A lei e a fé - Carta aos romanos

O julgamento divino

Reproduzir todos os áudiosDownload
Parte 1
Parte 2
Parte 3
Parte 4
Parte 5
Parte 6
Parte 7
Parte 8

Meu amigo, você julga os outros? (Capítulo 2 – versículo 1)

Paulo agora vai nos falar sobre julgamento, mas antes de ouvir o que ele tem para dizer, vamos falar um pouco a respeito do assunto.

Para os seres humanos, o julgamento acontece apenas quando você analisa o comportamento do próximo. Mas, julgar é muito mais do que o simples ato de saber se está limpo ou sujo. Na verdade qualquer avaliação, qualquer especulação que se faça sobre qualquer coisa é um julgamento.

É assim porque o ser humanizado analisou alguma coisa. Saiba, toda análise é um julgamento, porque se trata da comparação entre o que se acha certo (se sabe) com o que está sendo percebido como feito pelo próximo.

Então, quando Paulo pergunta se você tem o hábito de julgar os outros, ele está dizendo: você tem o hábito de dar valores às coisas do mundo? Você tem o hábito de afirmar verdades sobre alguma coisa? Por exemplo, apenas dizer que uma cor é branca ou que uma linha está reta ou torta ,é um julgamento.

Qualquer análise, qualquer especulação que faça sobre qualquer elemento percebido no mundo é um julgamento.

Agora que já definimos a questão do julgar, vamos ouvir um Paulo.

Não importa quem você seja, não tem desculpa de jeito nenhum. Porque, quando julga os outros e faz as mesmas coisas que eles fazem, você está condenando a você mesmo. (Capítulo 2 - versículo 1).

Veja, não importa quem você seja - pode ser o mais sábio sobre qualquer assunto, saber tudo de algum tema – não tem o direito de julgar ninguém. Mas, por que não tem direito a isso? Porque quando você julga (analisa e gera uma avaliação) o outro está fazendo o que mesmo que ele faz.

O que o outro está fazendo? Agindo a partir do seu saber individual. Não é isso que você está fazendo? Está julgando o próximo a partir do seu saber.

Então, quando você diz ‘aquele ali está errado’, quer dizer que a ação dele, gerada a partir do saber dele, está errada. Mas, você também deveria se considerar errado, porque está fazendo a mesma coisa: agindo a partir do seu próprio saber. Na verdade, você não se considera errado porque acredita no seu saber, mas o considera desta forma porque não acredita no saber dele.

É, a questão de julgamento é muito maior do que nós sequer imaginamos.... Não se trata apenas de julgar, mas de afirmar que está certo...

 Compreenda, não existe ‘eu sei a verdade’, ‘eu sei o certo’, mas apenas compreensões individuais, que se tornam paixões, que são geradas dessa forma para que cada um possa executar o seu trabalho de reforma íntima e alcançar a elevação espiritual.

Portanto, o seu certo, não é certo, mas é aquilo que você precisa reformar dentro do seu íntimo. Como já dissemos, esta reforma não se reflete em mudanças (passar a acreditar no que não acreditava), mas, como disse Paulo anteriormente, dar a Deus a Sua própria glória: Ele sabe, eu apenas acho.

É por isso que todo mundo sabe uma verdade, um certo: aquele que é necessário para o seu próprio trabalho. Por isso não se pode afirmar que existe um ser humanizado mais burro que o outro: existe um que sabe diferente do outro.

Quando falamos em viver com o amor universal, estamos apregoando a necessidade da vivência de um dos elementos deste sentimento universal: a igualdade. A prática dela se consiste em dar o direito do próximo saber o que sabe e você ficar com o meu saber.

A igualdade – e, portanto, o amor universal – é frontalmente ferido quando um ser humanizado quer impor ao outro o seu saber (ensinar) ou quando julga (avalia) o saber do outro a partir do seu.

É isso que Paulo está nos dizendo...

Quando você diz que o outro é qualquer coisa (certo ou errado, limpo ou sujo), está fazendo o mesmo que ele, ou seja, agindo a partir do seu saber individual querendo dominar o mundo porque acredita que é o certo.

Nós sabemos que Deus é justo quando condena os que fazem essas coisas. (Capítulo 2 – versículo 2)

Por que Deus é justo quando “condena o julgamento” dos seres humanizados? Ele condena aqueles que acreditam no que acham, porque, desta forma, eles julgam Deus a partir de suas próprias verdades.

Quando o ser humanizado analisa uma situação e a avalia, está julgando o que Deus fez, já que tudo é gerado por Ele através da Causa Primária, que é emanação Dele. Além disso, para julgar, estão se utilizando de suas paixões não naturais (verdades criadas pelo ego) e não dando a Ele a sua devida glória, como Paulo ensinou anteriormente.

