Conversando com um espiritualista - volume I

Sair do universo

Participante: Quando criança sempre me perguntava o que haveria caso eu não quisesse mais participar do Universo. Sei que eram questões complexas para criança de 10 anos, mas ainda sim pensava nisso. Como Pai Joaquim mesmo diz, essa vida na terra é um filme. Se o que vivemos é destino e o livre arbítrio é do espirito, poderemos nós espíritos nos rebelarmos contra Deus e assim não fazer mais parte do seu universo? Se sim, seria essa a morte do espirito?

Na primeira parte de sua pergunta você me diz: quando eu era criança pensava assim. Isso não é real. Não era você que pensava, mas sim a sua mente. Isso é importante deixarmos bem claro para que não se confunda as coisas.

É importante se entender isso para que não ache que era você que queria sair do universo. Na verdade quando você era criança quem pensava assim era a mente. Mais: quem se lembrou agora deste pensamento também foi a mente.

Para que ela fez isso? Para lhe prender à ideia de que você já tem uma propensão de querer sair e que pode conseguir esta saída através da mente. Não, não há saída através da mente: ela só pode acontecer com a libertação da mente.

A saída só acontece quando você simplesmente diz: ‘é a mente que está criando e isso não é a verdade, eu não sei qual a realidade, eu não sei se quero ou se não quero’. Não adianta se prender a nenhum processo mental porque, através do mesmo processo mental que sugere que você está realizando um trabalho espiritual como o sair do universo ou da libertação da humanidade, não se encontra saída alguma. O que existe neste caso é uma provação, pois todo processo mental é uma prova.

Então, com relação a ideia que a mente lhe lembrou – porque, repito, não foi você que se lembrou, mas a mente que criou a lembrança, já que não existem outras lembranças deste tempo ou há poucas – afirmo que ela fez isso para se propor como um guia infalível para levar-lhe à elevação espiritual. Mas, como o Espírito da Verdade ensina, a razão não é um guia infalível para o ser.

Esta é a primeira parte da resposta e corresponde ao início da sua pergunta. Vamos à segunda...

Você diz: ‘Se o que vivemos é destino e o livre arbítrio é do espirito, poderemos nós espíritos nos rebelarmos contra Deus e assim não fazer mais parte do seu universo’?

Você me pergunta se o espírito pode se rebelar contra Deus e assim não fazer mais parte do universo. Para lhe responder, pergunto: se você não faz parte do universo, faz parte do que? Se só o universo existe, se só ele é real, para onde iria se saísse do universo?

Na verdade o que existe neste caso é apenas a ideia de que você pode sair do universo, mas esta não possui nenhum fundamento, pois não há lugar para se ir que não seja o próprio universo. Foi justamente por isso que lhe disse na primeira parte que esta é uma ideia gerada pela mente para lhe prender e lhe aconselhei a não seguir a razão.

Não há como sair do universo. O que há é a possibilidade de viver a ilusão como realidade e por isso achar que não está na realidade. Vou explicar isso...

Os espíritos quando estão ligados a uma mente humana acreditam que o que é criado pela mente é uma realidade. Por isso acredita que a natureza, as casas, as ruas e tudo que o cerca e com o qual convive neste mundo é real. Mas, nada disso é real, nada disso existe. O que existe onde você está vendo tudo isso é o próprio universo.

Apesar de dizer que você não pode sair do universo, afirmo que há um jeito sim de dele, mas este jeito não lhe leva a sair dele, mas a viver uma ilusão, uma ideia ilusória como realidade dentro do próprio realidade. Como? Acreditando que o que a mente cria é real. Você quando vive dessa forma continua dentro do universo, só que acha que não está. Esta é a única forma de sair do universo...

Você me pergunta mais: o espírito pode se rebelar e chegar ao ponto de viver a ilusão como realidade? Eu respondo que sim. Aliás, é o que acontece com vocês quando encarnados, pois acreditam naquilo que a sua mente cria como realidade, como real.

Aquele que vive com esta mente humana, com a personalidade humana, como se fosse esta personalidade ele mesmo e como o que ela cria como algo real, é um espírito rebelado contra Deus. Isso fica muito fácil de se ver numa passagem bíblica sobre a qual me perguntaram outro dia: os anjos caídos, a rebelião de Lúcifer.

Os anjos caídos são espíritos que imaginam que possuem o poder de Deus como descrito no livro Gênesis: ter os olhos abertos (capacidade de perceber as coisas) e por isso separar o bem do mal. Eles acham que tem este poder e por isso se rebelaram contra a causa primária de todas as coisas, contra Deus como a origem de todas as coisas.

É por causa disso que esses anjos vivem nesta carne, já que só aqui, preso a identidade humanizada, o ser vive como que imagina quer viver, que faz aquilo que quer e nada pode impedi-lo de fazer. Estes seres vivem afastados de Deus, pois estão desligados da realidade: a causa primária que faz tudo acontecer.

Sobre essa questão de estar afastado de Deus também preciso falar um pouco. Temos usado muito esta expressão e por isso pode surgir uma ideia errônea do que estou falando.

O espírito está afastado de Deus quando ele acha que o que vive é real, é realidade. Este afastamento de Deus, no entanto, não é estar afastado, estar longe de Deus. O que o espírito vive é uma ilusão, um ideia ilusória de estar afastado, mas na realidade real está próximo de Deus sempre.

Aliás, é o que eu sempre disse: na verdade a elevação espiritual não é ganhar coisas novas, mas se limpar da sujeira, de coisas velhas. O espírito que vivencia o processo que vocês chamam de elevação espiritual se limpa da ilusão que vive e que denota a sua revolta contra Deus, se liberta da sua vontade de fugir do universo, ou seja, da sua vontade de não ser alguém que é administrado pela causa primária.

Portanto, essa é a sua resposta: sim, o espírito pode se rebelar, mas ao fazer isso não sai do universo, mas vive uma realidade ilusória que o leva a imaginar que está fora do universo, mas está dentro dele. Isso quer dizer, que mesmo achando-se afastado de Deus, na realidade real o ser continua ao lado do Pai e dentro do Universo...

Mas, há uma terceira parte na sua pergunta: Se sim, seria essa a morte do espirito’? Vamos responde-la...

Não, o espírito não morre. Quando imagina-se fora do universo ele está apenas desligado da realidade real temporariamente. Espírito jamais morre, porque só para vocês algo tem que ter princípio e fim.

Se o espírito morresse ele não seria eterno e todos os mestres nos ensinaram que ele é...

Para completar a resposta só quero dizer mais uma coisa que irá embasar tudo o que disse...

No Bhagavata Puranas, é perguntado assim: a mente primária é escrava da secundária? Krishna responde que sim, que a mente primária é escrava da mente secundária. Nesta conversa, a mente secundária representa a humana e a primária o próprio espírito, o princípio inteligente... Só que a resposta de Krishna não para por aí. Ele continua: se levarmos em consideração que tanto a mente secundária como a ligação desta com a primária são ilusórias, podemos dizer que a mente primária não é escrava de nada.

Na verdade o que acontece é isso. A mente primária, o espírito, continua vivendo toda a sua realidade e está presente no Universo. Apenas ilusoriamente ele está ligado a uma ilusão que o faz sentir-se fora deste universo, fora da causa primária que é Deus. Estes são os anjos caídos, aqueles que se rebelaram contra Deus.

Por isso, como Krishna ensina: você não é escravo desta realidade. Assim sendo, pode conseguir vencer a ideia ilusória e com isso sentir-se parte de onde está realmente...