Emoções

A natureza espiritual e a humana

Se realizar a reforma íntima não é freqüentar cultos, orar, estudar, assumir posição de guia, trabalhar com a mediunidade, fazer a caridade material, buscar o místico, conferir super valores a elementos deste mundo, o que é então? Vamos ver isso...

O que eu quero dizer é isto: deixem que o Espírito de Deus dirija as suas vidas e não obedeçam aos desejos da natureza humana. Porque o que a nossa natureza humana deseja é contra o que o Espírito quer, e o que o Espírito quer é contra o que a natureza humana deseja. Os dois são inimigos, e por isso vocês não podem fazer o que querem. Porém, se é o Espírito que guia vocês, então, não estão debaixo da Lei.

Gálatas, 5, 16 e 17.

Paulo nos afirma que o que a natureza humana quer é contra o que o espírito quer. Mas, não foi só Paulo que disse isso. Cristo também ensinou que não se devem amealhar bens na Terra, mas sim no céu e os demais mestres também ensinaram que a natureza humana é contrária à espiritual. .

Esta informação, portanto, é importante para o espiritualista, pois ela deixa claro o que precisa ser reformado: a natureza humana que o espírito vive durante a encarnação. Este é o trabalho que precisa ser realizado pelo ser durante a vivência dos acontecimentos do mundo humano. Por quê? Porque quem vive a existência carnal preso à natureza humana é movido pelas paixões determinadas por ela.

Sei que vocês acham que os anseios humanos são idênticos aos do espírito liberto da materialidade, mas isso não é real. Aquilo que o ser universal almeja quando encarnado nada tem a ver com aquilo que acreditava importante conseguir antes.

Em O Livro dos Espíritos Kardec pergunta se não seria natural que o espírito ao encarnar escolhesse para si apenas situações prazerosas. Em resposta o Espírito da Verdade diz o seguinte:

“Pode parecer-vos a vós; ao Espírito não. Logo que este ser se desliga da matéria, cessa toda ilusão e outra passa a ser a sua maneira de pensar”. (pergunta 266)

Os anseios do espírito liberto da carne são diferentes daqueles que estão apegados à natureza humana. Quando liberto, a sua única preocupação é ter todas as oportunidades para realizar a sua reforma íntima e aproximar-se de Deus. Quando vivendo de acordo com a natureza humana, este ser sonha em realizar seus desejos materiais, em conseguir conquistas humanas. É por conta desta diferença de ânimo que cessa logo que o espírito desencarna que Paulo e todos os mestres disseram que ela é contrária à natureza espiritual.

É exatamente por causa dessa divergência de desejos que a natureza humana torna-se contrária àquilo que o espírito quer. É por isso que eles precisam ser combatidos e combatê-los é o que caracteriza o trabalho da reforma íntima.

Sei que vocês por estarem humanizados devem estar achando que o que estou falando não é real, mas vejam esta afirmação do Espírito da Verdade na pergunta 267 de O Livro dos Espíritos:

“O desejo que então alimenta (encarnado) pode influir na escolha que venha a fazer, dependendo isso da intenção que o anime. Dá-se, porém, que, como Espírito livre, quase sempre vê as coisas de modo diferente”.

Mas, por que o desejo do espírito quando humanizado se altera? Por causa das três bases da vida ou três comportamentos que norteiam a interatividade do ser encarnado nos relacionamentos com as pessoas, objetos e acontecimentos de sua existência.

A primeira base ou comportamento que norteia a vida e gera os desejos do ser humanizado é o materialismo. O espírito quando encarnado é sempre materialista por essência. Mesmo aqueles que buscam a Deus, na verdade ainda almejam o bem material. Já o espírito norteia a sua interatividade com base no espiritual.

Sei que muitos estão pensando que estou faltando com a verdade quando afirmo que até aqueles que buscam a Deus querem o materialismo, mas é isso mesmo. Por exemplo: vocês hoje abandonaram o prazer (se divertir, passear assistir televisão, namorar) para poderem comparecer aqui. Para vocês, esta é uma demonstração clara que são espiritualistas. Mas, antes de encerrar a questão, vamos compreender as intenções que trouxeram cada um até aqui.

Vocês vieram aqui como fruto de um desejo de estar, ou seja, decidiram que queriam estar aqui antes de vir? Então, estão buscando satisfazer este desejo e isto é materialismo. Se estivessem aqui sem antes terem decidido e planejado estar, então, estariam no espiritualismo.

O exemplo que usei é uma demonstração de materialismo, apesar do que muitos acham, pois, ser materialista não é apenas querer objetos materiais (dinheiro, bens materiais). Materialista é aquele que quer a felicidade material, o prazer, a satisfação de ver seus desejos realizados.

Esperar viver aquilo que se quer: isto é materialismo. Mesmo que o desejo seja voltado para as coisas divinas, quando existe o contentamento de ter realizado o que era desejado o ser humanizado vive a sua natureza humana e não a espiritual. Sonhar em realizar os desejos, não importa quais sejam, é viver a partir da natureza humana.

