O poder da felicidade

Coerção moral

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Coerção moral

87. Ninguém está certo

Uma pessoa levanta uma questão muito interessante. Diz que nos relacionamentos as pessoas buscam conselhos com outras sobre os seus problemas. Neste momento, de acordo com quem me enviou esta questão, diversas pessoas apontam soluções e saídas para resolver os problemas do grupo ou individuais.

Ainda de acordo com a questão que me é apresentada, é afirmado que quando as pessoas dão as suas opiniões, na maioria das vezes, e eu digo que é sempre, as orientações são diferentes entre si. Me relata também essa pessoa que quando isso acontece, alguns daqueles que deram o seu conselho querem impor que ele seja acolhido à custa de violência moral ou até física.

A partir disso, me é perguntado agora se existe neste mundo condições de se alcançar uma consciência única, apesar de haver divergências de opiniões. É isso que está sendo me colocado agora.

A partir do que essa pessoa escreve, acredito que esse processo esteja causando algum sofrimento, já que ela me busca no momento em que estamos falando sobre o poder da felicidade. Por isso vou tentar responder a esta questão.

Primeiro detalhe: não existe uma opinião universal. Todas as que existem são individuais, pertencem a um indivíduo.

O que estou querendo dizer? Não existe unanimidade em nada. Não importa se quatro, cinco, dez ou milhões de pessoas tenham a mesma opinião, não pode ser considerada como unânime. Ela é individual, é de cada um isoladamente.

Parece que estou chovendo no molhado, mas isso não é real. Sei que todos imaginam que não pode existir nada unânime, mas mesmo assim ainda acham que algumas posições e ideias devem ser universais, ou seja, devem ser adotadas como verdadeiras e reais por todos.

Este é o primeiro aspecto que precisamos levantar para lhe responder. Para que? Para que vocês possam parar de se considerarem certos. Mais: pararem de imaginar que exista um alguém ou algo certo, que exista um padrão lógico que pertença a todos.

O ser humano quando tem uma opinião e encontra outras pessoas que a divida começa a imaginar que ela é verdadeira, que é certa, mas não é. Acha que porque ele e outras pessoas creem na mesma coisa, o que é acreditado é verdadeiro, é real. Se respalda na comunhão de crença para afirmar que aquilo é mais do que apenas a sua opinião individual, mas algo que é verdade. Isso não é real: apenas reflete a posição de cada um.

Alguma coisa para ser real, para ser verdade absoluta, precisa ser da mesma forma para todos. Quando falo de opinião, de ideias este todo que precisa ser amplificado por todos os seres do universo, não só pelos habitantes do planeta Terra. Uma ideia para ser verdadeira, para ser real, precisa ser única para todos os seres do universo. Sendo assim, não é porque um ser humano encontra milhares que comungam da mesma ideia que ela seja certa e real, verdadeira.

Isso é muito muito importante de ser compreendido para que nós acabemos com a ideia de que o outro precisa nos ouvir, que ele precisa seguir o nosso conselho. O que aconselhamos a outras pessoas não pode ser tratado desse jeito.

O outro é uma outra individualidade, uma outra personalidade que tem o direito de pensar diferente de você. De ter verdades relativas diferentes. Mesmo que ele lhe peça ajuda, mesmo que busque o conselho, tem todo o direito de ter a sua própria verdade. Para compreender isso, não importa no que acredite, tem que ter a consciência de que não está certo.

Já falamos neste estudo sobre a questão da eleição presidencial do Brasil. O que aconteceu naquele momento se não foi exatamente o que estou falando agora. Dois grupos acreditando que suas ideias eram verdadeiras e reais tentaram impedir a quem tinha ideias verdadeiras e reais diferentes de pensar como pensavam. Cada grupo agiu dessa maneira porque achava que estava certo, que ele detinha a verdade, que o que pensava era a realidade.

Então, já que essa pessoa neste momento me proporciona a oportunidade de falar sobre dar conselhos, a primeira questão que levanto é o fato de que cada um pode orientar quem pede ajuda, mas não pode achar que por causa disso o outro é obrigado a aceitar a sua orientação e a seguir o que diz. Mas, vamos falar mais sobre o assunto de agora.

88. O amor ao próximo deve estar acima de tudo

Quem me procura agora diz que algumas pessoas querem impor física ou moralmente a obrigação de aceitar o conselho que é dado. Desculpa, mas dessa sua frase tiraria a palavra alguma. Na verdade a maioria dos seres humanos acha que você é obrigado a seguir o que eles acham certo e por isso quer impor à sua verdade ao próximo.

É a grande maioria que age assim. Eles se consideram o certo, o conselheiro do mundo, o guru iluminado que possui a resposta para todas as coisas, só que não conseguem resolver os seus próprios problemas.

Reparem que as pessoas que acham que os outros precisam atender os seus conselhos também têm problemas. Também vivem situações que não sabem lidar, mas se consideram gurus iluminados, aqueles que têm respostas para todos os problemas dos outros. Mais: sempre acham que as respostas que possuem são a verdade absoluta do assunto e que por causa disso o outro é obrigado a seguir o que eles dizem.

Isso vai acabar um dia? Vai. Quando? Quando os seres humanos se amarem verdadeiramente. Quando cada um amar o próximo acima de todas as coisas, esta forma de proceder acabará, pois estará se amando o outro acima da sua e da opinião dele.

