Das penas e gozos futuros

Assassinato

Participante: o espírito da Verdade diz que o assassínio interrompe uma missão, pergunta 746.

746. É crime aos olhos de Deus o assassínio?

Grande crime, pois que aquele que tira a vida ao seu semelhante corta o fio de uma existência de expiação ou de missão. Aí é que está o mal.

Participante: como pode interromper se já estava programado?

Já estudamos essa pergunta. Na época fiz a seguinte pergunta: onde, nessa resposta, está falando em morte física?

Veja, precisamos entender que para o Espírito da Verdade não há vida no mesmo sentido que você conhece. Anteriormente já vimos que para esse mentor aquilo que é chamado de vida humana é uma encarnação. Esse detalhe precisa ser levado em consideração na análise da questão que você citou.

Será que o Espírito da Verdade está se falando aqui de interrupção de encarnação? Acho que não. Ele é bem claro: ‘aquele que tira a vida do seu semelhante’. Ora, se para ele não há vida o que será que quis dizer?

Como falei, não há a vida como você, humano, a concebe, mas há o estar vivo. O que é estar vivo? É estar em paz consigo mesmo e com o mundo, estar em harmonia com tudo, viver uma felicidade incondicional.

Partindo dessa interpretação, então, posso dizer que aquele que assassina é quem tira ou cria oportunidade para que o espírito perca a sua paz. Quem faz isso, responde pela sua ação emocional. Vou dar exemplo para entender o que estou falando.

Quando você participa de uma ação com raiva, como vimos hoje, essa emoção se expande pelo universo. Ela é recebida por aquele que acredita ter raiva. Essa recepção pode facilitar ao espírito ligado àquele ser humanizado perder a sua paz. Isso é um assassinato.

Então, assassino não é quem enfia uma bala em outro. Esse não é um assassino porque não acaba com vida, mas com uma encarnação. Se, como também já vimos, o fim da encarnação só acontece no momento que Deus sabia que ia acontecer e do modo que Ele conhecia previamente, o agente do ato não pode ser considerado culpado pelo que precisava ser feito.

Quem tira a paz do outro é o verdadeiro assassino. Esse tirou a vida do outro.

Agora, com relação ao entendimento que vocês humanos têm desse trecho, só posso dizer uma coisa: se ele estiver certo, jogue os ensinamentos do resto de O Livro dos Espíritos fora. Se ninguém morre antes da hora, pode alguém matar outro no momento que quiser? O assassino é mais forte que Deus? Acho que deve ser, pois segundo entendimento de vocês, faz alguém morrer antes da hora programa. Se a conclusão de vocês é verdadeira, Deus não conhece o gênero de morte antecipadamente, pois foi o assassino que determinou e não o Senhor Supremo.

Se é real o que vocês pensam, houve uma fatalidade que não foi criada antes da encarnação pela escolha do espírito. Ele criou para si uma espécie de destino, mas a vontade de quem o assassinou foi mais forte e alterou o que ele pediu. Se é verdade que alguém pode tirar a vida de outro, Deus não é a causa primaria de todas as coisas, mas apenas de um aparte dela. Sendo verdadeira a compreensão humana do tema, o espírito que praticou o ato tomou um corpo de acordo com esse mundo para fazer o que quisesse e não para cumprir a sua parte na obra da criação.

São essas incongruências que peço a vocês que pensem. Retirando apenas uma pergunta de O Livro dos Espíritos e gerando uma compreensão que não leve em consideração tudo o que já foi dito antes, estaremos colocando o que achamos e não o que foi ensinado a Kardec.

Uma obra não pode ser dúbia: não pode em um momento dizer uma coisa e em outro falar diferente. Se for, perde todo o significado, perde toda razão de existir.

Uma obra para ser considerada um guia trazido por um mestre tem que ser universal, ou seja, valer para todos de forma igual. Por isso, precisa ser totalmente válida. Outro detalhe: tem que valer para sempre, ser eterna. Se não for, ou seja, se alterar o seu conteúdo conforme o tempo, nunca foi real de verdade.

Participante: Kardec diz nessa pergunta se pensava no assassínio físico?

Não sei!

Participante: normalmente é o que dá a entender.

Não. É o que você compreende. É o que o seu ego criou para você.

Não podemos dizer nada de Kardec, pois tudo o que viveu foi entre ele consigo mesmo. É por isso que não sei de nada sobre o que Kardec pensava ou sentia. Se soubesse, estaria julgando o Codificador e, por ser cristão, não posso fazer isso.

Participante: estamos constatando que assim Kardec compreendeu.

Não sei se ele compreendeu assim. Sei o que está escrito. Mas, se ele compreendeu desse ou de outro jeito, não sei.

Compreenderam o que quis dizer quando falei das características necessárias para um livro ser verdade? Elas não valem só para o Livro dos Espíritos: vale para a Bíblia, para os suttas de Buda, etc. tudo.

Participante: precisamos sempre refletir sobre o que entramos em contato.

Essa é uma grande postura.

Quando recebemos algo novo, a primeira coisa que precisamos fazer é não nega-lo, mas também não aceitá-lo. Precisamos refletir para só depois tomar uma posição.

Acho que você nunca participou de uma palestra minha, mas no final digo sempre: esqueça tudo que falei. Sabe por quê? Porque é impossível esquecer.

O germe do assunto tratado está agora no seu ego. Mesmo que não queira, essa informação começará a ser usada por ele. Sendo assim, a partir de agora começará a perceber do que estamos falando. Mais que compreender: Deus usará essa informação em determinados acontecimentos para que você tenha confirmações.

