque no eu espiritual existe sempre a busca do abandono completo de verdades para que se possa receber de Deus a Realidade do universo.

Isso é importante e é fundamental para os buscadores para que vocês não fiquem querendo julgar toda informação nova para definir o que é verdadeiro...

Apenas Deus possui a Verdade. Além disso, como se diz em O Livro dos Espíritos, “jamais um ser humanizado compreenderá Deus”, ou seja, compreenderá a Verdade...

Vamos a outro trecho deste texto: “Para ti não há contemplador, contemplação ou o órgão da contemplação”.

O que é contemplar?

Participante: Olhar, admirar...

Ver... Ou seja, saber o que está acontecendo...

Contemplar alguma coisa é aplicar valores ao que está acontecendo. Você contemplar a natureza, por exemplo, é dizer que ela é bonita. Já que quem não gosta, quem a acha feia, não a contempla. Contemplar o seu marido é dizer que o ama, é dar valor a ele.

Só que não existe contemplador, porque você não é você. Quem está contemplando é o personagem, que não é você o espírito, mas sim uma personalidade ilusória que lhe serve de instrumento carmatico...

Quem contempla as coisas não é o espírito, mas sim o ser humanizado que você imagina ser. Isto porque o espírito não aplica valores às coisas. Só o ser humanizado...

Não existe também o elemento que é contemplado, ou seja, não existe o seu marido, a natureza ou qualquer coisa para você contemplar. Isso porque qualquer coisa que você contemple é fruto da sua imaginação. É maya, é uma criação racional do ego... É fluído universal que o ego cria razões que afirmam que aquilo é natureza, ser humano, etc.

Portanto, a contemplação é inútil, porque não existe contemplador nem contemplado. Mas, além disso, como vocês contemplam as coisas? Pelas suas percepções...

Pelas suas visões, pelas suas audições, pelo seu paladar, olfato ou tato, mas nada disso existe também, porque vocês, espíritos, não percebem nada através do olho. Quem está percebendo, aliás, criando a percepção, é o próprio ego, a personalidade ilusória que vocês acha que é...

Então, porque perder tempo contemplando, ou seja, porque perder tempo aplicando valores as coisas, se você, como contemplador não existe, as coisas contempladas não existem e a sua própria contemplação é uma criação ilusória?

Participante: Quando o senhor estava falando me veio a seguinte idéia... É como seu estivesse olhando, sentindo, ouvindo, dentro de uma caixa. Acontece que quando eu retiro esta caixa existe outra... Quando me livro desta, outra aparece e assim sucessivamente... Então a gente nunca vai conseguir realmente chegar à Realidade...

Exato, cada caixa dessa é uma ilusão, um maya que o ego cria...

Sendo assim quando você estará dentro da Realidade total? Quando tirar todas as caixas.

Quando se libertar de tudo o que vê, de tudo o que contempla. Mas, para fazer isso é preciso parar de contemplar, o que, aliás, é o que o mestre pergunta ao final deste texto: “Como, então, contemplas e não te envergonhas”?

Sabendo disso, como, então, você vive dando valor às coisas do mundo, se não existem você, as coisas e os órgãos que usa para a contemplação? Você não se envergonha disso?

Você não se envergonha de dar valores ao que Deus fez? É, você deve ter vergonha de dar valores ao que Deus fez...

Se você olha uma flor e a contempla dizendo que é bonita, imagina que está dando valor positivo ao que Deus fez. Mas, quando você contempla um coco e dá a ele o valor de feio, nojento, está também falando do que Deus fez...

Será que você não se envergonha de dizer que Deus é capaz de ser nojento e feio?

Participante: Mas esta flor está dentro de uma caixa... Quando se tira esta caixa aparece uma outra realidade, mas ainda dentro de outra Realidade e assim vai até o infinito, pelo menos dentro da minha visão...

Sim, é isso. Cada vez que você muda uma contemplação ainda não saiu da caixa, mas apenas tirou uma para viver em outra.

Então compreenda isso e não queira alterar os valores, mas sim deixar de dá-los... Ou seja, diga logo que tudo é caixa e que não adianta querer simplesmente mudar de uma para outra que ainda estará vivendo dentro de caixas...

Tudo é ilusão. Não adianta querer contemplar de outro jeito. O que precisa ser feito é parar de contemplar. Não adianta querer mudar os valores...

Não adianta, por exemplo, querer dizer que não é flor, mas fluído universal. Mas, o que é fluído Universal? Você também não sabe... Você, ego, terá que criar um maya, uma ilusão, uma simples compreensão racional para dizer que o que é fluido universal...

A evolução espiritual, portanto, não acontece com a simples troca de contemplações, mas pelo parar de contemplar, de dar valores às coisas do mundo. É por isso que o mestre lhe pergunta: você não se envergonha de ficar sempre trocando de valores? De sempre caminhar de lado ao invés de ir para frente?

Não é isso que estamos falando em todos os momentos...