Sim, este texto tem vinculação com tudo o que já estudamos até agora. Não podemos nos esquecer que esta carta foi escrita de forma corrida por Paulo e que a divisão que fazemos é apenas uma maneira didática de estudá-la.

Por isso é justo o julgamento de Deus: já que o ser humanizado se sente no direito de julgá-Lo, Ele pode fazer a mesma coisa. O ser humanizado deu a Deus o direito Dele julgá-lo.

Por quê? Porque o ser humanizado se achou no direito de julgar o próximo, que é um deus emanado...

NOTA: Segundo ensinamentos estudados anteriormente no Bhagavad Gita, existem três deuses, que na verdade, são apenas um.

DEUS SER – o espírito Supremo;

DEUS EMANADO – os egos que levam ao consciente dos seres realidades ilusórias;

EMANÇÕES DE DEUS – as situações criadas a partir da Causa Primária, que são levadas ao consciente do espírito pelo ego.

Nós temos que começar a repensar a vida e fazer isso desmascarando as compreensões ilusórias que os seres humanizados têm. Quando se fala alguma coisa de alguém, não está se julgando aquele, mas o próprio Senhor do Universo, porque, como já estudamos em Krishna, a ação é inexorável, é Deus que faz. Então, na verdade, está se julgando o próprio Pai.

 Quando o ser humanizado julga alguém que está comendo de boca aberta, por exemplo, está julgando o próprio Deus que está emanando esta ação através das percepções criadas pelo ego. Mas o que o ser humanizado utiliza para gerar este julgamento? Sua sabedoria (paixão), o que se constitui na culpa da humanidade.

Parece algo bobo, não? Mas, se o ser humanizado sabe que tem que se comer com a boca fechada e julga a percepção que tem do outro estar comendo de boca aberta, está tendo uma relação imoral como aquelas que conversamos antes... Ao manter este tipo de relação não dá a Deus a Sua glória e, ainda por cima, julga que Ele não sabe o que é certo, porque faz o outro comer de boca aberta.

É isso que precisamos desmascarar em nós. Ninguém acusa o outro: na verdade todos estão acusando o próprio Deus...

Mas você, meu amigo, faz as mesmas coisas que condena nos outros! Você pensa que escapará do julgamento de Deus? Ou será que você despreza a grande bondade, a tolerância e a paciência de Deus? Você sabe muito bem que ele é bom e que quer levá-lo a se arrepender. (capítulo 2 – versículos 3 e 4).

Repare o que Paulo nos diz: Deus quer levar os seres humanizados a se arrependerem? O que é se arrepender? É constatar que tudo que faça a partir de suas paixões mundanas não está Perfeito e que a reação precisa ser mudada.

Desta forma, tudo que acontece na vida de um espírito humanizado é criado pelo Pai com intenção de que ele se arrependa da forma humana como reagiu e, daí por diante, aja de uma forma diferente, dentro do seu padrão normal de ação: com o amor universal.

Claro que estou falando de ação espiritual, sentimental, ou seja, o arrependimento se caracteriza pela consciência de que se relacionou com próximo de uma forma artificial e sinta diferente em situações semelhantes no futuro.

Mas, ao invés disso o ser humanizado faz o que todos fazem: diz que está certo e que o mundo está errado. Todos agem assim.

Deus gera os acontecimentos com a intenção de que o ser humanizado reveja seus conceitos – o que pode ser chamado de reforma íntima – mas, ao invés de fazer isso, ele reafirma imperativamente a realidade do conceito para poder dizer que está certo...

Tudo o que Deus faz é no sentido que cada um esteja constantemente revendo seus conceitos, verdades e certezas sobre as coisas do mundo e cabe ao espírito remodelar-se na vida e não esperar que Deus remodele a vida dentro dos seus padrões. Ou seja, cria a provação necessária para cada um conseguir provar a si mesmo que abra mão de suas posses e assim aproxime-se do universal.

Mas o seu coração é duro e teimoso e por isso você está aumentando ainda mais o castigo que vai sofrer no dia em que o castigo e os julgamentos justos de Deus forem revelados. (Capítulo 2 - versículo 5).

Apenas para que os mais sábios não nos acusem, troquemos o termo castigo por carma...

Cada vez que o ser humanizado julga alguém em uma situação ao invés de buscar a reforma íntima, a mudança, a reavaliação dos seus conceitos, estará aumentando o seu carma. Isto porque, neste momento, gerou um novo carma...

Participante: Isso quer dizer que o sofrimento será maior...

Não, o carma não traz necessariamente consigo o sofrimento... Na verdade é você que escolhe sofrimento para passar pela situação carmática. Na realidade o que quero dizer é que a próxima situação carmática a respeito desta paixão, será mais difícil de ser vencida...