Então, não se preocupe nem em querer entender o que está ouvindo. Apenas não rechace a informação. Diga a si mesmo: ‘ele falou isso; se é verdade ou não, não sei. Vamos esperar o tempo passar e ver’.

Vocês tem um ditado que é muito certo: só o tempo constrói. Só a sequência, a assiduidade das coisas, constrói algo. Então, fique tranquilo. Ouça e deixe esse germe, no bom sentido, germinar dentro de você.

Voltando ao assunto que estamos falando, morte, quero fazer uma pergunta: vocês acham que o espírito liberto da ação da razão humana defende a vida? Claro que não ... O espírito está doido para se livrar dessa carne, pois sabe que a sua Realidade é outra: é a do mundo espiritual.

Nenhum espírito puro defende a vida humana. Somente o que está preso ao egoísmo defende a vida humana, o eu, a identidade provisória.

Participante: para muitos espíritas Deus é morto. Como causa primaria eles entendem que Deus criou o mundo e depois deixou os homens fazerem o que quiserem.

Sim, esse é o pensamento do Deus morto. O Senhor cria e vai dormir. Nesse caso, fica tudo ao deus dará. Não, estou errado: fica tudo ao homem dará.

Participante: é como se Deus tivesse criado o mundo e dito: agora vocês se virem.

Porque Eu vou descansar. Vocês que se danem.

Se esse é Deus para você, desculpe, mas para mim nem para os mestres é.

Participante: Jesus no Sermão do Monte ensina que devemos agir aqui e agora. Depois diz que o homem sensato é o que segue esses ensinamentos. Mas, o ego humano quer ver nisso uma ficção futura, um objetivo a longo prazo quase impossível de ser alcançado. A lógica da argumentação de Jesus é transparente. Minhas perguntas são: como podemos implementar isso em uma vida? Como fazer nessa vida, nesse século? São perguntas práticas.

A questão de fazer nesse século respondi no trabalho passado: ‘como fazer o desapego ao mundo material nesse século onde existem tantas coisas? Sabendo que as coisas desse século são provas e não benefícios.

O século de hoje não é diferente do passado, apesar da multiplicidade de elementos diferentes. As provas são as mesmas: possessão, egoísmo, individualismo, etc. É a mesma coisa de outros séculos.

‘Ah, claro que é diferente. Em outros séculos podia se pegar comida nas árvores. Hoje precisamos de dinheiro para compra-la’. Ilusão. Se morar no meio do mato poderá servir-se direto do pé. Só que não quer lá, não é? Porquê? Porque não quer se desligar da internet, do celular, do computador, porque não quer se desligar da televisão.

Como se pode fazer o que é preciso nessa vida? Só há uma maneira: libertar-se do eu, negar o eu. Esse é o único modo de fazer ou como Paulo diz: viver para servir o outro.

O que é viver para servir o outro? É não usar roupa, não ter casa? Não! É despossuir as coisas. Usar tudo, mas não querer ser o dono de nada.

Você não tem uma casa; tem um instrumento de carma. Disso tem notícia pelos ensinamentos dos mestres. Apesar de já ter recebido essa informação, garanto que tranca a porta de noite com medo do ladrão, não é mesmo? Acabou de deixar de fazer, porque possuiu a casa.

Servir ao próximo é estar sempre livre do individualismo: ‘nada é meu, nada possuo, nada quero, nada sei’. Aliás, esse é o lema dos três macaquinhos que ilustram um ensinamento de Buda: não falo, não ouço e não vejo.

A única forma de realizar é através da entrega total de si para o mundo. Quando entrega esse que é hoje ao mundo, vai poder viver quem é na espiritualidade. Hoje você não consegue porque se vê como humano. Ao invés de viver sua realidade, vive a vida humana do personagem.

Quando entrega o personagem à carne, à vida humana, ou seja, vive com a consciência de que vai acontecer o que tiver que acontecer, não se perturbará com nada. Nesse momento viverá a sua espiritualidade.

Sobre o que Cristo ensinou, ele não falou que não se deve fazer nada no aqui e agora. O que disse no Sermão do Monte foi o seguinte: bem aventurado os que têm fome e sede de fazer a vontade de Deus.

Portanto, não é fazer ou deixar de fazer alguma coisa agora; é estar sempre em conexão com a vontade de Deus. É bem diferente!

Participante: gostaria de saber sobres os casos que lemos na literatura espirita de pessoas que falham, entre aspas, na sua programação feita antes da encarnação?

Você está falando em falhas em atos? Isso é impossível. Está falando em falhar por não amar durante os atos predestinados? Isso não precisa ir para a literatura para observar, porque é o que vivenciam diuturnamente.

Quando alguém briga com você, ambos estão passando por uma atividade programada. Agora, se essa pessoa está achando que está certa e você se sentindo ferida, ambos estão falhando na encarnação.

Todos nasceram para expiar. Expiar é passar pelas vicissitudes, alternâncias de situações, sem ranger de dentes. Ou seja, você veio aqui para passar por momentos onde alguém lhe elogia e por outros onde é criticado, sem reclamar, acusar, chorar, ter qualquer tipo de sofrimento.

Então, falhar na programação, no sentido de acontecimentos da vida material, impossível. Falhar na programação no sentido de vivenciar as expiações com ranger de dentes, isso é o que acontece diariamente no mundo dos encarnados.