Reforma íntima - Textos - Volume 10

Espiritualismo

O espiritualismo compõe o tripé que deve servir de embasamento para toda a existência encarnada de um ser. A vida carnal sem espiritualismo não existe, não se transforma em realização para a vida eterna (espiritual).

Kardec nos ensina que o espiritualismo é o contrário do materialismo. Desta forma se o ser não vive em espiritualismo, obrigatoriamente tem que viver no materialismo, mesmo que se considere religioso.

No entanto, como vimos, quem vive no materialismo não “vive” nada, pois o fim de tudo o que é material é a “morte”, o fim. Tudo que é materialismo acaba com a morte.

A posição de doutor acaba com a morte, a de mãe e de motorista também: toda a vida material se encerra com a morte. Quando o “eu humanizado” deixa de existir, tudo que ele era, tudo que foi objetivo material se encerra.

Para que o ser possa continuar vivendo eternamente é preciso que tenha o espiritualismo, pois pela característica espiritual desse princípio de vida, tudo o que for obtido com este ideal transcenderá à encarnação.

Tudo o que o ser encarnado for espiritualmente falando nesta vida continuará existindo depois do desencarne. Tudo o que ele for materialmente encerrar-se-á com o desencarne.

É por isso que Cristo nos ensina: é necessário juntar bens no céu e não na terra. O espiritualismo é justamente isso: esta busca de juntar bens no céu, ou seja, bens espirituais.

Estes irão continuar com o ser após o desencarne. Já se ele amealha bens na terra, no desencarne todo “bem” fica aqui (na materialidade) e o ser volta ao mundo espiritual sem nada.

Esta é a importância do espiritualismo. Mas, o que é ser espiritualista? É priorizar o bem celeste em detrimento ao bem material.

Para tanto, o ser humanizado precisa compreender que ele não é quem pensa que é (o ser humano), mas compreender que ele é um espírito eterno, sem cor, sexo, raça ou qualquer outra distinção. Saber ainda que ele não conhece a Verdade Absoluta (a Realidade) das coisas e libertar-se de tudo o que acredita ser verdadeiro

Existe ainda uma outra visão que é fundamental para que o espiritualismo sirva como base para uma encarnação: acreditar que o motivo básico de estar na carne é provar a Deus que se é capaz de amá-Lo acima de todas e coisas e ao próximo como a si mesmo. Por isto Cristo nos disse que o ser humano deve empregar todo seu esforço neste sentido.

Ser espiritualista é também saber que não veio a este mundo para gozar a felicidade material. Esta felicidade é um bem material e acabará com o desencarne. Todos os seres vêm à carne para buscar a felicidade espiritual ou universal, o bem no céu.

O espiritualista é, portanto, aquele que não vive para a vida material. Ele não usa as “coisas” do mundo pela forma ou por vontade individual, mas utiliza todas como instrumento para a sua elevação espiritual.

O espiritualista não se preocupa com a vida material: se tem dinheiro ou não, se tem casa ou não, com o que vai acontecer amanhã. A única preocupação de um espiritualista é juntar bens no céu, ou seja, é estar sempre feliz (bem-aventurança), porque ele sabe que apenas esta felicidade é eterna.

Espiritualismo, espiritualista, é uma forma de viver e não uma ciência. Um conjunto de princípios utilizados durante uma existência carnal onde as coisas materiais não trazem prazer ou desprazer ao espírito, onde o mérito e o desmérito não existam.

É um estilo de vida onde os acontecimentos não importam: seja o que estiver acontecendo o espiritualista mantêm a felicidade incondicional para poder levá-la depois do desencarne.

O espiritualista não possui pessoas, porque sabe que todos são iguais, filhos do mesmo Pai; não possui coisas, porque sabe que elas são transitórias; não possui verdades porque sabe que apenas conhece a Verdade Absoluta das coisas.

É isto que é ser espiritualista e não apenas ser um religioso, um devoto, um seguidor de ensinamentos durante certos períodos do dia e viver como humano o restante do tempo.

