Choque de realidade

Negociatas

Hoje sai para comprar minha passagem para Brasília neste final de semana e ouvi a seguinte conversa entre duas senhoras na fila.

'Eu estou muito bem. O pastor da igreja que estou freqüentando agora nos ensinou que, além do dízimo, que é obrigação de todo fiel, devemos doar o valor de um dia do salário como doação espontânea. Tenho feito isso e Deus tem tirado leite de pedras para mim. No último domingo do mês passado, que não é um dia bom, precisava de quinhentos reais para poder fechar o mês. Minha sócia estava preocupada, mas eu disse a ela que Deus ia obrar por nós. Vendi os quinhentos e ainda mais cem'...

Não ouvi o resto da história porque chegou a minha vez e fui para o balcão comprar o bilhete. Saindo da rodoviária me deparei com uma unidade do resgate que estava atendendo a uma pessoa que tinha passado mal na rua. Na mesma hora venho na minha mente: 'Ela não deu a contribuição espontânea'...

Claro que isso é só uma história, mas que nos ajuda a pensar no choque de realidade. Passar mal na rua e precisar ser atendido pelo resgate é uma situação da vida. Não é exclusividade de ninguém: pode acontecer com todos nós, paguemos ou não a nossa contribuição espontânea ao pastor...

Isso porque, com a realidade, não se pode fazer negociatas. Nada que fizermos nos deixará impune de acontecer aquilo do qual pretendemos escapar.

Sabe, de nada adianta fazer negociatas com Deus – rezar, fazer penitência, praticar atos bons, auxiliar em trabalhos espirituais, etc. O que tiver que ocorrer com nossa vida vai acontecer.

Lembro-me que no início deste trabalho estávamos fazendo uma reunião na casa de um amigo no centro de São Paulo e eu esqueci o celular da minha sogra dentro do carro. Alguém atirou uma pedra e quebrou o vidro do motorista para levar o celular. Acontece que naquele dia estava chovendo e tínhamos que levar uma amiga que estava conosco em Barueri, onde ela morava. Por isso lá fui eu do centro de São Paulo a Barueri e depois de volta até Itaquera, onde morávamos, com o vidro quebrado e chovendo em mim – para quem não conhece São Paulo este percurso dá mais de 100 quilômetros – pela madrugada afora.

Lembro que esbravejava: 'Eu estou fazendo trabalho para Deus e Ele deixa isso acontecer'. Depois veio o recado de Joaquim: 'Não pense que por estar fazendo o trabalho para Deus você está imune de qualquer coisa. Você tem que beber até o último gole do seu cálice'. Portanto, não adianta nada se fazer negociata com Deus para prevenir qualquer coisa. Mas, também não adianta se fazer negociata com a vida para garantir imunidade.

A negociata com a vida, dentro da história que contei, é cuidar de sua saúde. Tomar remédios, vitaminas, visitar periodicamente o médico, fazer exercícios físicos, não fumar, não comer gordura, etc. Nada disso garante que uma pessoa não terá um mau súbito. A única coisa que pode realmente ajudar é estar preparado para tê-lo em qualquer momento, pois quando a realidade for acontecer o que não se espera, a pessoa não será pega de surpresa.

Não estou dizendo que devemos viver preocupados com a idéia de que poderemos ser acometido de um mal súbito a qualquer momento. O que estou falando é que não podemos viver com a certeza de que nós, ou qualquer pessoa chegada a nós está imune a isso. O que estou falando é que nada pode nos prevenir de acontecimentos como estes, se eles tiverem que ser realidades em nossas vidas.

Aquele que vive o choque de realidade está sempre preparado para tudo. Ele não se prende ao ter que acontecer, mas nunca é pego desprevenido. A tranqüilidade e a paz nestes momentos só podem ser alcançadas se o ser humano estiver preparado para qualquer acontecimento.

Portanto, estejamos sempre preparados para viver tudo, mas atento para a mente não fazermos vivenciar coisas que não gostamos antes da hora.