Preparando-se para viver - texto

Respeito a dor do outro

Tem mais um detalhe sobre o aspecto das diferenças que queria falar. O que estou comentando não vale só para o lado positivo da vida (gostar, querer, fazer, preferir), mas também para o lado negativo: não gostar, não querer, etc.

Cada ser é diferente um do outro nas suas dores, nas suas angustias e nos seus medos. Vocês sabiam disso?

Participante: sabia...

Então, porque riem do medo dos outros, do medo que os outros sentem? ‘Ah isso é besteira, você é um bobo por ter medo de uma baratinha, um inseto tão pequeno e que não faz mal nenhum’.

Participante: não dá para deixar de ter medo de batata ...

Não estou falando do medo da barata, mas sim daqueles que menosprezam os medos que os outros têm. Estou falando do outro caçoar de você porque tem medo de barata e de você caçoar dos medos que os outros têm... Tem gente que ri dos outros porque eles têm medo de cachorro.

Vocês têm o hábito de menosprezar as coisas negativas que os outros vivem. Por exemplo, as angústias que cada um tem. ‘Ah, isso é besteira. Você está se angustiando só por causa desta coisinha à toa’.

Sim, aquela pessoa está se angustiando por isso que não lhe faz sentir-se da mesma forma, mas tem todo direito de se sentir assim pelo que quiser, pois ela é uma personalidade diferente de você. Não vendo essa diferença, acha que aquela angústia é por motivo bobo e por isso você diz que ela deveria não sentir-se daquela forma. Só que você se angustia por coisas que ela não se angustia. Neste momento ela também menospreza o que você está vivendo. Você gosta quando isso acontece? Se não, porque, então, faz a mesma coisa com os outros?

É preciso que vocês entendam que a vida é completamente individual e que ninguém é capaz de avaliar o que está acontecendo na do outro. Só que não vivem assim: ficam medindo dor. ‘

‘Você está chorando por causa de uma dorzinha num pé. Nunca teve um filho para ver realmente o que é dor’. Vocês competem até para ver quem sente a dor maior. Isso é menosprezar a dor do outro Pior: ainda diz que ama ele...

Sabe eu acho lindo quando vamos falar sobre espiritualidade e quando pergunto alguma coisa recebo como resposta que devem amar os outros. Vocês estão muito longe de saber o que é amar o próximo. Muito longe mesmo... Não sabem nem o que é respeitar, o que dirá amar.

Vocês não sabem respeitar uma dor que o outro tenha: quer logo provar que já teve uma dor maior. Fazem isso para competir, para vencer. As quatro âncoras estarão sempre presentes: vencer, ter o prazer, fama e elogio estarão sempre presentes como fundamentos em tudo que falamos, pois elas correspondem ao ideal da vida de vocês. Querem sempre vencer o outro, nem que seja em ter uma dor maior.

Participante: qual a diferença entre respeitar e amar?

Amar é muito mais do que respeitar. O respeito é um dos ingredientes do amor.

Participante: se alguém tem medo de barata, não devemos ajudá-lo a não sentir esta dor? Para isso não devemos menosprezar aquele sentimento? Acho que se não fizermos isso estaremos alimentando o medo dos outros.

O que alimenta o medo dos outros não é você, mas o que ele sente. É a vida do outro que alimenta o medo nele. Aliás, propõe sentimento e o nutre.

Segundo detalhe: se é a vida dele que faz tudo o que ele vive, nem você nem ele tem condições de deixar de ter qualquer coisa. Isso porque é a vida que cria. Sendo assim, ele jamais deixará de ter. Pode não viver o que a vida cria, mas deixar de ter não pode.

Participante: mas, não existem tratamentos médicos para que as pessoas deixem de ter determinados medos?

Quando a pessoa vai a um médico fazer um tratamento para deixar de ter medos, só existirá um resultado positivo para esse tratamento se a deixar for ter. Não foi o médico ou o tratamento que fez isso acontecer.

Sendo assim, da mesma forma que você não pode acabar, não pode alimentar.

