Conversando com um espiritualista - volume II

O ego e as escolhas racionais

Participante: há muitas questões em O Livro dos Espíritos que eu ainda considero conflitantes com as ideias da doutrina que nos ensinastes. Embora já tenha aceitado pelo coração as novas ideias, ainda é incômodo conciliar totalmente o ecumenismo com a Doutrina Espírita. Aí vai uma: na pergunta 75a se diz que a razão dá ao homem o livre arbítrio, ou seja, o homem pode fazer escolhas racionais. Nesse caso, onde cabe a função do ego?

“75. É acertado dizer-se que as faculdades intelectuais instintivas diminuem à medida que crescem as intelectuais? Não; o instinto existe sempre, mas o homem o despreza. O instinto também pode conduzir ao bem. Ele quase sempre nos guia e algumas vezes com mais segurança do que a razão. Nunca se transvia”.

“75a. Por que nem sempre é guia infalível a razão? Seria infalível, se não fosse falseada pela má educação, pelo orgulho e pelo egoísmo. O instinto não raciocina; a razão permite a escolha e dá ao homem o livre arbítrio”.

Essa pergunta é interessante...

Há um detalhe que quero lhe mostrar e peço que preste atenção nele, pois é aplicado a O Livro dos Espíritos como um todo. Neste livro por inteiro Kardec utiliza diversos nomes para nomear algumas coisas. Hora ele fala em espírito com ‘e’ minúsculo e em outras com maiúsculo, fala em ser humano e em homem. Vocês podem até imaginar que está sendo falado sobre a mesma coisa, mas isso não é real.

Se o codificador distingue as coisas, elas não podem ser as mesmas. Existe, portanto, um espírito, que ele distingue com ‘e’ minúsculo, outro que aborda com ‘e’ maiúsculo, existe o homem e o ser humano, como elementos distintos na abordagem de O Livro dos Espírito.

Por isso posso dizer que para O Livro dos Espíritos o espírito não é o ser humano. Se estes dois elementos fossem a mesma coisa na visão de Kardec, ele não precisaria distinguir um do outro.

Sendo assim, nesta pergunta quando é dito que um homem raciocina, não é dito que o espírito raciocina, mas sim o homem. É a partir desse aspecto que vou lhe responder sobre a função do ego.

Onde está o ego? No homem. O ego é o homem, é a personalidade humana que o espírito se liga para viver uma encarnação.

Outra questão: O ego raciocina? Para responder a esta questão tenho que lhe perguntar: o que é um raciocínio? Raciocinar é avaliar diversas possibilidades e diversos aspectos de um assunto para chegar a uma conclusão. O ego não faz isso? Faz...

Então, a resposta do Espírito da Verdade está perfeita e em nada se contradiz ao que ensinamos: o homem, que é o ego, raciocina, possui uma razão. Só que para poder descobrir a semelhança entre o que ensinamos e o que está na resposta de O Livro dos Espírito há mais um aspecto que você precisa se atentar.

Na resposta não é dito que o ego raciocina por conta própria, mas apenas que ele raciocina. Portanto, esse raciocínio, por conta do que já foi mostrado na pergunta 1 deste mesmo livro, se submete à Causa Primária de todas as coisas. Não é isso que ensinamos?

Então, não vejo desacordo nenhum entre o que está nesta resposta e o que ensinamos. O ego é o homem; o homem raciocina, mas não livremente, mas sim por conta da Causa Primária. Só que preocupado com estes detalhes, você não se atentou ao mais importante desta questão: o que o Espírito da Verdade fala à respeito da razão...

Quando a mente vive o raciocinar gerado pela Causa Primária, o que ela cria é fundamentado na má educação, ou seja, em conceitos humanos, no egoísmo, ou seja, pensado a partir do eu e para que o eu ganhe, e no orgulho, ou seja, na ideia de se considerar melhor do que todos. Sei que você não se atentou neste detalhe, mas mais uma vez aí há a similitude entre o que eu falo e o que foi ensinado pelo Espírito da Verdade.

Dito tudo isso, só queria lhe fazer mais uma pergunta: quem foi que entendeu a minha resposta? Foi você ou o ego? Se me disser que foi o ego, eu lhe digo: cuidado! Ele ao concluir alguma coisa foi mal educado, orgulhoso e egoísta. Por isso não acredite nas conclusões que ele chegou ao ouvir a minha explicação...

Lembre-se: a razão não é guia infalível...