Sabe, quanto mais você impõe verdades, mais realizar em si mesmo seus conceitos. Quanto mais disser a si que esta cor é preta, pro exemplo, mais fundo vai se fixando o conceito de que isso é certo. Por isso é que quando Deus colocar o branco dela para fora, você terá uma provação mais árdua.

Mas, não é Deus que tornou a prova mais difícil... A dificuldade não está na própria prova, mas porque anteriormente você enraizou mais profundamente aquele conceito.

É isso que precisamos compreender para poder parar de julgar Deus...

Porque ele dará de acordo com o que cada um tem feito. Dará a vida eterna aos que procuram fazer o bem e buscar a glória, a honra e a vida imortal. (Capítulo 2 – versículos 6 e 7).

Paulo diz: Ele dará o bem para aqueles que buscam a Deus. Mas, o que é buscar a Deus? É buscar a harmonia com o momento presente...

Aqueles que buscam a glória e a honra de Deus, estão sempre procurando harmonizar-se com o momento presente, independente dos conceitos gerados pelo ego. Já os que não buscam a Deus, aceitam o antagonismo ao momento presente que o gerador de ilusões cria. .

No exemplo que eu dei anteriormente (comer de boca aberta), aquele que busca se harmonizar desacredita dos conceitos gerados pelo ego e, com isso, não criticam ou criam um antagonismo naquela situação. Eles desprezam o errado criado pela personalidade humana em nome de viver a glória de Deus.

Isso é buscar é buscar a Deus: viver o que você tem com felicidade total; sem críticas e julgamentos...

De nada adianta dizer que se está buscando a Deus através de oração, de trabalhos espirituais, etc. Sem que o ser humanizado não acredite nas formações mentais (pensamentos) criados pelo ego e, com isso, harmonize-se com os acontecimentos do mundo, nunca se estará procurando realmente ao Senhor.

Mas fará cair a sua ira e o seu castigo sobre os egoístas e sobre os que rejeitam o que é justo para seguirem o que é mal. (Capítulo 2 – versículo 8).

Quem são os egoístas? Aqueles que só querem para si mesmo e por isso rejeitam o que é justo e só aceitam o que é mal. Então, o que é o mal? Aquilo que cada um quer individualmente...

Aquilo que cada um quer individualmente (atendendo a seus conceitos) é mal. Não importa qual acontecimento esteja ocorrendo, aquele que está sempre querendo levar vantagem individual, estará sempre praticando o mal, porque não ama o próximo como a si mesmo...

Deixe-me contar uma história...

Quando abordei este ensinamento em uma palestra anterior, um ser humanizado se ofendeu e disse que ele não era assim. Que na verdade estava sempre preocupado com os outros.

Pedi, então, que me desse um exemplo disso. Ele citou a preocupação que tinha e externava a outro ser pelo fato dele fumar. Disse que agia assim pelo amor que sentia àquele e que, por conta deste sentimento, não queria que o outro fumasse, pois tinha problemas no coração.

Aparentemente tal atitude parece realmente um ato amoroso, mas vamos mais em frente. Perguntei a este ser, então, qual o problema do outro fumar, mesmo tendo uma doença. Objetive a seguinte resposta: ‘ele pode morrer...’

Prossegui na minha investigação. ‘Qual o problema dele morrer? Afinal, todos vão morrer um dia, não é verdade?’ Foi então que a máscara se desfez: ‘eu vou sentir saudades se ele morrer...’

Na verdade, apesar de aparentemente conter elementos de preocupação com o outro, toda a formação mental que o ego daquele ser estava criando naquele momento fundamentava-se na preocupação consigo mesmo, no sofrimento que ele iria vivenciar... Ele não estava preocupado com a morte do outro – aliás, nunca vi ninguém sofrer pela morte dos outros, mas pela sua própria dor, pela sua saudade – mas sim em defender o seu prazer que é gerado pela satisfação de seus desejos.

Esta é uma história real que ilustra perfeitamente o que estou comentando. Mas, voltemos ao assunto...

O ser humanizado é, em essência, egoísta e, por isso, rejeita o justo (aquilo que Deus faz e que é bem para todos) e quer o mal, o que é bom só para ele. Quer que o mundo se mude para que ele seja feliz: (tenha seus desejos e paixões contentadas): isso não é ser justo; é ser maldoso.

É buscar o mal...

O mal não está em atos ou atitudes. Ele é o individualismo, é a busca da sua própria satisfação e o resto do mundo que se dane.

Haverá sofrimentos e aflições para todos os que fazem o mal, primeiro para os judeus e depois para os não judeus. (Capítulo 2 – versículo 9)

Importante: nós já definimos anteriormente que compreenderíamos o termo judeu como os cristãos e não judeus como os seguidores de outras doutrinas religiosas...

