As reformas da reforma

O sofrimento por viver fora do presente

Mas, mais do que viver fora do universo, quem não está totalmente presente no momento de agora vive em sofrimento. Sofre porque está aqui e não lá onde desejava estar. É por isso que viver a realidade se constitui na primeira reforma da reforma íntima.

Como dissemos no início de nossa conversa, um ser elevado, aquele que conseguiu a elevação espiritual, é feliz. Quem não vive a realidade não consegue a elevação, pois vive o sofrimento de não estar fazendo algo diferente do que está vivendo naquele momento. O fim do sofrimento só acontece quando o ser cai na realidade e chega à conclusão que não pode alterar o universo, que não pode mudar aquilo que está vivendo.

Deixe-me dizer uma coisa: não estou falando em acomodação, mas em não sofrimento com a realidade. Se você, por exemplo, vive coisas que não gosta, tem todo o direito de querer mudá-las. Tente, se esforce, mas faça tudo isso sem se contrariar com o que está realizando em cada momento.

Se você não gosta de sua aparência, tem todo direito de tentar mudar-se. Procure todos os meios para realizar a transformação física que achar necessária para isso, mas enquanto não consegue a nova aparência, esteja em paz e feliz com a que tem. Se não gosta do seu emprego, lute para ir para outro, mas enquanto estiver neste, esteja em paz e feliz com o emprego que tem.

É isto que estou. Tem gente que não está feliz com o emprego que tem neste momento e sonha em ter outro. Até age neste sentido, mas como vive enquanto o novo não chega? Em sofrimento.

Este sofrer adicionou alguma coisa ao processo de busca de um novo lugar para trabalhar? Claro que não. Ao contrário, pode até atrapalhar, pois muitas vezes pode causar desânimo e tornar mais cansativa a busca.

O emprego que você tem agora é o universo. O emprego com que sonha não faz parte dele neste momento. Na verdade, este novo lugar de trabalho só chegará quando isso for o universo. Portanto, até que ele chegue viva em paz e harmonizado com o emprego que tem. É isso que estou falando...

Esta é, portanto, a primeira transformação. Quando o ser a realiza se transforma de humano, o ser individual, para universal, o nós. Isso porque vive no universo e não na individualidade. Mas, para isso, precisa deixar de ser humano, ou seja, precisa parar de sonhar, de gerar ilusões que não fazem parte do universo: ‘eu queria tanto aquela roupa, mas não consigo comprá-la’.

Esta é uma idéia comum entre os seres humanos. Eles sonham em ter coisas que ainda não possuem. No entanto, pergunto: o que vocês fazem quando conseguem ter o que sonham? Abandonam o que acabaram de conseguir e começam a desejar outra coisa.

Quem nunca teve um carro, sonha em possuir um. Em determinado momento o universo deste ser transforma-s em comprar um carro velho. No primeiro dia está entusiasmado com sua conquista, mas logo passa um veículo de modelo mais novo e ele critica aquele que tem. Sonha logo em trocar o carro que acabou de comprar por um mais novo...

Por que o ser humano age assim? Porque jamais deixará de condicionar a sua felicidade.

O ser humano não consegue alcançar a felicidade a não ser através da realização dos seus condicionamentos para ser feliz. Ele só sabe o que é ser feliz quando vê os seus desejos atendidos. Isso porque ele não quer ser feliz de verdade, mas sim vencer os outros.

O ser humano não quer desfrutar das coisas, mas sim conquistar. Ele pouco está se importando com as coisas que já possui, mas está sempre fixado em conquistar coisas novas para poder sentir-se famoso por ser alguém que conquista o que deseja. É por isso que assim que passa a possuir alguma coisa, ele abandona o que acabou de conseguir.

Na verdade, o ser humano precisa realizar conquistas para poder suprir o seu individualismo. ‘está vendo como eu posso, comprei o carro que quis’. Ele quer conquistar para poder ganhar o reconhecimento e o elogio de outros seres humanos. Isso, no entanto, não o faz feliz, pois esta felicidade não dura cinco minutos e precisa que uma nova conquista seja realizada para que ela exista novamente. Sendo assim, este ser vive sempre em sofrimento, na angústia de estar sempre lutando para conquistar algo.

Participante: o que o senhor falou não é felicidade, mas prazer. O fruto do desejo é o prazer.

Concordo com você, mas os seres humanos ainda chamam isso de felicidade. Na verdade a sensação momentânea que surge de uma conquista não é a felicidade, mas sim um prazer.

O que é um prazer? Uma satisfação. Ou seja, quando conquista o que anseia o ser humano se satisfaz. O prazer, portanto, surge porque ele desejou algo diferente do que tem hoje. Quando o universo se transforma em possuir o que o ser anseia ele vive o prazer, mas vocês ainda chamam este estado de espírito de felicidade.

Ele não é uma felicidade, pois acaba logo, enquanto que a felicidade real é eterna. O prazer de comprar uma roupa, por exemplo, acaba na próxima vitrine, pois lá haverá uma nova roupa que será desejada. O que foi adquirido antes fica no fundo da sacola e a roupa da nova vitrine passa a ser algo que aquela pessoa não pode viver sem. Não é assim que vocês vivem?

Repito mais uma vez: a primeira transformação é viver a realidade. Não importa o que lhe aconteça, esteja feliz. Por quê? Porque tudo que você tem é o que tem, tudo que está vivendo é o que está vivendo. Se parar e perder tempo querendo outra coisa, deixa de ser feliz com o que tem. Com isso não aproveita o que tem.