As virtudes e o vício

Pergunta 902

Será reprovável que cobicemos a riqueza, quando nos anime o desejo de fazer o bem?

Tal sentimento é, não há dúvida, louvável, quando puro. Mas, será sempre bastante desinteressado esse desejo? Não ocultará nenhum intuito de ordem pessoal? Não será de fazer o bem a si mesmo, em primeiro lugar, que cogita aquele, em quem tal desejo se manifesta?

Neste texto a resposta é formada por outras perguntas pois o Espírito da Verdade quer nos levar a questionarmos o nosso interior. Será que é tão desinteressado assim o nosso desejo de ganhar na loteria, por exemplo? Para provar o desinteresse alguns até prometem que se ganharem darão parte do prêmio a uma instituição de caridade. Mas, e o resto?

Vocês me diriam que há gente que prometeria doar tudo e, com isso, provaria o seu desinteresse. Será que, mesmo doando tudo, podemos realmente afirmar que um ser humanizado não teria interesse individual algum envolvido?

Há um ensinamento profundo nesse texto, um individualismo proposto pelo ego de forma camuflada que o espírito não se dá conta. É por isso que o Espírito da Verdade faz tanta pergunta: para nos aprofundamos na questão e compreendermos esse individualismo velado.

Será que realmente está agindo tão desinteressadamente aquele que promete doar a totalidade do que ganhar a instituições de caridade? Será que ele não espera nem um muito obrigado, um sorriso, ou seja, alguma forma de reconhecimento pelo que fez?

Apesar destes elementos esperados não aparentarem um lucro individual, eles compõem uma provação gerada pelo ego que chamamos de fama individual. Esta fama não é representada por aparecer na televisão, ser capa de revista, ou reconhecido na rua, mas se consiste em apenas ser bem reparado pelos outros.

Aquele que quer ou espera que os outros reconheçam a sua capacidade de doação ou a sua sublimidade, participam dos acontecimentos com o interesse de alcançar a fama individual. Ela, portanto, é uma motivação com a qual os espíritos humanizados participam dos acontecimentos da vida, apesar de imaginarem que estão agindo desinteressadamente.

Aquele que busca aproveitar a encarnação no seu sentido espiritual precisa atentar com este aspecto. Precisa estar muito atento à ação do ego observando constantemente para o seu interior para ver se realmente está agindo desinteressadamente ou se o ego ainda cobra o reconhecimento dos outros.

Para isso questione-se constantemente no sentido de saber como reagiria se, ao doar-se integralmente, aquilo que espera como reação do outro (concordância, amizade, aceitação, felicidade) não aconteça. Será que sofreria, ficaria ressentido com o próximo, o criticaria? Se a resposta foi sim, saiba que a sua participação nesse episódio da vida foi fundamentada na esperança de ser reconhecido, de ter a sua ação reconhecida, de ter mérito.

Krishna ensina que o verdadeiro sábio é livre da ação do mérito e demérito. Para isso ele não julga nada para saber se está ‘certo’ ou ‘errado’. Mas para poder não julgar é preciso que não haja nenhum individualismo em ação.

Quando isso correr poderemos desejar uma fortuna realmente com a intenção de ajudar os outros. Mas enquanto humanizados, presos ao ego, às intenções da vida, o individualismo falará mais alto e o egoísmo será a base de tudo que vivencia nessa vida.