Participante: A caixa nada mais do que o limite de nossa própria visão. Nem a caixa existe enquanto realidade...

Perfeito... Aliás, nem você existe como Realidade, pois qualquer contemplação que fizer sobre você mesmo é um maya, uma ilusão.

Aliás, como falamos, você é um brilho. Mas, o que é um brilho? Não sei... Isso porque qualquer valor que quiser dar ao brilho será uma caixa à qual estará preso...

Participante: Então estamos aqui para viver cada caixa a cada segundo?

Não, o espírito não se humaniza, cria caixas, não para vivê-las, mas sim se libertar delas... Uma a cada segundo...

Viver a caixa é o que faz hoje. Sempre que você acredita no que a razão cria a partir de percepções, você está vivendo uma destas caixas que foi dita aqui...

Mas, você não está aqui para isso... Você humanizou-se para provar a si mesmo que ama a Deus acima da beleza ou feiúra da caixa em que vive.

A cada vez que consegue por em prática o amor universal, Deus retira uma caixa, ou seja, elimina o apego a uma crença racional...

 Participante: Quando Jesus falou que os olhos são a candeia do corpo e que quando ele é luz, tudo se ilumina, mas quando ele é trevas, grandes são as trevas no nosso corpo, ele quis falar das somatizações da falta de amor que promove a dor?

Não vamos intelectualizar tanto o ensinamento, porque Cristo não tinha nada de intelectual...

Quando o mestre afirma que é preferível arrancar o seu olho e ir para o céu sem ele do que entrar no inferno com o corpo inteiro, não está falando, claro, do olho físico. Ele está falando da visão, do ver, do compreender o que está vendo. Esta visão a que se refere o mestre nazareno é mesma contemplação que o mestre Dattatreya diz que o espírito puro não faz.

Cristo estava dizendo exatamente isso: pare de contemplar as coisas, de ver, de aplicar valores as coisas, porque é preferível ir ao Reino dos Céus sem saber nada do que está acontecendo, do que ir para o inferno como um profundo conhecedor. Aliás, o próprio Cristo ainda ensina assim: louvado seja Deus que mostra aos simples o que esconde dos sábios...

Mas, há uma passagem mais forte sobre o tema. Logo depois de Cristo falar isso, os apóstolos perguntam a ele: então, o senhor está dizendo que somos pecadores? O Cristo responde: se você diz que vê, é cego e pecador, porque aquele que vê verdadeiramente (espiritualmente falando), nada percebe.

Aí está a síntese do ensinamento. Enquanto você disser que vê, que sabe, é cego e pecador, porque ainda contempla, dá valor às coisas do mundo.

Agora repare uma coisa. Para poder comentar este ensinamento de um mestre hinduísta, utilizei ensinamentos de Cristo, Buda e Kardec, sem ser hindu, budista e espírita, pois estes religiosos não compreendem estes ensinamentos como eu falei, apesar de conhecer estas passagens que citei. Isto é ser universalista: olhar sob um único aspecto todos os ensinamentos.

Participante: A visão da natureza para quem a pode ver fora da matéria é muito mais linda, não?

Não...

Sabe porque? Porque quem vê fora da matéria não vê nada lindo: vê perfeito...

O lindo é uma compreensão racional humana, uma contemplação, um valor que o ego humano cria sobre o que Deus faz. O espírito liberto da personalidade humanizada não dá valor às coisas, ele simplesmente diz: natureza é natureza. Ela não é “boa nem má”, “certa nem errada”, “bonita nem feia”. Ela é simplesmente a natureza...

Mas, mais do que isso, ele sabe que ela é emanação de Deus e por isso a declara Perfeita. Se ela é Perfeita não pode ser “bonita”... Aliás, se alguma coisa pudesse ser chamado de “bonito” na natureza, esta coisa não seria a massa, mas a ação de Deus...

Enquanto você achar a natureza linda não vê a Perfeição na emanação de Deus...

Sabe qual a beleza da natureza? É a funcionalidade dela. Sabe porque uma planta é colorida? Para atrair os passarinhos é assim garantir a continuidade da espécie...

Isso é lindo, isso é maravilhoso porque é ação de Deus que dá cor às plantas para garantir a reprodução. Agora, dizer que a cor ou a forma é linda é prender-se à matéria que é ilusória. E quem faz isso não vê a emanação de Deus, porque não vê a funcionalidade das coisas...

Participante: Quando estou fora da matéria vejo a natureza mais bonita, como se fosse numa fotografia à cores...

Deixe-me dizer uma coisa...

Apesar de você achar que está mais espiritualizado porque está fora da carne, isto não é real... Não é a carne que dá a humanização, mas a razão. Mesmo quando fora da carne você ainda está preso à consciência racional que vive hoje e por isso ainda é o mesmo ser humanizado.

Sendo assim, o que você está vendo ainda é uma das caixas que foram faladas aqui. Mesmo fora da carne, quando acha a natureza “bonita”, ainda está criando uma verdade.

Só isso...