Imperfeições do ser - Textos

O poder pela força

Participante: deixar as normatizações e padrões criados pelo homem, ainda que sejam para manipular a conduta do outro e impor a sua vontade, não seria retornar à normalização da força?

É você que está dizendo que se acabarmos com as normalizações o mais forte vencerá. Será que vai mesmo? Quem pode afirmar com certeza, não é mesmo?

Esta seria a sua resposta, mas deixe-me falar de um detalhe de sua pergunta. Nela você afirma: ‘ainda que seja para manipular a conduta’. Quando fala assim, você está lançando uma condicional (pode ser que seja) que não é real. Não existe condicionalidade na criação de normas e padrões. Toda padronização e codificação tem apenas um objetivo: mudar o comportamento do outro. Mudar para o que? Para o que você acha certo.

Vou dar um exemplo. Uma moça foi levar um presente para um estrangeiro que estava hospedado no Brasil. Ele agradeceu, pegou o presente e o levou para o quarto. Passado algum tempo de reunião, a moça disse ao amigo que presenteou: ‘acho que você não gostou do presente que lhe trouxe’. Ele disse que gostou muito e perguntou por que ela estava dizendo aquilo. A moça, então, respondeu: ‘você nem o abriu’.

Esta moça para falar assim estava usando de uma norma de etiqueta do país dela que afirma que quando se recebe um presente ele deve ser aberto na frente de quem o deu. Acontece que no país do presenteado a norma diz exatamente ao contrário: só se abre o presente a sós. Ou seja, para ela o fato dele não tê-lo aberto era falta de educação enquanto que ele deixou de fazer isso justamente por que tem educação. Portanto, todas as conclusões tiradas neste relato foram baseadas nas normas e padrões de ações individuais.

O problema do uso de formas padronizadas ou de ações normatizadas para os outros é querer impor que o outro aja por seus padrões. É querer dominar o mundo através das normas que acredita serem universais. Agindo assim fazem com que a aplicação destas normas acabem com os mandamentos que Cristo deixou.

O mestre afirmou que todos os seres encarnados que buscam a elevação espiritual devem concentrar-se completamente de corpo, alma, espírito e mente em amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo. Ao invés disso, vocês se concentram inteiramente em fazer com que os outros sigam as normas que você diz que são certas e verdadeiras.

Responda-me: é amor pelo outro dizer que ele precisa fazer alguma coisa quando não quer? Vocês mesmos dizem que a expressão deste amor é dar ao outro aquilo que quer para você. Se você quer seguir a sua norma, amá-lo não seria lhe dar o direito de seguir a dele? Se você quer fazer de um jeito, a expressão do amor ensinado por Cristo, neste caso, seria deixar o outro fazer do jeito que ele quer.

O apóstolo Paulo já ensinou: a lei cria o pecado. O errado só existe quando se cria o certo. Até este momento, tanto uma quanto outra forma de agir não é certa nem errada, mas apenas a forma como cada um age.

Repare: a questão que estamos comentando é muito mais profunda do que simplesmente deixar que o próximo faça aquilo que ele quer. Trata-se de cumprir o mandamento de Cristo, que é o caminho para Deus; trata-se do aproveitamento da encarnação para que ela influencie positivamente a sua eternidade espiritual. Estamos falando de coisa que possuem uma repercussão muito maior do que o momento atual.