Evangelhos canònicos - Textos

Amor e paixão

Mas eu digo a vocês que estão me ouvindo: Amem os seus inimigos e façam o bem para aqueles que odeiam vocês. Desejem o bem para aqueles que os amaldiçoam e façam orações em favor daqueles que maltratam vocês.

Hoje, vamos falar sobre a questão do amar... Não um amar qualquer, mas o amar como Cristo ensinou: o amar universalmente.

Em outras vezes já me perguntaram muitas vezes sobre a questão de amar. Por isso hoje vamos tentar deixar bem claro o que é o amor universal, aquele que é absoluto, e que não é entendido pelos seres humanizados.

Já neste primeiro texto do estudo de hoje encontramos um direcionamento para este amor quando Cristo diz: ame os seus inimigos e faça o bem aos que odeiam vocês. Este é um parâmetro estabelecido pelo mestre para que o amor exista... Mas, não é assim que os seres humanizados, mesmo os religiosos, amam...

Quando o ser humanizado ama, o faz de uma forma relativa. Ou seja, para o mundo carnal, o amor é compreendido como um sentimento que se deve ter por algumas pessoas que, dentro do critério do ser humanizado, são julgadas como merecedoras de recebê-lo.

O amor humano é relativo, porque dentro desta seleção que o ser humanizado faz, ele descobre outros que não devem ser amados... Ou seja, o ser humanizado imagina que há pessoas que são merecedoras de receber o amor e outras que não são...

Interessante isso... Interessante porque o julgamento que determina quem merece ou não ser amado é feio pelo próprio ser humanizado, como se ele tivesse a competência para julgar o próximo...

O amor que Cristo ensina, o universal, é um sentimento que extrapola julgamentos ou motivos para existir. O amor crístico é aquele que não vê quem está recebendo este sentimento; não se preocupa se quem está recebendo merece ou não.

O amor universal ama indiscriminadamente... O amor universal ama incondicionalmente...

Eis aí, portanto, um detalhe sobre o amar: ele é uma atividade sem interlocutor e sem receptor específico. Quem quer amar universalmente não pode amar a alguém específico e nem amar porque, como, quando ou onde.

O amor universal é aquele sentimento que o espírito dedica ao Universo, ou seja, a todos os elementos existentes e o faz o tempo inteiro e não apenas em momentos onde julgue que este sentimento deva existir.

Participante: Estava falando com uns amigos e eles disseram que existiam diversos tipos de amor. Eu ouvi e depois fui pegando as palestras anteriores e as li. Posteriormente lhe fiz diversas perguntas e vi que existe apenas um amor verdadeiro: o amor universal, o amor de Cristo. Vi também que existe o pseudo-amor, aquele que é baseado no ego, ou seja, a paixão. O que você acha deste raciocínio?

Perfeito... Só, por favor, não acredite que existem diversos amores ou diversos tipos de amor, nem que seja sobre o título de pseudo-amor.

Como vimos anteriormente, só uma coisa é Absoluta e, por isso, só ela pode ser chamada de Real. Sendo assim, só existe um Amor que merece este título: aquele ensinado por Cristo. O resto são paixões geradas pelo ego e que são rotuladas com o nome de amor.

Amor e paixão: esta é a diferença que eu quero colocar no que você falou.

Só existe um amor: as paixões são ilusões, irreais. Como isso, porém, não quero dizer que ter paixões é algo “errado”, já que elas são inerentes ao ser humanizado.

Ter paixões não é “errado”. Agora chamá-las de amor e, com isso, dizer que existem diversos tipos de amor é vivenciar o relativo como absoluto. Isto não lhe leva a lugar nenhum no sentido da elevação espiritual.

Portanto, é exato o que você está falando. Aliás, foi por causa de suas perguntas que escolhi para hoje o tema amor e paixões. Vamos desmistificar a questão do amor.

Hoje vamos começar a compreender que existe um único amor que não é nada do que os humanos chamam de amor. Aliás, por muitas vezes o amor crístico fere as condições de amar que são criadas pelos seres humanizados.

Quando Cristo diz que você deve amar o seu inimigo, por exemplo, ele está dizendo: não tenha paixão pelo seu amigo, porque se tiver, ou seja, for apaixonado por uma amizade, não conseguirá amar o inimigo... Mas, ser amigo é uma das condições para amar que os humanizados impõem, não é?