Participante: o tratamento condiciona a pessoa a não viver mais o medo.

Sim, mas este condicionamento que o médico faz só dá resultado se a pessoa se deixar condicionar. Não deixando, médico nenhum conseguirá fazer isso.

Mas, o importante, nesta conversa, não é o ato, mas a forma como você se relaciona com o ato. Pouco importa as palavras que dirá a quem está vivendo o medo não tem problema. O problema é menosprezar a dor dele. Isso é que torna a vida neste planeta antinatural. No universo os seres ajudam os outros a vencerem seus medos, mas para isso não menosprezam o que cada um sente.

Portanto, o problema está no menosprezar, ou seja, está no fato de dizer que a sua dor é muito maior ou que a dor dele não tem sentido... Porque? Porque com isso está desrespeitando-o, desrespeitando a diferença entre vocês.

Portanto, você pode falar o que quiser, mas achar que aquela pessoa é muito besta porque tem medo de uma baratinha tão pequenininha, lhe levará a sentir-se contrariado.

Participante: quando eu convivo num lugar onde tem muita barata, morro de medo. Como me relacionar com isso?

Ainda vamos chegar lá. Ainda falaremos sobre os relacionamentos com as coisas desse mundo. Por enquanto estou querendo apenas falar no respeito às diferenças que existem entre vocês. No não deixar as diferenças servirem como causas de contrariedades nas suas vidas.

Como se faz isso? Quando se conversa com a vida e não aceita o menosprezo que ela gera à dor dos outros.

Não dá para se mensurar a dor, a angústia, o medo dos outros. Só que sabendo disso, vocês ainda dizem que o que eles sentem é besteira, pois não sentem a mesma coisa.

Participante: quando vejo uma pessoa sentindo medo, eu digo para ela que já passei por coisas que causam muito mais. Acho que dessa forma estou ajudando aquela pessoa.

Você gosta quando você está aterrorizada e diz que ele é besteira? Gosta disso? Não, mas é o que faz pelos outros. Ainda diz que ama o próximo ...

Vocês riem dos sentimentos sofredores dos outros ...

Participante: mas,

Vai vida, continua defendendo o seu ponto de vista.

Uma das formas de saber se está ajudando o outro é se colocar no lugar daquele com quem está falando. Se alguém age mostrando para você que o que o aterroriza é besteira, como viverá isso?

A resposta mais comum de vocês é: pimenta nos olhos dos outros é refresco ...

Quando quer mostrar aos outros que a dor que eles sentem não é tão forte assim, está menosprezando a dor deles. Você menospreza alguma coisa que sente ou acha que suas dores são as mais profundas do mundo? Sente-se ofendida quando alguém ridiculariza a sua dor, mas quer diminuir a dos outros.

Participante: a gente quer ajudar ...

Quer nada: quer dominar. Quer mudar o outro porque não está sentindo a mesma coisa. Mas, quando é você que sente a dor, não aceita a interferência externa: quer ser respeitado. Melhor: gostaria que os outros sentissem a sua dor também.

Um dos ensinamentos máximos de Cristo é dar aos outros o que quer para você. Vocês cumprem isso? Dão ao próximo o que exigem deles?

Respeitar a dor dos outros é fundamental para se viver essa vida de uma forma normal, pois não fazendo isso, se vive em contrariedade. ‘Ele é um frouxo, não aguenta nem uma febrinha. Ele sofre logo por causa desse pequeno detalhe que é tão besta’. Só que na hora que tem suas dores, quer que as pessoas lhe respeite, que valorizem o que estão passando.

Por causa da falta de respeito, sofre quando desrespeita os outros e quando eles desrespeitam você.

Participante: minha esposa tem tanto medo de barata que quando ela vê uma parece que está de frente a um rinoceronte e não uma simples baratinha.

Ela vê um monstro e não uma barata? Ótimo. Não menospreze o medo dela. Não diga a ela que trata-se só de uma baratinha, porque na hora que cria os seus rinocerontes onde existem apenas mosquitos, você exige que ela respeite o seu medo.