A única definição que se têm para este termo foi dada por Kardec: espiritualista é aquele que sabe que existe nele alguma coisa a mais que a matéria. Esta definição está perfeita, mas é incompleta. De nada adianta saber-se algo mais: o fundamental é viver-se para este algo mais. Ou, como fala a definição do dicionário para o termo espiritualismo, priorizar o espiritual em detrimento da situação material.

Para se conseguir a reforma íntima, portanto, não adianta apenas ser seguidor de nenhuma religião: é preciso alterar o objetivo da vida. Aquele que vai ao templo para “pedir” prazer e satisfação material é materialista e não espiritualista, pois seus objetivos estão focados nas coisas materiais.

Ser espiritualista não é ir a igreja, mas amar ao próximo como a si mesmo. Não é ser médium ou praticar a caridade material, mas amar a Deus sobre todas as coisas.

O espiritualismo é a prática e não a teoria. Cristo não ensinou o “amor”, mas a “amar” e exemplificou este “amar” submetendo-se a acontecimentos considerados desagradáveis (traição, agressão) mantendo-se em glória com o Pai.

O Mestre não ensinou o “amor”, mas sim a prática dele. Ensinou a agir com amor, com felicidade.

É isto que não foi colocado na definição de Kardec. Espiritualista não é aquele que sabe ou conhece as coisas do espírito, mas aquele que, mesmo que não sabia as coisas do espírito, vive para gozar na vida a felicidade que Deus tem prometido aos seus filhos.

Isto é espiritualismo e quem o vivencia é espiritualista.

Hoje está em “moda” se dizer espiritualista, mas será que na hora do sofrimento (acontece o que não se quer) dos que se auto-designam desta forma não é o lado materialista que aflora (desgosto, sofrimento)? Por isto é necessária a reforma íntima, ou seja, a mudança dos pilares da vida.

É na hora que o sofrimento nasce com a contrariedade que o verdadeiro espiritualista surge.

Ele não se entrega ao sofrimento porque não possui contrariedades; não tem desprazer porque não busca a satisfação individual. Tudo isto porque o seu objetivo de vida não é a realização material, mas todo seu esforço é direcionado em elevar-se espiritualmente.

O espiritualista tem visões diferenciadas sobre as coisas do mundo. Ele não se ilude com atos materiais (ida a cultos, oração, meditação, trabalho caridoso, conhecimento dos ensinamentos) que aparentemente demonstram a sua fé, pensando que apenas estas posturas garantirão um “futuro feliz” na espiritualidade. Sabe que para alcançar o “Reino do Céu” precisará viver a vida carnal integralmente com objetivos espirituais.

Na prática do espiritualismo está a diferença entre uma encarnação proveitosa ou não para o espírito, pois apenas a mudança da essência (valor) das “coisas” (pessoas, acontecimentos e objetos) pode garantir a elevação espiritual. É preciso mudar a essência da própria vida, da existência carnal. Mudar a todas as intenções da vida.

É isto que é necessário para um espírito humanizado realizar durante a encarnação e é isto que se chama reforma íntima. Para executá-la a primeira coisa que deve ser reformada é o desejo pelos “bens materiais”.

Quando falamos em bens materiais não estamos nos reportando a objetos, pessoas ou acontecimentos, mas em utilizar estas coisas para obter a satisfação e o prazer: estes sentimentos é que são os verdadeiros bens materiais que todos os mestres ensinaram que devem ser despossuidos.

Anulado este desejo, o ser poderá, então, ser feliz com aquilo que já tem. Para o ser espiritualista as coisas “acontecem” naturalmente, no momento que têm que acontecer e não frutos de desejo.

Desta forma estará amando a Deus acima do seu desejo individual e dará ao próximo o direito de ser também satisfeito. Só no momento que este for o objetivo da vida de um ser ele poderá se autodesignar espiritualista.