Por que Paulo diz que para os cristãos é mais pesada a pena? Porque, a quem muito foi dado, muito será cobrado.

Os cristãos têm à sua disposição todas as informações (ensinamentos) trazidas por Cristo e pelos apóstolos através do Novo Testamento. Sendo assim, quanto mais informação tiver, mais poderá ser cobrado por Deus.

Mas, a mesma coisa vale para os seguidores das outras doutrinas: eles serão julgados primeiro do que outros pelos ensinamentos que tiveram acesso...

Todos têm que transformar os ensinamentos que recebem em ação, mas não fazem isso. Por isso eles acabam merecendo mais do que os outros, que não tiveram aqueles ensinamentos. Merecendo não “castigo”, mas carma...

Mas Deus dará glória, honra e paz a todos os que fazem o bem, primeiro aos judeus e depois aos não judeus. (Capítulo 2 – versículo 10).

Do mesmo jeito, àqueles que viverem para por em prática os ensinamentos receberão mais do que aqueles que não receberam o ensinamento.

Mas, isso também é relativo: mais tarde Paulo vai falar da prática mesmo sem ter recebido o ensinamento...

Participante: Mas, se for levar ao pé da letra a necessidade da prática destes ensinamentos, isto reprovará todos os seres humanizados...

Todos, não: apenas aqueles que não os praticarem, ou seja, que não vencerem a si mesmo, que não pegarem a sua cruz e seguirem Cristo.

Participante: Mas a prática dos ensinamentos depende ainda da forma como ele é ensinado. Tenho um amigo, por exemplo, que freqüenta uma das seitas evangélicas onde é pregado que a prosperidade material é sinônimo de que Deus está aprovando a conduta daquele ser...

Mas, esta teoria não está de acordo com os ensinamentos que aqueles seres têm à sua disposição, ou seja, a própria Bíblia...

Cristo pregou a honra e a glória como bens celestes e não materiais. Por isso incitou todos os seres a buscarem essa honra e não a material...

É isso que precisamos nos ater... Cristo não veio para trazer a felicidade material, mas sim o caminho da elevação espiritual.

Agora, se alguma interpretação fere a este ensinamento, o que devemos fazer? Em quem devemos acreditar?

A partir de tudo o que já falamos, posso dizer que esta seita é parte da provação deste espírito, ou seja, é um instrumento para que os seres humanos que a seguem possam dar a honra a Deus, ao invés de manter uma paixão não natural (eu adoro a minha religião, ela está certa) com a sua seita.

Pois Deus trata a todos igualmente. (Capítulo 2 - versículo 11).

A igualdade de Deus não é formada por uma única medida, mas dar a cada um segundo as suas obras. Por isso uns receberão a glória ou a pena maior que os outros...

Os que não são judeus não têm a Lei de Moisés; eles pecam e estão perdidos sem ela. (Capítulo 2 – versículo 12).

Participante: Aqui não está embutida uma propaganda da doutrina cristã?

Não, Paulo só cita a Lei de Moisés porque está falando a judeus. Se estivesse se dirigindo aos mulçumanos, por exemplo, estaria citando a Lei de Maomé.

Aliás, nem está se referindo à própria lei mosaica. O que ele está dizendo é que os religiosos possuem os parâmetros necessários para a reforma íntima.

Já os não judeus não seriam tão culpados assim, porque não possuem estes parâmetros. Ou seja, eles pecam (caem no individualismo), mas não tem os parâmetros para conhecerem o que estão fazendo.

Os judeus têm a Lei; pecam e são julgados por ela. (Capítulo 2 – versículo 12)

Por aquilo mesmo que você usa para julgar, as leis religiosas, morais, societárias, você será julgado.

Sabe, Cristo ensina que devemos amar o próximo como a si mesmo: isto é uma lei que você, que se diz buscador procura seguir. Aí você utiliza outro código legal (neste caso dos bons costumes) e diz que pela lei é feio comer de boca aberta, está usando a própria lei para julgar.

Com isso faz aquilo que o mestre disse que não deveria ter sido feito, ou seja, quebrou um código legal, pois usou uma lei para julgar o próximo, quando o seu código de conduta diz que deve amar o próximo como a si mesmo.

Ao fazer isso cometeu duas falhas: além de apontar o erro que não existe, utilizou a lei em seu próprio benefício. Isto, aliás, é a coisa mais comum entre os seres humanizados.

A maioria dos religiosos procura interpretar a lei de tal forma que eles não percam a satisfação, o prazer. Seja qual for a lei - seja de sociedade, moral, ou religiosa – sempre busca aplicá-la em seu próprio benefício. Mas, isso não é só particularidade da vida religiosa: pratica-se o tempo inteiro.