Este é o aspecto que a humanidade não entende sobre o amor. Alguns seres humanizados querem amar o inimigo como Cristo ensinou, mas querem fazê-lo mantendo separados os amigos dos inimigos, ou seja, querem viver de forma igual paixões positivas e negativas.

Isso é impossível. Eles acabam amando a paixão positiva e não desejando a paixão negativa.

Por isso é preciso acabar com algumas hipocrisias a respeito do amor. Quem ama, ama a todos e o tempo inteiro. Quem ama apenas alguns momentos e apenas alguns elementos, tem paixões e não amor...

Desejem o bem para aqueles que os amaldiçoam e façam orações em favor daqueles que maltratam vocês. Se alguém lhe der um tapa na cara, vire o outro lado para ele bater também. Se alguém tomar a sua capa, deixe que leve a túnica também. Dê sempre a qualquer um que lhe pedir alguma coisa; e, quando alguém tirar o que é seu, não peça de volta.

O amor – preste bem atenção nisso – não cria propriedades individuais...

O amor verdadeiro não gera propriedades para quem ama. Não o faz sentir-se proprietário daquele ou daquilo que ama.

O amor Real, o Universal, o de Cristo, não gera posse... Isto porque a posse em si já é um condicionamento da existência do amor. Com isso encerrou-se o caráter universal deste sentimento que os humanizados chamam de amor. O amor que contém expresso em si posses não é amor, mas paixão.

Quem ama de verdade, de Realidade, não possui o objeto desse amor. Mas, o que é possuir? É querer definir o destino e a ação do objeto ou pessoa possuído...

A posse sob o objeto material se traduz por paixões como estas: é minha casa, tem que estar arrumada do jeito que eu quero... É meu carro tem que estar sempre funcionando e não pode bater... É minha televisão, toda vez que apertar o botão tem que funcionar.

A posse sobre os outros ocorre quando, a partir da paixão, o ser humanizado espera do outro atitudes que ele quer receber... Ou seja, espera que o seu amigo, marido, mulher, parentes, lhe seja fiel...

A posse leva o ser humanizado a esperar que as outras pessoas concordem sempre com ele e estejam preocupadas em fazer aquilo que ele gosta, quer ou acha “certo”. Isto não é amor e se você diz que ama essas pessoas, isso é ilusão: você não ama, mas tem paixão.

O amor universal não cobra nada de ninguém. O amor universal pelos objetos existe quando elas funcionam, quando estão do jeito que o ser humanizado queria que estivessem. O amor universal com as pessoas não exige comportamentos ou atitudes pré-estabelecidas e esperadas para existir.

É isso que está, vamos dizer assim, por trás deste comentário de Cristo...

Vocês estão cansados de ler o ensinamento que diz que tem que se amar o inimigo, mas ainda não entenderam que o simples fato de terem amigos prova que não amam ninguém, mas só a vocês mesmos.

Só amam a si mesmo porque condicionam o amor ao atendimento que esta pessoa ou objeto faz às suas condições pra amar... Amam quem lhes satisfaz e enquanto esta satisfação acontecer. Quando a pessoa ou objeto não mais estiver realizando seus desejos positivos ou lhe ajudando a escapar dos seus desejos negativos, você não vai mais querer saber dela, não mais a amará...

Como disse, hoje queremos desmistificar esta questão de amor. Para isso vou lhes dar um conselho: parem de dizer eu lhe amo... Isto é falso.

Parem de achar e imaginar que são bonzinhos e amam os outros, porque isso é falso. O amor que imaginam que dão é apenas uma sensação. É um amor racional, um amor fundamentado em paixões. Na verdade, tais sensações existem para que o ser possa provar a si mesmo que ama a Deus acima de todas as coisas e ao próximo como a si mesmo...

Esqueçam... Esqueçam que amam alguém para não viverem a hipocrisia que Cristo falou dos professores da lei. Declarem expressamente que não amam ninguém, porque, nesta hora, pode ser que comecem a amar o Universo.

Façam aos outros a mesma coisa que querem que os outros façam a vocês.

 Esta é a base do amor universal. Amar universalmente é dar o que você espera receber...

Você quer receber carinho dos outros? Dê carinho a todos...

Você quer receber amizade dos outros? Dê amizade a todos...

Quer receber compreensão dos outros? Compreenda a todos...

Sabe por que? Ouça o que Cristo diz...