Quando todos se amarem, os conselhos continuarão sendo dados, mas, em nome do amor, não haverá mais cobrança para que ele seja seguido. Quando todos se amarem, os seres humanos terão consciência de que apenas deram um conselho que espelha uma verdade individual e não que por ter sido procurado tornou-se o guru iluminado que deve guiar a vida do próximo.

Este é o segundo detalhe que quero abordar. Temos que aprender a colocar acima de qualquer coisa neste mundo o amor ao próximo. Quando ele existir, o guru iluminado se verá apenas como mais um ser humano que possui uma opinião individual sobre as coisas.

89. Lidando com a coerção

Mas, enquanto isso não se torna realidade, como lidar com aqueles que querem moral ou fisicamente impor suas ideias? Acabei de responder: é preciso colocar o amor acima de tudo.

Se você assume a postura de corrigir o outro, de julgá-lo porque está querendo lhe impor uma verdade, está fazendo a mesma coisa. Isso não é amor, isso não é amar.

O jeito de lidar com aqueles que querem se impor, que querem deter o poder, que querem se transformar no sábio é amá-los. Para isso, deixe que eles imaginem que estão exercendo o poder sobre você.

Não estou falando de adotar as ideias dele para que ele se sinta bem. Isso não é amar. Estou falando para não reagir.

Imaginemos que uma pessoa ao lhe dar um conselho diga que está errado, que não dever agir desta forma, mas de uma outra. Ao invés de querer provar, mostrar ao outro que ele não está certo, que está se fundamentando num ponto de vista individual para querer lhe obrigar a fazer as coisas de determinado modo, simplesmente diga: ‘você está certo’.

Estou falando em doar a razão, em deixar ele imaginar que está a detém e não necessariamente de submissão ao que lhe é aconselhado. Quando esta pessoa não mais estiver na sua frente, faça as coisas do jeito que quiser. Continue procedendo como acha que está certo, se pautando pelas suas ideias, já que o conselho do outro, para você, não resolve o seu problema.

‘Ah, isso é hipocrisia, Joaquim’, você me diria. Não, não é: isso é amor. É amor ao próximo porque está respeitando a ideia dele e amor a si mesmo, pois está respeitando também o seu ponto de vista. Por isso, por amor, você não acusa, não ataca a opinião do próximo, mas também não se torna um seguidor das ideias dele.

Esta é a forma de lidar com aqueles que através de coação moral ou até mesmo física quer impor as suas verdades e quer que as siga.

90. A individualidade grupo

Último aspecto desta questão que quero abordar: será que existe algum meio de se criar uma consciência única para um grupo. Vamos analisar esta questão.

Falei no início deste comentário que mesmo que milhares de pessoas pensem de forma igual, este ainda é um pensamento individual, ainda é o de cada um. Agora vou deixar esta questão mais clara.

Cada indivíduo do universo possui um conjunto de verdades e realidades ou conceitos que convive, que acredita. Sendo isso verdadeiro, como, então, um grupo de pessoas pode ter uma só ideia? Simples: transformando-se o grupo num indivíduo. Vou tentar explicar isso.

Todo grupo é formado por uma quantidade de individualidades que se juntam com uma finalidade e por uma afinidade. Quando essas pessoas se juntam, cria-se a figura do grupo. Esse pode ser uma única personalidade ou pode continuar existindo como um grupo de pessoas diferentes.

Acho que ainda não me fiz entender, por isso vou falar de outra forma. Digamos que você e mais cinquenta pessoas se juntem para torcer por um time de futebol. Se ao participar desta torcida achar que é a figura mais importante deste grupo e se cada um achar a mesma coisa, o que existe é um grupo de pessoas e não uma torcida. Agora, se você e os outros ao se juntarem esquecerem suas individualidades e viverem a torcida, ela virou uma individualidade.

O que estou querendo dizer é que os membros de um grupo podem ter uma verdade única desde que cada membro ao participar dele coloque as verdades do grupo a frente das suas. Um exemplo? As nossas comunidades, que são um grupo de pessoas.

Elas podem ser uma individualidade, podem ser um elemento do universo. Só que para isso aconteça, cada um dos que participam precisa abster-se de ser ele mesmo, de buscar para si, de viver as suas verdades individuais e viver toda coletividade, inclusive a si, como um só. Se essas pessoas não vivem assim, continuam sendo individualidades em grupo e não um grupo de individualidades.

Quando existem coletividades em grupo, existem atritos: jamais haverá unanimidade, pensamento único. Por isso para que um grupo possa existir com uma personalidade individual e com isso evitar os atritos, é preciso que cada um pense prioritariamente no grupo e não em si.

91. As sanghas e as opiniões individuais

Aqueles que participam das nossas sanghas vejam se o que estamos abordando aqui não está ligado a coisas que venho conversando com vocês. Se um membro destas comunidades acha que o mais importante é que as coisas aconteçam do jeito que Joaquim falou, que só seja falado ou feito aquilo que ele acha que eu falei, essa pessoa não faz parte deste grupo. É por agirem assim, ou seja, por não transformarem as comunidades numa identidade que convivem com tantos problemas.

Se a comunidade é, como já falei diversas vezes, uma oportunidade para confraternizarem e se amarem, ela só haverá quando para cada um viver isso for muito mais importante de tudo o que acha ou pensa individualmente. Quando isso se tornar o mais importante para cada membro, haverá dentro da comunidade uma unanimidade e com isso cada individualidade que a compõe vive a individualidade grupo.

Não sei se me fiz entender, mas esta é a única forma de vocês conseguirem conviver em coletividade sem haver atritos entre os membros do grupo.