O evangelho segundo Tomé

Logia 34 - Guia de cego

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Logia 34

“034. Disse Jesus: se um cego guia outro cego, ambos caem no abismo”.

CEGO

A definição de Jesus com relação a enxergar ou não, foi transmitida por João no seu Evangelho.

 “Eu vim a este mundo a fim de julgar, para que os cegos vejam e para que os que vêem se tornem cegos”. (9,35)

Os ensinamentos de Jesus foram trazidos com a intenção de dar a real visão das coisas àqueles que afirmam que não podem “ver” as coisas. Para compreendermos este ensinamento, temos que voltar ao tema “percepções”, já explicado neste livro.

Quando uma percepção penetra pelo órgão da visão do ser humano, ela é encaminhada ao espírito e ali é analisada com a influência dos “conceitos” pré-estabelecidos armazenados. É desta análise que sairá a compreensão sobre o que está sendo percebido. É o resultado desta análise que o ser humano chama “ver”.

Caso o ser humano tenha experimentado anteriormente uma maçã e tenha gostado, ficará arquivado em sua memória o conceito que a maçã é uma fruta gostosa. Este conceito será aplicado toda vez que o ser humano receber as informações que identifiquem uma maçã: cor, cheiro, forma e sabor. Assim, toda vez que ele vir uma maçã, não estará apenas vendo uma maçã, mas estará vendo “uma maçã gostosa”. Os sentimentos anteriores sobre determinada coisa comporão a visão que o ser humano tenha sobre ela.

Quando o espírito arquiva em sua memória conceitos sobre outras pessoas, estes conceitos serão aplicados para formar a visão que está sendo alcançada do ato atual desta pessoa. Se ela um dia teve um dos seus atos julgados como “mal” por este espírito, toda vez que a imagem dela for captada o espírito verá maldade. Esta visão independente do sentimento (intenção) que ela esteja utilizando para a prática deste determinado ato.

Aquele que se diz capaz de ver, ou seja, de compreender o que está acontecendo, na verdade está vendo aquilo que ele “acha” sobre a situação, de acordo com os conceitos anteriores já formados. Por isso “Sábio”, no livro Eclesiastes da Bíblia afirma:

“É ilusão, é ilusão. Tudo é ilusão. A gente gasta a vida trabalhando, se esforçando e afinal que vantagem leva em tudo isso? Pessoas nascem, pessoas morrem, mas o mundo continua sempre o mesmo. O sol continua a nascer e a se pôr e volta ao seu lugar para começar tudo outra vez. O vento sopra para o sul, depois para o norte, dá voltas e mais voltas e acaba no mesmo lugar. Todos os rios correm para o mar, porém o mar não fica cheio. A água volta para onde nascem os rios, e tudo começa outra vez. Todas as coisas levam a gente ao cansaço – um cansaço tão grande, que nem dá para contar. Os nossos olhos não se cansam de ver nem os nossos ouvidos de ouvir”. (1,1)

O ser humano se cansa de achar que é capaz de “ver” (saber) as verdades sobre as coisas. Entretanto, as coisas acontecem independente de seu “achar” e seguem o seu fluxo natural. Isto porque a realidade das coisas não pode ser alcançada com o “achar” do espírito, que nada mais é do que uma ilusão criada a partir dos conceitos. Como os conceitos são individuais, a “realidade” alcançada quando se “vê” alguma coisa, trata-se de uma “realidade particular”, ou seja, uma ilusão.

Para que o espírito possa realmente compreender o que está acontecendo sobre as coisas do planeta, é necessário que ele deixe de tentar compreendê-las, ou seja, de analisá-las com seus conceitos. Só desta forma ele poderá alcançar a realidade universal desta coisa. Enquanto houver a aplicação dos conceitos (“enxergar/achar”), o espírito estará preso em um mundo ilusório que só pertence a ele mesmo.

Uma calça não é bonita ou feia, pois depende do critério (conceito) anterior do espírito sobre o que é ser bonito. Uma calça é apenas uma calça, independente do gosto de cada um (realidade universal). O espírito que afirma que consegue “enxergar” as qualidades desta calça estará criando uma ilusão a partir de seus conceitos sobre a qualidade aplicada (realidade particular).

