O evangelho segundo Tomé

Logia 57 - O joio e o trigo

“057. Disse Jesus: o Reino do Pai é como o homem que tem boa semente. Seu inimigo vem à noite, semeia o joio no meio da boa semente. O homem não permite que seus servos arranquem o joio. E diz-lhes: isto, para que não suceda que ao arrancar o joio venha também o trigo. No dia, porém, da colheita, o joio aparecerá, será arrancado e queimado”.

O joio e o trigo

“Joio:Erva tóxica, que medra no meio do trigo” (Mini Dicionário Aurélio – 3a Edição)

O joio é uma erva daninha que não serve como alimentação para os seres vivos. A ingestão deste vegetal pode causar problemas à saúde. No entanto, ele é muito parecido com o trigo, que é um alimento saudável, durante o processo de desenvolvimento das duas plantas.

A utilização destas duas figuras por Jesus neste ensinamento muito conhecido, pois também está nos evangelhos canônicos, busca simbolizar aquilo que faz “bem” ao espírito ou não, aquilo que deve ser utilizado como “alimentação” ou não.

Como alimentação não devemos entender apenas a alimentação material, pois Jesus não ensinou ninguém a viver como ser humano. Sua busca sempre foi, como estamos vendo nesta obra, passar todos os ensinamentos para que nos mantivéssemos “vivos”, ou seja, dentro do mundo de Deus. Estar “vivo” é participar da felicidade universal (ver logia 01).

Portanto, neste ensinamento devemos entender como trigo tudo aquilo que auxilie o espírito a atingir esta felicidade e como joio, aquilo que pode causar sofrimentos (tristeza, mágoa, angústia).

“o homem que tem boa semente”

Todo espírito nasce puro e ignorante, nos ensinou a espiritualidade através de Kardec, ou seja, possui “boa semente” (puro), mas não possui o conhecimento das coisas universais (ignorante).

Desta forma, podemos entender que a “evolução espiritual” é obter o conhecimento das coisas universais, mantendo a pureza.

“Seu inimigo vem à noite, semeia o joio no meio da boa semente”

 Para entender e alcançar este conhecimento, o espírito necessita estudar. Isto ele faz durante a sua vida em matéria menos densa que a carnal, ou seja, no “mundo espiritual”, como informado na literatura pós Kardec.

Porém, todo estudante tem que passar por verificações de conhecimentos (provas). Estas provas devem ser executadas sem consulta aos livros. É por este motivo que o espírito vem à matéria carnal: fazer provas de conhecimentos sem alterar a sua pureza (Quarta e Quinta Verdades Universais).

O chamado “véu do esquecimento”, ou seja, a não utilização da memória das coisas espirituais durante a vida carnal, é exatamente para que o espírito possa executar estas provas sem consultar suas “anotações” durante as aulas. É por causa desta ausência de visão das coisas que Jesus chama de “noite” a vida material neste ensinamento.

Durante a vida o “inimigo” buscará semear entre os ensinamentos que alimentam o espírito mantendo-o na felicidade, outros que se pareçam com estes, mas que tragam sofrimentos, ou seja, acontecimentos da vida carnal que não satisfazem os conceitos de um ser humano. Para ser “inimigo” de um ser humano é necessário que se contraponha aos seus desejos, não fazendo as coisas da forma e do jeito que ele quer.

Assim, no ensinamento Jesus está dizendo: durante a vida carnal aparecerão pessoas que se irão se contrapor às suas verdades.

“O homem não permite que seus servos arranquem o joio”

Através dos relacionamentos da vida social o espírito auxilia Deus na Sua obra, temperando (sal) a vida dos outros. Deus comanda todos os atos de um ser humano para que eles sirvam de transmissão de ensinamentos para ele mesmo e para os outros. Todos os nossos atos são “sementes que plantamos nas terras dos outros”.

O dono da terra que arranca a semente plantada é aquele que devolve aos outros o que recebe. Se você ataca quem lhe ataca, ofende quem lhe ofende e magoa quem lhe magoa, está arrancando as sementes que foram plantadas por ordem de Deus dentro de você.

“isto, para que não suceda que ao arrancar o joio venha também o trigo”

Quem devolve o que recebeu, nunca poderá saber se aquilo era para sua “alimentação” ou não. Quando retribuímos o sentimento (que imaginamos que originou o ato que recebemos) na mesma “moeda” (ofensa com ofensa), não poderemos saber se o que nos foi passado foi “bom” ou “mal” para nós.

É pela pressa de separar o joio do trigo (o “certo” do “errado”) que o espírito não se “alimenta” dos ensinamentos que Deus manda para ele através de outros seres humanos. Quantas vezes alguém já nos alertou de algum comportamento e, à primeira vista, recusamos o alerta classificando-o como acusação? Será que realmente o “inimigo” estava “errado”, ou nós que não percebemos o “mal” que causamos?

Este é o ensinamento de Jesus: não devemos “arrancar” nenhuma semente que Deus planta em nós, pois não sabemos se elas são joio ou trigo.

Estes dois alimentos, durante a sua germinação e crescimento, são muito parecidos. É preciso esperar que eles amadureçam para que se possa distingui-los.

Este amadurecimento ensinado por Jesus é a auto-avaliação. Quando reagimos instantaneamente a um acontecimento, acusando-o de “errado”, podemos estar eliminando uma fonte de nutrição espiritual. É necessário que se reflita sobre todos os acontecimentos para que os ensinamentos sejam compreendidos.

Esta auto-avaliação, porém, não pode ser baseada em conceitos individuais, ou seja, não pode ser avaliada com o que nós achamos “certo”. Nossos atos não podem buscar a satisfação pessoal, mas devem sempre cooperar para o equilíbrio universal.

Esta é a compaixão, integrante do amor universal. Para se alcançar a consciência do sofrimento que pode ser causado a outra pessoa é necessário que se avalie os seus atos com os conceitos dessa pessoa e não com os nossos.

Não ter conceitos não deve gerar um novo conceito: “não se deve ter conceitos”...

Não ter conceitos é participar do conceito de todos, no momento em que eles estão sendo colocados em pratica. Porém, este conhecimento não pode ser colocado em prática por obrigação ou seja, pelo conceito de que “eu não devo ter conceitos”.

Não possuir conceitos é não necessitar de razões para ser feliz. Aquele que alcançar esta consciência encontrará felicidade em todos os acontecimentos da vida e neste momento poderá participar da felicidade coletiva, a felicidade universal.

Isto é deixar as sementes amadurecerem.

“No dia, porém, da colheita, o joio aparecerá, será arrancado e queimado”

Quando conseguir colher o trigo (ensinamento espiritual contido em cada ato humano), você poderá ver o joio que cresceu junto com ele, ou seja, os seus conceitos. No entanto, se arrancá-lo ainda durante a semeadura não conseguirá se alimentar do ensinamento.

Para saber que ainda temos conceitos é necessário que eles sejam contrariados. Como saber que não gosto do amarelo em um local onde não exista esta cor?

É para isso que Deus faz o seu “inimigo” contrariar sua forma de ver e entender as coisas: ela é o seu conceito. Na verdade, os atos dos outros sempre serão trigos, pois o joio somos nós mesmos que plantamos dentro de nós...