Conversando com um espiritualista - volume II

A luta obsessiva da mente pela vitória

Participante: gostaria de fazer uma pergunta e alguns comentários a respeito do que Joaquim disse ao Jefferson no tangente a amar o próximo em uma das entrevistas. Em uma das entrevistas Pai Joaquim dá o seguinte exemplo ao Jefferson. ‘você marcou com o Firmino de vir até Rio das Pedras pra fazer a entrevista e quando chegou o Firmino não estava lá. Então, amar o próximo é você respeitar o direito dele fazer isso e não se contrariar com isso. Você pega o ônibus, volta para Piracicaba e depois remarca um novo dia’.

Me desculpem, mas não posso concordar com isso. Há regras para se viver em sociedade. Mesmo num caso de doença ou de morte e com a tecnologia que há hoje, o Firmino poderia muito bem ligar ao Jefferson dizendo que não estaria presente no dia da entrevista.

Então, quer dizer que o Jefferson se desloca, gasta dinheiro, perde tempo e simplesmente ao chegar lá dá com a cara na porta fechada e volta para casa todo alegre? Vou lhes contar o que recentemente aconteceu comigo e que é bem parecido com isso aí.

Eu estava comprando um imóvel e no dia combinado de irmos ao cartório a proprietária do imóvel simplesmente ligou para o cara do cartório, com apenas duas horas de antecedência, avisando que não iria, pois não poderia faltar no trabalho. Acontece que horas antes, à noite, eu tinha transferido o dinheiro da poupança para a conta corrente. No mesmo dia fui ao banco e fiz o cheque administrativo que ela pediu. Quando estava saindo do banco, para minha surpresa, meu pai ligou avisando que ela não compareceria ao cartório. O resultado foi que perdi o rendimento da poupança mais as taxas que paguei do cheque administrativo, mais as taxas para tirar certidões sobre o imóvel, mais a gasolina que gastei indo atrás de tudo e mais o tempo que perdi.

Reparem que ela poderia ter ligado no dia anterior e me avisado que não poderia comparecer ao cartório e marcado outro dia. Mas ela pensou: ‘ah!, hoje não vou lá não. Depois marco outro dia com ele’.

Então, com todo respeito que tenho a Pai Joaquim, acho que isso se trata de mau-caráter, tanto no exemplo hipotético dado por Pai Joaquim quanto no exemplo real que aconteceu comigo. Vou argumentar agora porque não concordo com Pai Joaquim e acredito que a tese defendida por ele carece de fundamento.

Amar ao próximo como a si mesmo. Logo se estou submetido aos caprichos de uma pessoa que não respeita compromissos, que brinca com você, que nem te conhece direito e faz você perder dinheiro e se fico mal com isso, logo não me amo. Como, então, poderei amar o próximo? Essa é uma pergunta que faço ao Pai Joaquim?

Ainda que Joaquim argumente que tudo o que aconteceu foi uma prova para mim, isto significa que tenho apenas que dirimir a raiva que está dentro de mim. Veja, o problema não é meu em relação a ela. O problema passa a ser meu apenas, pois sou eu lutando contra a raiva que está dentro de mim. Portanto não se trata de amar o outro, mas de fazer tudo isso sem se contrariar, como recomenda Pai Joaquim. Trata-se de amar a mim mesmo: ou continuo submetido aos caprichos e vontades dessas pessoas ou apenas sigo o meu caminho e deixo que a pessoa siga o dela.

E foi o que fiz. Desfiz o negócio porque estava num estado de estresse. Com isso resolvi o meu problema: tirei a raiva de dentro de mim. Então, amei a mim mesmo e em consequência amei o próximo, pois não estou com raiva dela.

Então, com todo respeito, a tese de Pai Joaquim carece de fundamento, como demonstrei aqui.

Não me surpreende que você não compactue comigo. Porque? Porque você é humano e eu não sou. Apesar de ligado a um ego humano, eu não vivo humanamente falando. Por isso jamais imaginaria que você, sem uma análise da questão, compreendesse o que tentei passar ao longo dos anos. Portanto, se me permite, vou lhe explicar minha visão do assunto.

Como já dissemos diversas vezes, a mente humana quer obter vitórias. A mente humana jamais raciocina sem ter como fundamento a intenção de uma vitória.

É por isso que ela, não importa no que esteja acontecendo, sempre torce pelo pobre coitado, pelo coitadinho, pelo injustiçado. Faz isso porque ela quer fazer o injustiçado, dentro da visão humana, ganhar a qualquer custo. Ao transformá-lo num coitadinho, a mente humana cria a ideia de que ele ganhou, apesar de ter perdido. É por isso que vocês torcem sempre por aquele que tem pouca chance de ganhar...

Você fez um discurso lindo, humanamente falando. No entanto, espiritualmente falando ele é fraco, é falho. Aliás, até materialmente falando ele é fraco, pois contém possíveis falhas. Vamos ver isso...

Por exemplo, você fala que o Firmino deveria ter telefonado ou usado os recursos disponíveis hoje em dia para avisar o outro. O que a sua mente não investiga é se ele tinha esses recursos naquele momento. Será que o telefone dele estava funcionando? Será que a internet dele estava funcionando? Será que ele tinha o número do telefone do outro para poder ligar e avisar que não poderia estar presente?