Por exemplo, você diz que para ir a determinado lugar (por exemplo uma festa) deve estar com um determinado tipo de roupa que escolheu, mesmo que ela seja incômoda. Isso não é real: na verdade não tem que ir vestida daquele jeito, mas precisa ir para não ser criticada... Na realidade não é obrigada a ir, mas vai porque quer ser elogiada e aparecer como certa, ser aceita pela coletividade.

O ser humanizado interpreta e cria leis sempre a seu favor, mesmo que, aparentemente, isto não salte aos olhos.

Então, o hábito de usar a lei para julgar o outro constitui em duas ações individualistas: a primeira quando acreditou no seu certo e a segunda quando julgou os outros por ela.

Com isso vai se somando carmas e quando Deus dá o julgamento, o ser humanizado defende-se alegando inocência: ‘eu não fiz nada... Não bati, não agredi; só disse que ele é um idiota...’ Aí Deus pergunta “porque” e você responde: ‘porque ele não faz o que a lei manda fazer’... Esquece-se apenas que Cristo disse: “quem chamar o seu irmão de idiota estará em perigo de ir para o fogo do inferno” (Evangelho de Mateus, 5-22).

Participante: Quer dizer que não adianta ter lei?

Não é isso... A lei é um parâmetro para você realizar a sua reforma íntima. Ou, como disse Cristo: a espada que ele trouxe para que você matasse a sua humanidade...

Agora você não pode usar este mesmo ensinamento para julgar os outros, porque aí estaria descumprindo um dos princípios desta mesma lei: julgar os outros.

Porque Deus não aceita os que somente ouvem a Lei; ele aceita os que fazem o que a Lei manda. (Capítulo 2 – versículo 13)

Ou seja, Deus não aceita aqueles que somente se prendem à letra fria: isso é certo, aquilo é errado...

Veja, como é que você quer que alguém cumpra a lei se você não cumpre? Como é que quer ser amado, se não ama? Este é o ponto básico da vida para a elevação espiritual: exigir ser amado (ser atendido em seus desejos), mas não amar (submeter-se à vontade do próximo, mesmo acima de suas paixões).

Um dia eu disse para uma pessoa que ela deveria servir o próximo para elevar-se espiritualmente. Como exemplo, disse que se o marido quisesse ir ao futebol e ela à praia, que deveria acompanhá-lo e que isto deveria ser uma constante. Sabem o que ela me perguntou: ‘e quando eu vou fazer o que quero?’

Aí está o problema do ser humanizado e que caracteriza o seu egoísmo: exige receber para poder dar. É desta característica que surge a cobrança e o julgamento,

Sofre e imagina que não está recebendo do outro, mas na verdade, não recebe é de Deus... Ele não pode lhe dar não porque queira, mas como é que poderia lhe dar algo se você não gerou o merecimento de receber doando?

Os seres humanizados só buscam para si o tempo inteiro, vivem preocupados apenas em satisfazer suas próprias paixões e desejos. Como podem receber algo?

Como eles não compreendem a lei da causa e efeito que rege o Universo, na maioria das vezes utilizam a própria lei para cobrar do próximo: ‘você tem que me amar, pois está escrito na lei’. Mas, ao criticarem o próximo (dizer que ele não ama), não o amaram...

É isso que Paulo está nos ensinando... Este ensinamento é muito profundo. Eu disse antes que Paulo é muito profundo e é preciso compreender o que ele falava.

Ele dizia: você quer ser amado, ame. Ame sem esperar, sem julgar, sem exigir, sem criar valores para sentir-se amado. Ame e sinta-se amado a cada momento senão jamais você será amado...

Aliás, não só ele, mas todos aqueles que realmente compreenderam a mensagem de Cristo sempre falaram a mesma coisa...

Senhor, fazei-me um instrumento da vossa paz... Onde houver ódio que eu leve o amor, onde houver ofensa que eu leve o perdão, onde houver discórdia que eu leve a união, onde houver dúvidas que eu leve a fé, onde houver erro que eu leve a verdade; onde houver desespero que eu leve a esperança, onde houver tristeza que eu leve a alegria, onde houver trevas que eu leve a luz.

Oh mestre, faze com que eu procure mais consolar do que ser consolado, que eu procure mais compreender do que ser compreendido, amar do que ser amado, pois é dando que se recebe, é perdoando que se é perdoado e é morrendo que se nasce para a vida eterna. (Oração atribuída a São Francisco de Assis).

Tudo isso, sem críticas a ninguém...

Os não judeus não têm a Lei. Mas, quando fazem pela sua própria vontade o que a Lei manda, eles são a sua própria lei, embora não tenham a Lei de Moisés. (Capítulo 2 – versículo 14).