Ter o espiritualismo como base de vida é mais do que se voltar para as coisas divinas, mas caracteriza-se por alcançar a felicidade com as coisas divinas. Quem alcança esta felicidade vive na equanimidade (‘se for, é bom; se não for, também estará bem’) e não no prazer (‘que bom, consegui vir’) ou na depressão (‘eu queria tanto ter ido’).

Portanto, quem quer viver a sua natureza espiritual precisa reformar-se. Precisa deixar de sonhar conseguir realizar seus desejos para viver a felicidade e vivenciá-la sempre, mesmo que o sonha não seja alcançado.

O segundo aspecto da natureza humana é que ela age sempre guiada por regras e normas. Esta é uma forma de viver que não se coaduna com o Universo espiritual, pois os seres universais reconhecem o direito de livre arbitrar sobre suas ações que cada espírito tem. Como reconhecem este direito, não crêem em regras e normas que padronizem uma ação como certa e classifiquem outras como erradas.

Esta forma de viver aplica-se a todos os acontecimentos da existência de um espírito. Mesmo que o ser venha a ser prejudicado com o que o outro faz, por conta do reconhecimento do direito de livre optar pelo que quer do outro, o espírito nunca o acusa ou ataca.

Já aqueles que vivem apegados à natureza humana não vivem assim. Eles sempre subjugam os acontecimentos da vida a regras normativas que criam o certo e o errado a ser feito. Mesmo o trabalho de elevação espiritual é realizado a partir de codificações que criam obrigações que precisam ser cumpridas. Apesar de aparentemente para vocês humanos ser necessário se cumprir obrigações e sujeitar-se e normas, a evolução espiritual não necessita disso. Por isso Paulo também nos ensina:

“É claro que ninguém é aceito por Deus por meio da Lei, pois as Escrituras dizem: ‘viverá aquele que, por meio da fé, é aceito por Deus’. (Gálatas, 3, 11)

No mundo espiritual não existem padrões e regras porque não existe individualismo, ou seja, cada um experimenta a sua individualidade pelo seu caminho. Apenas uma coisa existe no Universo e ela é genérica: o Amor. Só o amor é comum a todos os espíritos e, por conseguinte o amar. Assim sendo os espíritos vivem pela consciência amorosa que possuem e não por padrões ditados por quem quer que seja, inclusive Deus.

Portanto, para se viver a natureza espiritual é preciso ligar-se sempre ao amor e não a regras de comportamento. Este é o segundo aspecto que precisa ser reformado por aquele que pretende aproveitar a oportunidade da encarnação que está tendo.

A terceira característica diferente entre as naturezas é que a humana é individualista enquanto que a espiritual é universalista. A natureza humana está sempre buscando o seu bem individual enquanto que a espiritual está sempre buscando viver para o próximo, para servir o próximo sem intencionalidade alguma.

A natureza espiritualista é completamente livre de paixões individualizadas e, portanto, sem desejos a serem satisfeitos. O único objetivo da natureza espiritual é servir incondicionalmente ao próximo. Já a natureza humana é apegada a paixões que geram vontades. Ela não consegue lidar com os elementos da existência carnal sem gerar uma paixão individual. Mesmo no tocante ao relacionamento com as coisas divinas, a natureza humana está sempre pensando em si primeiro.

Por exemplo, vocês vieram aqui para evoluírem, para adquirir conhecimento para a sua evolução ou para servir ao próximo? Claro que foi para si, para ganhar. É este egoísmo de querer para si, mesmo que seja a elevação espiritual, que caracteriza a natureza humana.

Aquele que vivesse na essência espiritual viria aqui sem planejar, sem desejar, mas porque Deus o trouxe. Estaria aqui participando desta conversa com a consciência amorosa, ou seja, emanando amor e não prestando atenção em regras e normas para sua evolução. Enquanto aqui permanecesse não esperaria receber nada, mas estaria sempre voltado a expandir o amor para servir ao próximo.

Estes são os três elementos que levaram Paulo e o Espírito da Verdade a nos dizer que o que a característica humana deseja é contrária ao que a característica espiritual quer. Esta constatação precisa ficar bem clara para aqueles que pretendem realizar a elevação espiritual, pois não adianta se buscar a vida espiritual na natureza humana, ou seja, com prazer, com regras e normas e com individualismo. É preciso buscá-la com a natureza espiritual: com o espiritualismo, que se traduz pela felicidade incondicional, que é fruto da consciência amorosa da ação, e pelo universalismo, se doar ao próximo.

Resumindo para deixar bem clara esta questão da busca da elevação espiritual: não se trata do que se faz, mas de como se faz, para que se faz. O ato, a ação, não é por si só atributo de elevação ou não. O que pode ser considerado como atributo de elevação espiritual é a base da ação: a intencionalidade com que se vivencia cada acontecimento da existência.

Por isso, não importa se você passa o dia inteiro rezando ajoelhado no milho ou se freqüenta regularmente um local de ligação com Deus; se não tiver como fundamentos da sua existência o espiritualismo, a consciência amorosa e o universalismo, nada foi realizado.