Se vocês amam aqueles que os ama, por que esperam alguma recompensa divina? Até as pessoas de má fama amam os que têm amor por elas. E se vocês fazem o bem somente àqueles que lhes fazem o bem, por que esperam alguma recompensa divina? Até as pessoas de má fama fazem isso. E se vocês emprestam somente para aqueles que vocês acham que vão lhes pagar, por que esperam alguma recompensa divina? Até as pessoas de má fama emprestam aos que tem má fama, para receberem de volta o que emprestaram. Ao contrário, amem os seus inimigos e façam o bem a eles. Emprestem e não esperem receber de volta o que emprestaram e assim vocês terão uma grande recompensa divina e serão filhos do Altíssimo Deus.

Sabe, se você só quer compreender quem diz que ama, como espera que Deus lhe compreenda? Se quer dar carinho apenas àqueles que quer, como espera que Deus lhe dê carinho?

Saiba de uma coisa: dar carinho a quem se ama é mais fácil do que fazer coco de cócoras. É simples, é um prazer. Não há nisso nenhuma doação...

Por isso afirmo: o fundamento que gera a existência da universalidade no amar é a doação... Para você entender o amor universal é preciso compreender isso: não se pode falar em amor universal sem doação de verdades, posses, paixões e desejos...

Se você está apegado apenas àquele que retribui o seu apego, o que espera? O que espera de Deus, do Universo, se você é individualista? Quem escolhe a quem se apegar, o que espera do Universo, que é universalista e não separa elementos “bons e maus”, “certos ou errados”?

Esse é o fundamento universal do amor crístico que precisa ser bem compreendido. Tudo que existe na Realidade do Universo é universalista e, por isso, vive em equanimidade com tudo e com todos...

Chamar paixão de amor, ou seja, chamar egoísmo – porque a paixão é fundamentada no egoísmo – de amor, é hipocrisia. Saiba de uma coisa: o egoísmo, ou seja, tudo que se baseia numa condição individual, é a antítese do amor universal.

Amar a tudo e a todos de uma forma indiscriminada. Amar doando-se sem esperar retribuições: isso é atividade de espírito. Já a atividade do ser humano é amar apenas aquele que ele quer. Na verdade é apenas dizer que ama, porque na realidade o que nutre pelo próximo é uma paixão...

O ser humanizado ama apenas aquele lhe puxa o saco, que primeiro faz o carinho para depois receber, que primeiro lhe presta o serviço. Já o ser universal ama antes de qualquer coisa que o outro faça. Estas são as diferenças básicas entre a paixão que vocês chamam de amor e o Amor Crístico, o Universal.

Participante: O que você chama fazer a vontade do próximo é o que acabou de ser lido?

Sim, é servir ao próximo. Fazer a vontade do próximo é estar sempre à disposição do próximo.

Agora, volto a repetir uma coisa: eu não falo de atos. Outro dia me perguntaram: e se o outro quiser que eu vá matar alguém... Tenho que servi-lo? Eu respondi: com relação ao ato, Deus dirá o que acontecerá. Agora internamente, sentimentalmente, você tem que estar sempre à disposição do outro.

Participante: Explique-me melhor a sua afirmação que diz que o ato do meu inimigo é o amor de Deus em ação. Como o meu inimigo é a presença de Deus?

Veja... Você não é um ser humanizado, não tem vida e, por isso, não participa de atos. Você é um espírito que tem uma existência eterna. Aquilo que você chama de atos humanos, na verdade, fazem parte desta existência, mas não com os valores que representam agora para você, mas como provações da sua caminha espiritual.

Ou seja, o ato do seu inimigo desta vida carnal é o seu carma, é uma provação. Por quê? Porque o ato do seu inimigo trabalha justamente esta questão da paixão.

O que é ser seu inimigo? É ser uma pessoa que não satisfaz as suas vontades... O que é o ato que ele pratica? São atitudes que não satisfazem os seus desejos...

Como já estudamos, o desejo, a vontade e a paixão são elementos carmaticos, ou seja, são provas. Assim, quando o seu inimigo lhe faz alguma coisa, está criando uma oportunidade para você vencer seus desejos, paixões, posses e com isso vencer o seu egoísmo. Como resultado disso, se alcança a elevação espiritual.

Costuma se dizer que a ação do seu inimigo é um presente de Deus, fruto do amor do Pai, porque é a oportunidade para o espírito realizar o objetivo da encarnação. Se não houvesse estas provas, não haveria encarnação e nem elevação espiritual.