Como disse anteriormente, a questão de haver a lei ou não é subjetivo e Paulo falaria posteriormente dos não judeus que, mesmo não tendo a lei, a cumprisse. Vamos agora ver este tema...

Outro dia disse em uma palestra – e os que lá estavam ficaram horrorizados – e vou repetir agora: se o ser humanizado amar ao dinheiro acima de todas as coisas e ao próximo como a si mesmo, ele estará amando a Deus. Isto porque se o Senhor é tudo, Ele é o dinheiro.

O mandamento, a lei, o ensinamento, é amar incondicionalmente e sem propriedade, portanto, ame. Não importa qual o objeto desse amor, se amá-lo desta forma, estará cumprindo a lei.

Não estou falando em possuir, que é a forma normal do ser humanizado se relacionar com as outras coisas da matéria, mas sim em amar o dinheiro de uma forma incondicional, estando ele com você ou não...

Participante: Então, porque Cristo diz que eu não devo ter posses materiais?

Porque você não sabe amar a estas coisas. Na verdade, guiado pelo ego, o ser age possessivamente e egoisticamente na relação com os demais elementos do mundo - a relação pecaminosa que vimos antes...

O problema, no sentido espiritual, não são os elementos materiais, mas a forma como o ser se relaciona com qualquer coisa. Se o espírito relacionar-se com Deus, com os mestres ou mentores a partir de paixões humanas (possessivas) os objetivos da encarnação não serão alcançados do mesmo jeito.

Além do mais, Cristo não disse que o ser humanizado não pode ter coisas materiais – até por que ele tinha: o que ensinou é que o espírito não deve possuir aquilo que está sob sua guarda temporária. Disse também: não se pode desejar ter mais do que tem. Isso ele ensinou, mas não ter, não disse...

O Espírito da Verdade foi claro sobre o assunto: “É natural o desejo de possuir? Sim, mas quando o homem deseja possuir para si somente e para sua satisfação pessoal, o que há é egoísmo” (O Livro dos Espíritos – pergunta 883). Não há problema em ter, mas quando se tem e não se compartilha e, ainda por cima se quer mais, aí o egoísmo aparece e a elevação espiritual é abandonada.

Quer ver um exemplo? Você tem uma calça?

Participante: Tenho...

Quer comprar outra, não importa o motivo?

Participante: Quero...

Então, você não ama universalmente a calça que tem...

Ter uma determinada quantidade de calças não é problema: você pode ter cinqüenta ou uma. O importante é não achar-se dono dela e, por isso, esperar que ela lhe satisfaça (por exemplo esteja sempre limpa) ou querer ter outra que já não esteja sob sua guarda.

Participante: Então eu posso alcançar a Deus através de coisas materiais, como por exemplo o dinheiro?

Sim, desde que ame este elemento de uma forma universal e não possessiva. Quando isso acontecer você não desejará o do próximo e não possuirá como seu o que estiver sob sua guarda...

Se estes preceitos não estiverem preceitos não é amor, mas paixão. A paixão por qualquer elemento prende à materialidade, mas o amor universal por eles leva a Deus...

Participante: Mas, se eu amar o dinheiro não amarei o próximo, porque irei querer ter o dinheiro?

É, vocês nem sabem o que é amor... Falou em amar, logo ligam este sentimento à possessão.

Se você amar universalmente o dinheiro amará o seu e o do próximo, sem precisar tê-lo. Além disso, poderá repartir o seu sem querer mantê-lo sob sua custódia. O amor universal ao dinheiro é aquele que não precisa da posse para ocorrer; a paixão é que necessita.

Vocês confundem amor universal com posse... Veja outro exemplo...

A esposa diz que ama seu marido, mas se esse se afasta (há uma separação do casal), ela diz que o amor acabou. Isso é amor ou paixão mundana?

Paixão, pois precisa da possessão sobre o marido (estar perto) para existir. Se fosse amor verdadeiro ele continuaria existindo, mesmo que o objeto dele se afastasse...

Amar o dinheiro universalmente é amá-lo na sua ausência ou na sua presença, o que está no seu ou no bolso do outro, sem condições ou desejos... Amar a todas as situações que envolvam o dinheiro incondicionalmente...

Participante: Amar desta forma é o que vem sendo dito que é o amor que se deve ter com Deus...

Sim, e por isso disse que se pode alcançar a Deus através do amor incondicional a qualquer coisa...

O amor a Deus que Cristo ensina é a sensação de felicidade (bem-aventurança) que se sente na alegria ou na dor, na felicidade ou na tristeza, na saúde ou na doença, na riqueza ou na pobreza... Foi este mesmo sentido que eu dei acima ao amor ao dinheiro.