Por isto Jesus afirma que veio para trazer os ensinamentos necessários para que aquele que afirma “ver” se torne cego, ou seja, não passe mais a forma captada pelos órgãos da visão pelo crivo dos seus conceitos. O amor universal ensinado pelo Mestre não permite que o espírito qualifique as formas que percebe.

A constante análise (julgamento) de todas as formas percebidas com a utilização do conceito gera o cansaço que o Sábio falou. Este esforço acaba com a alegria de viver uma vida simples que o espírito deve ter.

Quando o espírito abrir mão deste poder de analisar todas as coisas que acontecem, encontrará a verdadeira felicidade de viver com alegria.

Por isto Jesus afirmou na logia 90: “vinde a mim, pois o meu jugo é leve e meu domínio suave e achareis repouso”.

Mesmo que o espírito conclua positivamente (elogie) o que está “vendo”, ele só pode proceder desta forma porque conhece a comparação bom/mau, feio/bonito etc. Uma calça só poderá ser bonita porque foi comparada a outra, onde o espírito “viu” feiúra.

A compaixão, característica do amor universal ensinada por Jesus, não permite que o espírito critique nada, pois desta forma estará transmitindo a reprovação, que fere.

Toda qualificação segue uma escala entre dois pontos distintos: o bom e o mal, o feio e o bonito. Esta escala necessária para se “enxergar” o objeto acaba com a igualdade necessária para que o amor universal ensinado por Jesus esteja presente.

Aquele que “vê” (acha) alguma coisa sobre qualquer ato, pessoa ou objeto, está negando os ensinamentos de Jesus. Aquele que se diz cego, ou seja, não consegue “enxergar” o que está se passando, coloca na prática os ensinamentos do Mestre.

“se um cego guia outro cego, ambos caem no abismo”

Quando um ser humano transmite para outro o seu conceito sobre determinada coisa, está afastando este outro dos ensinamentos de Jesus e, portanto, colocando pouco ou muito “sal” na vida dele. Auxiliar realmente o seu irmão na caminhada é transmitir os ensinamentos sem julgar os atos que ele estiver praticando.

Um conhecimento necessita ser vivenciado para que se transforme em base para próximos raciocínios.

Guiar alguém que ainda se imagina capaz de “enxergar” (cego) é apenas transmitir a Boa Nova de Jesus e não julgar ou analisar situações. O guia apenas ensina e permite que o seu seguidor pratique ou não, sem acusações posteriores. Aquele que faz acusações contra os que ainda conseguem “ver”, também é um cego.

O ensinamento “Deus não escolhe os capacitados, mas capacita os escolhidos”, já nos foi transmitido por Emmanuel. Aquele que recebe o ensinamento será capacitado por Deus para a perfeita compreensão dele. Esta capacitação pode ser alcançada através de dois caminhos: o amor ou a dor. Se o espírito que recebe a Boa Nova consegue reagir com amor aos acontecimentos subseqüentes, abrindo mão da sua capacidade de “enxergar” o que está se passando, aprenderá mais rapidamente.

Entretanto, a grande maioria não consegue reagir desta forma. Por este motivo, Deus precisa colocar situações onde fique comprovado que o que ele está vendo não é a realidade, mas uma ilusão criada pelo seu “saber” das coisas. É esta a “capacitação” que Deus dá àquele que foi escolhido (por merecimento) para receber as lições de Jesus.

Neste momento, aquele que serviu como transmissor para o ensinamento não pode jamais querer “enxergar” os acontecimentos e acusar quem reagiu com sentimentos negativos. Esta forma de proceder só comprovará que os dois são “cegos” espiritualmente.

Por isto Jesus condena os professores da Lei que acusam aqueles que estão sob sua orientação:

“Ai de vocês, professores da Lei e fariseus, hipócritas! Pois dão a Deus a décima parte até mesmo da hortelã, da erva doce e do cominho, mas deixam de obedecer aos ensinamentos mais importantes da Lei, como a justiça, a bondade e a obediência a Deus. Vocês deviam fazer estas coisas, sem desprezar aquelas. Guias cegos! Coam um mosquito, mas engolem um camelo”. (Mateus – 23,23)

Aquele que afirmam que fazem a sua parte, mas condenam aqueles que não fazem, não obedecem aos ensinamentos de Deus, pois não vêm a ação de Deus motivada pelo Amor Sublime aplicando a Justiça Perfeita.