Veja, em momento algum você se preocupou em averiguar se estava fazendo uma denúncia com base ou não. É assim que a mente humana age: ela jamais analisará os fatos de forma ampla. Ela jamais investigará o assunto em profundidade querendo saber se havia uma motivação por parte de quem supostamente errou. O que ela faz é apenas gerar ideias que sirvam para acusar o outro e assim lhe dar a vitória sobre ele.

A mente humana não se preocupa com a verdadeira justiça, mas sim em dar vitória a alguém. Por isso, ela não se preocupa, nos seus raciocínios, em aprofundar-se nos assuntos da vida, mas funciona na superficialidade levando em conta apenas o que interessa para que a vitória se concretize.

Voltando à questão do espiritualmente falho na sua observação, digo que você esqueceu de uma coisa da mais alta importância. Se esqueceu de amar ao próximo como a si mesmo. Só isso que você esqueceu. Desculpe, não é só isso. Você também esqueceu de amar a Deus sobre todas as coisas. Se tivesse se preocupado com essas coisas, poderia por força desse amor ter superado tudo o que a mente gerou naquele momento.

Além disso, ainda pelo lado espiritual da questão, posso dizer que a sua análise dos acontecimentos feriram os ensinamentos dos mestres. Digo isso porque você se preocupou em amealhar bens na Terra e não no céu.

Durante o relato que está na sua pergunta, você só se ligou no prejuízo de quem veio e não encontrou a pessoa. Você só se preocupou com o fato de alguém ter perdido tempo, dinheiro, esforço. Se preocupou com o fato de alguém possa ter se deslocado ou feito algumas atitudes e não ter conseguido realizar o que pretendia. Você jamais se preocupou com a questão espiritual do acontecimento.

Você jamais se preocupou – e o você que estou falando é a sua mente e não você – com a sua função espiritual naquele momento. Você em nenhum momento se ligou ao fato de ser um espírito encarnado e estar vivendo uma vicissitude que lhe serve de provação. Também não viveu em momento algum a ideia de que quem agiu diferente do que você esperava era um espírito que tomou um corpo para aqui contribuir, sob as ordens de Deus, para a obra geral.

Esse é o grande problema. Esperar que a mente vá apelar para o lado espiritual durante os acontecimentos da vida humana é abrir mão da sua oportunidade de elevação espiritual. Esperar que a mente vá lhe lembrar dos compromissos espirituais assumidos antes da encarnação é perder a oportunidade que você está tendo de aproximar-se de Deus. É por isso que venho falando há anos a respeito do aceite ao que a mente fala.

Repare, como eu já lhe disse nessa resposta, que a sua mente humana está presa somente a coisas materiais. Ela só analisa as questões pelo lado material. Ela só está preocupada com as coisas materiais. Em momento algum ela se preocupou com a convivência harmônica, a paz e a felicidade comum durante os acontecimentos que você narrou. Com isso ela não se preocupa.

Ela se ocupa em criar uma acusação ao outro. Para isso, ela justifica: ‘eu não faria isso’. Será?

Quantas vezes você já não fez igual? Quantas vezes você se esqueceu de um compromisso e deixou pessoas lhe esperando? Ou será que você nunca fez isso? ‘Ah, mas eu tinha motivos’, você me responderia. Mas, será que nos seus exemplos quem faltou ao compromisso não tinha seus motivos também?

Você sabe se aconteceu algo extremamente grave com as pessoas que faltaram aos seus compromissos? Sabe se elas estavam vivendo um momento onde não se pensa em outra coisa a não ser resolver o problema que apareceu? Não, a mente não se preocupa com essas questões, a não ser que elas o faça ganhar. Por isso é que ela diz que você tinha motivos para faltar, quando faltou, mas não dá a mesma dúvida a quem não cumpriu o compromisso com você. É isso que estou querendo lhe mostrar.

Saiba de uma coisa: apesar de falar desse jeito, tenha a certeza que não estou brigando com você. Não estou lhe acusando de nada, nem defendendo ninguém. O que estou fazendo é lhe mostrando o funcionamento da mente.

Só estou querendo lhe mostrar que todo esse raciocínio desenvolvido pela sua mente nada mais foi do que uma jogada. Sim, ela jogou com a verdade, jogou com a compreensão sobre os acontecimentos sem analisar todas as possibilidades. Ela funcionou como num tribunal de exceção, ou seja, sem dar a menor possibilidade de defesa a quem está acusando. Fez tudo isso só para poder lhe dar a sensação de vitória. Isso você não percebeu....

Esse é o grande problema. Isso é o que vocês precisam estar muito atento, pois essa questão, para você, espírito, é uma questão de vida ou morte. Em todo momento que a sua mente funciona, ou você vive, ou seja, consegue superar tudo que a mente criou – está vivo neste caso porque está próximo de Deus – ou se afasta Dele, o que para nós espíritos é a morte.

Portanto, se a sua mente interpretar essas palavras como se eu estivesse brigando com você, por favor, não acredite nisso. Na verdade é com todo amor que estou lhe respondendo. O meu único objetivo com essa resposta é lhe ajudar a aproveitar a oportunidade de estar encarnado.

Que a paz esteja com você...