Levemos agora isso para o ensinamento presente de Paulo: aqueles que não têm a lei... Você, como cristão, deve buscar amar a Deus incondicionalmente, pois esta é a sua lei (ensinamento), mas aqueles que nem acreditem em Deus, se agirem com os elementos do mundo material nesta mesma incondicionalidade, terão cumprido a lei, sem nem ao menos conhecê-la.

Um ser humanizado não acredita em Deus.: qual o problema, espiritualmente falando? Se, por vontade própria, ele se harmoniza com o Universo na carência e fartura, qual o problema?

Participante: Mas e a luta para manter o dinheiro que muitos fazem?

Continuo insistindo: não estou falando em possuir ou desejar, mas em amar incondicionalmente. Aqueles que lutam para manter o dinheiro, bem como aqueles que lutam para manter o prazer individual na sua relação com Deus (pede que o Pai faça o que ele quer), não estão amando, mas seguindo suas paixões materialistas.

Participante: É que o senhor dá uns exemplos difíceis de compreender...

Para poder tirá-los da mesmice.

Sem estes exemplos vocês condenariam todos que tem dinheiro, mesmo sem saberem com que intencionalidade eles se relacionam com as coisas...

Estes exemplos são bons porque acabam com a idéia de que o externo dita o interno de cada pessoa. O que vale não é o que se tem ou faz, mas o interno de cada um (a forma como se relaciona com o ato) já que Cristo ensinou que Deus julga as intenções e não as ações.

Participante: Mas Cristo ensinou que temos que amar a Deus?

Disse isso para você que acredita em Deus, mas, e para quem não acredita, será que não há salvação? Mais: se é Deus que emana as compreensões que o ego gera, será que este ser não poderia queixar-se depois de ter sido injustiçado porque o Pai não o fez acreditar Nele?

Pense... Nada pode ser hermeticamente fechado: tudo tem um destinatário e o mesmo ensinamento não pode ser aplicado coletivamente... Olha o que falamos do julgamento no início deste trecho: “... não importa quem você seja - pode ser o mais sábio sobre qualquer assunto, saber tudo de algum tema – não tem o direito de julgar ninguém. Mas, por que não tem direito a isso? Porque quando você julga (analisa e gera uma avaliação) o outro está fazendo o que mesmo que ele faz”.

Como disse antes, Deus cria as verdades de cada um de acordo com sua provação. Se uma pessoa não acredita em Deus, eis aí uma compreensão, uma prova. A vitória nesta prova não é passar a acreditar, mas, mesmo fustigado por esta razão, viver incondicionalmente.

Para isso não precisa nem aprender os ensinamentos dos mestres: a lógica material serve.

Dinheiro foi feito para ser gasto, para gerar conforto, saúde, segurança: é isso que diz a lógica material. Quem segui-la, ou seja, despossuir a necessidade de manter o dinheiro sempre consigo, estará realizando a elevação espiritual.

A vida é cheia de altos e baixos; um dia se está por cima no outro por baixo. Compreendendo mais esta máxima material e vivendo-a com intensidade, saberá se trabalhar no momento que não tem dinheiro para tê-lo depois. Com isso eliminou o desejo e fez a elevação espiritual...

Agora disso tudo que disse retire a palavra dinheiro e coloque Deus... Não chegamos a todos os ensinamentos de Cristo sobre a forma de nos relacionar com o Pai?

Mas, os seres humanizados não aceitam o que estou dizendo porque partem da sua verdade para impor “certos”: “Cristo disse que tinha que amar a Deus, então nada substitui isso”. Ora, você está julgando o mundo, o certo e o errado, a partir de suas convicções e, por isso,não consegue entender o que estou dizendo.

O que eu e Paulo estamos querendo dizer é que ninguém está perdido... Não importa se o ser humanizado é religioso ou não e nem que doutrina siga: se realizar o trabalho necessário, conseguirá a elevação espiritual. Mas, vocês não compreendem isso porque se fixam na letra fira do ensinamento do mestre...

A questão entre o que eu estou falando (elevar-se através do amor ao dinheiro) e o que vocês estão dando como certo, é semântica: só uma troca de nomes. Na verdade eu mantive a essência do ensinamento e troquei o nome justamente para mostrar que estão apegados à letra fria dos ensinamentos.

Quer outra aplicação para isto que estou falando? A consciência que existe em alguns egos que os índios são selvagens e não podem elevar-se espiritualmente porque não possuem contato com os ensinamentos do homem branco. Estas verdades geraram, por exemplo, a necessidade da catequização. Mas quem disse isso, quem disse que é necessário que os silvícolas tenham que se adquirir a cultura do branco para poder se elevar?

Se o índio – que, aliás, tem muito mais chance do que o branco de se elevar por possuir menos conceitos sobre as coisas – vivenciar os ensinamentos de Cristo, mesmo que nunca tenha ouvido falar deste mestre, ele ascenderá ao reino do céu.