Então, o ato do inimigo é uma dádiva de Deus porque é a oportunidade do trabalho. Mas, o ato do amigo também, pois ele mexe com paixões, vontades e desejos iguais ao ato do inimigo.

Na verdade, o que você precisa se libertar é da paixão – do amar porque, do não amar porque – e alcançar o amor que Cristo ensinou e que é incondicional e universal.

Repare que para mudar a sua compreensão do ato do seu inimigo (de “mal” para fruto do amor de Deus) só alterei uma coisa: a sua forma de ver. Não alterei em nada o acontecimento, ou seja, não mudei a ação. Ou seja, utilizei a livre opção (livre arbítrio) que o Espírito da Verdade ensina.

NOTA: Na resposta à questão 851 de O Livro dos Espíritos, o Espírito da Verdade afirma que os acontecimentos da vida ocorrem de acordo com a escolha feita pelo espírito antes de encarnar. Apesar disso, afirma ainda o mentor de Allan Kardec, o ser universal continua, no tocante às provas morais e tentações, livre para escolher entre o bem e o mal.

No nosso caso, o amigo espiritual não alterou a ação porque ela é uma decorrência dos gêneros de provas escolhidos pelo espírito, mas mudou a visão, ou seja, a forma sentimental como encarar a situação.

Para o humano a felicidade está na satisfação material, prazer. Por isso ele precisa adequar as ações às suas vontades e paixões para ser feliz. Quando os acontecimentos não coincidem com o que o humano “acha”, o ato do inimigo transforma-se em “ruim”, “mal”.

Já para o espírito, a realização está na boa execução de suas provações. Por isso o ato do inimigo passa a ser bom, ótimo e perfeito para quem quer se elevar.

Façam isso porque Ele também é bom para os ingratos e maus. Sejam bons, assim como o Pai de vocês é bom.

No Evangelho de Mateus, tem um trecho interessante.

Vocês sabem o que foi dito: “Ame os seus amigos e odeie os seus inimigos”. Mas eu lhes digo: amem os seus inimigos e orem pelos que perseguem vocês para que vocês se tornem filhos do Pai que está no céu. Porque ele faz o sol brilhar sobre os bons e os maus e dá chuva tanto aos que fazem o bem como aos que fazem o mal. Se vocês amam somente aqueles que os amam, porque esperam alguma recompensa de Deus? Até os cobradores de impostos amam aqueles que os amam. Se vocês falam somente com os seus amigos, o que é que fazem de mais? Até os pagãos fazem isso! Portanto, sejam perfeitos em amor, assim como é perfeito o Pai de vocês, que está no céu. (Evangelho de Mateus – Capítulo 5 – versículos 43 a 48).

Ou seja, Cristo afirma que a dádiva de Deus necessária para a vida está à disposição daqueles que você considera bom assim como os que você considera mau... Já repararam nisso?

Com este ensinamento, Cristo está nos mostrando a característica do amor de Deus: ser igual para todos... Deus ama a todos de uma forma igual.

Juntando o que está em Mateus (“sejam perfeitos em amor, assim como é perfeito o Pai de vocês”) tudo a respeito do amar fica compreendido. Ou seja, compreende-se que não dá para amar ao próximo de uma forma não universal. Por quê? Porque Deus ama a todos de uma forma universal e se o ser humanizado aspira entrar no Reino do Céu precisa praticar este amor.

Esta é a palavra importante para se entender o amor: ser perfeito no amar como Deus é perfeito em amar. Amar não aceita imperfeições, porque quando o amor é imperfeito, ele não existe. Transforma-se numa paixão, ou seja, num elemento de provação, uma ilusão do qual precisa se libertar.

Então, mais um ensinamento interessante sobre o amor ensinado por Cristo: ame como Deus ama a todos. Ame universalmente...

Encerrando esta questão, quero apenas dizer que, amar universalmente, dentro da única compreensão que vocês podem ter, é não amar como amam hoje... Vocês são incapazes de gerar este amor universal, porque o ego agirá, como instrumento de provação que é, sempre criando condições.

Apesar disso afirmo uma coisa: vocês são capazes de reconhecer a existência do condicionamento... Os seres humanizados podem não saber amar universalmente, mas são capazes de identificar as paixões, ou seja, as razões para amar.

Por isso lhes digo: libertem-se destas paixões que vocês estarão amando como Cristo disse que deve se amar...