O evangelho segundo Tomé

Logia 69b - Busca espiritual

“069b. Felizes os que têm fome, porque o seu ventre será preenchido com o que desejam”.

“Felizes os que têm fome”

Na logia 68 Jesus nos falou como alcançar a felicidade universal nos atos físicos e na logia 69 como alcançá-la nos atos espirituais. Nas duas logias, entretanto, sempre se referiu a atos praticados pelos outros.

Neste ensinamento, o Mestre nos fala como alcançar este mesmo sentimento em acontecimentos que não possuem um causador aparente. Nas duas logias anteriores Jesus nos ensinou a reagir aos atos praticados por outros, mas nesta ele nos ensina como reagir conosco mesmos.

A carência de nutrientes materiais (fome) é um destes acontecimentos. Aparentemente não existe um “causador” para a situação de penúria que leva um ser humano a passar fome. Entretanto, não existe efeito sem causa. Por isto, a fome tem que ser causada por alguém ou por alguma coisa ou situação.

O ser humano, aquele que não reconhece Deus como a Causa Primária das coisas, busca outras origens para o seu estado. Acusa o governo pela situação econômica, aquele que lhe tirou as posses, a sociedade que não é caridosa, uma fatalidade, o destino, etc. Muitas são as origens, mas todas elas são “materiais”.

Quando aprendemos que Deus é a Causa Primária das coisas, temos que entender que não cai uma folha de uma árvore sem que Ele faça cair. Desta forma, a fome, como todas as situações da vida, é causada por Ele.

Deus não faz qualquer um passar fome, pois é Justo e Amoroso. Assim, só passa fome quem precisa e merece desta situação para alcançar a sua evolução espiritual. Todas as situações da vida são provas que visam a melhoria espiritual.

Deus não faz isso porque quer ou escolhe determinado espírito para passar por uma ou outra situação, mas dá a cada um o que precisa e merece. As situações de uma vida são geradas por Deus, mas seguem o “destino” traçado e pedido pelo próprio espírito antes da encarnação.

“A fatalidade não existe senão pela escolha que fez o espírito, em se encarnado, de suportar tal ou tal prova. Escolhendo, ele faz uma espécie de destino que é a conseqüência mesma da posição em que se encontra”. (Livro dos Espíritos – perg. 851)

Cabe ao espírito a escolha moral de como suportar tal prova, ou seja, passar pela fome utilizando a felicidade (entendendo a sua finalidade) ou de acusá-la de ser fruto de uma maldade alheia. Nos dois casos, porém, ele terá que passar pela fome, pois isto é o melhor para ele. Vencer a prova é reagir com amor universal à fome.

“porque o seu ventre será preenchido com o que desejam”

Não estamos aqui pregando a inércia na vida material. A lei de Deus afirma que todos devem trabalhar para merecer receber algo em troca. O trabalho é “uma expiação e, ao mesmo tempo, um meio de aperfeiçoar sua inteligência” (Livro dos Espíritos – Perg. 676).

Nota: Como inteligência na citação de Kardec entenda-se o próprio espírito.

Sendo assim, o ser humano que se encontra em situação de penúria precisa trabalhar para ganhar o seu sustento. No entanto, este trabalho não é apenas material.

“675 – Não se deve entender pelo trabalho senão as ocupações materiais?”

“Não. O espírito trabalha como o corpo. Toda ocupação útil é um trabalho”. (Livro dos Espíritos)

 Existe, portanto, um “trabalho físico” e outro “espiritual” em cada atividade da vida humana. Por isto muitas vezes o ser humano está empregado, mas passa por situações de necessidades (fome). Não é apenas o trabalho físico que determina a situação da vida do ser humano, mas, principalmente, o trabalho espiritual que realiza.

O trabalho espiritual é sempre reagir com amor universal aos acontecimentos da vida material. Aquele que sofre porque está com fome não realiza este trabalho espiritual e por isto não recebe o alimento, mesmo que exerça trabalhos físicos.

Para que Deus forneça o alimento na vida de cada um é preciso que o espírito passe pela fome com felicidade universal entendendo que aquela situação é perfeita, pois será ela que o levará a elevar-se. Deus não satisfaz os desejos humanos (alimento), mas dá a cada um o necessário para que evolua.

Enquanto o espírito não compreender esta verdade universal e sofrer acusando o “mundo” de injusto, não receberá o seu alimento. Aquele que conseguir executar o seu trabalho espiritual, receberá de Deus o alimento material, pois terá vencido sua prova e não mais necessitará daquela situação.

Além do trabalho espiritual, o ser humano precisa do trabalho material. Portanto, não adianta ao espírito ficar sentado chorando de fome: precisa buscá-lo. A humildade de pedir esmolas para aqueles que não têm atributos que possam gerar outra forma de trabalho é uma vitória para o espírito.

São os dois trabalhos (espiritual e material) conjugados que podem dar ao espírito o fim da sua prova. De nada adianta apenas um deles. Não procurar ajuda não garante o fim da prova. Jesus nos ensinou que o espírito precisa pedir para receber, bater para que a porta se abra.

O trabalho material, no entanto, muitas vezes não é na “forma” que o espírito deseja. Existem muitos que por soberba e altivez passam fome, mas não procuram trabalhos considerados por ele como inferiores à sua capacidade ou não aceitam o auxílio dos outros. Para que a prova seja vencida em toda a sua totalidade, o espírito precisa ser feliz sempre, não importando as condições existentes.