Isto se aplica à idéia que os cristãos fazem dos mulçumanos, dos hindus e dos próprios integrantes das seitas cristãs diferentes, como as desavenças entre católicos e protestantes. Se estes seres conseguirem vivenciar os acontecimentos de sua vida dentro da incondicionalidade – o que aliás é ensinamento todos os mestres e não só de Cristo – estarão amando a Deus e é isso que importa.

É isso que Paulo está dizendo: não precisa ser judeu para ser salvo... Não precisa ser cristão, religioso e nem mesmo acreditar em Deus para alcançar a elevação espiritual.

Na hora que os seres humanizados compreenderem esta realidade poderão aprender a conviver harmonicamente com o mundo em que vivem. O problema é que se apegam a letra fria de leis, que, aliás, são meras interpretações que eles mesmos fazem e com isso não conseguem viver bem nem com os outros nem com Deus.

Eles mostram, pela sua maneira de agir, que têm a Lei escrita nos seus corações. A própria consciência deles prova que isso é verdade, pois os seus pensamentos às vezes os acusam e às vezes os defendem. E assim será, de acordo com o Evangelho que eu anuncio, naquele dia em que Deus, por meio de Cristo Jesus, julgará os pensamentos secretos de todos. (Capítulo 2 - versículos 15 e 16).

Dois assuntos a serem destacados neste trecho. O primeiro: “e assim será de acordo com o Evangelho que anuncio”.

Como já disse, Paulo não foi apóstolo de Cristo durante a existência carnal do mestre. Ele recebeu os ensinamentos e percebeu a santidade divina de Cristo diretamente em espírito, durante o período que ficou cego depois do acidente da estrada de Damasco. Por isso posso dizer que sua percepção sobre o mestre e sua compreensão sobre os ensinamentos foi muito mais profunda do que qualquer outro apóstolo.

Mesmo assim, Paulo não chega à raia do fanatismo, da idolatria a Cristo. O Evangelho, ou caminho para elevação espiritual que ele prega, necessariamente não inclui a idolatria ao Filho de Deus.

O que prega, como ele mesmo disse anteriormente, é que os não judeus, apesar de não conhecerem a lei nem a santidade divina de Cristo, também podem alcançar o objetivo da encarnação: aproximar-se de Deus. Para isso, não precisam idolatrar a Cristo.

Isto é muito importante para os seres humanizados, porque na verdade eles se preocupam em idolatrar a apenas um mestre, dizendo que apenas ele é real e, com isso, criam paixões mundanas (gostar) que não os deixam alcançarem a Deus.

Quem idolatra um mestre não chega a Deus. Isto porque esta idolatria é fomentada por uma paixão gerada pelo ego. O Universo é uno, vive em unicidade, por isso não se pode distinguir um bom ou melhor do que o outro.

Todos os mestres são enviados de Deus e ensinaram a amá-Lo acima de todas as coisas. Nenhum deles pediu idolatria a si mesmo, mas ensinou que é preciso alcançá-Lo para se conseguir a bem-aventurança.

Paulo era cristão, ou seja, reconhecia Cristo como mestre, mas não o Cristo homem nem o próprio espírito: para ele o mestre é o ensinamento (caminho) trazido por ordem de Deus. Esta constatação fica bem clara logo no início desta carta: por meio dele (Cristo), Deus me deu a honra de ser apóstolo...

O apóstolo servia a Deus através de Cristo e não ao próprio mestre.

Segundo assunto do texto: “Deus, por meio de Cristo Jesus, julgará os pensamentos secretos de todos”.

Paulo está nos ensinando que a consciência (conjunto de valores do ego) do ser humanizado é que ditará se houve ou não elevação espiritual e não o fervor demonstrado nas práticas religiosas. Aquilo que o espírito encarnado acredita que é real é que servirá de base para avaliação de Deus.

Não é o que ele fez, mas aquilo que tem como verdades dentro de si. De nada adianta, por exemplo, dar comida para os pobres criticando o governo. Quem age assim, apesar de aparentemente estar parecendo pio, na verdade não o é, pois deixou de amar alguém (a autoridade que ele considera como responsável pela fome).

Deus julgará cada um através da sua própria consciência, dos seus valores: se eles refletirem o amor incondicional a tudo e todos, o ser terá realizado a reforma íntima; mas se ainda houver críticas ou julgamento fomentados por verdades individualistas (“eu sei, eu gosto, é meu”), nada terá sido alcançado, mesmo que os atos daquela existência tenham sido considerados como caritativos. Mais nada do que isso.

Portanto, não pensem em amealhar bens no céu com atos, mas lutem para resguardar a sua consciência do individualismo, porque será isso que Deus irá julgar...